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Cadernos de Psicologia Social do Trabalho

versão impressa ISSN 1516-3717

Cad. psicol. soc. trab. vol.16 no.1 São Paulo jun. 2013

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

A economia solidária na inclusão social de usuários de álcool e outras drogas: reflexões a partir da análise de experiências em Minas Gerais e São Paulo

 

Solidarity economy in the social inclusion of users of alcohol and other drugs: reflections from the analysis of experiments in Minas Gerais and São Paulo

 

 

Raquel de Oliveira Barreto; Fernanda Tarabal Lopes; Ana Paula Paes de Paula

Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal de Minas Gerais (Belo Horizonte, MG)

Endereços para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo tem como objetivo analisar as ações de economia solidária como via de inclusão social de usuários/dependentes de álcool e outras drogas. Para isso, foram estudadas duas experiências inscritas na Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária, rede esta organizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Tal discussão se insere em um projeto mais amplo, apoiado pelo CNPQ, cuja proposta é problematizar a relação entre o trabalho e o uso/dependência de álcool/drogas, resgatando formas alternativas de organização que propiciem a inclusão social desse público em particular. Na fundamentação teórica, primeiramente apresenta-se uma visão sobre o que é a parte álcool/drogas dentro do todo saúde mental, principalmente quanto às suas especificidades e a relação com o trabalho. Realizou-se, então, uma investigação exploratória que ocorreu, em Minas Gerais e em São Paulo, verificando a existência de lacunas significativas no que se refere a essas ações. Nas conclusões, ressaltaram-se as dificuldades que emergem, principalmente no que se refere aos dependentes de psicoativos, como a questão do dinheiro, dos ganhos secundários e do desinteresse pelas atividades. Nesse sentido, o artigo reforça a complexidade do fenômeno em questão, que implica, necessariamente, a adoção de ações integrais, que façam parte de uma política mais ampla de atenção a esses indivíduos.

Palavras-chaves: Economia solidária, Toxicomania, Trabalho, Políticas públicas.


ABSTRACT

This article is an attempt to analyze the actions of solidarity economy as a mean of social inclusion of users/dependents of alcohol and other drugs. For this purpose, two experiences included in the Brazilian Network of Mental Health and Solidarity Economy, which is organized by the Ministry of Labor and Employment, were studied. This discussion is part of a larger project, supported by CNPq, whose purpose is to analyze the relation between labor and use/dependency of alcohol/drugs, rescuing alternative forms of organization that facilitate the social inclusion of that particular audience. In the theoretical foundation, firstly, an overview on what is the part alcohol/drugs in the whole mental health is presented, especially regarding its specificities and its relationship to work. Accordingly, an exploratory investigation, that took place in Minas Gerais and in São Paulo, verifying the existence of significant gaps in relation to these actions, was conducted. The conclusions highlighted the difficulties that arise, particularly with regard to the dependents of psychoactive drugs, such as the question of money, the secondary gains, the lack of interest in activities, among others. In this sense, the article reinforces the complexity of this issue, which necessarily implies the adoption of integral actions which are part of a broader policy of attention to these individuals.

Keywords: Solidarity economy, Substance abuse, Work, Public policy.


 

 

Introdução

Este artigo tem como objetivo analisar as ações de economia solidária como via de inclusão social de usuários de álcool e outras drogas. Para isso, foram estudadas duas experiências inscritas na Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária, rede organizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a partir de 2005. Tal discussão se insere em um projeto de pesquisa mais amplo, que foi apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), cuja proposta era estudar a relação entre o trabalho e o uso/dependência de álcool/drogas, resgatando formas alternativas de organização que propiciem a inclusão social e o resgate de cidadania desse público em particular.

Mas o que a economia solidária teria a contribuir com o campo da saúde mental? Essa relação é extremamente instigante e já vem sendo abordada em alguns trabalhos (Silva, Oliveira & Bertani, 2007; Lima & Guirardi, 2008; Andrade, Ramos & Marini, 2008). É interessante destacar que alguns desses textos descrevem experiências que vêm sendo realizadas, reafirmando a possibilidade real e frutífera da junção dessas duas dimensões. A importância de se trazer ao campo da saúde mental a discussão sobre as potencialidades e limitações da economia solidária insere-se nas conquistas e transformações proporcionadas pelo movimento da Reforma Psiquiátrica, o qual evocou mudanças radicais na estrutura de atenção aos portadores de sofrimento mental, incluindo o trabalho como parte essencial na extremidade da cadeia de reabilitação.

No âmbito da saúde mental como um todo, o governo realizou em 2005 uma parceria entre a Secretaria Nacional de Economia Solidária (Ministério do Trabalho e Emprego) e o Ministério da Saúde, de forma a constituir a Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária. Essa rede visa mapear e contribuir para iniciativas de geração de renda e inclusão dos pacientes com transtornos mentais e/ou que apresentam problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas, contando com 393 iniciativas cadastradas (Portal da Saúde, 2010). No entanto, como resultado de um primeiro levantamento entre as iniciativas da região metropolitana de Belo Horizonte, constatou-se que, de dez iniciativas cadastradas, apenas uma atende a essa demanda dos usuários de álcool e outras drogas, sendo que atualmente não se tem nenhum paciente desse grupo sendo atendido. A mesma realidade pôde ser observada em São Paulo, pois apenas uma organização declarou atender a esse público específico. A fim de compreender melhor tal contexto, realizou-se então uma pesquisa exploratória nessas duas organizações encontradas e em órgãos a elas relacionados, de modo a entender as especificidades do atendimento a esses usuários e a forma como a economia solidária tem sido vivenciada, para atuar como um elo para a reinserção social desses sujeitos.

Os resultados revelaram que, no momento, as organizações não atuam na perspectiva da economia solidária, embora estejam cadastradas como tal. Percebeu-se que, devido a uma lacuna existente no que tange ao atendimento a esse público, que por vezes não encontra espaços de atenção voltados especificamente para ele, as organizações acabam por atuar em fases anteriores do tratamento, como a do próprio acolhimento, e não exclusivamente no elo final da cadeia, como via de inclusão social. Ou ainda, como no caso mineiro, os profissionais sequer se consideram preparados para atender a essa demanda. Entende-se que trazer essa discussão para o âmbito da administração é relevante, uma vez que refletir sobre como as organizações tratam esta questão é fundamental para pensar ações mais efetivas na recuperação e na inclusão desses indivíduos.

Este artigo organiza-se, então, da seguinte forma: inicialmente, é contextualizado o cenário do campo álcool e drogas dentro da saúde mental, destacando, nesse contexto, o elemento trabalho. Em seguida, aborda-se a relação entre saúde mental e economia solidária, ressaltando suas características. Posteriormente, expõem-se as considerações sobre a realidade específica desses usuários/dependentes, a partir da análise das experiências já apontadas. Em seguida, retoma-se a temática da economia solidária, problematizando os limites e potencialidades em relação a esse público em particular, para então serem tecidas as considerações finais.

 

Fundamentação teórica: álcool, drogas e trabalho

O campo da saúde mental abarca diversos tipos de sofrimentos psíquicos, dentre os quais estão os transtornos relacionados a consumo/dependência de álcool e outras drogas. Tal tipo de transtorno se diferencia dos demais e vem crescendo significativamente por inúmeras razões, com destaque para a omissão histórica de atuação do Estado no âmbito da saúde pública. Como explicitado pelo Ministério da Saúde (2005), essa questão vem sendo tratada ao longo dos anos como pertencente mais à área de segurança e pedagogia do que de fato compreendida como um problema de saúde pública. Uma decorrência dessa postura estatal foi o desenvolvimento de várias iniciativas de caráter filantrópico e, principalmente, religioso, a fim de dar conta de uma realidade cada vez mais preocupante, em instituições que se caracterizam pela busca da abstinência possibilitada por meio da exclusão e do isolamento social.

Em 2002, esse problema começou a ser analisado sob uma nova ótica, ao se definir o Programa Nacional de Atenção Comunitária Integrada aos Usuários de Álcool e outras Drogas. Com a implantação do programa pelo Ministério da Saúde, inaugurou-se um atendimento específico a esse público, tendo como objetivo proporcionar a expansão do tratamento, uma abordagem mais ampla do problema e a inclusão da perspectiva da redução de danos. Ao contrário da exigência de abstinência pregada em geral pelas instituições, a perspectiva da redução de danos busca reduzir ou amenizar as consequências salutares e sociais da utilização dos psicoativos a partir do entendimento de que a exigência da abstinência imediata costuma ser uma ação pouco efetiva (Ministério da Saúde, 2005).

Nesse cenário, surgem os Centros de Atenção Psicossocial para Atendimento de Pacientes com dependência e/ou uso prejudicial de álcool e outras drogas (CAPSad), que se constituem como dispositivos estratégicos na rede de atenção e assistência a essa clientela. Além dos CAPSad, destacam-se também outros componentes importantes na rede de atenção aos usuários de álcool e outras drogas, como as ações no âmbito da atenção primária, a articulação com as redes de suporte social (tais como os grupos de ajuda mútua e entidades filantrópicas) e a implementação nos hospitais gerais e em suas estruturas de atendimentos de urgência e emergência de uma rede hospitalar de retaguarda aos usuários/dependentes de álcool e outras drogas.

O Ministério da Saúde (2005) defende que, assim como nas outras áreas da saúde mental, a organização da rede deve ser diversificada, complexa, com abordagens diversas e com a perspectiva da integração social do usuário. No entanto, admite que o campo voltado para o tratamento da dependência química é uma rede em formação, ainda muito distante das necessidades da demanda, e que busca recuperar o tempo perdido pela saúde pública no enfrentamento da questão. É importante destacar que é questão primordial no caso desses usuários o (re)estabelecimento de uma rede social, que em geral é deteriorada pelo uso abusivo da substância psicoativa. Desse modo, o foco apenas na abstinência ou alteração do padrão de consumo não é o bastante, pois não é suficiente viver longe das drogas, uma vez que também é preciso redescobrir um sentido para a vida. Nessa direção, o trabalho se destaca como alternativa privilegiada de resgate da autonomia e como instrumento de inclusão social para o dependente químico.

Considerar as potencialidades do trabalho significa tratá-lo como categoria fundamental na conquista da saúde mental dos indivíduos e como um recurso terapêutico na vida dos sujeitos (Brun, 2007). Karam (2003) defende que, além de se considerar a centralidade do trabalho na vida dos sujeitos, é importante resgatá-lo como operador de saúde mental, por meio da promoção da cidadania, que se dá no próprio local de trabalho. Baseada em Yves Clot, Karam (2003) sustenta que o trabalho não se encontra apenas no registro do consumo, mas também no registro da constituição do ser. Em seu estudo sobre alcoolismo, a autora demonstra que, em geral, as abordagens tradicionais sobre tratamento e prevenção de álcool e drogas restringem o problema à esfera doméstica, não levando em conta a primazia da dimensão política na qual se insere o trabalho. Para a autora, a intervenção sobre as doenças tem sido feita "em detrimento do investimento em ações ético-políticas, voltadas para uma abordagem compreensiva do sofrimento humano em sua relação com o trabalho – vetor pelo qual entendemos a construção da cidadania" (Karam, 2003, p. 473).

 

Economia solidária e saúde mental: o que a primeira tem a contribuir com a segunda?

A proposta de se trazer ao campo da saúde mental a discussão sobre a economia solidária insere-se nas conquistas e transformações proporcionadas pelo movimento da Reforma Psiquiátrica. No Brasil, este movimento foi fortemente influenciado pela experiência italiana de desinstitucionalização em psiquiatria e sua crítica radical ao manicômio, e se inscreve – em referência tanto a um contexto internacional de superação de um modelo asilar quanto a transformações provenientes da Reforma Sanitária, iniciada no Brasil nos anos 1970 – em favor de mudanças nos modelos de atenção e gestão nas práticas de saúde (Ministério da Saúde, 2005).

Nacionalmente, este movimento foi marcado pela Lei nº 10.216, sancionada em 6 de abril de 2001, após um longo e lento processo de tramitação iniciado em 1989. Tal legislação decreta, entre outras questões, a progressiva extinção dos manicômios (instituições fechadas) e sua substituição por instituições abertas, tais como: unidades de saúde mental em hospital geral, emergência psiquiátrica em pronto-socorro geral, unidade de atenção intensiva em saúde mental em regime de hospital-dia, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), serviços territoriais que funcionem 24 horas, pensões protegidas, lares abrigados, centros de convivência, cooperativas de trabalho e outros serviços que busquem preservar a integridade do cidadão. Tal rede, que busca substituir a internação psiquiátrica, tem como ideal o resgate de cidadania dessa parcela de sujeitos excluídos, sustentando-se nos princípios de inclusão, solidariedade, cidadania e resgate ético (Ministério da Saúde, 2005).

Além da sanção da lei, vale destacar que a Reforma Psiquiátrica é um movimento complexo e que vai além das mudanças na legislação, sendo composto por vários atores, instituições e forças de diferentes origens, incidindo em diversos territórios, no âmbito governamental, na educação, no mercado dos serviços de saúde, nos movimentos sociais, no imaginário social e na opinião pública. O movimento da Reforma Psiquiátrica significou um grande avanço em termos de transformações sociais do modo de ver e de tratar a loucura, visto que representa a busca de maior humanização no atendimento aos portadores de sofrimento psíquico, optando por uma tentativa de reinserção social em detrimento do afastamento outrora realizado (Ministério da Saúde, 2005).

Costa-Rosa (2006), ao comparar o paradigma asilar, anterior à Reforma Psiquiátrica, com o psicossocial, revela que o primeiro parte de uma concepção em que o indivíduo é colocado como o centro do problema, o que culmina em seu isolamento do meio familiar e social. Em oposição, o paradigma psicossocial se baseia na noção de que o sujeito não é o único problema, visão que acarreta a inclusão da família no tratamento e, eventualmente, de um grupo mais ampliado. Nesse novo contexto, tem-se a potencialização do trabalho como instrumento de inclusão social e promoção da cidadania dos sujeitos portadores de sofrimento mental. Para tanto, é fomentada a criação de cooperativas, associações e oficinas de geração de renda (Ministério da Saúde, 2005).

Nesse contexto, a proposta da economia solidária emerge como uma possibilidade de inserção, geração de renda e mudança social. Mas em que consiste o movimento da economia solidária? Apesar das inúmeras definições que têm sido dadas ao movimento, que refletem, inclusive, as diferentes perspectivas que coexistem sobre o tema, alguns elementos são considerados fundamentais. Independentemente do ponto de vista, é fato que a economia solidária constitui um caminho alternativo, capaz de possibilitar aos envolvidos a vivência da imersão de dimensões sociais – e, aqui, leiam-se: laços sociais, solidariedade e ajuda mútua – no campo econômico. Tais iniciativas representam uma possibilidade para os excluídos do mundo do trabalho (França Filho & Laville, 2004).

A economia solidária baseia-se na ideia de que os benefícios da atividade econômica devem estar ao alcance daqueles que a realizam, ou seja, dos trabalhadores. Essa proposta diferencia-se da realidade da sociedade centrada no mercado justamente em função dos seus princípios e valores. Seus fundamentos são o humanismo, a liberdade, a igualdade, a solidariedade e a racionalidade (Singer, 2002).

No campo da saúde mental, a proposta da economia solidária se apresenta como forma de inserção social pelo trabalho. Tais iniciativas compreendem as possibilidades de geração de atividade e renda solidárias, que permitam o processo de emancipação dos usuários pelo desenvolvimento de empreendimentos que promovam espaços reais de trabalho, onde estejam implicadas a atividade cooperada, a participação democrática e a autogestão, o fortalecimento do coletivo, a validação dos saberes e dos recursos das pessoas e dos contextos locais, a inserção no mercado e a possibilidade de ganho econômico real (Ministério da Saúde & Ministério do Trabalho e Emprego, 2006).

Historicamente, o trabalho para os portadores de sofrimento mental é limitado ao simples desenvolver de tarefas que tendem a manter o sujeito na restrição de seu campo existencial. Ao contrário, a proposta do trabalho pela economia solidária busca a "inserção laborativa", ou seja, a inclusão social pelo trabalho, por meio da qual o sujeito articula novos campos de interesse, possibilidades e desejos (Silva, Oliveira & Bertani, 2007). No entanto, apesar de sua reconhecida importância, o movimento da economia solidária na saúde mental ainda se encontra incipiente e esbarra em uma série de desafios, que vão desde as dificuldades de financiamento aos projetos, preconceito e exclusão, até a capacitação dos profissionais, cuja formação nem sempre se volta à importância do trabalho como recurso terapêutico, ou mesmo a conhecimentos sobre empreendimentos solidários e autogestionários.

Além disso, ao se tratar da economia solidária, não devem ser negligenciadas as dificuldades vividas pelo movimento como um todo. Entre as principais estão a sustentabilidade dessas organizações, a vivência dos princípios que as sustentam e a questão da competição de mercado (Vietez & Dal Ri, 2001). Essas dificuldades afetam todos os tipos de empreendimentos da economia solidária, inclusive os relacionados a saúde mental. Mas essas limitações, ao contrário de serem percebidas como fatores desmotivadores, podem ser encaradas como obstáculos a serem trabalhados. Nesse sentido, abordar essas questões dentro do campo dos Estudos Organizacionais significa uma possibilidade de refletir sobre problemas sociais e abrir possibilidades de atuação sobre eles.

 

Percurso metodológico: o desenho da pesquisa

Como já explicitado anteriormente, este trabalho se insere em uma pesquisa mais ampla, que objetiva investigar a relação entre economia solidária e saúde mental, especificamente no que diz respeito aos usuários/dependentes de álcool e outras drogas. A pesquisa apresenta, no que se refere aos seus fins, um caráter exploratório (Vergara, 2004) e, quanto aos meios, configura-se como uma pesquisa de campo, utilizando-se do estudo de casos múltiplos como estratégia de coleta de dados. O estudo de casos múltiplos, segundo Yin (2005), permite um aprofundamento em relação a realidades específicas, possibilitando ao pesquisador compreendê-las de forma mais detalhada e, se possível, compará-las.

Inicialmente, elencaram-se para estudo as iniciativas de Economia Solidária da Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária1 do Ministério do Trabalho e Emprego inseridas no "Cadastro de Iniciativas da Saúde Mental de Inclusão pelo Trabalho"2 localizadas na região metropolitana de Belo Horizonte (10 iniciativas) e na cidade de São Paulo (5 iniciativas). Todas as instituições que abrigam essas iniciativas foram contatadas por telefone e, para surpresa dos pesquisadores, em apenas duas delas afirmou-se haver o atendimento aos usuários/dependentes de álcool e drogas, uma em cada Estado. No caso mineiro, a única iniciativa é na região metropolitana, em Itaúna, onde há um Centro de Convivência de Saúde Mental que não é especializado em usuários/dependentes de álcool e drogas, embora atenda a esse tipo de público, ainda que no momento da pesquisa não houvesse nenhum frequentador em tais condições. No caso paulista, foi identificado um centro destinado exclusivamente a esse público, chamado Centro de Convivência "É de Lei".

Após esse levantamento, partiu-se, então, para a realização de uma pesquisa exploratória nessas instituições e em órgãos relacionados a elas. No caso mineiro, em função da ausência de usuários/dependentes de álcool e drogas, optou-se por estender a pesquisa também para o Centro de Atenção Psicossocial para Atendimento de Pacientes com dependência e/ou uso prejudicial de álcool e outras drogas (CAPSad) de Itaúna, instituição que encaminha os usuários/dependentes para o Centro de Convivência de Saúde Mental de Itaúna. Sendo assim, objetivou-se apreender como estas organizações utilizam-se da economia solidária no processo de reinserção social dos usuários/dependentes de álcool e outras drogas. Além disso, buscou-se compreender quais são as principais características e especificidades desses usuários/ dependentes, bem como do tratamento, de forma a ampliar e problematizar a realidade encontrada.

Em Minas Gerais, foram realizadas quatro entrevistas, duas no CAPSad e duas no Centro de Convivência de Itaúna. As duas primeiras foram realizadas no Centro de Convivência de Saúde Mental com duas psicólogas, uma que coordena o Centro (Luiza)3 e outra que conduz oficinas de trabalho (Leila). As outras duas, realizadas no CAPSad, foram com um psicólogo (Marcos) e com uma assistente social (Maria). Já no Centro de Convivência "É de Lei", de São Paulo, foram realizadas três entrevistas, com Tales, Vando e Rogério. Tales é psicólogo e atua como técnico, Rogério era um usuário do serviço, mas hoje também atua na OSCIP4 na função de redutor de danos, e Vando é um dos usuários mais antigos do serviço. É importante destacar que os dados coletados foram analisados pela técnica de análise de conteúdo (Machado, 2002), a partir da qual foram extraídos os principais temas que emergiram nas falas dos sujeitos. No tópico a seguir, serão apresentadas algumas questões que permitem compreender melhor a realidade dessas organizações e as especificidades dos usuários/ dependentes, bem como a lacuna existente no seu atendimento.

 

Economia solidária e tratamento da toxicomania: o quadro em MG

A primeira visita em Minas Gerais foi realizada no Centro de Convivência de Saúde Mental na cidade de Itaúna, na região metropolitana do Estado. Tal organização, inscrita no "Cadastro de Iniciativas da Saúde Mental de Inclusão pelo Trabalho", atende aos diversos públicos que compõem o campo da saúde mental. De acordo com a entrevistada Luiza, existe uma diferença entre as oficinas tipicamente terapêuticas e as oficinas desenvolvidas no Centro, pois estas incluem a questão da produção. Essas oficinas assumiram um caráter diferente, pois têm como objetivo o alcance de resultados econômicos como parte de um projeto maior de reinserção social.

Embora a atividade produtiva e remunerada pareça ser o objetivo do Centro de Convivência de Saúde Mental de Itaúna, quando a entrevistada foi questionada sobre a vivência da economia solidária, afirmou que a construção de uma cooperativa é um projeto que, embora exista enquanto ideia, ainda não foi estruturado e documentado. Ainda que classificado como uma iniciativa de economia solidária, o Centro não desenvolve exatamente atividades nesse sentido, embora realize ações como a produção em grupo e a divisão dos ganhos. Percebeu-se um trabalho bastante incipiente, que, apesar de tentar se diferenciar das oficinas terapêuticas pelo discurso, na prática funciona mais como terapia do que como atividade de geração de renda e inclusão.

Além de não se caracterizar como uma iniciativa de economia solidária, no momento da pesquisa não havia nenhum usuário/dependente de álcool e outras drogas participando das atividades do Centro, mas apenas pessoas com outros transtornos mentais, o que gerou certo estranhamento. Leila, responsável por uma das oficinas de produção, argumenta que existe uma demanda de assistência por parte do público de usuários/dependentes de álcool e outras drogas, mas que não há para onde encaminhá-los, deixando implícita a ideia de que um centro de saúde mental geral não seria esse lugar de atendimento. Em outros momentos da entrevista, ela justifica essa afirmativa argumentando que os próprios profissionais que trabalham no local não estão preparados para o acolhimento destes usuários/dependentes. No entanto, se o Centro, que, teoricamente, seria o local de atendimento dessa demanda, não está preparado para tal, onde ela poderá ser atendida? A resposta, infelizmente, é que tal demanda simplesmente não está sendo atendida. A profissional do Centro apresenta ainda mais uma razão para o afastamento desses usuários:

Percebo um certo preconceito dos usuários daqui e deles. Tipo assim, pra um paciente que é alcoólatra ou drogadito, é difícil aceitar que ele é doente, muitos têm essa dificuldade de aceitar que isso é uma doença. Então chega aqui e vê esse tanto de gente que é doente, que assume a própria doença... geralmente eles falam que eles têm depressão, depressão muito grave, ou então falam "eu sou doido mesmo". Então pra eles é "ah, eu não sou doido, o que eu vou fazer aqui?". Então eu acho que isso é um dos agravantes que afasta eles daqui.

Como exposto no trecho, existe claramente uma diferença entre os drogaditos e alcoólatras e os demais usuários do serviço de saúde mental, os quais possuem distúrbios de outra natureza, havendo um preconceito entre os grupos, cultivado pelos dois lados. As constatações até este ponto geram dois tipos de questionamento: 1) não seria necessário começar a estruturar centros de convivência exclusivos para os usuários/dependentes de álcool e outras drogas no Estado de Minas Gerais? e 2) as atividades de trabalho realizadas pelo Centro de Convivência realmente conseguem transcender os objetivos terapêuticos e alcançar os propósitos de inclusão social?

Nesse sentido, se os usuários/dependentes químicos ou de álcool somente são atendidos – e ainda parcialmente – pelas oficinas terapêuticas, e estas possuem uma ação limitada quanto à reinserção social, tem-se uma lacuna evidente: a insuficiência de experiências com este objetivo. A fim de compreender melhor essa realidade e as especificidades relacionadas aos usuários de álcool e outras drogas, foi realizada a segunda visita em Minas Gerais, ao Centro de Atenção Psicossocial para Atendimento de Pacientes com dependência e/ou uso prejudicial de álcool e outras drogas (CAPSads), localizado em Itaúna. Nele, foi possível compreender melhor a realidade desses usuários/dependentes.

Um primeiro aspecto observado nas entrevistas acerca dos usuários/dependentes químicos e de álcool refere-se aos prejuízos atinentes ao âmbito familiar, constatados na literatura sobre o tema. Isso porque a dependência acaba por levar o indivíduo a ter atitudes negativas, como violência doméstica e prática de roubos, as quais tendem a degenerar seus vínculos sociais e afetivos. A reconstrução dos vínculos familiares constitui um processo fundamental quando se trata da reabilitação dos dependentes de substâncias químicas e de álcool, pois a família constitui um ponto de apoio para o paciente durante o período de tratamento.

Nesse sentido, o psicólogo Marcos defendeu durante a entrevista a necessidade de se buscar restabelecer esses vínculos, o que muitas vezes exige a intervenção de um profissional de assistência social. É interessante destacar que o isolamento dos pacientes, que costuma ser uma exigência do tratamento, tende a dificultar esse retorno ao seio social, que se iniciaria pela reintrodução na própria família. Além dessa questão dos vínculos, percebeu-se outra dificuldade relacionada ao tratamento, que são os ganhos secundários: "Já tivemos pacientes aqui que não almoçavam, guardavam o marmitex pra trocar por álcool, trocar por droga e álcool. Inclusive, até a passagem".

Ao se referir ao ganho secundário, o psicólogo retrata um problema fundamental, porque o paciente acaba por se tornar dependente do tratamento, sendo refratário à cura, em função dos ganhos advindos da posição de usuário/dependente, sejam eles intangíveis, como o ganho de atenção por parte dos profissionais e de outras pessoas, sejam os tangíveis, como a manutenção de uma renda financiada pela previdência social, a alimentação e os demais benefícios oferecidos pela instituição. Nesse sentido, há um movimento por parte dos profissionais envolvidos visando à não cronificação dos assistidos, para que eles possam, após o tratamento, retornar ao convívio social.

Quando questionada especificamente sobre um espaço de trabalho existente dentro do CAPSad, Maria explicou que a maior parte dos usuários/dependentes não possui interesse nas atividades disponíveis. No entanto, ressalta – a título de exemplo – que é positivo quando alguém se interessa pelo trabalho na horta, contextualizando o trabalho mais como uma atividade braçal. Haveria um desinteresse dos pacientes ou uma ausência de opções de atividades gerando um aparente desdém pelo trabalho? Não se pode desconsiderar também que, para os toxicômanos, o trabalho pode representar repressão, de modo que o desafio de oficinas no contexto da economia solidária é justamente estabelecer um contraponto a isto e restabelecer a possibilidade de expressão em um espaço público. Outro ponto fundamental levantado pelo psicólogo ao tratar do tema trabalho refere-se à dificuldade do paciente em lidar com o dinheiro: "Tem esse problema do dinheiro. Tem esse problema, hoje, o paciente, ele falou que ele consegue ficar sem beber quando ele fica sem um centavo no bolso. A relação com o dinheiro é [...]. Ele vai ter que reaprender a lidar com o dinheiro".

A questão do dinheiro também aparece na literatura sobre o tema (Melo, 2006). O fato é que o dinheiro é especialmente perturbador para o toxicômano, que faz do encontro com este recurso um problema, e não uma solução. Nas mãos do toxicômano, o dinheiro assume outro estatuto, pois não metaforiza a falta nem um equivalente universal: dinheiro significa álcool ou droga. Assim, a remuneração percebida por alguma atividade pode ser uma arma contra o tratamento, de forma a constituir-se um caminho para possíveis recaídas. No entanto, é necessário destacar que a inserção do trabalho, contida, inclusive, na proposta da Reforma Psiquiátrica, localiza-se ao final do processo de tratamento, momento em que o sujeito já se encontra em um grau de estabilização maior. Todavia, ainda assim o dinheiro é uma questão problemática, levantada por todos os entrevistados, sobre a qual é preciso refletir.

 

Economia solidária e tratamento da toxicomania: o quadro em SP

Em São Paulo, a visita foi a um Centro de Convivência chamado "É de Lei", também inscrito no Cadastro de Iniciativas da Saúde Mental de Inclusão pelo Trabalho (Ministério da Saúde & Ministério do Trabalho e Emprego, 2006), constatado como a única instituição da cidade cujo atendimento se volta especificamente a usuários/dependentes de álcool e drogas e busca iniciativas no âmbito da economia solidária. Assim como em Minas Gerais, constatamos uma lacuna, pois há uma escassez de iniciativas para o tratamento deste público. O Centro é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos e se caracteriza por seu trabalho voltado à promoção da redução de danos à saúde e sociais relacionados ao uso de drogas, atuando como um espaço de interação social e promoção da cidadania e dos direitos humanos entre os usuários. Esta ONG foi inaugurada em 1998 e estava vinculada inicialmente ao NEPAIDS (Núcleo de Estudos e Prevenção em Aids do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo). Entre seus trabalhos iniciais, destacam-se aqueles que visam à implementação de estratégias de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis (DST), do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e da síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA).

Assim como aconteceu na investigação em Minas Gerais, não foram encontradas, no momento da realização da pesquisa (2010), iniciativas de trabalho voltadas à perspectiva da economia solidária. Os entrevistados, entretanto, alegaram que algumas oficinas de trabalho já ocorreram em outros momentos. Atualmente, o principal foco de trabalho da ONG é uma região do centro da cidade de São Paulo conhecida como "Cracolândia", onde se concentram diversos sujeitos usuários de crack. Lá, os profissionais da ONG atuam segundo a perspectiva da redução de danos, que busca reduzir ou amenizar as consequências salutares e sociais da utilização dos psicoativos a partir do entendimento de que a exigência da abstinência imediata é, em geral, uma ação pouco efetiva (Ministério da Saúde, 2005). Os trabalhos realizados pelo Centro estão vinculados, por meio de projetos, a parceiros tanto do governo brasileiro como da sociedade civil, e tratam de questões relacionadas a cidadania e direitos humanos. Além de trabalhos relacionados à saúde, atualmente a ONG está buscando realizar ações na área cultural.

Sobre atividades desenvolvidas no Centro de Convivência "É de Lei" relacionadas à perspectiva de trabalho, incluindo a geração de renda, Tales conta sobre uma oficina de pão, que partiu de uma ideia de usuários do serviço que possuíam experiência com essa atividade. Iniciaram então a "oficina de pão", e logo começaram a vender os pães para pessoas que trabalhavam no shopping onde funciona o Centro. A iniciativa foi bem sucedida, mas interrompida devido a problemas que tiveram com o forno, que foi considerado inadequado para aquelas atividades após uma fiscalização. Sem possibilidades financeiras de adquirir outro equipamento, uma das poucas iniciativas de geração de renda desenvolvidas no serviço teve de ser encerrada.

E aí tem o trabalho aqui na sede, que já rolou as oficinas de geração de renda [...[ eu participei mais da oficina de pão, a gente fez em 2007, que foi bem legal, que na verdade veio da ideia deles – tinham dois usuários que tinham tido a experiência de fazer pão em outro lugar, falaram: "vamos fazer, a gente consegue tirar alguma, pelo menos pra ONG pagar produtos de limpeza". A gente fazia pão duas vezes por semana aqui à tarde, e a gente vendia os pães aqui mesmo no prédio, é um shopping, uma galeria: a gente vendia pras costureiras, pros africanos e aí o pessoal comprava pão. É super interessante (...) eu nunca tive outra experiência com geração de renda, mas eu considero que ela gerou pouca renda. Acabou gerando pouca renda, mas durante um ano a gente conseguiu comprar nossos produtos de limpeza, os ingredientes, e os usuários sempre acabavam saindo com um trocado mínimo pra comer, pra comprar um maço de cigarro, pra fazer as coisas dele (Tales).

Com esses pães a gente tomava o café no final da tarde. Aí, quando foi um dia, sobrou pão, e a gente saiu aqui na galeria vendendo, e [...] aí a mulher falou "se você tiver mais amanhã, traz". Aí no outro dia foi feito e [...] quando a gente percebeu, nós estávamos com a oficina de pães feita, entendeu? [...] não foi mais ou menos uma geração de renda, mas foi uma coisa assim: [...] a gente estava sem nada pra fazer e inventou uma coisa pra gente comer no final da tarde e eu sei que a coisa começou a andar e que hoje é a oficina de pães, entendeu? E a coisa foi indo, foi indo, foi indo nessas oficinas até que a gente não podia usar mais gás aqui (Rogério).

Assim, o que se constatou nessa instituição foi uma tímida atividade de trabalho, haja vista o tempo de funcionamento da ONG, apesar de a mesma estar cadastrada no Ministério da Saúde e Trabalho como uma iniciativa de inclusão social pelo trabalho, conforme já exposto. A atividade descrita gerou resultados positivos, tanto entre os usuários como em relação à comunidade local do shopping, mas não teve continuidade. Dessa forma, não podemos afirmar que a atividade de geração de renda seja uma prioridade nesta instituição. Uma questão interessante, relacionada a esta iniciativa da oficina de trabalho, foi o reconhecimento e a valorização dos saberes dos trabalhadores para a implantação e o desenvolvimento da atividade, como foi explicitado nas entrevistas. Outra discussão a respeito desta iniciativa é quanto à renda gerada pela atividade. Muitas atividades de trabalho realizadas no Centro possuem um foco mais terapêutico, e menos produtivo, aproximando-se de uma terapia ocupacional, na qual a atividade de trabalho se configura como um meio, e não um fim a ser alcançado, não gerando, por exemplo, renda para o indivíduo necessária para sua sobrevivência, nem inserção política e social.

Desse modo, mesmo com a atividade da oficina de pão, embora com esta finalidade, não se conseguiu uma renda significativa para os sujeitos. Tal fato certamente não desqualifica a iniciativa, que estava em seu desenvolvimento inicial, mas aponta para uma reflexão importante sobre a inserção de iniciativas como esta, que se voltam à recuperação de dependentes na perspectiva da economia solidária. Além disso, há que se refletir sobre a renda, tendo em vista as dificuldades do toxicômano para lidar com o dinheiro, problema que também constatamos no caso de Minas Gerais. Sobre esta relação, os sujeitos apontam a importância do trabalho para tal sujeito, mas atentam para os obstáculos:

Eu acho que primeiramente se tratar né?! Ela tem que ter consciência de que ela precisa de um tratamento. [...] Agora o que enobrece a pessoa é o trabalho, o estudo... É tipo assim, você tem que ter estratégia, entendeu?! (Tales).

Em primeiro lugar o tratamento, porque se a pessoa não tiver um tratamento psicológico [...] como vai fazer quando a pessoa for pegar o dinheiro? Ela vai trabalhar, que nem eu falei uma vez, pro traficante. Entendeu?! Então, quer dizer, é uma coisa psicológica, quer dizer, a pessoa primeiro tem que ter um tratamento, ter um conhecimento pleno que ela precisa de ajuda e [...] que ela vai se engajar nessa ajuda. [...] Muitas vezes, o dinheiro, ele se torna inimigo. [...] Então, tem pessoas que trabalham feito louco, e, quando chega no pagamento, o cara, ele simplesmente se detona, entendeu? Mas, muitas vezes, você trabalhar é bom, porque você vai se ocupar, você vai vendo que você é uma pessoa útil, entendeu? (Vando).

O dinheiro se torna seu inimigo. É muito complicada a coisa. A pessoa tem que tá bem em todos os aspectos, em todos os aspectos (Rogério).

Mesmo como uma iniciativa inicial, e diante da discussão relativa à relação do toxicômano com o dinheiro, o trabalho com a oficina de pão aproximou-se dos ideais preconizados na economia solidária, por trabalho coletivo, relações horizontais, valorização dos saberes locais, dentre outros fatores. Essas características possibilitaram aos sujeitos, com este trabalho, estabelecer relações diferentes daquelas pautadas na organização do trabalho capitalista. Vando comenta sobre essas relações na oficina e em outras que teve oportunidade de desenvolver em outros espaços:

Ajuda muito sabe no quê? [...] no fator diálogo, comunicação, ou seja, a pessoa que é usuária de droga, a pessoa que ela usa droga, ela é delirante... [...] E através desses trabalhos você entra naquele clima, aquele elo, aquela amizade gostosa e tal [...] Agora você vê, eu tô conversando com você aqui numa boa. A partir desse trabalho, a partir... fica astral, fica harmonioso, fica que nem uma família, que nem uma família. (Entrevistador: Aí tem um sentido diferente do trabalho formal, do chefe, empregado?) Com certeza, porque você faz as coisas com mais espontaneidade, você faz as coisas com mais amor, com mais carinho, com mais vontade. Você sabendo que ninguém tá ali te enchendo o saco, você sabendo que tá fazendo aquilo ali porque você quer fazer, ninguém tá te mandando fazer. É tão legal fazer as coisas porque você quer. Você já provou isso? (Vando).

Vando enfatiza também os benefícios do trabalho na vida do toxicômano em geral. Um ponto interessante sobre a atuação do Centro é que, apesar de tímidas, nessas iniciativas de oficinas de trabalho, há o reconhecimento e valorização do trabalho e suas possibilidades na toxicomania, tanto psíquicas quanto sociais, de resgate de cidadania e do sujeito político. Nesse sentido, é incentivada pelos técnicos a participação dos usuários do serviço em atividades da ONG, como participação em eventos com entidades governamentais, seminários, cursos de formação etc.

É bom que você se reintegre à sociedade, a pessoa se sente mais útil [...]. Porque às vezes [...] as pessoas ficarem nas drogas, ficar nessa vida, a pessoa ela não se sente útil à sociedade, ela pensa que ela é um lixo. [...] pra ela já era; não tem mais um por que viver [...]. Ela tá totalmente errada. A gente tenta transmitir para os usuários qual que é o projeto, qual que é a visão, qual que é o olho clínico da ONG. É o quê? É resgatar essas pessoas. Pra quê? Pra ter uma vida social igual às outras. Não é ser rico, ser um Sílvio Santos da vida; é igualdade (Vando).

Há também o incentivo de que os usuários do serviço tornem-se trabalhadores da ONG, como já aconteceu com outros participantes e ocorre no momento com Rogério. Rogério atua na ONG na função de redutor de danos. "Hoje eu sou um funcionário da ONG, tenho trabalho e tal". Tales esclarece sobre esta ação:

O Rogério, que é da redução de danos e estava ali, tem uma história interessante, que ele era um usuário nosso, que o CAPSad encaminhou ele pra cá, começou a frequentar aqui. Foi uma mudança na vida dele toda. [...] Já teve acho que alguns, pelo menos uns sete, oito, redutores de dano que chegaram a trabalhar com a gente. Alguns deram certo, que nem o Rogério tá dando; alguns também não deram certo – o cara começava a receber o dinheiro dele e já desandava (Tales).

Além das atividades localizadas na sede, que envolvem o acolhimento do indivíduo usuário de droga em um espaço de convivência, os técnicos do serviço se deslocam para áreas de alto índice de uso de drogas e desenvolvem um trabalho tanto informativo sobre a utilização de substâncias psicoativas como de redução de danos físicos e morais. Dentre as atividades realizadas, cita-se a distribuição de seringas descartáveis, preservativos, além de outros instrumentos para uso de drogas, que evitam o uso compartilhado e a propagação de doenças. Além das atividades no âmbito da saúde, destacam-se as atividades culturais, atualmente bastante preconizadas no centro. Sobre estas, Tales aponta a possibilidade futura de uma perspectiva de geração de renda, mas no momento a atividade está apenas iniciando. É interessante pensar, até mesmo como uma ação propositiva desta pesquisa, uma maior inter-relação entre ações voltadas para saúde com as culturais e aquelas voltadas para o trabalho. As falas dos sujeitos apontam que todas essas ações constituem-se em importantes "estratégias" (conforme termo utilizado por eles), para ficar longe das drogas.

Nessa linha, pode se inserir também a perspectiva da educação, amplamente inter-relacionada com as anteriores; o estudo foi referenciado pelos sujeitos da pesquisa e destacado em seus benefícios e possibilidades de transformação e elaboração.

Ela [a droga] destrói você em todos os aspectos, [...] ela é um alto poder viciante: a dependência dela é muito pior do que as outras. Aí, nesse tempo que eu estava me recuperando, foi quando eu voltei a estudar [...] porque quando eu estava preso, eu tinha estudado só até a oitava série, aí lá na cadeia, quando eu estava preso [...] eu terminei o ensino fundamental. Aí quando eu saí [...] fiquei sabendo de um programa que tem aqui no Mackenzie. Então, é uma faculdade aqui que tem um programa de EJA, educação de jovens e adultos, então eu fui lá, me inscrevi. Então hoje eu estudo numa faculdade, eu não tô fazendo faculdade, tô terminando o ensino médio, tô no terceiro ano, e o uso, ele tá praticamente a zero (Rogério).

O fato é que o uso do trabalho no Centro de Convivência, seja por terapêutica, seja por geração de renda, seja pela inclusão dos usuários do serviço como membros da equipe, não é, conforme já mencionamos, a atividade principal do Centro, assim como também foi observado no caso de Minas Gerais. Isso aponta para a incipiência dessas ações no atendimento da saúde mental no campo da dependência de álcool e outras drogas: infelizmente, há um reduzido número de iniciativas com este fim. Na realidade, o que a instituição mais preconiza são ações no âmbito da saúde, voltadas para a perspectiva de redução de danos, com destaque para as atividades realizadas em trabalho de campo.

 

A economia solidária na saúde mental: por um olhar propositivo

Os dois casos estudados, em Minas Gerais e na cidade de São Paulo, revelaram que, embora sejam experiências que fazem parte da Rede Brasileira de Saúde Mental e Economia Solidária, elas não realizam, no momento, atividades que se aproximam da proposta da economia solidária. De forma mais específica, percebeu-se que elas não enfocam o trabalho como forma de inclusão de sujeitos que possuem alguma dependência de álcool e outras drogas. Tal constatação aponta para a existência de uma lacuna no atendimento a esses sujeitos no que se refere a essa possibilidade de recuperação de sua cidadania e espaço social. Percebeu-se, na realidade, que tais organizações acabam por atuar em esferas anteriores da cadeia de tratamento, como a própria fase de acolhimento de pacientes que resolvem se tratar.

No entanto, ainda que essas práticas não estejam sendo vivenciadas, é fato que o trabalho aparece nas entrevistas como um elemento central na vida dessas pessoas e, especialmente no caso das pessoas em processo de recuperação, revela-se uma possibilidade de reconstrução dos laços sociais. No caso de São Paulo, especificamente, observou-se que já houve uma iniciativa neste sentido, mas que essa não teve continuidade. Ao mesmo tempo, algumas especificidades desses usuários foram elencadas como dificultadoras da inserção pelo trabalho, como é o caso da relação com o dinheiro. Diante desse contexto, pretende-se, nesta seção, refletir sobre as potencialidades e limitações da proposta da economia solidária no campo da saúde mental relacionado ao uso abusivo do álcool e outras drogas. Então, primeiramente, quais seriam as potencialidades dessa aproximação?

Um primeiro aspecto importante se refere à preocupação existente sobre a criação e a manutenção de vínculos afetivos e sociais pelos usuários, dado que o vício, na maior parte das vezes, acaba por desgastar as relações dos indivíduos, acentuando o processo de isolamento e a exclusão. Nesse sentido, a economia solidária se destaca pela necessária condição de existência desses vínculos, os quais constituem, ao contrário das organizações tradicionais, o motor que alimenta a produção de bens ou serviços. Os laços sociais são, portanto, parte da essência do movimento da economia solidária, tornando esses empreendimentos espaços de socialização e também de expressão política (participação). Esses laços são fundamentais quando se leva em consideração a racionalidade que permeia essas organizações: a racionalidade substantiva (Ramos, 1981). Tal racionalidade, fundamentalmente baseada em valores, envolve um novo sentido para o trabalho, que além de constituir meio de subsistência, também é o espaço de autoconstrução do sujeito, sendo que a presença do ideal da autogestão e o rompimento com o sentido de hierarquia diferenciam essas iniciativas do trabalho tradicional.

Outro aspecto importante relacionado à proposta da economia solidária é a questão da autonomia (Singer, 2002). Ela se relaciona estreitamente com o entendimento de que a organização também se configura, conforme explicitado anteriormente, como um espaço de expressão política (Andion, 2005). Isso porque uma característica fundamental do movimento é a vivência de uma gestão democrática, em que todos os participantes podem influenciar diretamente nas decisões da organização. As decisões coletivas, bem como a possibilidade de experienciar uma posição de igualdade dentro da organização, pode ser um fator capaz de despertar maior interesse dos participantes.

Outros aspectos relacionados às experiências em economia solidária podem constituir fontes de motivação para a participação do público em questão. Uma prática comum – e recomendada – aos empreendimentos solidários é a rotatividade das funções (Vietez & Dal Ri, 2001). Isso porque possibilita que o indivíduo saiba lidar com todo o processo de produção, abandonando a posição de especialista. Esse aprendizado torna também o cotidiano de trabalho menos monótono, na medida em que não se repetem diariamente as mesmas atividades.

Um aspecto importante identificado na pesquisa exploratória é a dificuldade dos usuários em lidar com o dinheiro. Primeiramente, é válido destacar que a proposta da economia solidária envolve uma ressignificação da visão de mundo em que o trabalho e as questões econômicas são subjugados à dimensão social. Nesse sentido, em certa medida, essa ressignificação do dinheiro é algo inerente à proposta, já que o "ter" é repensado em relação ao "ser" e "construir". No entanto, pôde-se perceber que a relação com o dinheiro é algo realmente problemático para esses indivíduos, podendo ser o caminho mais rápido para uma recaída. Nesse contexto, pode-se considerar a constituição de clubes de troca e da criação de uma moeda social, a qual tenha valor circunscrito ao espaço da própria organização ou de uma rede de organizações. Essa experiência de criação de uma moeda própria se deu no âmbito dos clubes de troca e, como explicitado por Búrigo (2000, p. 2), tem ganhado expressão tanto em países desenvolvidos quanto nos periféricos. Segundo o autor, "em cada uma dessas experiências a moeda adotada assume nome e regras próprias".

Como explicita Singer (2002), os clubes de troca se constituem em organizações de pessoas que se unem para trocarem umas com as outras os frutos de seu trabalho. As moedas sociais foram, portanto, um meio de quantificar essas trocas sem os "vícios" embutidos na moeda tradicional. Búrigo (2000) também apresenta o relato de um grupo brasileiro que se utiliza de uma moeda social. O depoimento esclarece como esta funciona e quais são as suas vantagens.

Ela é produzida, distribuída e controlada pelos seus usuários. Por isso, o valor dela não está nela própria, mas no trabalho que vamos fazer para produzir bens, serviços, saberes e depois trocar com o resultado do trabalho dos outros. A moeda enquanto tal não tem valor, até que comecemos a trocar trabalho com trabalho. Ela é diferente também porque a ela não está ligada nenhuma taxa de juros. Por isso não interessa a ninguém guardá-la. Interessa, sim trocá-la continuamente por bens e serviços que venham responder às nossas necessidades. Esta moeda será sempre um meio, nunca um fim. (Multirão Abopuru, 2000, citado por Búrigo, 2000).

Por fim, o autor destaca que a ideia da constituição de uma moeda social pode ser associada a outras iniciativas, como programas de desenvolvimento local. Neste contexto, é válido destacar outra questão muito discutida no campo da economia solidária, tanto no meio acadêmico quanto pelos envolvidos diretamente no cotidiano dessas organizações: a construção de redes. As redes propiciam que as organizações se apoiem e enfrentem as dificuldades em conjunto, possibilitando maiores chances de sustentabilidade e crescimento (Mance, 2002).

No entanto, quais seriam as limitações da aproximação entre economia solidária e saúde mental, especialmente no que tange aos usuários de álcool e outras drogas? Primeiramente, devem-se levar em consideração as limitações que a proposta da economia solidária enfrenta de uma forma geral. Dentre estas questões, destacam-se a dificuldade de se manter uma lógica diferenciada, uma vez que estas instituições estão incrustadas em um ambiente no qual predomina o ideário capitalista, e também o fato de possuir valores (um imaginário) muito distantes dos tradicionais, o que exige dos indivíduos processos de ressignificação e conscientização expressivos (Barreto & Paes de Paula, 2009). Além disso, salienta-se a questão das dificuldades de sustentabilidade (sobrevivência) dos empreendimentos (Vietez & Dal Ri, 2001), os dilemas relativos à intervenção ou não do Estado no movimento e problemas relativos ao aparato legal (Tesch, 1999), dentre outras. Essas dificuldades que permeiam o movimento e que têm sido reveladas pela vivência prática dessas organizações são objetos de várias pesquisas e, embora não devam ser perdidas de vista quando se deseja tratar do assunto, não serão aprofundadas aqui, já que se está priorizando as dificuldades relativas à vivência da proposta em um contexto particular.

De certa maneira, discute-se que as dificuldades apontadas ao longo da pesquisa exploratória em relação aos indivíduos em questão podem ser transpostas ao contexto de trabalho. Um dos aspectos levantados diz respeito ao ganho secundário, ou seja, aos ganhos percebidos pelos pacientes ao se manterem em tratamento em detrimento do empenho pela alta. Neste esteio, coloca-se um desafio à economia solidária no sentido de se revelar uma opção mais interessante do que esses ganhos secundários, pois os ganhos no que se refere à autonomia e ao estreitamento de laços solidários talvez possam gerar um sentido de alteridade que supere a busca por ganhos materiais e pela obtenção narcísica de atenção.

Ainda no que tange à dimensão financeira, o dinheiro foi apontado como um aspecto bastante problemático. Embora a proposta da constituição de uma moeda social se mostre um caminho viável para amenizar o problema, ela abrange apenas parte dele. Isso porque, como apontado nas entrevistas, qualquer bem, até mesmo o alimento fornecido pela instituição de tratamento, pode ser objeto de troca para sustentar o vício. Neste sentido, mais que colocar o dinheiro como algo "fora do alcance" desses indivíduos, deve-se vislumbrar um movimento maior de ressignificação como parte do processo de reabilitação como um todo. Ou seja, o que se deseja ressaltar aqui é a complexidade do problema, que acaba por exigir uma atuação ampliada em que o empreendimento seja apenas um elo de uma cadeia maior, que vai da prevenção à reabilitação.

Tal complexidade referente à temática tratada neste trabalho implica, portanto, a construção de políticas mais efetivas no que diz respeito ao atendimento a esse público. Assim, problemas como o despreparo dos profissionais para este atendimento e a deficiência em termos de locais para receber essa demanda – apontados nas entrevistas – precisam ser resolvidos. Como pensar em uma ação mais ampla, envolvendo até mesmo a construção de redes de empreendimentos solidários, em que esses usuários possam se recuperar socialmente, reconstruindo sua dignidade e cidadania, se não há suporte do Estado para isso?

Diante de todos esses pontos levantados, é possível perceber a potencialidade e os limites das relações entre o problema do uso/dependência de álcool e outras drogas e as saídas apontadas pela economia solidária. Muito mais do que um recurso terapêutico, trata-se aqui da percepção do trabalho como este elo que proporciona ao indivíduo sentir-se novamente parte do todo social. Sendo assim, pensar na possibilidade da vivência da economia solidária significa muito mais do que a potencial de inserção pela renda, mas toda uma mudança de visão de mundo que o movimento propõe: resgatando laços, aprendendo a viver em comunidade, ressignificando o trabalho e seus produtos. Quanto às dificuldades, elas realmente existem e não podem ser ignoradas sob pena de acusação de uma visão ingênua da realidade. Não se trata de ignorá-las, mas de trabalhar sobre elas, considerá-las menos dificuldades e mais desafios que tal realidade impõe.

 

Considerações finais

Como apontado ainda na introdução, o objetivo deste trabalho foi analisar as ações de economia solidária como via de inclusão social de usuários de álcool e outras drogas, mas a constatação empírica da ausência ou incipiência de ações dessa natureza levou à discussão da lacuna de atendimento aos usuários/dependentes de álcool e outras drogas, bem como dos limites e potencialidades de economia solidária como via de cura e reinserção dos assistidos. Conforme foi averiguado, entre as organizações da região metropolitana de Belo Horizonte e da cidade de São Paulo, listadas no Cadastro de Iniciativas da Saúde Mental de Inclusão pelo Trabalho, apenas duas confirmaram atender a esse público, uma em cada localidade. E, ao pesquisá-las, percebeu-se que nenhuma das duas no momento atua, de fato, com a proposta da economia solidária.

No entanto, a investigação realizada nessas organizações possibilitou certo aprofundamento sobre a realidade desses sujeitos, contribuindo para a compreensão de suas dificuldades e especificidades. Os aspectos discutidos no artigo apontam que, apesar da incipiência das ações, há potencialidades para a reinserção social dos usuários/dependentes de álcool e outras drogas por meio da economia solidária, devido às características percebidas nessas iniciativas fora do campo da saúde mental. Tais potencialidades provêm, basicamente, da congruência entre os objetivos do movimento da economia solidária e as problemáticas atinentes ao público em questão, pois os valores, a lógica e a racionalidade do movimento possibilitam um resgate desses indivíduos para o convívio público. Por outro lado, chamou-se a atenção para as dificuldades que emergem, tanto no movimento da economia solidária como um todo quanto no que tange aos dependentes de psicoativos, como a questão do dinheiro, dos ganhos secundários, do desinteresse, entre outros.

O que o artigo reforça é a complexidade do fenômeno em questão, que implica, necessariamente, a adoção de ações integrais. Em que sentido? Ações que não se restrinjam ao pontual, ou seja, que façam parte de uma política mais ampla de atenção a esses indivíduos. Isso significa a articulação de uma cadeia – interligada e harmônica – de programas e propostas de ação. Em outra via, isso também implica um envolvimento mais amplo dos vários atores sociais sob a ótica de um esforço conjunto.

Em termos de contribuições, este trabalho realiza uma investigação de um tema ainda pouco explorado no que tange às relações de trabalho, ao abordar a reflexão de formas alternativas de organização do trabalho como vias para inclusão social de sujeitos usuários/dependentes de substâncias psicoativas. Além disso, destaca-se o caráter propositivo da pesquisa, que tenta expandir a discussão e contribuir para que essas experiências possam, de fato, constituírem-se em possibilidades de ações concretas de mudança social.

 

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Endereços para correspondência
admraquelf@hotmail.com, fernandatarabal@hotmail.com,
appaula@face.ufmg.br

Recebido em: 11/04/2012
Revisado em: 25/11/2012
Aprovado em: 29/11/2012

 

 

1 A criação desta rede foi uma iniciativa do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério da Saúde que consta na Portaria do Interministerial nº 353, de 7 de março de 2005, que institui o Grupo de Trabalho Saúde Mental e Economia Solidária.
2 Este cadastro consta no Anexo V do documento "Saúde Mental e Economia Solidária. Relatório Final do Grupo de Trabalho" (Ministério da Saúde & Ministério do Trabalho e Emprego, 2006).
3 Todos os nomes dos entrevistados são fictícios.
4 O Centro de Convivência "É de Lei", visitado na cidade de São Paulo, é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos e caracteriza-se por seu trabalho voltado para a promoção da redução de danos à saúde e sociais relacionados ao uso de drogas, atuando como um espaço de interação social e promoção da cidadania e direitos humanos entre os usuários.