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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.20 no.1 São Paulo jan./abr. 2018

http://dx.doi.org/10.5935/1980-6906/psicologia.v20n1p223-234 

ARTIGOS
PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO

 

Escala de reação ao curso em educação a distância: adaptação e estrutura fatorial

 

 

Lara Barros MartinsI; Thaís ZerbiniII; Francisco José MedinaIII

IFaculdade Meridional, Passo Fundo, RS, Brasil
IIUniversidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIIUniversidad de Sevilla, Sevilha, Espanha

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo adaptar e analisar a estrutura fatorial e as propriedades psicométricas da Escala de Reação aos Procedimentos Instrucionais em Educação a Distância (ERPI-EAD) e sua relação com a efetividade do treinamento no trabalho. Participaram deste estudo 3.600 funcionários de um banco estatal brasileiro respondendo à ERPI-EAD depois de realizar um curso on-line. Mediu-se o impacto do treinamento no trabalho em amplitude com uma escala de autoavaliação. Foram realizadas análises de consistência interna, fatorial confirmatória e regressões múltiplas. Uma estrutura unifatorial e um alto nível de ajuste para o modelo foram encontrados. A satisfação dos participantes com o curso esteve relacionada à efetividade do treinamento. Sugere-se o uso da ERPI-EAD como uma medida confiável e válida, que prediz a efetividade de treinamento, contribui para a coleta de informações relevantes à melhora dos aspectos instrucionais e assegura melhores resultados de desempenho no trabalho.

Palavras-chave: educação a distância; avaliação; reação; escala; efetividade de treinamento.


 

 

Introdução

As reações podem ser definidas como a opinião e a satisfação dos treinandos sobre diversos aspectos do treinamento. Os participantes julgam a qualidade do plano instrucional ou de sua programação (objetivos, adequação e sequência de conteúdo, duração etc.), a qualidade de sua execução e o apoio oferecido (por exemplo, instalações e materiais didáticos), que são indicadores também da qualidade de entrega da instrução, refletindo a satisfação geral dos participantes com o curso (resultados afetivos), bem como a relevância e a utilidade dos conteúdos- em que medida os egressos sentem que o treinamento foi útil para ajudá-los a realizar seus trabalhos (Alvarez, Salas, & Garofano, 2004; Klein, Noe, & Wang, 2006).

As medidas de reações estão marcadamente presentes nos estudos da área de avaliação da efetividade de programas de Treinamento, Desenvolvimento e Educação (TD&E). A preocupação atual dos estudos concentra-se particularmente em torno da questão de como usar as reações para melhorar o desenho e a entrega de treinamentos, não utilizando essa medida como o único critério de eficácia do treinamento, mas associada a outras variáveis que possam conduzir ao aprimoramento do planejamento instrucional conforme dados sobre a avaliação de efeitos produzidos (Aguinis & Kraiger, 2009).

A mensuração e a coleta dessas informações visam aprimorar procedimentos próprios da instrução para facilitar o alcance de resultados de aprendizagem e de desempenho almejados por uma organização, uma vez que a adoção das estratégias e dos métodos de ensino, combinados à escolha da mídia instrucional, são apontadas como fatores importantes para que ocorra o impacto do treinamento no trabalho (Burke & Hutchins, 2007)- principal indicador da efetividade de ações de treinamento no nível individual, que se refere aos efeitos a longo prazo do treinamento no comportamento do egresso, em termos de desempenhos gerais no trabalho (Abbad, Pilati, Borges-Andrade, & Sallorenzo, 2012; Grossman & Salas, 2011; Pilati & Abbad, 2005).

Os procedimentos instrucionais são constituídos por diferentes estratégias e princípios de ensino, como ferramentas, métodos e o próprio contexto, que são combinados e integrados para criar uma abordagem de entrega do treinamento, pois a forma que ele foi planejado, organizado e estruturado importa para que se obtenha êxito (Salas, Tannenbaum, Kraiger, & Smith-Jentsch, 2012). Desse modo, os procedimentos instrucionais adequados devem ser elegidos de acordo com os resultados prévios que mostraram vínculos com o processo de transferência, ou seja, a aplicação eficaz no ambiente de trabalho das novas competências aprendidas (Burke & Hutchins, 2007).

Deve-se medir as reações de ações educacionais on-line e aperfeiçoar o uso de tais informações (Long, DuBois, & Faley, 2008), já que os contextos de Educação a Distância (EAD) apresentam especificidades (por exemplo, procedimentos instrucionais apoiados em tecnologias, tutoria on-line, ambiente virtual de aprendizagem) que podem influenciar a sua efetividade. De modo geral, os estudos indicam que os participantes apresentam reações favoráveis (Lim, Morris, & Kupritz, 2007; Vaughan & MacVicar, 2004), mostrando inclusive preferência pelo método a distância em comparação com outros modos de instrução, como os tradicionais em sala de aula (DeRouin, Fritzsche, & Salas, 2005).

A satisfação pode levar a níveis mais altos de engajamento, aprendizagem e sucesso na EAD (Sahin & Shelley, 2008), possuindo vínculos com o processo de transferência de competências e interferindo nos resultados de treinamentos (Carvalho & Abbad, 2006; Zerbini & Abbad, 2010). Dessa forma, conhecer os fatores capazes de interferir na (in)satisfação dos participantes permite otimizar o impacto dos programas de e-learning, oferecer subsídios para intervenções efetivas (Martins & Zerbini, 2016) e aumentar a retenção de aprendizagem (Chyung & Vachon, 2013).

Acompanhando as novas tendências de oferecimento de programas educacionais a distância, foram propostas medidas nacionais específicas de reação para cursos dessa natureza. Tais medidas buscam aferir a satisfação dos participantes em relação à qualidade dos procedimentos do curso (objetivos, estratégias e meios de ensino, conteúdos, avaliações de aprendizagem) e também às ferramentas virtuais de interação (links, fóruns, chats etc.).

Inicialmente, a primeira versão da medida de reação aos procedimentos instrucionais foi proposta por Zerbini e Abbad (2005) e era composta por três fatores: Procedimentos Tradicionais (9 itens, α = 0,91), Recursos da Web (7 itens, α = 0,89) e Atividades e Exercícios (7 itens, α = 0,85). A mesma medida foi revalidada por Borges-Ferreira (2005)- estrutura unifatorial (12 itens, α = 0,89)- e depois por Zerbini e Abbad (2009)- Procedimentos Tradicionais (12 itens, α = 0,91) e Recursos da Web (3 itens, α = 0,76). Posteriormente, Martins e Zerbini (2015) propuseram uma versão adaptada com 17 itens (α = 0,96) e uma estrutura unifatorial. As adaptações foram necessárias para adequar as medidas às diferentes amostras de participantes e aos contextos de aplicação (a distância ou híbridos), como: cursos técnicos e profissionalizantes, abertos e gratuitos de alcance nacional, ou de graduação.

Embora as medidas mencionadas apresentassem bons a excelentes índices psicométricos, em alguns casos, o grande número de itens em soluções de fator único e os altos índices de confiabilidade poderiam sugerir que havia repetição de conteúdo ou sobreposição de aspectos avaliados pelos itens. De fato, foi constatada a presença de multicolinearidade, por exemplo, no instrumento de Martins & Zerbini (2015)- quatro pares de itens altamente correlacionados entre si.

Diante disso, o presente estudo objetivou adaptar e analisar a estrutura fatorial e as características psicométricas da Escala de Reação aos Procedimentos Instrucionais em EAD (ERPI-EAD) e sua relação com a efetividade do treinamento no trabalho. A confirmação da estrutura fatorial do instrumento ERPI-EAD justifica-se tendo em vista várias pesquisas nacionais, inclusive em diferentes contextos EAD (Borges-Ferreira & Abbad, 2009; Carvalho & Abbad, 2006; Martins & Zerbini, 2015; Zerbini & Abbad, 2009), que utilizaram a medida, a qual manteve as boas qualidades psicométricas e os índices de consistência interna considerados excelentes. No entanto, todas as pesquisas possuíam caráter exploratório e, portanto, não realizaram a validação estatística do instrumento por meio de análise fatorial confirmatória, mantendo esse passo como agenda de pesquisa. Portanto, este estudo pretende apresentar evidências de validade da ERPI-EAD, possibilitando investigar a satisfação de participantes de cursos on-line em diversos contextos.

 

Método

Participantes

Os participantes foram funcionários de um banco estatal brasileiro, que haviam realizado durante a jornada de trabalho um treinamento on-line e autoinstrucional sobre o tema da promoção de eficiência operacional nas atividades de trabalho ("Eficiência Operacional"). As características demográficas e funcionais obtidas de 1.639 respondentes indicam que a maioria é do sexo masculino (56,8%), tem entre 46 e 55 anos de idade (26,1%), trabalha na Unidade de Apoio aos Negócios e à Gestão (37,8%), possui experiência na função de 1 a 3 anos (20,3%) e concluiu estudos na Graduação (33,6%).

Instrumentos

O instrumento ERPI-EAD contém 9 itens associados a uma escala de qualidade que varia de 1 ("Péssima") a 5 ("Excelente"), que avaliam a satisfação dos participantes em relação à qualidade dos procedimentos do curso. Foi adaptado da versão proposta por Martins e Zerbini (2015): estrutura empírica unifatorial com 17 itens, α = 0,96 e cargas fatoriais entre 0,60 e 0,86. Devido à presença de multicolinearidade (ou seja, pares de itens altamente correlacionados entre si) na estrutura original, uma adaptação mais expressiva da escala, com a eliminação de itens redundantes, era necessária para gerar um instrumento mais parcimonioso. A ERPI-EAD foi submetida à validação por juízes (n = 2), especialistas da área, que visou analisar o seu conteúdo ao revisar os itens, verificar a adequação teórica do instrumento, a escala de mensuração e as instruções de preenchimento.

Para medir o impacto do treinamento no trabalho em amplitude, foi utilizada uma versão adaptada da "Escala de Impacto no Treinamento no Trabalho" (Pilati & Abbad, 2005), com 7 itens (α = 0,89 e cargas fatoriais: 0,62 a 0,86) e alternativas de resposta pontuadas de 1 ("Não concordo") a 5 ("Concordo totalmente"). O impacto em amplitude refere-se à influência indireta do treinamento sobre o desempenho global, atitudes e motivação dos egressos (exemplos de itens: "Realizo meus trabalhos com mais agilidade", "Melhorou a qualidade do meu trabalho", "Aumentou minha motivação para o trabalho").

Procedimentos de coleta e de análise de dados

A coleta de dados foi realizada totalmente a distância, por meio da disponibilização do questionário virtual na página da Universidade Corporativa do Banco a uma amostra potencial de 3.600 funcionários que participaram do curso mencionado.

Para executar as análises, o Statistical Package for the Social Science (SPSS) e o SPSS 23.0 AMOS foram utilizados. Anteriormente às análises propriamente ditas, as 2.201 (taxa de retorno de 61,1%) respostas aos questionários, obtidas na autoavaliação de treinamento conduzida, passaram por tratamento estatístico para verificar a existência de dados ausentes, de outliers uni e multivariados, e se elas respeitavam o pressuposto da normalidade (assimetria e curtose entre- 2,0 e 2,0).

Os 1.915 casos válidos para a ERPI-EAD foram submetidos a análises fatoriais confirmatórias (AFC; Método de Máxima Verossimilhança) e de consistência interna (Alfa de Cronbach: α). Para julgar a bondade de ajuste do modelo, as medidas incrementais de ajuste (GFI, CFI e TLI) deveriam ter valores superiores a 0,90 (idealmente > 0,95), e as residuais (RMSR e RMSEA), inferiores a 0,08 (idealmente < 0,05). O índice de parcimônia BIC foi usado para comparar os ajustes entre modelos (Byrne, 2010). Para analisar a validade preditiva da escala, utilizou-se a análise de regressão múltipla, com o fator único da ERPI-EAD como preditor da efetividade do treinamento no trabalho (impacto do treinamento no trabalho em amplitude).

Quanto às considerações éticas envolvidas, o trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (CAAE nº 46449615.0.0000.5407).

 

Resultados

Adaptação da medida ERPI-EAD

O instrumento de Martins e Zerbini (2015) foi analisado, considerando-se os seus aspectos semânticos (conteúdo dos itens e sua distribuição em fatores) e psicométricos (cargas fatoriais, multicolinearidade, Alfa de Cronbach se o item fosse excluído etc.) para que itens redundantes fossem reescritos ou eliminados. Essa etapa de edição resultou na exclusão de oito itens, tendo como foco o contexto e a amostra específicos de aplicação deste estudo, ou seja, trabalhadores participantes de treinamentos corporativos a distância. O instrumento, no entanto, pode ser também aplicado a estudantes em ambientes acadêmicos.

Análise teórica

As sugestões provenientes da validação por juízes consistiram na modificação da escala de mensuração, já que não possuía ponto neutro, equidistante dos extremos tanto qualitativa como quantitativamente, e três dos cinco pontos ancorados possuíam conotação positiva. Logo, para que os pontos fossem equidistantes entre si e respeitassem uma ordem, tais escalas foram modificadas, ao incluir as etiquetas em todos os pontos, mas distribuindo-se melhor os qualificadores: 1 "Péssima", 2 "Ruim", 3 "Regular", 4 "Boa" e 5 "Excelente".

Análises descritivas

As estatísticas descritivas relativas aos itens do instrumento ERPI-EAD podem ser visualizadas na Tabela 1.

De modo geral, observa-se que os participantes julgaram que a qualidade dos procedimentos instrucionais utilizados ao longo do curso é boa, uma vez que as médias variam entre 3,99 (DP = 0,73) e 4,30 (DP = 0,63) em uma escala de 5 pontos, estando satisfeitos com os procedimentos adotados. Como os valores dos desvios-padrão foram baixos, pode-se considerar que houve concordância de opiniões entre os respondentes quanto aos aspectos avaliados, com destaque para a linguagem utilizada no material do curso, a sequência de apresentação do conteúdo e a correspondência entre o conteúdo proposto e os objetivos do curso.

Análise fatorial confirmatória e consistência interna

A análise da normalidade aponta que todos os itens estão dentro do limite de referência estabelecido, indicando distribuição normal - variação de assimetria de- 0,86 a- 0,48, e de curtose, de 1,06 a 1,94 -, com exceção do item 6 que apresenta valor levemente acima do limite (2,03).

O modelo hipotético inicial (estrutura empírica unifatorial com 9 itens e α = 0,92), para o instrumento ERPI-EAD, apresenta bons valores para os indicadores de ajuste, com exceção do CMIN/DF e do RMSEA. Ao introduzir correlações aos dois pares de erros (e1-e2 e e6-e7) apontados com valores mais altos na análise dos resíduos (mode-lo reespecificado 1), obtiveram-se valores incrementados dos indicadores e uma estimação aceitável do RMSEA. Os itens 1 ("Correspondência entre o conteúdo proposto e os objetivos do curso") e 2 ("Correspondência entre o conteúdo do curso e os seus objetivos pessoais"), e 6 ("Atividades/tarefas propostas ao final de cada unidade") e 7 ("Orientação para solução de erros nas atividades/tarefas") apresentam similaridade de conteúdo em sua redação, o que pode ter levado os participantes a entenderem os dois pares de itens como uma mesma medida, contribuindo para que fossem encontradas as covariâncias entre eles, embora sejam baixas: r = 0,30 (e1-e2) e r = 0,19 (e6-e7). Ao testar um novo modelo (modelo reespecificado 2), apenas com a correlação entre o par de itens 1 e 2, os valores dos índices tiveram um leve aumento e o valor de BIC diminuiu (ΔBIC = 146,07), indicando que esse é mais ajustado que o modelo hipotético inicial (ver Tabela 2 e Figura 1), portanto, mais parcimonioso.

 

 

A escala ERPI-EAD tem um excelente Alfa de Cronbach (α = 0,92), com um total de 9 itens (cargas fatoriais entre 0,65 e 0,81) que medem as reações aos procedimentos instrucionais que medem as reações aos procedimentos instrucionais de cursos on-line.

Influência da ERPI-EAD sobre a efetividade de treinamento no trabalho

Considerando a autoavaliação de treinamento, as reações ao curso estiveram correlacionadas com o impacto do treinamento no trabalho em amplitude (r = 0,52) e contribuíram significativamente para a sua explicação (R2 = 0,27; β = 0,52 p < 0,01), confirmando a influência positiva das reações para a ocorrência do fenômeno de resultado do treinamento no desempenho dos egressos.

 

Discussão

A solução unifatorial encontrada apresenta sentido teórico e os resultados confirmam as evidências de validade e confiabilidade da medida, que serve como uma ferramenta de avaliação útil para mensurar a satisfação de participantes de eventos educacionais on-line em relação a diversos aspectos do curso. Como há evidências empíricas que comprovam o poder explicativo das reações e sua contribuição para a ocorrência da transferência de competências no trabalho e sobre o processo de aprendizagem, o instrumento pode ser usado para realizar diagnósticos da qualidade e da efetividade de treinamentos a distância em contextos corporativos, bem como em instituições de ensino que ofertam cursos EAD.

A adaptação do instrumento logrou eliminar um elevado número de itens (8), que, corroborado pela presença de multicolinearidade- existência de pares de itens altamente correlacionados entre si -, indicava a repetição de conteúdo ou sobreposição de aspectos avaliados pelo instrumento original (Martins & Zerbini, 2015). Os estudos anteriores com a medida optaram pela não exclusão de itens por serem as primeiras aplicações e testagens dos instrumentos em contextos específicos a distância (Borges-Ferreira & Abbad, 2009; Zerbini & Abbad, 2009). Contudo, a literatura mostra que instrumentos destinados a medir reações costumam ter um número bastante reduzido de itens em soluções unifatoriais (Klein et al., 2006), indicando que a exclusão de itens e uma adaptação mais expressiva da escala era necessária para gerar um instrumento mais parcimonioso, rápido e fácil de aplicar. Tal objetivo foi alcançado, tendo sido produzida uma nova versão que incidiu sobre a multicolinearidade entre os itens da medida, sendo essa extinguida e mantendo-se as excelentes qualidades psicométricas do instrumento.

Apesar do alto nível de ajuste encontrado para o modelo reespecificado 2, a estrutura fatorial considerada mais ajustada, ele inclui a correlação entre os erros dos itens 1 ("Correspondência entre o conteúdo proposto e os objetivos do curso") e 2 ("Correspondência entre o conteúdo do curso e os seus objetivos pessoais"). Observa-se que para responder aos itens do instrumento ERPI-EAD, a referência do respondente está nos aspectos relativos ao curso e nos seus procedimentos instrucionais, com exceção do item 2, único item que remete aos objetivos pessoais do participante. Isso pode sinalizar que o respondente não distingue bem os itens 1 e 2, talvez pela similaridade de conteúdo na redação deles ou porque seja levado a responder aos itens em relação ao curso e, somente nesse caso (item 2), em relação à consonância do curso com os seus objetivos pessoais. Contudo, a opção por não retirar o item 2 da estrutura justifica-se por apresentar sentido teórico.

A construção e o uso de instrumentos de medida específicos à modalidade a distância são imprescindíveis, considerando-se o grande avanço no oferecimento de cursos mediados pela internet na atualidade. A aplicação da escala ERPI-EAD, em contextos e amostras diferentes, pode contribuir para a coleta de informações relevantes ao aprimoramento dessas ações educacionais no que diz respeito aos aspectos instrucionais existentes (ver Salas et al., 2012), uma vez que a satisfação com esses aspectos influi positivamente sobre os resultados e o sucesso acadêmico em ambientes de aprendizagem on-line, produzindo bons efeitos sobre os comportamentos dos egressos.

Tais efeitos das reações à transferência bem-sucedida das novas competências aprendidas em treinamento para o trabalho foram corroborados no presente estudo, uma vez que os egressos que relataram estar satisfeitos com os procedimentos formais do curso avaliado tiveram seus desempenhos gerais modificados (impacto do treinamento no trabalho em amplitude). Esses resultados confirmam achados já cotejados em inúmeras investigações prévias (cf. Giangreco, Carugati, Sebastiano, & Della Bella, 2010) e indicam a pertinência de se continuar medindo os níveis de satisfação pós-treinamento para a produção de consequências positivas sobre a performance no trabalho de participantes de eventos instrucionais. O quão satisfeitos os egressos ficaram com a formação importa e gera implicações de caráter aplicado: o treinamento será transferido para o ambiente de trabalho à medida que essas condições sejam atendidas.

O instrumento utilizado para mensurar o impacto do treinamento no trabalho é uma medida de autorrelato, portanto, os resultados indicam que, a partir da perspectiva dos egressos, o desempenho dos participantes desta pesquisa no trabalho melhorou depois de terem participado do treinamento. A autoavaliação permite medir a percepção dos egressos quanto aos efeitos do treinamento sobre o seu comportamento, em termos de ganhos nos desempenhos gerais no trabalho.

Vale ressaltar que, com vistas a minimizar o viés do autorrelato, também foi realizada a heteroavaliação do treinamento (N = 2.411; índice de retorno de 66,9%), na qual os superiores hierárquicos dos egressos avaliaram o impacto do treinamento no trabalho de seus subordinados. A auto e a heteroavaliação permitiram analisar as relações entre os níveis médios globais de transferência de treinamento relatados pelos trabalhadores (egressos do treinamento) e seus supervisores. Os resultados descritivos favoráveis apontaram alta convergência entre ambas as avaliações- egressos (M = 4,31 e DP = 0,70) e gestores (M = 4,07 e DP = 0,83) -, mostrando que eles concordaram sobre as contribuições do treinamento no que tange ao grau de manifestação no trabalho das competências.

Deve-se seguir avaliando as reações afetivas (satisfação ou não em relação ao treinamento) e de utilidade do treinamento ao final do programa por serem variáveis importantes na explicação da ocorrência do fenômeno do resultado do treinamento no desempenho dos egressos. Nesse sentido, futuras pesquisas devem continuar atestando a capacidade preditiva da medida ERPI-EAD, tanto em relação a resultados de aprendizagem quanto de impacto do treinamento no trabalho.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Lara Barros Martins
R. Senador Pinheiro, 304, Vila Rodrigues
Passo Fundo, RS. CEP: 99070-220
E-mail: lara_bmartins@hotmail.com

Submissão: 10.7.2017
Aceite: 21.11.2017

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