SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.21 número2Personalidade patológica e qualidade de vida: evidências de validade para o IDCP-2Evidências de confiabilidade e validade do instrumento de avaliação sensorial Sensory Profile: um estudo preliminar índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.21 no.2 São Paulo maio/ago. 2019

http://dx.doi.org/10.5935/1980-6906/psicologia.v21n2p58-74 

ARTIGOS
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

 

Instrumentos de medida de reserva cognitiva – uma revisão sistemática

 

 

Thaís LandenbergerI; Nicolas de O. CardosoII; Camila Rosa de OliveiraIII; Irani Iracema de L. ArgimonIV

IPrograma de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)
IIPrograma de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)
IIIPrograma de Pós-Graduação em Psicologia, Faculdade Meridional IMED
IVPrograma de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)

Correspondência

 

 


RESUMO

O construto reserva cognitiva (RC) busca explicar a capacidade de o cérebro compensar a degeneração causada pela idade ou neuropatologia. Contudo, medidas padronizadas de RC são incipientes. Por meio de uma revisão sistemática, este estudo objetivou investigar os instrumentos em formato de escalas e questionários utilizados como medida objetiva de RC, a partir da mensuração de múltiplas variáveis relacionadas a atividades realizadas ao longo da vida. A busca por artigos foi realizada nas bases de dados PubMed, Scopus, ScienceDirect, PsychINFO, BVS e Cochrane. Sete estudos foram selecionados após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão. Constatouse a existência de cinco escalas/questionários que mensuram RC. Os instrumentos são de curta duração, porém variam quanto aos itens/às variáveis mensuradas e carecem de estudos aprofundados, com amostras amplas e diversificadas. São necessários mais estudos que busquem aprimorar as evidências de validade e realizar adaptações transculturais das escalas/dos questionários de RC.

Palavras-chave: reserva cognitiva; instrumentos de medida; avaliação; escala/questionários; cognição.


 

 

1. Introdução

Reserva cognitiva (RC) é um conceito proposto para explicar a discrepância observada entre o grau de lesão cerebral ou patologia e suas manifestações clínicas (Stern, 2009). Pressupõe-se a existência de diferenças individuais nos processos cognitivos ou nas redes neurais subjacentes ao desempenho das tarefas, as quais permitem que algumas pessoas compensem melhor do que outras a degeneração causada pela idade ou doença neurológica (Stern, 2009, 2017).

Tais diferenças na capacidade de o cérebro enfrentar um dano neurológico são consideradas a partir de dois modelos de reserva: passivo e ativo. No modelo passivo, a reserva se daria mediante características de substrato anatômico, como tamanho do cérebro, número de neurônios ou sinapses - reserva cerebral (Katzman, 1993). Ela está relacionada à quantidade de dano que o cérebro é capaz de suportar antes de ultrapassar o limite dos sintomas e permitir o diagnóstico (Stern, 2009, 2017).

Esse modelo, no entanto, tornou-se insuficiente ao se perceber que, mesmo quando indivíduos tinham volumes cerebrais parecidos, danos neurológicos semelhantes apresentavam efeitos diferentes sobre eles. Segundo o modelo ativo, essa diferença se daria mediante o esforço ativo e eficiente do cérebro em compensar a lesão fazendo uso de processos cognitivos preexistentes ou dispondo de processos compensatórios (Stern, 2009, 2017). Dessa forma, embora dois indivíduos tenham a mesma capacidade de reserva cerebral, aquele com mais RC seria capaz de melhor tolerar uma lesão, retardando o aparecimento clínico da deficiência (Stern, 2009).

Embora a RC seja predominantemente discutida no contexto do envelhecimento e das demências, diversos estudos têm evidenciado o seu efeito neuroprotetivo, atenuando os sintomas cognitivos em diferentes quadros patológicos. Entre eles, estão esclerose múltipla (Silva et al., 2015), dependência química (Pedrero-Pérez et al., 2014), transtorno de humor bipolar (Forcada et al., 2014), traumatismo cranioencefálico (Mathias & Wheaton, 2015), HIV (Shapiro, Mahoney, Peyser, Zingman, & Verghese, 2014), hepatite C (Sakamoto et al., 2013), obesidade (Galioto, Alosco, Spitznagel, Stanek, & Gunstad, 2013), entre outros.

A RC não é fixa, mas continua a se desenvolver a partir das experiências ao longo de todos os estágios da vida (Stern, 2012, 2017). Estudos epidemiológicos apontam para diferentes variáveis relacionadas ao estilo de vida que estariam associadas a maiores índices de RC, como educação, ocupação profissional e atividades cognitivamente estimulantes (Opdebeeck, Martyr, & Clare, 2015; Stern, 2017).

No entanto, os métodos utilizados para mensurar a RC são variados, o que dificulta a comparação entre os estudos (Opdebeeck et al., 2015). Além disso, embora seja um construto dinâmico, resultado da combinação de experiências acumuladas ao longo de toda a vida, muitos consideram uma única variável para estimar a RC, como o quociente de inteligência (QI) ou QI pré-mórbido do indivíduo (Grotz, Seron, Van Wissen, & Adam, 2017). Estudos recentes, no entanto, considerando a multiplicidade de variáveis da RC, destacam a necessidade de métodos de avaliação que integrem as diferentes dimensões (Grotz et al., 2017; Stern, 2017).

A importância de instrumentos sensíveis e validados para avaliação de RC é embasada pela relevância desse construto na prática clínica, tanto no contexto de avaliação como para intervenção cognitiva. Na avaliação, por exemplo, os primeiros sinais de declínio cognitivo podem ser mais difíceis de detectar entre indivíduos com maior RC, visto que, apesar das queixas cognitivas, é possível que neles não sejam detectados prejuízos nos resultados dos testes cognitivos formais (Elkana et al., 2016). Instrumentos de avaliação, clínicos e neuropsicológicos, assim, podem perder a sensibilidade de detecção do comprometimento cognitivo quando utilizados em indivíduos com alta RC, bem como em indivíduos com nível educacional muito baixo, podendo subdiagnosticar a doença ou promover falsos negativos (Piovezan, 2012).

Em vista disso, o objetivo desta revisão foi investigar os instrumentos em formato de escalas e questionários, utilizados como uma medida objetiva de RC, a partir da mensuração de múltiplas variáveis relacionadas a atividades realizadas ao longo da vida. Buscou-se, ainda, averiguar: 1. a origem e as características do público avaliado em cada estudo; 2. o referencial teórico de RC, as variáveis e os estágios de vida em que essas variáveis foram avaliadas em cada instrumento; 3. as características relacionadas à aplicação das escalas/dos questionários, tais como número de itens, tempo de aplicação e respondente; e 4. as propriedades psicométricas estudadas.

 

2. Métodos

O presente estudo seguiu o modelo de revisão sistemática conforme diretrizes do PRISMA (Moher, Liberati, Tetzlaff, & Altman, 2010). As buscas foram realizadas em maio de 2018, por dois juízes independentes, nas bases de dados eletrônicas PubMed, Scopus, ScienceDirect, PsychINFO, BVS e Cochrane. Para a pesquisa, foi utilizada a chave de descritores "cognitive reserve" OR "brain reserve" AND questionnaire OR scale OR index OR psychometric OR assessment. Os descritores foram selecionados com base nos dicionários do MeSH (PubMed) e do Thesaurus (PsycINFO). Realizaram-se buscas avançadas com os referidos termos presentes no título, no resumo ou nas palavras-chave, e sem qualquer outro filtro.

Os critérios de inclusão foram: 1. estudos que utilizaram escalas ou questionários para avaliar RC; 2. o artigo deve tratar do processo de validação do instrumento. Não se estabeleceram restrições quanto à idade, às características clínicas da população, aos anos de busca ou ao idioma do manuscrito, visando a uma varredura mais abrangente da literatura. Excluíram-se estudos de revisão, artigos repetidos e artigos de adaptação transcultural dos instrumentos.

A primeira busca realizada pelos dois juízes gerou uma quantificação inicial de abstracts, os quais foram analisados de forma independente e selecionados conforme os critérios de inclusão e exclusão previamente estabelecidos. Foram excluídos os abstracts repetidos para que não fossem contabilizados duplamente. Uma segunda busca foi realizada manualmente nas referências dos estudos selecionados. Todos os artigos incluídos foram analisados na sua íntegra para responder às questões de pesquisa deste estudo.

 

3. Resultados

A presente revisão sistemática identificou um total de 1.248 estudos. Após triagem detalhada dos títulos e abstracts, foram selecionados 21 artigos para leitura na íntegra. Houve divergência entre os juízes em relação à inclusão de alguns desses estudos (n = 06), sendo consultada a opinião de um terceiro juiz especialista na temática. Houve total concordância entre os três juízes em relação à inclusão final de cinco artigos e posteriormente de outros dois manuscritos a partir de busca manual nas referências dos artigos selecionados. Na Figura 3.1, são apontadas as etapas desde a identificação até a seleção final dos estudos.

 

 

3.1 Instrumentos de medida de RC

Identificaram-se cinco instrumentos que se propõem a mensurar RC por meio de uma medida objetiva, a partir de múltiplas variáveis relacionadas a atividades realizadas ao longo da vida. No idioma inglês, predominante na ciência, eles são identificados como: Cognitive Reserve Scale (CRS), Cognitive Reserve Index Questionnaire (CRIq), Cognitive Reserve Questionnaire (CRQ), Lifetime of Experiences Questionnaire (LEQ) e Lifetime Cognitive Activity Scale (LCAS).

Uma das escalas, a CRS, apareceu repetidamente em três estudos, todos organizados pelas autoras originais (León-Estrada, García-García, & Roldán-Tapia, 2017; León-Estrada, García, & Roldán-Tapia, 2011; León, García-García, & Roldán-Tapia, 2016; León, García-García, & Roldán-Tapia, 2014). Os estudos foram incluídos nesta revisão, visto que abordam ajustes realizados no instrumento, adaptação teórica e atualização de dados normativos. Informações sintetizadas dos sete estudos, como autores, ano de publicação, instrumento utilizado e características da população, são descritas na Tabela 3.1.1.

 

 

3.2 Origem dos estudos e características do público avaliado

Os estudos encontrados são provenientes de diferentes países, sendo três escalas originárias da Europa (duas da Espanha e uma da Itália), uma da Austrália e outra da América do Norte (Estados Unidos). Quanto aos participantes, observa-se a prevalência do público adulto e idoso, e dois dos estudos envolveram participantes jovens (León-Estrada et al., 2011; Nucci et al., 2011). De forma geral, foram contemplados participantes com, no mínimo, 18 anos de idade e, no máximo, 102. Quanto ao gênero, com exceção do estudo de Valenzuela e Sachdev (2006), observa-se uma prevalência do gênero feminino entre as amostras. Apenas um dos estudos utilizou amostra clínica entre os participantes (Rami et al., 2011), a qual incluía adultos idosos com diagnóstico de DA.

3.3 Referencial teórico, variáveis e estágios de vida avaliados

O referencial teórico a partir do qual as escalas e os questionários foram construídos é predominantemente baseado no conceito de RC de Stern (2009, 2012, 2017), e as variáveis avaliadas em cada instrumento variam conforme evidências sugeridas pela literatura. De forma geral, conforme mostra a Tabela 3.2.1, são incluídas variáveis como escolaridade, ocupação laboral, atividades cognitivamente estimulantes (por exemplo, leitura, domínio de idiomas, uso de tecnologias, formação musical, jogos intelectuais) e vida social. Os instrumentos CRS (León-Estrada et al., 2011) e LCAS (Wilson et al., 2003) não incluem as variáveis nível educacional e profissional. León-Estrada et al. (2011) consideram que essas variáveis não fazem parte da definição operacional de RC.

 

 

A participação em cada variável é medida considerando os diferentes estágios da vida. As escalas CRS (León-Estrada et al., 2011) e LEQ (Valenzuela & Sachdev, 2006) avaliam três estágios: jovem adulto, adulto e idoso. A LCAS (Wilson et al., 2003) propõe cinco estágios, sendo o único instrumento que contempla a infância (> 6). A CRIq (Nucci et al., 2011) tem os 18 anos como idade de partida. Já a CRQ (Rami et al., 2011) não contempla um período específico, considerando assim as experiências ao longo da vida. Em sua versão original, a CRS avaliava seis diferentes estágios de vida. Posteriormente, houve redução para três estágios visando diminuir o efeito de fadiga dos participantes (León-Estrada et al., 2011).

Quanto à forma de medida, de maneira geral, os instrumentos buscam avaliar a frequência com que cada uma das atividades é realizada ao longo dos diferentes estágios de vida e utilizam diferentes métodos para obter esses dados. A CRS, LEQ e LCAS propõem uma escala do tipo Likert (0-5), enquanto a CRIq mensura os anos de participação em cada atividade e a CRQ define uma pontuação específica para os diferentes níveis de escolaridade, atividade laboral exercida e frequência para cada atividade avaliada. Em todos os casos, os dados se transformam em uma pontuação total final, em que se considera o escore total de RC.

3.4 Características da aplicação dos instrumentos

As escalas são de curta duração e variam quanto ao tempo de aplicação, podendo levar de 2 a 30 minutos. Esse tempo está associado ao número de itens e a quantos estágios de vida são avaliados, uma vez que cada estágio vai exigir que o participante responda aos itens mais uma vez. Dessa forma, a CRQ é a escala mais breve, com apenas oito itens, enquanto a LEQ é uma das mais longas, composta de 42 itens e três estágios de vida. Em sua maioria, são escalas de autorrelato que, em alguns casos, podem ser respondidas por um familiar ou pessoa próxima.

3.5 Propriedades psicométricas

A Tabela 3.4.1 apresenta resumidamente as estratégias de obtenção das propriedades psicométricas dos instrumentos. Em relação às evidências de validade, a maioria dos estudos buscou verificar características da estrutura interna das escalas de RC, exceto na escala CRQ (Rami et al., 2011). Houve maior utilização da análise de consistência interna dos itens (LEQ, CRS, CRIq e LCAS), sendo utilizada a Teoria de Resposta ao Item a fim de verificar construtos latentes em dois estudos (LEQ e CRIq). De maneira geral, as escalas demonstraram investigar um fator único correspondente à RC. Os valores de alfa de Cronbach dos escores gerais variaram de 0,62 a 0,88, indicando que as escalas LEQ e CRIq apresentaram índices de confiabilidade muito baixos, enquanto no estudo da escala CRQ não foi obtido o valor do alfa de Cronbach.

 

 

Ao se considerarem as relações com variáveis externas, apenas o estudo da escala CRS não fez uso dessa estratégia. As principais variáveis utilizadas foram idade (CRIq e CRO), escolaridade (CRO e LCAS), gênero (CRIq), grupos clínico e controle (CRO) e desempenho em demais tarefas cognitivas (CRIq, CRO e LCAS). As funções cognitivas que apresentaram associações significativas com os escores das escalas de RC foram inteligência (León-Estrada et al., 2014), velocidade de processamento (Rami et al., 2011), flexibilidade cognitiva (Rami et al., 2011), memória de trabalho (Rami et al., 2011), habilidades visuoespaciais e memória semântica (Wilson et al., 2003).

Apenas o estudo da escala CRS apresentou dados normativos de referência para o índice de RC geral.

 

4. Discussão

Por meio desta revisão, buscou-se identificar os instrumentos existentes de avaliação de RC, os quais consideram a multiplicidade de variáveis associadas a esse construto. Buscou-se ainda explorar a estrutura, a forma de aplicação e os dados psicométricos de validade de cada instrumento. Foi identificado um total de cinco diferentes escalas/questionários, com descrição do seu processo de construção e evidências psicométricas satisfatórias.

Muitos estudos consideram uma única variável para estimar a RC, como o QI ou o nível de escolaridade do indivíduo (Grotz et al., 2017). Em um estudo de metanálise, constatou-se que apenas seis de 135 estudos combinaram mais de uma variável para avaliação da RC (Opdebeeck et al., 2015). Além disso, o construto RC é considerado recente na literatura, o que pode explicar o número reduzido de instrumentos do tipo escala/questionários existentes e um formato ainda não tão consensual quanto às variáveis e à sua forma de medida (Opdebeeck et al., 2015; Stern, 2017).

Em relação às variáveis avaliadas pelos instrumentos encontrados, observa-se que ainda não existe consenso sobre quais atividades relacionadas às experiências de vida contribuem de fato para o desenvolvimento da RC. No entanto, de forma geral, todas elas baseiam-se em variáveis já elucidadas pela literatura, com destaque para educação, ocupação profissional e atividades cognitivamente estimulantes (Opdebeeck et al., 2015; Stern, 2017).

Os instrumentos CRS e LCAS não incluem diretamente as variáveis nível educacional e nível profissional. Segundo León-Estrada et al. (2011), eles consideram que essas variáveis não fazem parte da definição operacional de RC. Um estudo sobre o impacto da escolaridade e do tempo de estudo no diagnóstico de demência, no entanto, mostrou que o impacto no diagnóstico é maior diante do nível de educação do que para o tempo de estudo (Contador et al., 2016). Assim, mesmo poucos anos de educação formal contribuem para RC e são capazes de modificar a relação dos índices neuropatológicos com a demência (Farfel et al., 2013). Nesse mesmo sentido, estudos apontam que todos os tipos de atividade ocupacional (profissional e não profissional) têm claramente um efeito protetivo no envelhecimento cognitivo (Adam, Bonsang, Grotz, & Perelman, 2013).

A variável "atividades cognitivamente estimulantes" destaca-se, estando presente em todos os instrumentos. Segundo Opdebeeck et al. (2015), é indicada como a segunda forma de medida indireta de RC mais utilizada na literatura, ficando atrás apenas da escolaridade. Há evidências de que o engajamento nessas atividades pode reduzir o risco de demência, atrasando o aparecimento das manifestações da doença (Scarmeas, 2001; Then et al., 2016; Kühn, Gleich, Lorenz, Lindenberger, & Gallinat, 2013). No entanto, as escalas divergem em seus itens, combinando diferentes modalidades de atividades, como hábitos de leitura, visita a livrarias, jogos intelectuais, domínio de idiomas, tocar algum instrumento musical, entre outras. Não há, assim, um consenso ou mesmo uma classificação de modalidades de atividades consideradas cognitivamente estimulantes.

Embora de forma menos consensual entre os instrumentos, outras experiências são avaliadas de acordo com evidências trazidas pela literatura (Stern, 2017), como prática de atividade física e participação e engajamento em atividades sociais. Além disso, é importante considerar que há uma variedade de estudos apontando para os efeitos dos treinamentos cognitivos com jogos eletrônicos sobre a cognição, e essa é uma área em expansão mediante as novas oportunidades diante dos avanços da tecnologia (Cardoso, Landenberger, & Argimon, 2017; Gleich, Lorenz, Gallinat, & Kühn, 2017; Stern, 2012).

Este é um estudo inovador, uma vez que não foram identificadas revisões precedentes com o objetivo de levantar os instrumentos de RC existentes. Os resultados aqui expostos podem contribuir para que pesquisadores tenham acesso aos materiais disponíveis até este momento no meio científico e, a partir disso, possam aprofundar estudos de validação psicométrica, expandir dados a partir de adaptações transculturais de instrumentos já existentes e/ou aprimorar áreas ainda não consensuais a fim de alcançar um instrumento "padrão ouro". Um instrumento de avaliação válido e fidedigno para avaliar RC tem importante contribuição para o diagnóstico precoce de uma doença neurodegenerativa, oferecendo, assim, maiores possibilidades de eficiência e otimização de medidas preventivas e de tratamento, de modo a melhorar a qualidade de vida de indivíduos acometidos por alguma patologia cerebral (Stern, 2012; Piovezan, 2012).

Uma das principais limitações deste estudo está relacionada à não inclusão dos estudos que utilizaram as escalas mencionadas nesta revisão, realizados após o processo de validação original do instrumento. Compreendemos que esses dados poderiam contribuir para um maior entendimento das características psicométricas de um mesmo instrumento em diferentes faixas etárias ou em outras culturas.

Por fim, foram identificadas cinco escalas/questionários que mensuram RCs originárias de diferentes contextos. Todos os instrumentos são de curta duração, porém variam quanto aos itens/às variáveis mensurados e carecem de estudos aprofundados, com amostras mais amplas e diversificadas. Ao longo da busca, foram encontrados poucos trabalhos envolvendo adaptação dessas escalas (Choi et al., 2016; Maiovis, Ioannidis, Nucci, Gotzamani-Psarrakou, & Karacostas, 2016). Sugerem-se, assim, estudos que aprimorem as evidências de validade e realizem adaptações transculturais das escalas/dos questionários de RC, a fim de alcançar um instrumento com poder de qualidade que seja reconhecido científica e internacionalmente.

 

Referências

Adam, S., Bonsang, E., Grotz, C., & Perelman, S. (2013). Occupational activity and cognitive reserve: Implications in terms of prevention of cognitive aging and Alzheimer's disease. Clinical Interventions in Aging, 8,377-390. doi:10.2147/CIA.S39921        [ Links ]

Cardoso, N. O., Landenberger, T., & Argimon, I. I. L. (2017). Jogos eletrônicos como instrumentos de intervenção no declínio cognitivo - Uma revisão sistemática. Revista de Psicologia da IMED, 9(1),119-139. doi:10.18256/2175- 5027.2017.v9i1.1941        [ Links ]

Choi, C. H., Park, S., Park, H. J., Cho, Y., Sohn, B. K., & Lee, J. Y. (2016). Study on cognitive reserve in Korea using Korean version of Cognitive Reserve Index Questionnaire. Journal of Korean Neuropsychiatric Association, 55(3),256-263. doi: 10.4306/jknpa.2016.55.3.256        [ Links ]

Contador, I., Ser, T. del, Llamas, S., Villarejo, A., Benito-León, J., & Bermejo-Pareja, F. (2016). Impact of literacy and years of education on the diagnosis of dementia: A population-based study. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 3395,1-8. doi:10.1080/13803395.2016.1204992        [ Links ]

Elkana, O., Eisikovits, O. R., Oren, N., Betzale, V., Giladi, N., & Ash, E. L. (2016). Sensitivity of neuropsychological tests to identify cognitive decline in highly educated elderly individuals: 12 months follow up. Journal of Alzheimer's Disease, 49(3),607-616. doi:10.3233/JAD-150562        [ Links ]

Farfel, J. M., Nitrini, R., Suemoto, C. K., Grinberg L. T., Ferretti, R. E. L., Leite, R. E. P., ... Jacob, W. (2013). Very low levels of education and cognitive reserve: A clinicopathologic study. Neurology, 81(7),650-657. Recuperado de http://ovidsp.ovid.com/ovidweb.cgi?T=JS&PAGE=reference&D=medl&NEWS=N&AN=23873971%5Cnhttp://ovidsp.ovid.com
/ovidweb.cgi?T=JS&PAGE=reference&D=emed11&NEWS=N&AN=2013596337
        [ Links ]

Forcada, I., Mur, M., Mora, E., Vieta, E., Bartrés-Faz, D., & Portella, M. J. (2014). The influence of cognitive reserve on psychosocial and neuropsychological functioning in bipolar disorder. European Neuropsychopharmacology, 25(2),214-222. doi:10.1016/j. euroneuro.2014.07.018        [ Links ]

Galioto, R. M., Alosco, M. L., Spitznagel, M. B., Stanek, K. M., & Gunstad, J. (2013). Cognitive reserve preserves cognitive function in obese individuals. Aging, Neuropsychology, and Cognition, 20(6),684-699. doi:10.1080/13825585.2012.762972        [ Links ]

Gleich, T., Lorenz, R. C., Gallinat, J., & Kühn, S. (2017). Functional changes in the reward circuit in response to gaming-related cues after training with a commercial video game. Neuroimage, 152,467-475. doi:10.1016/j.neuroimage.2017.03.032        [ Links ]

Grotz, C., Seron, X., Van Wissen, M., & Adam, S. (2017). How should proxies of cognitive reserve be evaluated in a population of healthy older adults? International Psycho-geriatrics, 29(1),123-136. doi:10.1017/S1041610216001745        [ Links ]

Katzman, R. (1993). Education and the prevalence of dementia and Alzheimer's disease. Neurology, 43,13-20.         [ Links ]

Kühn, S., Gleich, T., Lorenz, R. C., Lindenberger, U., & Gallinat, J. (2013). Playing Super Mario induces structural brain plasticity: gray matter changes resulting from training with a commercial video game. Molecular Psychiatry, 19,272. doi:10.1038/mp.2013.120        [ Links ]

León, I., García-García, J., & Roldán-Tapia, L. (2016). Cognitive Reserve Scale and ageing. Anales de Psicologia, 32(1),218-223. doi:10.6018/analesps.32.1.182331        [ Links ]

León, I., García-García, J., & Roldán-Tapia, L. (2014). Estimating cognitive reserve in healthy adults using the Cognitive Reserve Scale. PloS One, 9(7),e102632. doi:10.1371/journal.pone.0102632        [ Links ]

León-Estrada, I., García, J., & Roldán-Tapia, L. (2011). Development of the scale of cognitive reserve in Spanish population: A pilot study. Revista de Neurologia, 52(11),653-660. Retrieved from https://www.neurologia.com/articulo/2010704        [ Links ]

León-Estrada I., García-García J., & Roldán-Tapia, L. (2017). Escala de reserva cognitiva: Ajuste del modelo teórico y baremación. Revista de Neurología, 64,7-16.         [ Links ]

Maiovis, P., Ioannidis, P., Nucci, M., Gotzamani-Psarrakou, A., & Karacostas, D. (2016). Adaptation of the Cognitive Reserve Index Questionnaire (CRIq) for the Greek population. Neurological Sciences, 37(4),633-636. doi:10.1007/s10072-015-2457-x        [ Links ]

Mathias, J. L., & Wheaton, P. (2015). Contribution of brain or biological reserve and cognitive or neural reserve to outcome after TBI: A meta-analysis (prior to 2015). Neuroscience and Biobehavioral Reviews, 55,573-593. doi:10.1016/j.neubiorev.2015.06.001        [ Links ]

Moher, D., Liberati, A., Tetzlaff, J., & Altman, D. G. (2010). Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses : The PRISMA statement. International Journal of Surgery, 8,336-341. doi:10.1016/j.ijsu.2010.02.007        [ Links ]

Nucci, M., Mapelli, D., & Mondini, S. (2011). Cognitive Reserve Index Questionnaire (CRIq): A new instrument for measuring cognitive reserve. Aging Clinical and Experimental Research, 24(3),218-226. doi:https://doi.org/10.3275/7800        [ Links ]

Opdebeeck, C., Martyr, A., & Clare, L. (2015). Cognitive reserve and cognitive function in healthy older people: A meta-analysis. Aging, Neuropsychology, and Cognition, 23(1),40-60. doi:10.1080/13825585.2015.1041450        [ Links ]

Pedrero-Pérez, E. J., Rojo-Mota, G., Ruiz-Sánchez de León, J. M., Fernández-Méndez, L. M., Morales-Alonso, S., & Prieto-Hidalgo, A. (2014). Reserva cognitiva en adictos a sustancias en tratamiento: Relación con el rendimiento cognitivo y las actividades cotidianas. Revista de Neurología, 59(11),481-489.         [ Links ]

Piovezan, E. B. (2012). A relevância da reserva cognitiva no processo reabilitador. In A. J. Gomez (Org.), Reabilitação neuropsicológica: Abordagem interdisciplinar e modelos conceituais na prática clínica (pp. 78-86). Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Rami, L., Valls-Pedret, C., Bartrés-Faz, D., Caprile, C., Solé-Padullés, C., Castellví, M., ... Molinuevo, J. L. (2011). Cuestionario de reserva cognitiva. Valores obtenidos en población anciana sana y con enfermedad de Alzheimer. Revista de Neurologia, 52(4),195-201.         [ Links ]

Scarmeas, N., Levy, G., Tang, M. X., Manly, J., & Stern, Y. (2001). Influence of leisure activity on the incidence of Alzheimer's disease. Neurology, 57(12), 2236-2242. doi:10.1212/wnl.57.12.2236        [ Links ]

Sakamoto, M., Woods, S. P., Kolessar, M., Kriz, D., Renee, J., Olavarria, H., ... Flora, K. D. (2013). Protective effects of higher cognitive reserve for neuropsychological and daily functioning among individuals infected with hepatitis C. Journal of Neurovirology, 19(5),442-451. doi:10.1007/s13365-013- 0196-4        [ Links ]

Shapiro, M. E., Mahoney, J. R., Peyser, D., Zingman, B. S., & Verghese, J. (2014). Cognitive reserve protects against apathy in individuals with human immunodeficiency virus. Archives of Clinical Neuropsychology, 29(1),110-120. doi:10.1093/arclin/act071        [ Links ]

Silva, A. M. da, Cavaco, S., Moreira, I., Bettencourt, A., Santos, E., Pinto, C. ... Moltaban, X. (2015). Cognitive reserve in multiple sclerosis: Protective effects of education. Multiple Sclerosis Journal, 21(10), 1312-1321. doi:10.1177/1352458515581874        [ Links ]

Stern, Y. (2009). Cognitive reserve. Neuropsychologia, 47(10),2015-2028. doi:10.1016/j. neuropsychologia.2009.03.004        [ Links ]

Stern Y. (2012). Cognitive reserve in ageing and Alzheimer's disease. The Lancet, 11(11),1006-1012. doi:10.1016/S1474-4422(12)70191-6        [ Links ]

Stern, Y. (2017). An approach to studying the neural correlates of reserve. Brain Imaging and Behavior, 11(2),410-416. doi:10.1007/s11682-016-9566-x        [ Links ]

Then, F. S., Luck, T., Heser, K., Ernst, A., Posselt, T., Wiese, B., ... Riedel-Heller, S. G. (2016). Which types of mental work demands may be associated with reduced risk of dementia? Alzheimer's & Dementia, 13(4),431-440. doi:10.1016/j.jalz.2016.08.008        [ Links ]

Valenzuela, M. J., & Sachdev, P. (2006). Assessment of complex mental activity across the lifespan: Development of the Lifetime of Experiences Questionnaire (LEQ). Psychological Medicine, 37(7),1015-1025. doi:10.1017/S003329170600938X        [ Links ]

Wilson, R., Barnes, L., & Bennett, D. (2003). Assessment of lifetime participation in cognitively stimulating activities. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 25(5),634-642. doi:10.1076/jcen.25.5.634.14572        [ Links ]

 

 

Correspondência:
Thaís Landenberger
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Av. Ipiranga, 6681, Partenon, prédio 11, 9º andar, sala 908
Porto Alegre, RS, Brasil. CEP 90619-900
E-mail: thaislandenberger@gmail.com

Submissão: 20/07/2018
Aceite: 28/02/2019

Creative Commons License