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Cadernos de Psicologia Social do Trabalho

versão impressa ISSN 1516-3717

Cad. psicol. soc. trab. v.5  São Paulo dez. 2002

 

ARTIGOS

 

Representações dos trabalhadores sobre os riscos em uma usina química1

 

Workers’ representations about risks at a chemical plant

 

 

Márcia Hespanhol Bernardo2

Departamento de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Os riscos no trabalho têm ocupado um grande espaço nas discussões referentes à saúde e segurança dos trabalhadores, sendo abordados por diversos enfoques teóricos, alguns essencialmente tecnicistas e outros que adotam a perspectiva social. Na pesquisa aqui apresentada utilizou-se o enfoque social para investigar as representações dos trabalhadores sobre os riscos presentes na sua atividade de trabalho. Buscou-se comparar as representações dos diferentes grupos de trabalhadores com relação a dois tipos básicos de riscos: o de acidentes, que é mais evidente, e o de contaminação por produtos químicos, que é menos identificável pelo olhar leigo. Para tal, optou-se por um estudo de caso de orientação etnográfica em uma usina química de grande porte, onde esses dois tipos de riscos estavam presentes. Verificou-se, assim, que o acesso às informações técnicas (que depende da posição ocupada pelo trabalhador na estrutura da empresa) e a forma como se estabelecem as relações entre a empresa e os trabalhadores (que está diretamente vinculada ao tipo de organização do trabalho adotado) foram os fatores mais relevantes na construção das representações.

Palavras-chave: Risco, Psicologia social, Representação social, Trabalho.


ABSTRACT

Occupational risk is a matter that has always been prominent in discussions about workers’ health and safety. It has been studied according to several theoretical approaches, some essentially “technicis” and others adopting a point of view that attributes special relevance to the social features. In the research presented here, the social approach was used to investigate workers’ representation of the risks they are exposed to in their professional activity. We sought to compare the representations of different groups of workers about two basic kinds of risk: accidents, which are more evident, and contamination by chemical products, which is less obvious to the layman. For this purpose a case study was carried out making use of the ethnographic approach in a large chemical plant, which is characterized by the presence of both kinds of risks. It was verified that access to technical information (which depends on the position occupied by the worker in the company structure) and the way that the relationship between company and workers is established (which is directly linked to the work organization) were the more relevant aspects in the construction of representations.

Keywords: Risk, Social psychology, Social representation, Work.


 

 

1. Introdução

É possível dizer que a noção de risco está totalmente incorporada ao cotidiano da sociedade ocidental nesse início de século. Referimo-nos, por exemplo, a atividades ou atitudes individuais arriscadas - como o risco de acidentes na pratica dos chamados “esportes radicais” ou aos riscos de contrair câncer ao fumar - e aos riscos aos quais estamos submetidos sem uma opção individual - como o risco de contaminação por agrotóxicos nos alimentos, risco de seca ou enchente em uma determinada região, etc.

Spink (2001), ao fazer uma revisão histórica sobre o tema, afirma que “a noção de risco é essencialmente moderna” (p. 6) e isso ocorre em função de uma mudança na nossa relação com eventos futuros. Segundo a autora, os perigos sempre fizeram parte da vida humana, mas, a diferença é que, atualmente, esses eventos passaram a ser passíveis de gerenciamento, enquanto que em tempos passados eles eram deixados à mercê do destino.

Beck (1992, 2000) vai mais longe e afirma que hoje vivemos em uma “sociedade de risco”. Segundo ele, isso acontece não só por termos incorporado o conceito no nosso cotidiano, mas porque os atuais riscos relacionados à atividade humana - mais especificamente, os riscos gerados pela adoção de novas tecnologias - são diferentes daqueles do passado. Até meados do século XX, os riscos eram mais padronizados e se restringiam a certas localidades ou grupos, enquanto agora eles não respeitam mais limites geográficos ou classe social. Na defesa da sua posição, o autor apresenta como exemplos a energia nuclear e a engenharia genética, temas atuais que dizem respeito a todo o planeta.

Tendo em vista esse quadro, não é surpreendente que, nas últimas décadas, tenham se desenvolvido diversos estudos a respeito do tema “risco”. De um modo geral, esses estudos podem ser classificados em duas grandes vertentes bastante antagônicas entre si. A primeira é representada por uma área denominada “Análise de Risco”, a qual adota uma postura essencialmente técnica defendendo a objetividade da ciência e da tecnologia no gerenciamento dos riscos. A segunda vertente é representada por teóricos - na maior parte pertencentes às áreas da sociologia e da antropologia social - que afirmam que os riscos são construídos socialmente e, portanto, não podem ser analisados e gerenciados sem considerar a participação daqueles que estão ou estarão expostos a eles. Vejamos rapidamente os aspectos essenciais de cada uma dessas linhas de pensamento, uma vez que este antagonismo será considerado na discussão da pesquisa que será apresentada adiante.

Para aqueles que se incluem na área de Análise de Risco (onde predominam os engenheiros) a questão é objetiva: deve-se identificar os perigos, caracterizá-los, quantificá-los - fundamentalmente em relação ao custo-benefício, seja para a economia ou para a saúde e vida humanas - e, finalmente, gerenciar o risco através de medidas técnicas definidas por profissionais especializados (Short, 1984)3.

No entanto, apesar de essa concepção ser amplamente adotada por órgãos governamentais e empresas para fundamentar a autorização ou realização de atividades de risco - tais como a construção de usinas nucleares e termoelétricas ou a plantação de alimentos transgênicos - pode-se dizer que ela não encontra a mesma receptividade na população em geral. Para esta, só a possibilidade de alguma conseqüência desastrosa advinda das novas tecnologias, mesmo que ínfima do ponto de vista estatístico, pode ser suficiente para gerar uma grande preocupação e até uma oposição ao que é proposto como sendo tecnicamente viável (como apontam, entre outros, Douglas & Wildavisky, 1982; Gardner & Gould, 1989; Perrow, 1984 e Slovic, 1993). Exemplos históricos de grandes acidentes em situações supostamente seguras, como Three Miles Island, Chernobyl etc., são apontados como razões suficientes para sustentar essa desconfiança social em relação à infalibilidade da ciência e da tecnologia.

Assim, uma conclusão aparentemente consensual entre os analistas de risco e aqueles que criticam essa linha teórica é que, ao avaliar os riscos, a população leiga utiliza critérios diferentes daqueles defendidos pelos técnicos, ou seja, enquanto estes últimos baseiam-se em dados estatísticos e cálculos econômicos, as pessoas comuns utilizam critérios essencialmente qualitativos. Porém, esse tipo de avaliação leiga - particularmente quando serve de base para a rejeição de uma atividade - é vista pelos analistas de risco e outros interessados nas atividades em questão (indústrias, órgãos governamentais, etc.), como sendo uma atitude irracional que advém da ignorância (Gardner & Gould, 1989; Otway & Thomas, 1982; Slovic, 1993) e que, por isso, deve ser combatida através do esclarecimento e da educação sobre a confiabilidade da análise científica e das propostas técnicas.

A complexidade da questão, no entanto, demonstrou aos analistas de risco que, para conseguir a aceitação da população, se faz necessário, antes de qualquer ação educativa, compreender com maior clareza os critérios utilizados pelas pessoas leigas na avaliação do risco ou, na linguagem dos profissionais da área, como o risco é “percebido”. Essa constatação fez surgir, dentro da área de Análise de Risco, uma sub-disciplina fundamental para o campo em questão, a chamada “Análise de Percepção de Risco”, que se insere no âmbito da psicologia.

Nessa concepção, a percepção de risco é entendida como “julgamentos intuitivos”, utilizados pela maioria das pessoas leigas em oposição aos “métodos tecnologicamente sofisticados” empregados pelos especialistas (Slovic, 1987, p. 280). Partindo desse enfoque, a Análise de Percepção de Risco tem utilizado métodos psicométricos em estudos de atitudes, visando entender a percepção das pessoas sobre um determinado risco e, assim, encontrar as formas mais adequadas para convencê-las da segurança dos processos de gerenciamento do mesmo.

Podemos dizer que essa perspectiva teórica focaliza essencialmente a relação dos indivíduos com os riscos e, por isso, não é nenhuma surpresa que tenha encontrado uma forte oposição de nomes representativos das áreas da antropologia social e da sociologia, entre os quais, podemos destacar Douglas e Wildavsky (1982), Dwyer (1991), Lash e Wynne (1992) e Short (1984). Estes afirmam que as relações sociais ocupam um papel central na produção de condições de risco e, a partir dessa premissa, se opõem radicalmente às correntes tecnicistas hegemônicas de Análise de Risco e de Percepção de Risco. Na concepção desses autores, quando tratamos de questões que envolvem riscos, devemos sempre considerar os aspectos culturais e sociais (incluindo as relações de poder) envolvidos. Segundo Lash e Wynne (1992) há três razões básicas que fundamentam essa linha de pensamento:

Primeiro, os riscos físicos são sempre criados e efetivados em sistemas sociais, por exemplo, através de organizações e instituições que têm a responsabilidade de manejar e controlar as atividades de risco. Segundo, a magnitude dos riscos físicos é, portanto, uma função direta da qualidade dos processos e das relações sociais. Terceiro, o risco básico, mesmo para as atividades mais tecnicamente intensas (e, talvez, mais especialmente para essas), é o da dependência da sociedade com relação a instituições e atores sociais que podem muito bem ser &– e, de fato, são cada vez mais &– estranhos, obscuros e inacessíveis para a maior parte das pessoas afetadas pelos riscos em questão (p. 4).

Podemos resumir a posição dos críticos com a afirmação de Douglas e Wildavisky (1982), de que “a percepção do risco é sempre um processo social e a sua aceitabilidade é sempre política” (p. 6). Para eles, pesquisar a aceitação do risco sem considerar seus aspectos sociais é um erro, pois os diferentes princípios sociais que guiam o comportamento também afetam o julgamento de quais perigos devem ser evitados e quais podem ser admitidos.

Esta breve exposição evidencia o contraste existente entre a perspectiva tecnicista e a perspectiva social na avaliação de riscos que envolvem grandes grupos populacionais. Mas, devemos esclarecer que a divergência não se restringe a esses casos. Um debate similar também é observado em publicações que tratam dos riscos relacionados a atividades de trabalho.

Nesse campo, o enfoque tecnicista também é dominante, mas igualmente criticado por teorias que consideram que os aspectos sociais presentes nas relações de trabalho são centrais em qualquer abordagem a respeito dos riscos ocupacionais. Entretanto, é importante destacar que, em ambas as perspectivas teóricas, encontramos relativamente poucas pesquisas direcionadas aos riscos de adoecimento causado pela atividade laboral. Observamos que os acidentes ocupam posição de destaque nos estudos sobre riscos no trabalho, seja no enfoque tecnicista ou no social. Isso parece compreensível se pensarmos que, por definição, os acidentes acontecem de forma repentina e grande parte de seus efeitos pode ser sentida de imediato, enquanto que os fatores que levam ao adoecimento - mesmo podendo chegar a resultados piores - agem mais lenta e sorrateiramente (Harrison, 1988). Por outro lado, vale lembrar que esse destaque dado aos acidentes pode levar a uma desconsideração de importantes fatores de risco para a saúde dos trabalhadores.

Entre os estudos relativos aos riscos de acidentes de trabalho, observa-se que aqueles que adotam a perspectiva tecnicista atribuem duas causas básicas ao problema: os fatores ambientais (riscos físicos, químicos, mecânicos, etc.), que poderiam ser gerenciados através de medidas técnicas de controle de risco, e os fatores individuais dos trabalhadores (em geral, relacionados à sua personalidade), que os levariam a cometer os chamados “atos inseguros”4, os quais seriam gerenciados através de medidas de controle sobre o comportamento dos trabalhadores.

Essa forma de ver o controle de riscos é hegemônica nos setores industriais e, como é possível observar, está em perfeita consonância com aquela da área de Análise de Risco, descrita anteriormente. No entanto, nas últimas décadas, vem sendo fortemente questionada por autores da Sociologia e de algumas correntes da Psicologia, da Ergonomia e da Medicina Social. Essas abordagens são bastante diferentes entre si, mas têm em comum o fato de buscarem bases mais amplas, que vão além da Análise de Risco, para uma atuação efetiva no sentido de reduzir a insalubridade e a periculosidade dos locais de trabalho. É importante que se diga que nenhuma delas nega a necessidade de adoção de medidas técnicas para reduzir ou eliminar os riscos, mas todas ressaltam a importância de também se considerar os fatores relacionados ao tipo de organização e às relações sociais presentes no local de trabalho ao se analisar os riscos e elaborar propostas para sua superação.

Como exemplo, podemos citar Dwyer (1989, 1991) na área da Sociologia do Trabalho - o qual afirma que “a produção de adoecimento e acidentes em um dado local de trabalho está inextricavelmente ligada às relações sociais utilizadas para gerenciar o relacionamento entre trabalhadores e os vários riscos no seu trabalho” (Dwyer, 1997, p. 63) - e, Laurell e Noriega (1989) na Medicina Social - que ampliam o conceito de risco tradicionalmente utilizado pela medicina do trabalho clássica, introduzindo conceitos de “desgaste” e “carga de trabalho” e incorporando a participação dos trabalhadores na identificação dos riscos.

Em resumo, podemos dizer que, sejam nas questões relacionadas ao trabalho ou à sociedade como um todo, as abordagens teóricas que consideram os aspectos sociais são mais diversificadas do que as tecnicistas, mas têm em comum o fato de valorizarem o conhecimento e a posição das pessoas que estão ou estarão expostas ao risco, aspectos estes que devem ser acrescidos aos dados técnicos em uma análise de risco mais ampla.

 

2. Bases teóricas da pesquisa

Dentro do debate apresentado acima, filiamo-nos à linha teórica que considera os fatores sociais no estudo de riscos5. Sendo assim, realizamos uma pesquisa com o objetivo de investigar a compreensão de um grupo de trabalhadores a respeito dos riscos a que eles estavam submetidos durante suas atividades laborais. Mais precisamente, desejávamos compreender como as relações sociais estabelecidas na organização do trabalho influenciavam as representações e a forma de agir dos trabalhadores em relação aos riscos ocupacionais.

Para tal, avaliamos que uma investigação qualitativa em profundidade seria a metodologia mais apropriada. Optamos, então, pela realização de um estudo de caso em uma única empresa, utilizando o enfoque etnográfico, o qual nos proporcionou um contato mais próximo e prolongado com os trabalhadores no seu ambiente de trabalho. Dessa forma, pudemos não só ter acesso ao discurso dos sujeitos da pesquisa, mas também observar a sua prática cotidiana nas situações de risco.

Na análise dos dados obtidos no trabalho de campo, adotamos as concepções de Pierre Bourdieu como principal referência teórica. Bourdieu se define como sendo um teórico “estruturalista-construtivista” (Bourdieu, 1990) e, assim, se propõe a estudar o mundo social através da sua dupla determinação, as estruturas sociais externas e as estruturas sociais internalizadas pelos agentes (Gutierrez, 1994) e, para isso, desenvolve os dois conceitos básicos da sua teoria, o campo e o habitus.

Segundo o autor, a estrutura social é constituída por diversos campos, caracterizados por diferentes tipos de capital, o que torna o mundo social um espaço dinâmico e multidimensional, muito mais complexo do que uma estrutura rígida composta por um número restrito de classes sociais. Nessa perspectiva, outros tipos de capital, além do econômico, adquirem importância, tais como o capital cultural, o capital social, o capital simbólico, etc. Já o habitus é o conceito desenvolvido para explicar os aspectos sociais que são internalizados pelos agentes e diz respeito às estruturas mentais através das quais o mundo social é apreendido, sendo essencialmente produtos de uma internalização das estruturas sociais (Bourdieu, 1990, p. 131).

Sendo assim, a teoria de Bourdieu não focaliza diretamente as representações dos agentes sociais, mas, na medida em que busca “articular dialeticamente o ator social e a estrutura social”, possibilita entender as condições de produção tanto das representações como das práticas sociais dos agentes. Para o autor, “a posição social, definida adequadamente, é o que permite a melhor predição das práticas e representações” dos agentes e grupos (Bourdieu, 1985, p. 739). No entanto, é importante que se diga que Bourdieu não fala em “representações sociais”, termo comum na Psicologia Social, mas em “representações mentais” ou, simplesmente “representações”, que ele define como sendo “atos de percepção e de apreciação, de conhecimento e reconhecimento, em que os agentes investem seus interesses pressupostos” (Bourdieu, 1996, p. 107). Segundo o autor, tais como as práticas sociais, as representações também estariam submetidas ao habitus e às pressões das condições estruturais sob as quais elas operam, podendo, então, variar de acordo com a posição do agente na estrutura social e com as “estruturas cognitivas e avaliativas que foram adquiridas através da experiência duradoura de uma posição no mundo social” (Bourdieu, 1987, p. 134).

Isso significa que, de acordo com a teoria bourdieuniana, estudar as representações dos trabalhadores sobre os riscos só tem sentido se levarmos em conta a realidade objetiva onde elas acontecem. Dessa forma, além da compreensão das representações propriamente ditas, torna-se essencial entender também a estrutura social que é a base para essas representações (que, no caso da presente pesquisa, se configura como a estrutura das relações sociais internas à fábrica), identificar quais são os tipos de capitais envolvidos e qual é a posição dos agentes nessa estrutura de acordo com a qualidade e a quantidade do seu montante de capital.

Dessa forma, podemos dizer que, em relação à investigação aqui apresentada, a teoria de Bourdieu forneceu uma base consistente para a compreensão das condições sociais de produção das representações dos trabalhadores a respeito dos riscos. A concepção de que a posição dos agentes sociais se baseia na distribuição de diversos tipos de capital além do econômico foi um dos aspectos mais importantes para a análise dos dados obtidos durante o trabalho de campo.

 

3. Investigando as representações dos trabalhadores sobre os riscos na fábrica

Tendo em vista o objetivo e a metodologia propostos, optamos por realizar o trabalho em uma indústria química de grande porte, porque julgamos que nesse tipo de empresa poderíamos encontrar uma variedade maior de riscos relacionados aos acidentes e ao adoecimento. Esse aspecto era particularmente importante porque, ao contrário de outros ramos de atividade, nos quais boa parte dos riscos, particularmente aqueles que dizem respeito aos acidentes, pode ser identificada apenas levando em conta o senso comum, no ramo químico não é fácil saber exatamente quais são os riscos, porque estes estão relacionados à exposição a produtos cujos efeitos não são facilmente avaliáveis pelo olhar leigo. Metais pesados, como o chumbo e o mercúrio, por exemplo, são inodoros e não causam nenhuma sensação de mal-estar imediato, mas, ao longo do tempo, podem ser mais prejudiciais à saúde do que outros produtos químicos que tenham odor forte e desagradável.

Podemos afirmar, então, que, para a identificação de riscos relacionados à exposição a produtos químicos, são necessárias mais informações do que aquelas que se obtêm através do senso comum. É preciso recorrer a informações técnicas e científicas, as quais não estão acessíveis de forma igualitária para todos os agentes sociais.

Sendo assim, buscamos investigar as representações dos trabalhadores a respeito dos dois tipos de riscos a que eles estavam expostos - os riscos de acidentes e os riscos de contaminação por exposição crônica a produtos químicos - levando em conta a posição social ocupada pelo trabalhador dentro e fora da empresa e as relações sociais que se estabeleciam a partir daí.

A seleção do locus adequado para a realização do trabalho se deu a partir de um levantamento das empresas do ramo químico em um pólo petroquímico situado na região sudeste do país. A partir de uma listagem inicial fornecida pelo sindicato dos trabalhadores e de informações obtidas junto ao próprio sindicato e à coordenação de saúde do trabalhador de um dos municípios da região, selecionamos as três indústrias que pareciam possuir os processos de produção mais complexos. Com essas informações em mãos, optamos por procurar primeiramente aquela de maior porte e mais tradição no ramo, a qual, após um processo de negociação relativamente longo, permitiu a realização do trabalho nas suas dependências6.

Trata-se de uma usina química pertencente a um grupo de capital estrangeiro que, na ocasião, possuía várias empresas no país (todas no ramo químico) e ocupava um espaço significativo no mercado nacional e internacional. Especificamente, a usina na qual realizamos a pesquisa - que chamaremos de Fabquim7 - se caracterizava por fabricar produtos fornecidos como matéria prima para diversos setores industriais, tais como o automobilístico, o farmacêutico, o alimentício.

Ela se situa em uma extensa área com mais de quinhentos alqueires, que, anteriormente, havia sido uma importante fazenda da região. Na ocasião das nossas visitas, a área de produção ocupava somente uma parte da fazenda e o restante era constituído por uma vegetação natural, onde circulavam animais silvestres, como capivaras, veados, etc. O que mais chamava a atenção quando se entrava nas dependências da usina era justamente o contraste entre a área verde e a área de produção propriamente dita. Esta última se caracterizava por ser árida e cinzenta, com diversas chaminés exalando fumaças de diferentes cores e com a presença de fortes odores no ar. Os pequenos jardins situados em torno de algumas edificações e as pinturas de suas paredes em tons vivos não eram suficientes para amenizar o cinza predominante na paisagem.

A usina era gigantesca e existiam imensos feixes de tubulações aéreas passando por toda parte. Nessas tubulações circulavam centenas de toneladas dos produtos utilizados como matéria-prima ou fabricados no local, que eram armazenados em imensos reservatórios. Podemos afirmar que essa imagem geral poderia ser bastante impressionante para pessoas que nunca tivessem entrado em uma usina de transformação desse porte, como, por exemplo, novos trabalhadores sem experiência nesse ramo. E, de fato, verificamos que essa questão foi bastante significativa na construção das representações de muitos trabalhadores sobre a segurança no local, como veremos adiante.

Devido às dimensões da usina - que, na ocasião, possuía dezenas de processos produtivos e empregava cerca de mil trabalhadores diretos - optamos por nos concentrar em um dos seus setores: o setor de produção de solventes, o qual contava com cerca de oitenta empregados. As razões para essa escolha foram, entre outras, o fato de este setor ser aquele que produzia a maior variedade de produtos (oito, enquanto a maior parte dos outros se restringia a um) e, principalmente, porque, nos últimos anos, ele havia mudado seu status dentro da empresa, deixando de ser considerado o lugar onde mais se faziam “gambiarras” para passar a ser o símbolo de segurança para todo o grupo empresarial.

Porém, depois de iniciado o trabalho de campo, observamos a existência de um grande número de trabalhadores terceirizados na usina (cerca de 500), que pareciam estar submetidos a condições de trabalho bastante contrastantes àquelas dos operadores contratados diretamente pela Fabquim8. Esse fato nos levou a mudar os rumos do trabalho, incluindo também um grupo de trabalhadores terceirizados entre os sujeitos da pesquisa. Para isso, escolhemos uma empreiteira contratada para a realização de manutenção hidráulica. Essa empresa era a maior prestadora de serviço no local e possuía um grande canteiro de obras dentro da Fabquim. Dessa forma, nossos contatos com os seus empregados sempre ocorreram nas dependências da própria usina.

O trabalho de campo foi realizado através de diversas visitas no decorrer do ano de 2000, tendo uma duração total de 10 meses. A primeira etapa foi mais intensiva, com uma freqüência de três a quatro visitas por semana, cada uma com duração que variava de três a seis horas. Gradativamente, essa freqüência (mas não a duração de cada visita) foi se reduzindo para possibilitar mais tempo para a análise dos fatos observados. Na fase final, também foram realizadas entrevistas abertas com alguns trabalhadores de ambos os grupos. As visitas foram minuciosamente descritas em um diário de campo e as entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas.

Durante as visitas, acompanhávamos os trabalhadores nas suas atividades, observando sua atuação e conversando sempre que fosse possível. De início, por mais que explicássemos quem éramos e quais eram os objetivos da pesquisa, havia uma desconfiança não explicitada de que nosso trabalho fosse contratado pela empresa. Com a convivência, porém, essa desconfiança foi se dissipando e, depois de algum tempo, certos assuntos “proibidos” passaram a ser abordados na nossa presença.

 

4. Os riscos identificados na usina

A partir do que foi observado durante o trabalho de campo, elaboramos uma classificação dos riscos encontrados no local, que serviu de base para a análise dos dados da pesquisa. Essa classificação não teve nenhuma pretensão técnica e foi elaborada apenas para ajudar na compreensão das representações dos trabalhadores.

Primeiramente, é importante que se diga que os produtos químicos eram, sem dúvida, o grande perigo no local. Além da sua óbvia relação com os riscos de contaminação, eles também estavam diretamente associados à maior parte dos riscos de acidentes. Tomando isso em conta, classificamos os riscos presentes na usina em dois tipos mais gerais - (1) os riscos de acidentes e (2) os riscos de contaminação por exposição crônica aos produtos químicos - e, em seguida, os subdividimos em grupos mais específicos. Desse modo, entre os riscos de acidentes, destacamos duas categorias. A primeira se refere aos acidentes estruturais, cujos efeitos poderiam extrapolar os limites da empresa, atingindo até as cidades mais próximas (o que poderia acontecer se, por exemplo, um imenso reservatório, onde eram armazenadas mais de cem toneladas de amônia, se rompesse). No segundo tipo de acidentes estão aqueles que chamamos de acidentes pessoais, os quais, apesar de poderem ter conseqüências graves, são limitados a poucas pessoas (explosões e vazamentos de produtos perigosos em área restrita).

No que se refere à contaminação crônica por produtos químicos, também identificamos dois tipos de riscos para os trabalhadores: no primeiro, se incluem aqueles relacionados ao contato direto com os produtos durante a atividade de trabalho e, no segundo, estão os riscos relativos à poluição atmosférica causada pelos vapores de produtos exalados pelas chaminés ou que evaporam do abastecimento de caminhões e aberturas das linhas de produção.

 

5. A política de segurança da empresa

Em relação à política de segurança da empresa concernente a esses riscos, podemos dizer que havia uma grande contradição na forma como os acidentes e a exposição crônica aos produtos eram abordados. Enquanto se podia observar uma ênfase acentuada em relação aos primeiros, a última raramente era focalizada. No que se refere aos riscos estruturais de acidentes, por exemplo, a Fabquim possuía analistas de risco que propunham medidas técnicas para minimizar os riscos em todos os seus aspectos (ambientais, para o patrimônio e para as pessoas). Mas, além disso, também em consonância com o que foi apresentado na introdução deste artigo, existia uma concepção generalizada de que se deveria investir na mudança de comportamento dos trabalhadores, pois se acreditava que o “ato inseguro” era o maior fator de risco de acidentes da usina, uma vez que, para os engenheiros de segurança e os gerentes com os quais conversamos, a maior parte das medidas técnicas estruturais cabíveis já teria sido tomada.

Na ocasião da realização do trabalho de campo, também observamos a existência de vários fóruns onde se abordava a questão da segurança com os operadores da Fabquim. Alguns desses encontros tinham o objetivo de promover a participação dos trabalhadores através de opiniões e sugestões que pudessem melhorar a segurança no local9. No entanto, apesar da aparência democrática, a tendência de culpabilização individual dos trabalhadores envolvidos nos acidentes era predominante em todos os fóruns que tivemos a oportunidade de presenciar ou que nos foram relatados. Um exemplo bastante significativo era o método utilizado para a análise dos acidentes. A empresa adotava o assim chamado modelo de “Árvore de Causas”, que é uma metodologia participativa defendida por setores ligados à saúde dos trabalhadores10. Apesar disso, na Fabquim, ela era sentida pelos operadores como uma instância de julgamento com “cartas marcadas”, onde, fatalmente, o “réu” (no caso, o trabalhador envolvido) seria considerado culpado. Isso ocorria porque, segundo eles, as análises concluíam invariavelmente que o acidente havia acontecido por culpa do trabalhador. Daí vem o trocadilho “Árvore dos Culpados”, utilizado por alguns operadores para se referir à metodologia.

Como já dissemos, a postura da empresa era visivelmente diferente em relação aos riscos de contaminação por exposição crônica a produtos químicos. Observamos que, enquanto os riscos de acidentes estavam no centro do seu discurso a respeito de segurança, o risco de contaminação estava completamente ausente da fala dos seus representantes e, conseqüentemente, dos fóruns onde se discutia segurança. Quando indagados a esse respeito, os engenheiros de segurança afirmavam existir todo um controle da contaminação do ar, no qual era possível constatar que todos os produtos estariam abaixo daquilo que a legislação preconizava11. Por isso e pelo fato de os trabalhadores terem muito pouco contato direto com os produtos na sua atividade rotineira (os processos de produção eram fechados), esse aspecto não era considerado preocupante e, conseqüentemente, também não era abordado com os trabalhadores.

 

6. A estrutura social interna da Fabquim

Como dissemos anteriormente, os sujeitos da investigação foram os trabalhadores do setor de solventes da Fabquim e os empregados de uma empresa terceirizada. A grande diferença observada entre os dois segmentos - tanto no que diz respeito às condições de trabalho propriamente ditas, como em relação às condições sociais de existência fora da empresa - e destes em relação ao nível dos engenheiros e dos gerentes denunciava a existência de uma hierarquização social bastante definida na usina, que, de certa forma, reproduzia aquela existente na sociedade como um todo.

Assim, identificamos que o segmento mais desfavorecido era composto pelos trabalhadores terceirizados. Os operadores da Fabquim ocupavam a posição intermediária, enquanto que os engenheiros e gerentes (estes, na maioria, também engenheiros) ficavam no nível mais alto. Além do capital econômico, esses grupos se diferenciavam pela composição de outros tipos de capitais, tais como o cultural e o simbólico (que, entre outras marcas distintivas, se traduzia pelo domínio das informações técnicas relativas aos riscos), conforme veremos a seguir.

 

6.1. Os engenheiros e gerentes &– os porta-vozes do discurso oficial

É possível afirmar que o grupo dos engenheiros e gerentes era o maior detentor de capital simbólico na Fabquim. A identificação da fala dos engenheiros com o discurso oficial da empresa (observado em folhetos, filmes sobre segurança, etc.) era evidente e esse fato nos autorizou a tomar a fala dos integrantes desse grupo - juntamente com as normas de segurança disseminadas entre os trabalhadores - como a expressão daquilo que podemos chamar de a “posição oficial da Fabquim” a respeito dos riscos.

O discurso oficial da empresa, por sua vez, serviu como um contraponto fundamental para a compreensão das representações dos segmentos dos operadores e dos trabalhadores terceirizados a respeito dos riscos. Ele nos permitiu identificar em que medida a empresa conseguia influenciar as representações dos diferentes grupos sociais em relação a cada tipo de risco existente na usina.

 

6.2. Os operadores da Fabquim &– a elite entre os operários

Todos os trabalhadores da área de produção da Fabquim - e, portanto, também aqueles do setor de solventes - eram denominados “operadores”. Do ponto de vista social, os componentes desse grupo apresentavam uma certa heterogeneidade nas suas origens (alguns vinham de famílias de camponeses e outros de famílias de classe média urbana), mas existia uma predominância de pessoas com origem nas regiões sul e sudeste.

Além de possuírem um nível de escolaridade razoavelmente elevado (o 2º grau era exigido para o ingresso na Fabquim), os operadores ainda passavam por vários cursos e treinamentos na própria usina. Nos primeiros contatos com estes trabalhadores, o que mais nos chamou a atenção foi o alto nível de informações que eles demonstravam possuir em relação ao seu trabalho. Isso se evidenciava no tipo de linguagem utilizada para descrever as suas atividades e os produtos que manipulavam. Eles apresentavam um discurso muito articulado e seguro e sempre empregavam termos técnicos, que davam um tom mais erudito à fala, aproximando-a daquela utilizada pelos engenheiros. E é importante destacar que essa maneira de se exprimir era natural, pois eles demonstravam realmente saber o que estavam dizendo. Podemos, inclusive, assegurar que a maior parte das coisas que aprendemos sobre os processos de produção da Fabquim foi ensinada pelos integrantes desse segmento.

O domínio dos processos de fabricação propiciado pela formação técnica permitia aos operadores ter condições de controlar a produção, identificar problemas e intervir quando necessário. Essa qualificação era uma condição fundamental para o funcionamento da usina, já que, na produção, o papel desses trabalhadores era fundamentalmente de controle dos processos de produção, os quais eram contínuos, fechados e automatizados. Assim, não se pode dizer que os operadores tivessem tarefas consideradas pesadas do ponto de vista físico, mas, por outro lado, sua atividade era caracterizada pela necessidade de atenção permanente a diversos fatores. Qualquer distração poderia provocar graves danos à produção ou mesmo para a segurança no local.

Em função do investimento feito nesses trabalhadores e da grande responsabilidade que envolvia suas tarefas, verificamos que não havia nenhuma intenção da Fabquim em ter uma alta rotatividade nos seus quadros, como é comum em outros ramos. Isso propiciava uma certa estabilidade no emprego que, apesar de ter sido relativizada com a adoção de medidas de reengenharia que reduziram significativamente os quadros da empresa nos últimos anos, ainda podia ser considerada elevada em relação a outras categorias profissionais (segundo um boletim da Fabquim, no ano de 2000, a média de tempo na empresa girava em torno de 11 anos).

Os operadores tinham uma carreira que diferenciava os cargos pelo aumento de conhecimento e de responsabilidades, mas não por uma hierarquia de comando, isto é, quem estava em um nível mais alto já havia passado por vários cursos e treinamentos, podendo desempenhar uma gama maior de atividades, mas não era, necessariamente, chefe daqueles que estavam em níveis inferiores.

No setor de solventes, o trabalho era organizado em duplas de operadores de níveis diferentes, denominadas de “equipes semi-autônomas”, que eram responsáveis por um determinado número de linhas produtivas12, que variavam de uma a cinco, dependendo da sala à qual a equipe pertencia.

É importante salientar que, mesmo sendo bastante críticos em relação a diversos aspectos da Fabquim, quase todos os operadores afirmavam gostar de trabalhar ali e não ter intenção de deixar a empresa. As maiores queixas diziam respeito à redução de pessoal e de níveis hierárquicos trazidas pela reengenharia, pois esta criava dificuldades para a realização do desejo da maioria dos operadores de progredir na carreira e se aposentar em um cargo mais elevado na usina.

 

6.3. Os trabalhadores terceirizados &– o segmento social mais desfavorecido

Já a situação do grupo dos trabalhadores terceirizados era radicalmente diferente a dos operadores da Fabquim e um primeiro ponto a destacar nesse contraste está na origem dos seus integrantes. Na sua maioria, eles eram imigrantes oriundos de regiões pobres do Nordeste que vieram para o Sudeste por não encontrar condições de subsistência no seu local de origem. Entre aqueles com quem conversamos, observamos um nível de escolaridade bastante baixo, que, em geral, se restringia à alfabetização.

O quadro funcional da empreiteira focalizada, que chamamos de Hidrotec, contava com encanadores, soldadores e ajudantes. Os encanadores possuíam uma certa especialização no ramo petroquímico, tendo uma oferta de trabalho relativamente boa na região, mas, mesmo assim, a rotatividade era bastante grande entre eles (poucos diziam ter trabalhado mais de um ano em uma mesma empresa). Ao contrário dos operadores da Fabquim, eles não tinham nenhuma autonomia nas suas atividades, recebiam baixos salários e estavam submetidos a uma organização de trabalho rígida e bastante hierarquizada.

Em relação ao trabalho na usina, a tarefa básica dos trabalhadores na Hidrotec consistia na realização de serviços de manutenção hidráulica, ou seja, na retirada de tubulações e válvulas avariadas das áreas de produção (a tarefa mais pesada, que cabia aos ajudantes), no conserto dessas peças ou montagem de outras e na recolocação das peças no local de origem.

Apesar de não manipularem produtos químicos diretamente, esses trabalhadores podiam se expor a resíduos remanescentes nas tubulações na hora da retirada de peças. Devido à quantidade de produtos químicos inflamáveis e explosíveis que circulavam no local, a realização de solda na fixação da peça também era uma tarefa bastante perigosa, que exigia muitos cuidados.

No entanto, diferentemente dos operadores da Fabquim que passavam por vários cursos e treinamentos onde se abordavam questões relacionadas aos riscos, as informações que os trabalhadores terceirizados recebiam se restringiam àquelas fornecidas em treinamentos rápidos que se referiam basicamente às suas tarefas e à obrigatoriedade de utilização de equipamentos de proteção individual. Tivemos oportunidade de acompanhar um treinamento de segurança voltado para os trabalhadores ingressantes e observamos que a linguagem utilizada era bastante alarmista. O técnico de segurança que conduzia o evento dava pouquíssimas informações sobre os riscos, limitando-se a falar da obrigatoriedade do uso dos equipamentos e do que “não” se podia fazer, ressaltando a possibilidade de demissão para quem não se adequasse às regras.

Uma outra diferença em relação aos operadores da Fabquim é que os trabalhadores terceirizados, gostando ou não do trabalho na usina, não demonstravam vínculo afetivo com a empresa. A maioria via a Fabquim com grande distanciamento (e, às vezes, também com admiração) e não se via como parte dela ou da empreiteira a que estava vinculada. Com a grande instabilidade presente nesse tipo de atividade, os trabalhadores da Hidrotec estavam sempre procurando melhores oportunidades em outras firmas e, quando encontravam, não relutavam em “pedir as contas”.

 

7. Os acidentes e a contaminação &– representações distintas nos diferentes grupos

A partir das informações acima, analisamos as representações dos trabalhadores com base em dois eixos: o grupo social ao qual os sujeitos pertenciam (trabalhadores terceirizados ou operadores da Fabquim) e o tipo de risco representado (acidentes estruturais, acidentes pessoais ou contaminação por exposição crônica a produtos químicos). A análise também compreendeu uma contraposição das representações dos sujeitos da pesquisa com a posição oficial da empresa (expressa através da fala dos engenheiros e da política de segurança adotada na usina).

Em relação aos grupos sociais, o que mais se destaca é o tipo de vínculo com a usina que as posições ocupadas por cada um dos segmentos proporcionava. Observamos que, enquanto as representações dos operadores da Fabquim estavam claramente associadas ao fato de eles se sentirem parte da empresa e de manterem com ela um forte vínculo, as representações dos trabalhadores de empreiteiras se basearam em observações de quem se sente estrangeiro naquele local e que está ali somente de passagem.

O segundo eixo - tipo de risco - foi particularmente interessante, pois, como já dissemos, a empresa adotava uma postura bastante distinta em relação aos diferentes tipos de risco. Os acidentes estavam permanentemente em pauta, fosse em relação à adoção de medidas técnicas estruturais ou à necessidade de prevenir “atos inseguros” por parte dos trabalhadores, enquanto que a contaminação por exposição crônica estava ausente do discurso oficial. Esse fato influenciou particularmente as representações do grupo dos operadores da Fabquim.

Desse modo, observamos que, enquanto os trabalhadores de empreiteiras apresentaram uma uniformidade na forma como construíam suas representações a respeito de todos os tipos de risco, os operadores da Fabquim utilizavam diferentes referências caso se tratasse dos acidentes - que estavam presentes no discurso oficial - ou da contaminação - que não era incluída na fala da empresa. Essa constatação nos permite afirmar que não só o conhecimento técnico (capital simbólico), mas também as distintas relações com a Fabquim - dada pelo tipo de inserção de cada grupo na estrutura social local - se traduziam em uma maior ou menor assimilação do discurso oficial. Passemos, então, à apresentação dos resultados da pesquisa em relação a cada um dos tipos de risco identificados.

 

7.1. Os riscos de acidentes estruturais &– a confiança na política de segurança da empresa

Em relação a este tipo de risco, o grupo dos operadores da Fabquim apresentava representações que se aproximavam bastante do discurso oficial da empresa, ou seja, esses trabalhadores faziam referências constantes às medidas técnicas adotadas, falavam disso com certa familiaridade e demonstravam confiar nessas medidas. Para justificar sua confiança, apresentavam uma análise racional das motivações econômicas da Fabquim, como, por exemplo, a idéia de que um acidente poderia ser fatal para sua posição no “mercado”.

Já os trabalhadores terceirizados, que não tinham quase nenhum acesso às informações técnicas e econômicas, apresentavam representações mais variadas, que se caracterizavam pela radicalidade. Desse modo, ou se acreditava plenamente na empresa ou se desconfiava totalmente dela. As representações do risco de grandes acidentes nesse segmento se baseavam no senso comum e levavam em conta três aspectos principais: a vivência ou observação direta de acidentes (na Fabquim ou outra usina), a comparação do programa de segurança da Fabquim com outras usinas conhecidas e as observações cotidianas das condições dos equipamentos e dos esquemas de segurança adotados pela empresa. Esses dados, algumas vezes, levavam a conclusões opostas. Como exemplo podemos citar o caso das tubulações corroídas pela ferrugem que eram os principais objetos de trabalho da Hidrotec. Para alguns trabalhadores da empreiteira, o fato de eles serem sempre chamados para trocar tubulações que furaram por causa da corrosão demonstrava por si só o descaso da empresa com a segurança (que esperava haver uma perfuração no encanamento para trocá-lo), enquanto que, para outros, ocorria exatamente o contrário, ou seja, o fato de a Fabquim manter uma empresa para esse tipo de manutenção, propiciando a possibilidade de uma ação rápida nessas situações, demonstrava seus cuidados com a segurança.

A aparência geral da usina também era um fator de contradições. Para alguns, uma empresa tão grande e “bonita” não podia proporcionar riscos para os trabalhadores, enquanto para outros, todas aquelas fumaças e odores eram indicadores de que “coisa boa aquilo não era”.

 

7.2. O risco de acidentes pessoais &– a assunção da responsabilidade pessoal

O fato mais interessante a observar aqui é que, ao contrário do que verificamos em relação aos outros tipos de risco, no caso dos acidentes pessoais, encontramos uma grande homogeneidade entre as representações dos dois grupos estudados. Em ambos, as representações eram bastante similares ao discurso oficial da empresa, traduzindo-se pela assunção da responsabilidade pessoal pelos “atos inseguros”. Frases como “99% dos acidentes são causados por falha humana” estiveram presentes em grande parte das falas, demonstrando o sucesso da empresa na difusão da sua posição oficial. Esse fato foi particularmente evidente entre os trabalhadores terceirizados, os quais não reproduziram aqui a heterogeneidade de discursos verificada em relação ao risco de grandes acidentes. Para eles, a prevenção de acidentes pessoais era de responsabilidade exclusiva do indivíduo, pois a empresa já estaria fazendo a sua parte ao estabelecer normas rígidas de segurança e ao distribuir e exigir o uso de equipamentos de proteção individual.

Os operadores da Fabquim também apresentavam esse mesmo tipo de representação e apontavam a implementação cada vez mais intensa de normas rígidas de segurança como uma forte justificativa para essa postura. Porém, é importante que se diga que, justamente por terem incorporado tão profundamente essa posição, os operadores apresentavam uma crítica bastante contundente aos supervisores do setor, quando estes, em algumas ocasiões, os pressionavam para burlar as regras de segurança com vistas a acelerar a produção. Os operadores relatavam que isso nunca ocorria explicitamente, o que os deixava em uma posição bastante delicada, pois a determinação oficial era claramente de obediência às normas de segurança. Dessa forma, se as burlassem e disso decorresse um acidente, certamente seriam acusados de negligência. Por outro lado, caso se recusassem a fazê-lo, poderiam ficar em uma posição frágil junto aos níveis superiores.

O fato mais importante a ser destacado em relação a esse ítem é que a assunção da responsabilidade individual pelo acidente era bem mais pesada entre os operadores da Fabquim do que entre os trabalhadores terceirizados. Enquanto para esses últimos o acidente era algo que deveria ser evitado por causa das suas conseqüências físicas para o envolvido ou, no máximo, para a preservação do emprego, entre os operadores da Fabquim, existia um forte julgamento moral realizado por todo o grupo, como se o trabalhador envolvido fosse alguém que não tivesse se comportado de modo correto. Os fatores ligados à organização do trabalho que poderiam induzir o trabalhador a realizar um “ato inseguro” - como a pressão por produção ou a sobrecarga de trabalho, citadas pelos próprios operadores - pareciam ficar em segundo plano no momento em que ocorria um acidente. Um operador nos disse que a forma mais fácil de ficar famoso dentro da Fabquim era o envolvimento em um acidente, pois esse tipo de ocorrência, bem como o nome dos envolvidos, era uma informação que se difundia rapidamente por toda parte.

 

7.3. O risco de contaminação ausente do discurso oficial, presente nas representações dos trabalhadores

Em relação a este caso, o padrão das representações entre os trabalhadores terceirizados foi mais ou menos o mesmo daquele relativo ao risco de grandes acidentes, ou seja, suas representações se baseavam no senso comum e tomavam como referências as vivências pessoais e as observações cotidianas. Como já dissemos, esses trabalhadores tinham muito pouco acesso a informações referentes aos produtos químicos. Em função disso, costumavam denominar quase todos os produtos perigosos genericamente como “ácidos” e, entre estes, aqueles que tivessem odor mais forte eram considerados mais perigosos do que aqueles de cheiro mais fraco ou nenhum odor.

Esses trabalhadores também costumavam se preocupar mais com os efeitos imediatos dos produtos (reações alérgicas, dores de cabeça, etc.) do que com efeitos de longo prazo. Avaliamos que isso ocorria porque sentiam que os efeitos de longo prazo dos produtos não lhes diziam respeito, uma vez que, diferentemente dos operadores da Fabquim, a sua perspectiva de tempo de trabalho na usina era muito reduzida.

Contudo, isso não quer dizer que eles não achassem que esse tipo de risco existisse. Nas conversas conosco, muitos desses trabalhadores fizeram referência à “poluição” do ar na usina e aos efeitos perigosos (como o câncer, por exemplo) que a convivência com os produtos poderia trazer especificamente para os operadores da Fabquim, uma vez que estes permaneciam expostos por períodos de tempo prolongados. Nesses casos, os relatos eram sempre acompanhados de histórias nebulosas que teriam ouvido sobre operadores que ficaram doentes ou morreram por causa dos produtos químicos.

Por outro lado, um outro aspecto que vale a pena ser destacado em relação aos discursos dos trabalhadores terceirizados foi a naturalidade atribuída ao risco de contaminação. Raramente ouvimos dos integrantes deste segmento qualquer menção à responsabilidade da empresa pelos problemas citados. A poluição era vista como natural e inerente ao tipo de atividade da usina e, por isso, na opinião deles, não havia o que a Fabquim pudesse fazer para evitá-la. Dessa forma, eles isentavam totalmente a empresa por qualquer culpa relativa à contaminação do ar.

Os operadores da Fabquim, por sua vez, apresentavam um discurso oposto a este, revelando representações muito mais pessimistas do que as dos trabalhadores terceirizados em relação aos riscos de exposição aos produtos químicos e, principalmente, em relação à culpa da empresa pela existência desse risco.

Mas, além da diferença dessas representações dos operadores da Fabquim em relação às representações dos trabalhadores terceirizados, também observamos um grande contraste entre as representações dos próprios operadores, conforme estas dissessem respeito ao risco de contaminação ou ao risco de acidentes. E devemos afirmar que este foi, sem dúvida, o aspecto mais interessante da pesquisa.

É importante esclarecer que o tema da contaminação foi quase sempre objeto de tensão na conversa com os operadores. A postura dos componentes deste grupo em relação a essa questão era bastante destoante da descontração habitual com que eles abordavam quaisquer outros temas, fossem os riscos de acidentes ou assuntos mais polêmicos, como a relação conflituosa com as chefias em relação às normas de segurança. Observávamos que o risco de contaminação gerava um claro desconforto nos operadores e, sendo assim, é compreensível que as representações referentes a esse risco só se tenham revelado paulatinamente à medida em que a nossa presença se tornava mais familiar e as desconfianças em relação a uma possível vinculação com a empresa se dissipavam. Esse processo foi bastante interessante e, por isso, merece ser descrito13.

Durante a fase inicial das visitas à usina, os operadores apresentavam uma posição compatível com o discurso oficial da empresa a respeito da possibilidade de contaminação por produtos químicos, ou seja, eles raramente falavam do tema de forma espontânea e, quando eram indagados diretamente, utilizavam uma linguagem recheada de termos técnicos para demonstrar que os efeitos desses produtos não eram preocupantes. Assim, em um primeiro momento, avaliávamos que as representações desse grupo em relação à contaminação eram similares àquelas relativas aos acidentes, ou seja, pareciam coincidir com a posição oficial da Fabquim.

Com o passar do tempo, porém, começaram a aparecer algumas falas isoladas que diziam respeito a possíveis doenças que poderiam se manifestar posteriormente naqueles que tivessem maior exposição a alguns produtos específicos. Estas eram trazidas por operadores que estavam descontentes com a empresa ou que tinham apresentado alguma alteração nos exames de saúde periódicos. Sendo assim, nos questionávamos se essas falas eram realmente representativas do grupo. De qualquer forma, elas demonstravam que, pelo menos, a compatibilidade das representações dos operadores com o discurso oficial da empresa não era tão homogênea como ocorria em relação aos riscos de acidentes.

Foi somente na fase final do trabalho de campo, particularmente nas entrevistas, quando a nossa presença já não era mais vista com desconfiança pelo grupo, que os operadores passaram a apresentar um discurso no qual os temores a respeito desse tipo de risco eram bastante destacados. As falas se referiam a uma grande preocupação em adquirir alguma doença pela exposição aos produtos químicos que se manifestariam depois de muitos anos - até mesmo depois da aposentadoria - e não ter nenhum respaldo por parte da Fabquim. Essas preocupações eram sempre justificadas através de histórias de casos de colegas que, depois de anos, descobriram ser portadores de doença ocupacional e que não tiveram a causa da sua doença reconhecida pela empresa.

Aqui, é importante destacar que, mesmo quando já falavam mais abertamente do tema, era visível a tensão que esse assunto provocava nos operadores. O que ficava evidente é que, na avaliação deles, a empresa enfatizava a segurança em relação aos acidentes, mas negava o risco de contaminação e, o que é pior, abandonava aqueles que se contaminavam.

Assim, podemos dizer que um dos fatores mais relevantes nas representações desse grupo em relação ao risco de contaminação foi que, ao contrário dos trabalhadores terceirizados, que não atribuíam nenhuma responsabilidade à empresa pela “poluição” da usina, os operadores associavam esse risco diretamente a uma postura de omissão da Fabquim. Este comportamento da empresa era visto como bastante contrastante com aquele relativo aos riscos de acidentes.

No entanto, como os operadores tinham um forte vínculo com a empresa (lembremos que muitos estavam lá havia anos e quase todos pretendiam aposentar-se ali), eles diziam evitar falar e pensar sobre o assunto para “poder agüentar ir trabalhar no dia seguinte”, como afirmou um deles. Assim, nos pareceu que os operadores estabeleciam um acordo tácito para não falar e pensar no risco de contaminação que contrastava com a forma positiva como viam a postura da empresa em relação a outras questões (inclusive em relação ao risco de acidentes). Parece que somente desse modo, eles poderiam manter a coerência da imagem de uma empresa onde valeria a pena trabalhar até a aposentadoria.

 

8. Conclusões

A partir dos dados apresentados acima, concluímos que as diferenças entre as representações dos trabalhadores terceirizados e aquela dos operadores da Fabquim demonstraram que o acesso às informações técnicas e a autonomia no trabalho que cada segmento social possuía foram fatores importantes na formação das representações a respeito dos riscos. Porém, a forma como se estabelecia o vínculo dos trabalhadores com a empresa também se mostrou um fator fundamental no caso estudado.

Podemos dizer que, enquanto os trabalhadores terceirizados estavam submetidos a uma coerção cotidiana no nível de suas ações (em um modelo clássico de organização do trabalho), entre os operadores, a influência das relações de trabalho era muito mais profunda porque agia no nível emocional. Existia uma norma tácita de que, para pertencer à empresa, era necessário pensar como ela. Mas, isso não ocorre sem um custo e o preço a ser pago nos pareceu ser um sofrimento no nível psíquico, já que, para manter uma imagem coerente da empresa, esses trabalhadores não podiam manter a coerência na sua própria maneira de pensar e agir.

Esse fato fazia com que, ironicamente, os trabalhadores terceirizados, que não possuíam nenhuma autonomia nas suas atividades de trabalho e ocupavam uma posição social extremamente desfavorecida dentro da usina, gozassem, no entanto, de uma liberdade maior no nível do pensamento (já que eles não se sentiam compromissados com a empresa), podendo, assim, construir suas representações a partir de todos os dados disponíveis (mesmo que fossem poucos), sem nenhuma necessidade de evitar aqueles que prejudicassem a imagem que tinham da empresa. Já os operadores não podiam se dar a esse luxo.

Isso nos possibilita afirmar que, no caso estudado, não só a difusão de informações e a maior autonomia no trabalho influenciavam as representações dos trabalhadores a respeito dos riscos, conforme defende Harisson (1988) em uma pesquisa sobre esse mesmo tema, mas que as relações sociais que se estabeleciam entre a empresa e os trabalhadores, e a forma como a Fabquim manipulava essas relações, desempenharam um papel fundamental na formação das representações dos diferentes grupos de trabalhadores e, conseqüentemente, na forma de agir de cada um deles.

Sendo assim, acreditamos que uma “verdadeira” política de segurança somente será alcançada nessa empresa, se houver uma transformação real das relações sociais no ambiente de trabalho. E, entre outros aspectos, a mudança na postura tecnicista assumida pelos engenheiros e gerentes - que são os responsáveis pela implementação dessa política - é fundamental, pois eles se prendem à suposta objetividade da ciência e dos dados técnicos, assumindo-os como uma verdade absoluta, e não dão importância às sensações e avaliações pessoais dos trabalhadores.

 

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Endereço para correspondência
E-mail: marciahb@usp.br

Manuscrito recebido em: 26/11/2001
Envio de pareceres à autora em: 28/02/2002
Aprovado para publicação em: 11/12/2002

 

 

1 O trabalho apresentado neste artigo foi realizado sob a orientação da Prof. Dra. Leny Sato e resultou na obtenção do título de Mestre em Psicologia Social junto ao Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo
2 Doutoranda em Psicologia Social no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.
3 É importante destacar que os analistas de risco estabelecem uma clara distinção entre os termos “risco” e “perigo” (risk e hazard, em inglês). Segundo o enfoque teórico utilizado por eles, o perigo é definido como uma ameaça às pessoas ou a coisas importantes para elas, enquanto que o risco é a quantificação (cálculo probabilístico) do perigo (Short, 1984). Essa distinção entre os termos é essencialmente técnica e não é observada na linguagem corrente.
4 Oliveira (1997) faz uma extensa discussão a esse respeito.
5 As razões para esta opção teórica são apresentadas na dissertação (Bernardo, 2001) que deu origem a este artigo.
6 É importante esclarecer que, até o início dessa pesquisa, não conhecíamos o ambiente da empresa e tampouco nenhum de seus funcionários ou gerentes. Desse modo, os primeiros contatos para a obtenção da permissão para a realização do trabalho de campo ocorreram via telefone. Em seguida, foi-nos solicitado que enviássemos um resumo do projeto e, depois disso, fomos recebidos pelo gerente de Recursos Humanos, que intermediou as negociações com a diretoria da empresa. Durante esse processo, observamos uma certa relutância por parte da gerência em autorizar a realização do trabalho, porém, depois de fornecida a autorização, não houve nenhuma interferência por parte dos representantes da empresa. Tivemos total liberdade para circular pela fábrica e manter contato com os trabalhadores sem a presença de representantes da gerência ou necessidade de autorização prévia. Este fato foi fundamental para o bom andamento da investigação nos moldes propostos.
7 Todos os nomes utilizados são fictícios.
8 Na ocasião, existiam cerca de dez de empreiteiras contratadas pela Fabquim. A maioria destas tinha como função básica a realização de serviços de manutenção de rotina e reformas da estrutura da usina, cada qual com um tipo de especialização (hidráulica, eletricidade, mecânica etc.).
9 É importante que se diga que essa possibilidade existia apenas para os empregados diretos da usina. Os trabalhadores de empresas terceirizadas não tinham nenhum tipo de atividade participativa.
10 Para entender o método, ver Binder (1997).
11 É importante que se diga que essa visão é bastante contestada por diversos autores, uma vez que os limites de tolerância estabelecidos pela legislação e, mesmo, por órgãos técnicos internacionais, são muito questionáveis em relação a sua isenção e adequação às necessidades de saúde dos seres humanos (Neves, 1998).
12 As linhas produtivas eram fechadas e automatizadas e se constituíam por tanques, tubulações, colunas de destilação e reatores. Cada uma delas gerava um produto final diferente e, apesar de os processos serem relativamente similares, alguns produtos eram mais sujeitos a instabilidades do que outros. Isso fazia com que certas linhas fossem fáceis de operar, enquanto outras exigiam atenção constante.
13 Aqui vale destacar a importância da metodologia adotada e do tempo dedicado ao trabalho de campo, pois, se tivéssemos optado por entrevistas ou pela permanência reduzida no campo, possivelmente, os dados obtidos a esse respeito seriam parciais. Ficaríamos apenas com o discurso de fachada.

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