SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.21 issue1Relations among adolescents' life purpose, household chores, and school performanceSchool climate and school satisfaction among high school adolescents author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Psicologia: teoria e prática

Print version ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.21 no.1 São Paulo Jan./Apr. 2019

http://dx.doi.org/10.5935/1980-6906/psicologia.v21n1p242-247 

ARTIGOS
PSICOLOGIA SOCIAL

 

Fatores de risco, proteção psicossocial e trabalho: organizações que emancipam ou que matam

 

 

Eveli F. VasconcelosI; Julia A. da F. PalmiereII; Krisley A. de AraujoIII

IDepartamento de Psicologia, Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)
IIUniversidade Católica Dom Bosco (UCDB)
IIIDepartamento de Psicologia, Universidade Católica Dom Bosco (UCDB)

 

 

A obra a qual resenhamos, Fatores de risco, proteção psicossocial e trabalho: organizações que emancipam ou que matam, é fruto do trabalho conjunto de dois professores doutores prestigiados por sua experiência profissional e produção acadêmica, Dr. José Carlos Zanelli e Dra. Lilia Aparecida Kanan. O objetivo do trabalho nasceu de um projeto de pós-doutorado realizado em conjunto pelos autores e ancora-se no texto de Zanelli (2014), ampliando-o em termos de profundidade teórica e relevância aos estudiosos e profissionais da área. Os autores abordam teoricamente, por meio de uma linguagem clara e didática, os fenômenos psicossociais nas organizações de trabalho, focalizando nos fatores de risco e proteção psicossocial e em estratégias para a construção de organizações saudáveis. Conforme os autores apontam na apresentação do livro, são escassos os cuidados de proteção psicossocial nas organizações latino-americanas, assim, tendo em vista as transformações atuais no mundo do trabalho, o comprometimento com políticas e programas voltados aos riscos psicossociais faz-se imperativo ético da gestão de pessoas, e a obra pode funcionar como dispositivo teórico aos profissionais da área que pretendem intervir na redução dos danos psicossociais. No capítulo 1, denominado "Fatores de risco, proteção psicossocial e trabalho", os autores conceituam alguns termos-chave que serão explorados ao longo do livro. Destacam que a saúde dos trabalhadores é um fator que precisa ser considerado como valor objetivo e estratégico, aliando aos conceitos de organizações saudáveis e não saudáveis. São abordados os agentes de riscos relativos ao ambiente de trabalho e uma análise dos fatores psicossociais relacionados ao trabalho, que os autores dividem em: fatores do indivíduo trabalhador, fatores internos ao trabalho e fatores externos ao trabalho. Após, é definido o conceito de risco, a fim de indicar quais são os fatores de riscos psicossociais e de proteção psicossocial ligados ao trabalho. Portanto, os autores são firmes ao afirmar que os riscos jamais devem ser aceitáveis nas organizações, assim, pontuam a necessidade de gerenciar e monitorá-los. O capítulo 2 é intitulado "Indicadores da organização de trabalho como construções saudáveis e não saudáveis", em que os autores se aprofundam na definição do que é organização saudável, por meio do resumo de indicadores de trabalho decente, organizações positivas e organizações autentizóticas, os quais são termos que se incorporam ao termo "organizações saudáveis" e indicam a construção de ambientes laborais saudáveis. Assim, é deixado claro que não há uma receita pronta para a construção de uma organização saudável, ainda, é destacada a necessidade de aproximar as demandas dos trabalhadores e das organizações, e a preservação da saúde dos trabalhadores é um grande desafio no cenário do mundo do trabalho. No capítulo 3, "Fenômenos psicossociais no contexto organizacional", os autores iniciam falando sobre a noção de extensão do risco e evento detonador e como eles se relacionam no ambiente de trabalho. Com isso, é destacada a complexidade na identificação dos riscos psicossociais. Assim, a fim de facilitar esse processo, os autores resgatam da literatura especificidades dos perigos psicossociais em comparação aos perigos físicos, indicando que eles possuem graus de manifestação diferentes. Para exemplificar, colocam em evidência o conceito de vulnerabilidade e, a partir disso, aproximam esse conceito do princípio da precaução, apontando a responsabilidade das organizações. O ponto alto do capítulo é o resgate da literatura dos fenômenos psicossociais negativos e positivos, que é discorrido de forma resumida sobre os aspectos gerais e comuns desses fenômenos, destacando a indissociação e a relação entre eles. Portanto, o posicionamento dos autores parte do pressuposto da prevenção de riscos psicossociais no ambiente de trabalho, assim, a identificação de vulnerabilidades indica caminhos para a elaboração de programas preventivos. Os autores trazem nesse capítulo conceitos desenvolvidos na literatura e promovem a revisão de outros. No capítulo 4, "Características básicas da cultura e do poder nas organizações saudáveis e não saudáveis", os autores ressaltam as interações humanas e a sua influência na constituição de organizações saudáveis, afirmando que o processo de compreensão de uma organização pressupõe o entendimento de sua cultura. Desse modo, apontam as relações entre poder e cultura, trazendo suas respectivas definições e realizando a articulação de como esses conceitos podem potencializar ou não os riscos psicossociais nas organizações de trabalho. Ainda, são tecidas considerações sobre organizações e ambiente e, assim, desenvolvem ao longo do capítulo a discussão sobre cultura organizacional em relação com sua interface política e as relações de poder; dessa forma, são revisados alguns termos utilizados pela literatura, bem como feita a ampliação de alguns conceitos. Com isso, é apresentado como os processos interacionais associam-se à cultura organizacional, enfatizando as mudanças de comportamentos em todos os níveis organizacionais e destacando a necessidade do valor saúde como pressuposto integrante da cultura organizacional. O capítulo 5, "Princípios éticos, valores e moral associados aos fenômenos psicossociais no contexto organizacional", aborda o papel dos princípios, valores e da moral no que se refere aos riscos psicossociais e ao desenvolvimento de uma cultura organizacional comprometida com a saúde e o bem-estar, apoiando-se na Psicologia do Desenvolvimento Moral. Os autores abordam os estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg, princípios egocentrados e sociocentrados e os aspectos de uma gestão de valores éticos no interior das organizações, discutindo a construção de um convívio democrático e eticamente comprometido no espaço laboral. Nessa esteira, tem início o capítulo 6, "Atitudes e comportamentos associados aos fenômenos psicossociais no contexto organizacional", que versa sobre o papel das atitudes e dos comportamentos individuais e coletivos na construção do ambiente organizacional. Os autores discorrem sobre os componentes das atitudes e os aspectos do comportamento, oferecendo indicações acerca do papel da gestão de pessoas na estimulação e no desenvolvimento de comportamentos favoráveis à redução dos danos psicossociais, visando a importância da relação indivíduo-organização no processo de construção de atitudes e socialização. O capítulo 7, "Pressupostos de responsabilidade social corporativa associados aos fenômenos psicossociais no contexto organizacional", que conta com a participação da pesquisadora Dra. Magna Macedo Madalozzo, da Universidade de Caxias do Sul (UCS), discute questões pertinentes à responsabilidade social corporativa, tensões entre sustentabilidade organizacional e produtividade, corrupção corporativa, práticas e políticas - como a governança da sustentabilidade -, comprometidas com o desenvolvimento de um ambiente corporativo ético e confiável. Destaca-se o modo como os autores trazem casos de corrupção corporativa no mundo para pensar seus efeitos internos e externos às organizações, dada a atualidade da temática e a necessidade de desenvolver uma responsabilidade social corporativa autêntica, comprometida eticamente com a sustentabilidade psicossocial. Por fim, o capítulo 8, "Articulação das variáveis psicossociais de riscos e de proteção associadas ao trabalho", apresenta recursos e práticas possíveis para a construção de ambientes cooperativos favoráveis a uma cultura organizacional saudável, abordando aspectos da intervenção psicossocial e estratégias de prevenção e promoção de saúde no ambiente de trabalho, dividindo-as em quatro partes: condições do ambiente de trabalho, das tarefas, do grupo de trabalho e da própria organização. O que chama atenção nesse capítulo é o modo como os autores oferecem sugestões instrumentais ao desenvolvimento de recursos e práticas psicossociais, dialogando com o leitor e convidando-o a pensar estratégias de redução dos danos psicossociais. A responsabilização das organizações, tanto com seus membros quanto com os diversos setores da sociedade, faz-se presente na obra, servindo como linha condutora para pensar o compromisso ético e político de uma gestão de pessoas orientada ao desenvolvimento de estratégias de prevenção e proteção dos riscos psicossociais, vislumbrando a saúde organizacional e seus benefícios aos trabalhadores e ao desempenho competitivo da própria organização. O que chama atenção no livro é o modo como os autores convocam as organizações a se responsabilizarem pela redução dos danos psicossociais, considerando aspectos corporativos, fatores como corrupção, falhas éticas e o modo como isso permeia a sociedade de modo geral. Assim, situam a organização como uma entidade viva que deve chamar para si o desafio de olhar as tensões globais, como as relacionadas à sustentabilidade, à segurança, à corrupção, à produtividade, entre outras, de modo a se engajar com a sustentabilidade psicossocial. Diante da atualidade das discussões empreendidas e da centralidade da problemática dos riscos psicossociais para as organizações, entende-se a leitura da obra como obrigatória aos que se comprometem com o desenvolvimento de organizações saudáveis. Zanelli e Kanan conseguem aliar uma linguagem concisa e didática à profundidade teórica e científica, tornando a leitura essencial aos profissionais que lidam com fatores de riscos psicossociais e aos estudiosos da área. Assim, recomenda-se a leitura da obra aos profissionais e pesquisadores cujo foco seja a elaboração de políticas e programas voltados à prevenção e à proteção de riscos psicossociais, pois é um instrumento teórico valioso para estudos e experiências orientados à redução dos danos psicossociais. Desse modo, produzir conhecimento referente a essa problemática pode contribuir para o avanço de práticas promotoras de prevenção e promoção de saúde nos espaços de trabalho. Os autores, a fim de dar continuidade às informações potentes disponibilizadas no livro, construíram um blog.2 Tal espaço possibilita estreitar a interação entre pesquisadores, profissionais e acadêmicos da área, por meio de discussões, troca de artigos, livros e filmes sobre a temática, ampliando sua visibilidade e reconhecendo o caráter coletivo do engajamento com a construção de organizações saudáveis, éticas e comprometidas com o bem-estar de todos os seus membros, ancoradas na responsabilidade ética consigo e com a sociedade.

 

Referências

Zanelli, J. C. (2014). Organizações saudáveis e riscos psicossociais no trabalho. In C. G. Laimer (Eds.), Gestão das organizações: Estudos e pesquisas organizacionais (pp. 223-250). Florianópolis: Conceito Editorial.         [ Links ]

Zanelli, J. C., & Kanan, L. A. (2018). Fatores de risco, proteção psicossocial e trabalho:Organizações que emancipam ou que matam. Florianópolis: Editora Uniplac.         [ Links ]

 

 

Endereço de correspondência:
Eveli Freire Vasconcelos
Av. Tamandaré, 6000, Jardim Seminário
Campo Grande, MS, Brasil. CEP 79117-010
E-mail: evelivasconcelos@yahoo.com.br

Submissão: 29/01/2018
Aceite: 10/10/2018

Creative Commons License