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Cadernos de Psicologia Social do Trabalho

versão impressa ISSN 1516-3717

Cad. psicol. soc. trab. vol.24 no.2 São Paulo jul./dez. 2021

http://dx.doi.org/10.11606/issn.1981-0490.v24i2p201-215 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Ritornelos de chefs imigrantes: ritmos e marcas da e na cozinha

 

Refrains of immigrant chefs: rhythms and marks of and in the kitchen

 

 

Vanessa Amaral Prestes; Carmem Ligia Iochins Grisci

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Porto Alegre, RS, Brasil)

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Objetiva-se apresentar como se dá a produção de territórios no trabalho de chefs de cozinha imigrantes a partir dos ritornelos identificados. Toma-se o território como um modo de ser ou de agir, de se expressar e de se relacionar com o mundo, sendo que processos de apropriação, associação e desejo vêm a conferir o caráter existencial ao território. E ritornelo como os padrões rítmicos que permitem visibilizar os territórios por meio da repetição e de tudo aquilo que se faz expressivo. O ritornelo oferece subsídios para pensar a repetição como produtora de territórios no trabalho. O estudo é qualitativo, e adotou a narrativa como método, contemplando a produção e a análise das informações narradas pelos participantes. A narrativa produzida reflete como chefs imigrantes arranjam e fazem a gestão de equipes com códigos culturais distintos dos seus de origem; como estabelecem uma cadência para suas equipes de trabalho; como são marcados por acidentes na cozinha e como investem as pausas na rentabilização de si e do trabalho. Esses ritornelos ganham função afetiva, social e profissional e, ao se tornarem expressivos, dão visibilidade aos territórios na imigração.

Palavras-chave: Ritornelo, Território, Imigração, Chef de cozinha.


The aim of this article is to present how the production of territories takes place in the work of immigrant chefs, based on the identified refrains. The territory is understood as a way of being or acting, of expressing and relating to the world, and processes of appropriation, association and desire confer the existential character on the territory. Refrains are viewed as the rhythmic patterns that make territories visible through repetition and everything that is expressive. The refrain offers subsidies for thinking about repetition as a producer of territories at work. The study is qualitative, and adopted narrative as a method, reaching the production and analysis of information narrated by the participants. The narrative produced reflects how immigrant chefs arrange and manage teams with cultural codes different from their origins; how they set a cadence for their work teams; how they are marked by accidents in the kitchen and how they invest breaks in the profitability of themselves and their work. These refrains take on an affective, social and professional function and, when they become expressive, they give visibility to territories in immigration.

Keywords: Refrain, Territory, Immigration, Chef.


 

 

Introdução

O atual contexto, a tal ponto marcado por fluidez e movimentações, veio a ser nominado como sociedade líquido-moderna (Bauman, 2007). Ele abarca termos como trabalho imaterial (Lazzarato & Negri, 2001; Mansano, 2009) e território existencial (Deleuze & Guattari, 1997a), e, nele, dá-se a perceber a subjetividade e a sutileza presentes nas produções dos dias que correm. Uma vez que esse contexto requer sujeitos cada vez mais articulados com o trabalho, importa pensar a produção de territórios também em uma lógica que vai além da materialidade.

A partir das articulações de Deleuze e Guattari (1997a), toma-se território como um modo de ser ou de agir, de se expressar e de se relacionar com o mundo, que "afeta os meios e os ritmos, que os territorializa" (Deleuze & Guattari, 1997a, p. 127), e ritornelos como os padrões rítmicos que permitem visibilizar os territórios por meio da repetição e de tudo aquilo que se faz expressivo. Tal ênfase na ação remete a uma lógica processual, não estática e não linear. Ao estudar a produção de territórios e os ritornelos presentes no cotidiano de trabalhadores, busca-se explicitar as relações que envolvem o trabalho e o sujeito.

Para o presente artigo, argumenta-se que a interface entre imigração e trabalho se apresenta como campo relevante à problematização dos modos de trabalhar e viver contemporâneos (Castles, 2010; Freitas & Dantas, 2011). Considera-se, entretanto, que determinadas profissões ainda são pouco exploradas na literatura pertinente. Desse modo, elegeu-se a profissão de chef de cozinha em âmbito internacional, campo ainda inexplorado em estudos acadêmicos.

Constata-se, ainda, que permanecem lacunas referentes à observação e à análise da imigração e da vida de imigrantes, aspectos que poderiam ser mais bem explorados com o suporte dos conceitos apresentados inicialmente por Deleuze e Guattari (1997a, 1997b), e, posteriormente, explorados em estudos mais recentes (Haesbaert & Bruce, 2002; Herner, 2017; Oliveira & Fonseca, 2006).

Toma-se essa relação como interessante possibilidade de abertura para efeitos de uma análise da imigração, pois, conforme Haesbaert e Bruce (2009, p. 3), há muitas conexões a serem produzidas a partir da noção de território de Deleuze e Guattari, "incluindo, sem dúvida, a possibilidade de reconstruí-la, recriá-la, reconduzindo-a por outros caminhos." A torção que aqui se propõe é pensar os territórios também para além das materialidades, de modo a incluir espaços de reprodução de modos de trabalhar intensivos, acelerados pela lógica do capital e demandantes de outras "dimensões da atividade humana, particularmente aquelas voltadas para a educação, a cultura, a geração de conhecimento, a saúde, o afeto e a sociabilidade" (Mansano, 2009, p. 513).

A partir das noções basilares acerca de territórios e ritornelos, e sobre imigração e trabalho de chefs de cozinha, objetiva-se, com este estudo, apresentar como se dá a produção de territórios no trabalho de chefs de cozinha imigrantes a partir dos ritornelos identificados. A essa introdução seguem o referencial teórico, o procedimento metodológico, o resultado do estudo e sua análise, e as considerações finais.

 

Referencial teórico

Territórios e ritornelos

Em busca realizada em bases acadêmicas nacionais e internacionais, constatou-se que os termos território e territorialidade têm sido adotados em distintas áreas. Estes se concentram, sobretudo, no âmbito da Geografia, e se relacionam às teorizações da geografia física e humanística, a exemplo das pesquisas de Haesbaert e Bruce (2009), Chelotti (2013) e Saquet (2007). Há, também, pesquisas na área da Psicologia Social, referentes aos espaços e aos modos de subjetivação por eles constituídos, como estudos de Souza e Fonseca (2013) e Oliveira e Fonseca (2006).

Território é aqui compreendido como um conceito que vai além da abordagem espacial. Se constitui, portanto, como território existencial, pois é efeito de relações humanas, contemplando apropriação, associação e desejos. Em linhas gerais, território "diz respeito ao pensamento e ao desejo - desejo entendido aqui como uma força criadora, produtiva. Deleuze e Guattari vão, assim, articular desejo e pensamento" (Haesbaert & Bruce, 2009, p. 8).

Nessa perspectiva, compreende-se território como algo relativo a um espaço vivido e a sistemas percebidos, considerando-o como um conjunto de espaços físicos habitados como países, regiões e organizações, assim como tempo, afetos e desejos. Segundo Guattari e Rolnik (1996), "território é sinônimo de apropriação", pois é formado por um "conjunto de projetos e representações nos quais vai desembocar, pragmaticamente, toda uma série de comportamentos e de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, estéticos, cognitivos" (Guattari & Rolnik, 1996, p. 323). Assim, território espacial e existencial coexistem. Por serem concomitantes, acredita-se que contribuam para a discussão acerca de distintas situações de trabalho.

A territorialização, "ato do ritmo devindo expressivo, ou dos componentes de meios devindos qualitativos" (Deleuze & Guattari, 1997a, p. 128), confere movimento ao conceito tradicional de território. A relação entre território e mundo é expressa justamente por meio dos movimentos específicos que constituem os territórios. Mais precisamente, as qualidades expressivas de território (cor, odor, som, silhueta etc.) combinam entre si e formam um devir-expressivo do ritmo ou da melodia. Segundo Deleuze e Guattari (1997a), é nessa combinação que se deve buscar o fator territorializante, e é dela que se origina o ritornelo, conceito que designa conexões de ritmos e melodias que territorializam o sujeito.

Os ritornelos permitem aos territórios a fixação de padrões rítmicos, e ganham outras funções como "amorosa, afetiva, profissional ou social" (Deleuze & Guattari, 1997a). Segundo Fonseca et al. (2008, p. 43), "o ritornelo é composto pelos gestos, lugares e momentos que cabem dentro de certos caminhos da descoberta".

Do trabalho, por exemplo, podem advir ritornelos que demarcam territórios particulares, a exemplo do território do feirante, mencionado por Deleuze e Guattari (1997a).

Ritornelos profissionais cruzam-se no meio, como o grito dos feirantes, mas cada um marca um território onde não pode se exercer a mesma atividade nem ecoar o mesmo grito. No animal como no homem, são as regras de distância crítica para o exercício da concorrência: meu cantinho na calçada. Em suma, há uma territorialização das funções que é a condição de seu surgimento como "trabalhos" ou "ofícios" (Deleuze & Guattari, 1997a, p. 136).

A partir da compreensão de ritornelo como efeito da repetição, que pode ser perceptível e imperceptível e, posto que "as intensidades se distribuem no espaço ou em outros sistemas que não precisam ser espaços externos" (Deleuze, entrevista com Claire Parnet, 1998), diferentes formas de produção de territórios podem ser imaginadas. A leitura de um livro, a apreciação de uma música, o ato de cozinhar, os modos de trabalhar e de controlar, enfim, qualquer pensamento e ação constante que desencadeie uma combinação de afetos são ritornelos passíveis de despertar emoções que nenhum deslocamento geográfico tenha permitido.

Ao estudar os territórios, busca-se entrar no modo de existência que se apresenta ali, explicitando o conjunto que envolve o trabalho e o sujeito, uma vez que o trabalho pode ser uma via para apropriar-se do espaço e criar territórios (Brulon & Peci, 2013). O objetivo de perceber o trabalho a partir do seu território é ir além do visível, captando os movimentos, ritmos e marcas por meio dos quais os seres viventes se articulam.

Uma vez que pessoas migrantes partem de seus países de origem para outros contextos espaciais, sociais e culturais, depreende-se como relevante o estudo dos ritornelos produzidos nessa condição. A seguir, apresenta-se literatura relativa ao trabalho em condição de imigração.

Imigração e trabalho de chefs de cozinha

Estudos que associam as temáticas de imigração e de trabalho passaram a ganhar espaço em âmbito acadêmico, especialmente nas áreas da Antropologia, Sociologia, Geografia, Administração e Psicologia. Segundo Castles (2010, p. 25), o processo migratório é complexo, posto que "as possíveis combinações se tornam infinitas, o que, por sua vez, aponta o papel crucial do contexto" e da interdisciplinaridade para a sua análise.

Segundo Freitas e Dantas (2011, p. 602), "a experiência de ser estrangeiro varia não apenas de pessoa para pessoa como também em função das condições e das razões que motivaram sua inserção num território". Múltiplos aspectos podem interferir na imigração, como, por exemplo, tempo, espaço, relações entre sujeitos, mercado de trabalho, país de origem e de destino, raça, gênero, sexualidade, classe, entre outros fatores a serem considerados quando se fala em imigração. Segundo May (2016), a imigração gera efeitos distintos sobre as experiências temporais de pertencimento de imigrantes em comparação com não imigrantes. A autora destaca que as formas de pertencimento de imigrantes são atemporais, pois não coadunam com a norma esperada, ou seja, de que pertencer a um lugar seria uma premissa relacionada a ter nascido ou ter vivido por anos naquele lugar. Para Dupuis (2018), é pela via do trabalho que imigrantes conseguem integrar-se ao país de destino.

Com relação ao trabalho, cabe considerar, ainda, segundo Mansano (2009), a reivindicação por um trabalho cada vez mais criativo e imaginativo, produzido sob uma lógica que opera no inconsciente, na sensibilidade, nos corpos e nos afetos dos sujeitos, de modo a colocá-los sempre a dispor do trabalho, mobilizando-os por inteiro. Nessa lógica, relações afetivas e momentos de lazer podem ser, gradativamente, colocados em segundo plano em prol de compromissos organizacionais, ou rentabilizados para o trabalho imaterial, que conta com as experiências de vida.

Nesse contexto, considerou-se adequada a conexão da temática com os conceitos de ritornelo e território (Deleuze & Guattari, 1997a, 1997b; Guattari & Rolnilk, 1996). Tais conceitos contribuem para pensar a imigração e a adaptação como imigrante em uma lógica processual. Considera-se que "subjetividades, independentemente de sua morada, tendem a ser povoadas por afetos . . . uma constante mestiçagem de forças delineia cartografias mutáveis e coloca em xeque seus habituais contornos" (Rolnik, 1997, p. 19).

Pensar a repetição e a composição de territórios na imigração propicia o contato com práticas culturais diversas. A cozinha é um dos elementos mais significativos entre migrantes e, segundo Rekowsky e Dorfman (2013), possui uma perenidade maior do que outras práticas culturais. A vivência de trabalhadores da cozinha imigrantes configura-se, portanto, como um campo interessante para pensar a composição de territórios no trabalho.

Ao trabalhador da cozinha, mais especificamente ao chef de cozinha, é solicitado que saiba como repassar instruções expressivas para seus aprendizes, a fim de cumprir com a finalidade prática de orientar e de transmitir o conhecimento tácito, aquele "tão óbvio e habitual que simplesmente parece natural" (Sennett, 2009, p. 206).

A repetição, característica comum à atividade de chef, quando intensificada, também pode se caracterizar como uma das fontes de sofrimento no ambiente de trabalho. Estudos encontrados em âmbito internacional acerca do trabalho de chef de cozinha (Chuang & Lei, 2011; Harris & Giuffre, 2010; Meloury & Signal, 2014; Pidd et al., 2015) evidenciariam que as exigências exacerbadas aliadas às características físicas dos locais de trabalho (elevado nível de ruído, calor e umidade) e ao ritmo acelerado da profissão ocasionam uma série de consequências aos chefs de cozinha, tais como: acidentes de trabalho recorrentes, conflitos com a família, dores corporais, oscilações de peso corporal, adoção de hábitos alimentares não saudáveis, aumento do consumo de álcool e cigarro, perturbações do sono, estresse e constrangimento com colegas de trabalho. Ademais, segundo Meloury e Signal (2014), chefs de cozinha mulheres sofreriam adicionalmente pela maior discriminação no ambiente de trabalho e na família, em função da dupla jornada de trabalho (como chef de cozinha, no trabalho, e como esposa e mãe, em casa).

 

Procedimentos metodológicos

O presente estudo se caracteriza como de natureza qualitativa. Nas palavras de Minayo, a pesquisa qualitativa propicia o "reconhecimento da subjetividade, do simbólico e da intersubjetividade", e opera "nas relações como parte integrante da realidade social" (2016, p. 18). A seguir, será detalhado o caminho percorrido com relação ao método.

Adotou-se para o presente estudo a produção de narrativas (Jovchelovitch & Bauer, 2008), em especial por se constituírem em "um processo dinâmico de viver e contar histórias, e reviver e recontar histórias, não somente aquelas que os participantes contam, mas aquelas também dos pesquisadores" (Clandinin & Connelly, 2011, p. 18). Trabalhadores e trabalhadoras transmitem, por meio do dizer narrativo, saberes cognitivos, culturais, afetivos e corporais. A adoção de tal delineamento permitiu tomar acontecimentos específicos relativos aos chefs imigrantes.

Participaram do estudo 13 homens e mulheres selecionados pelo critério de trabalharem como chefs de cozinha, serem imigrantes, falarem e compreenderem o português. Com o objetivo de proporcionar maior riqueza de detalhes para a pesquisa, foi estabelecido como critério a estadia por um período mínimo de um ano no Brasil. No momento da pesquisa, todos os participantes residiam e trabalhavam no Rio Grande do Sul.

A seleção desses participantes ocorreu, inicialmente, pela rede de contatos das pesquisadoras, mas contou também com o apoio das próprias pessoas participantes no sentido de indicarem outras. Informou-se, previamente, o caráter voluntário da participação e o compromisso de não divulgação de nomes. Desse modo, foram adotados nomes fictícios escolhidos pelos próprios entrevistados. São nomes usualmente encontrados em seus países de origem, conforme evidencia o Quadro 1, a seguir:

 


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O Quadro 1 permite verificar que os chefs participantes possuem origens distintas, contemplando quatro continentes: África, América, Europa e Ásia. Pelos países de origem, observa-se que contemplam uma diversidade em termos de tradição e conhecimento na cozinha. Dos 13 chefs entrevistados, 10 vieram ao Brasil por motivações relativas a relacionamentos amorosos com pessoas brasileiras. Os outros três: Emília e Seydou vieram para buscar experiência e melhores oportunidades de trabalho em um país diferente do seu de origem; e Nikkei, que trabalhava em um restaurante renomado em Buenos Aires, veio a convite de empresários brasileiros. Ressalta-se que os chefs entrevistados não estiveram em condições de imigrantes em situação de vulnerabilidade.

As narrativas produzidas no âmbito desta pesquisa são compostas por entrevistas narrativas realizadas com os participantes. Chase (2005) caracterizou entrevistas narrativas como fontes de compreensão da vida vivida, ao lado de documentos escritos, imagens e outros tipos de registro. Segundo a autora, nessas entrevistas, o foco não deve recair sobre eventos históricos, contados de acordo com um tempo cronológico, mas sobre pensamentos, emoções e significados.

As entrevistas narrativas ocorreram presencialmente nos locais de trabalho dos participantes ou em local acordado previamente, e tiveram duração aproximada de duas horas. Foram gravadas em gravador digital com consentimento do(a) entrevistado(a). Transcorreram como uma conversa prolongada - longe do bate-pronto, próxima do bate-papo - com temporalidade e localização não linear, a exemplo de entrevistas que foram realizadas dentro de cozinhas, em cafés e bares. Tomou-se o cuidado de garantir aos participantes a "liberdade de dialogar, de forma fluida, narrando a sua história" (Leite, 2016, p. 376) e, ao mesmo tempo, de oportunizar retomar algum aspecto relevante.

Após a transcrição e análise atenta da primeira parte narrada, foram elaboradas questões sobre temas já mencionados, privilegiando pontos citados, mas que não foram suficientemente abordados em um primeiro momento. Após, foram realizadas de duas a três entrevistas com cada chef, dando continuidade aos pontos identificados. Por motivo de indisponibilidade de agenda, Nikkei, Samira e Lorena não concederam a segunda entrevista.

Com relação às análises das narrativas, pretendeu-se engendrar diferentes reflexões, leituras e compreensões relacionadas à vivência da imigração, tendo em vista o referencial teórico adotado. Para a produção do conjunto de narrativas, foram agenciadas particularidades das narrativas de cada participante, reunindo aproximações e distanciamentos entre as experiências, estabelecendo conexões entre passado, presente e futuro.

No que se refere às análises posteriores às entrevistas realizadas, seguiu-se a seguinte sequência: (a) elaborou-se a contextualização individual de cada uma das narrativas escutadas; (b) em seguida, à luz do referencial teórico adotado, analisaram-se as narrativas em conjunto, destacando possíveis pontos de convergências e afastamentos; (c) por fim, visando ao avanço teórico no campo pesquisado, compuseram-se narrativas temáticas.

Para a análise - à luz do referencial teórico - empreenderam-se esforços em estabelecer "jeitos, tramas e redes com vistas a estabelecer modos operatórios que buscam evocar questões, levantar problemas e provocar perguntas", conforme Leite (2016, p. 373). A seguir, encontram-se narrativas temáticas elaboradas a partir das narrativas tecidas pelos chefs. Os fragmentos que as compõem são aqueles que melhor expressam desdobramentos associados à vida dos chefs de cozinha imigrantes.

 

Apresentação e análise dos resultados: ritornelos: ritmos e marcas do trabalho de chefs de cozinha imigrantes

"Sim, chef!", para além de uma resposta positiva a uma pergunta, é uma expressão alusiva à autoridade, à hierarquia. "Sim, chef!" é sinal de que as instruções foram compreendidas e de que a atividade logo será executada. Segundo Artusi, "nos restaurantes mais sérios, durante o serviço, é só o chef que fala". Aos demais, a fala é restrita às afirmativas ou dúvidas sobre os preparos: "'Sim chef!' Não entendi, chef! Podes repetir, chef?" (Artusi). Nas cozinhas, espaços de atividades incessantes, manifestações dessa natureza foram reiteradamente expressas durante as observações realizadas.

Sobrepondo-se aos ruídos mecânicos de máquinas, louças e utensílios, outras melodias fazem parte da trilha sonora da cozinha. Assobios, cantarolados de músicas oriundas dos países de origem dos chefs e batuques foram percebidos, ainda que emitidos predominantemente pelos chefs. Vozes em diferentes idiomas produzem o manto acústico que flutua sobre as cozinhas. São articulações vocais de chefs imigrantes que calculam, planejam, comandam e ensinam; vozes que narram histórias e semeiam sabedorias da sua terra, que recordam o esquecido, que esquecem o sabido, que gritam, que riem, que dialogam, que cantam.

O trabalho de chef em muito se aproxima ao de um músico ao compor suas melodias. Chefs, assim como os músicos, captam as vibrações, imprimem suas referências, organizam o arranjo, conduzem a cadência, improvisam pausas, experimentam o desconhecido, enfrentam acidentes, atentam para o que ressoa e perseguem a harmonia, mesmo que, na cozinha, por vezes, a harmonia ceda lugar à cacofonia. Para tanto, esses dois trabalhos demandam prática intensa e um produzir-se contínuo, mobilizador da inventividade, do conhecimento, da cooperação e da comunicação.

Para um processo exitoso, "é preciso marchar a cozinha" - expressão comumente utilizada no meio. Avizinha-se, assim, uma proximidade entre o campo da música e o da gastronomia, algo que também se constata nas narrativas dos participantes, em especial na propriedade com que usam termos do universo musical - "composição", "marcha", "ritmo", "marca", entre outros.

Nessa composição de afazeres, observam-se ritornelos que "cruzam-se no meio, como o grito dos feirantes, e cada um marca um território onde não pode se exercer a mesma atividade nem ecoar o mesmo grito" (Deleuze & Guattari, 1997a, p. 136). Os ritornelos dizem das regularidades, dos hábitos e de tudo aquilo que se torna expressivo e marca o território.

Tomando-se emprestados termos próprios do universo musical, a seguir são apresentados ritornelos característicos do trabalho de chefs de cozinha imigrantes. São eles: arranjo, cadência, acidentes e pausas, ritornelos que ditam os ritmos e marcam os corpos e a gastronomia produzida.

Arranjo

O arranjo da equipe diz respeito ao selecionar, organizar, ensinar e preservar os trabalhadores, responsabilidades que demandam experiência e estratégia por parte dos chefs de cozinha. Nesse contexto, por serem imigrantes, os chefs revelam estriamentos culturais adicionais, em especial os que dizem respeito aos relacionamentos com os nativos.

No processo dinâmico que acontece nas cozinhas, há um modus-operandi usual, que atribui aos novatos atividades relacionadas à higienização do local, das ferramentas e das louças. Encontrar trabalhadores para ocupar tais posições é um obstáculo, conta Nicolás. Chef afirmou:

Nós, brasileiros e argentinos, vamos para a Austrália, EUA, Espanha, limpamos banheiros podres, faríamos de tudo! E aqui não trabalham em uma cozinha como essa . . . um dia veio um cara e ficou uma semana. Ele disse: "isso [de limpar] não é pra mim".

Artusi diz perceber certa resistência por parte de estudantes e recém-formados em cursos de gastronomia para realizar tarefas de limpeza, prática comum em outros países, conforme relata.

Um cozinheiro vem de escola e tu pedes para limpar, não vai ficar feliz. Mas faz parte. Trabalhei em um restaurante chileno em que eu passava a maior parte do tempo limpando. Limpava a coifa todos os dias, o forno duas vezes por dia (Artusi).

A propensão por contratar trabalhadores que não possuam experiências prévias em outras cozinhas foi mencionada. Para Franchesco, ninguém melhor do que um legítimo italiano para ensinar aos demais o preparo das receitas da sua terra. Para que esse aprendizado seja mais efetivo, o chef prefere contratar trabalhadores principiantes, algo que pode sugerir um modo encontrado por ele para constituir seu território no ambiente de trabalho. Nesse sentido, ele produz o arranjo minimizando a interferência de referências pregressas por parte da equipe. Segundo Lorena, chefs acabam sendo professores(as) das suas equipes: "Para ter uma basezinha, né? Mas temos que formar, não adianta. Eu encaro a questão de ser professora como uma missão do cargo de chef. Temos que ensinar sempre. Os cursos ainda têm muita lacuna na formação" (Lorena).

Na França, de acordo com Michel, cursistas são motivados pelos professores a estagiarem em restaurantes, inclusive de modo voluntário.

Se tu queres trabalhar nos melhores restaurantes, tu vais trabalhar quase de graça. Só pelo fato de saber que vai conseguir sugar tudo que o chef tem de conhecimento. Tu tens que aproveitar tudo que ele pode te ensinar, então eu fazia meu trabalho mais rápido para conseguir aprender. E não olhando no relógio. Não! Os chefs não têm relógio no braço, o relógio é só pra ver o tempo de assar uma carne (Michel).

O relógio de pulso, objeto que Michel considera dispensável para observar o horário de saída, associando-o tão somente à rentabilização do trabalho, refere-se a um dispositivo que submete os corpos à extensão das jornadas, mantendo-os mais produtivos e engendrando-os à rotina exigente das cozinhas profissionais (Chuang & Lei, 2011; Harris & Giuffre, 2010; Meloury & Signal, 2014; Pidd et al., 2015). Vê-se, assim, que o ritornelo arranjo da equipe ganha função territorial, reverberando modos de trabalhar internacionais no contexto de imigração. O ritornelo arranjo, assim como os demais, está em relação essencial com algo que diz respeito a uma tradição, "a um natal, a um nativo" (Deleuze & Guattari, 1997a, p. 124).

O compartilhamento de referências da terra natal se estende pelo expediente. No momento de instruir a equipe, chefs instruem a equipe para as produções gastronômicas vindouras com saberes territoriais singulares, carregados por eles além-fronteiras. A noção de território, desse modo, é tomada como território existencial e não mais um território físico delimitado (Haesbaert & Bruce, 2009), uma vez que o território é movimentado em harmonia com os deslocamentos da pessoa migrante.

Ademais, os chefs exigem do grupo a observação atenta às orientações relativas aos preparos, seguida pela repetição incansável dessas instruções. "Tive que ensinar toda a cozinha árabe para a equipe. Não foi fácil, pois a comida árabe é muito artesanal, é muito manual, sabe? Tem que respeitar o tempo da massa, tem que ensinar todos os processos", relata Samira. "Tem pessoas que chegam muito cruas das escolas, uma coisa é cozinhar, outra é saber os pontos, as técnicas, falta muita bagagem", diz Seydou. Conforme Guattari e Rolnik (1996), territórios são sinônimos de apropriação e também dizem das relações que se formam a partir do compartilhamento dessas apropriações. Perceber a absorção dos ensinamentos pelo grupo de trabalho é motivo de orgulho para os chefs, algo que confere à constituição do território um caráter existencial (Oliveira & Fonseca, 2006), pela via da cultura compartilhada.

Além da habilidade mobilizada para selecionar, formar e instruir a equipe, é preciso empreender esforços para a retenção dos trabalhadores, de modo a minimizar a rotatividade. Emília, por reconhecer maior mobilidade entre seus compatriotas peruanos, acaba formando equipes majoritariamente compostas por trabalhadores locais. "Aqui já passou muito peruano, e não ficam. Vão embora", relata ela, embora com certo pesar. A chef considera que a possibilidade de trabalhar com peruanos seria favorável, uma vez que possuem referências gastronômicas próximas às suas. Essa opinião é compartilhada por Samira: "os árabes sabem e entendem o processo, daí não preciso ficar com aquela preocupação de sair alguma coisa errada, porque tá no sangue deles né?".

O saber/fazer artesanal, mencionado por Samira, remete a uma prática particular do seu país de origem. Tal prática é especializada e elaborada com as mãos, e faz parte de um conhecimento que não está nos livros de receitas. Deixar de preservar tal saber na gastronomia e de transmiti-lo à equipe tal qual é realizado na Palestina soa como perda do território para Samira. O desrespeito à cultura do seu país é tomado pela chef como um desrespeito a si. "Tem uns truques que têm que ser feitos, porque se vai seguir as receitas à risca, não dá. Tem um processo que tem que respeitar, não adianta", considera a chef.

Nesse sentido, percebe-se que territórios existenciais e espaciais podem coincidir para imigrantes, de modo que compartilhar a mesma origem pode ser fator que os aproxima em termos de trabalho. Essa situação também os motiva para a formação do que Castles (2010) chamou de comunidades ou redes de cooperação em condição de imigração.

Segundo Nikkei, é um desafio legitimar seus ensinamentos, mesmo tendo amplo conhecimento na área.

Cozinhar termina sendo a parte mais fácil de toda a história. Tudo que ensino na cozinha é baseado em critérios. Não é só "coloca o copo ali, coloca o prato ali, só porque eu sou o chef". Não. Tudo tem critério. E, na medida em que teus funcionários acreditam e replicam os teus critérios, toda a equipe e o trabalho tem mais chance de dar certo (Nikkei).

"Na cozinha temos que manter certo rigor e muitas pessoas não aguentam. Não se dá facada, mas na cozinha não se distribui flores, o ritmo é pesado", relata Seydou.

O ritornelo arranjo diz respeito ao modo como chefs imigrantes formam suas equipes para as produções gastronômicas. Em geral, esse momento ocorre antes da abertura dos restaurantes ou da execução dos eventos, uma vez que é mínimo o tempo de que a equipe dispõe para interromper suas atividades após o início. Os pedidos são lançados e, de modo quase imediato, é preciso "marchar a comanda" - comando tradicional utilizado pelos chefs para indicar que o pedido deve ser preparado.

Embora alguns dos chefs participantes atuem em padarias e pequenos restaurantes, nesses espaços também há um ritmo de trabalho a ser seguido, ritmo esse que é ditado pela velocidade e aceleração características do capital. Esse movimento pode ser observado no ritornelo cadência, apresentado a seguir.

Cadência

O ritornelo cadência diz respeito ao modo como chefs promovem o encadeamento ritmado das atividades, garantindo a entrega dos pratos no tempo estimado. Cadenciar o ritmo de trabalho demanda dos chefs imigrantes adequação a uma rotina e a um ritmo predefinidos no país de destino, mas também permite que desafiem a organização encontrada. Ao desafiarem os ritmos condizentes à uma organização padronizada, chefs de cozinha imigrantes imprimem na cozinha do país de destino cadências particulares, alinhadas ao seu próprio território.

A popular expressão "colocar a mão na massa", comumente utilizada para designar a prática de trabalho, associa-se, de modo literal, ao trabalho de chefs de cozinha. Cozinhar é apenas uma das tarefas desempenhadas. Para Andrea, "o ritmo é pesado na cozinha", e a profissão demanda esforço físico e mental. "São horas de trabalho em pé, em cozinhas quentes. Também temos que transportar utensílios pesados", considera a chef.

A cadência envolve o encadeamento acelerado das atividades. "Tens que ter tudo separado, tudo pesado, tudo picado" (Emília), para "soltar a comida na hora certa, não pode atrasar. Você tem que cuidar de tudo que está a sua volta" (Seydou). Essa sucessão de tarefas ocorre em meio ao caos organizado das cozinhas, com "forno ligado, lava-louças funcionando, oito fogões ligados, caras grandes cozinhando, garçons circulando, janelas fechadas, sem ar-condicionado" (Andrea). Esse cenário também possibilita aos chefs momentos singulares, expressados nas orientações minuciosas e no esmero para o preparo de pratos típicos da origem.

Entende-se que o esforço em articular o que é organizável e formalizável com o que é potência, próprio do domínio dos desejos (Deleuze & Guattari, 1996), cadencia o trabalho de chefs imigrantes. Percebe-se que a possibilidade de compartilharem uma coleção de histórias sobre o seu povo e sobre a origem de determinadas receitas peculiares de seus países, e de serem reconhecidos por isso, é algo que territorializa, diferencia e ameniza a rotina acelerada e intensa de trabalho.

Encontrar e manter um ritmo para o trabalho da equipe exige prática e repetição, sendo que essa repetição não está ligada à reprodução do mesmo e do semelhante, mas à produção da singularidade e do diferente, conforme compreensão de Deleuze (2006). A técnica artesanal de produzir a massa, relatada por Franchesco, e a forma correta de manusear determinados utensílios, mencionada por Kaori, são também elementos que dizem respeito aos ritornelos por eles produzidos.

Os equipamentos e ferramentas da cozinha japonesa também são diferentes, então para eles foi bem complicado. As pessoas saíam e entravam, agora que acalmou um pouco. Agora que a cozinheira entendeu mais, eu consigo sair mais da cozinha. Mas dá muito problema, tenho que ensinar tudo de novo e não é fácil. Não é feijão, não é bife também (Kaori).

Com a prática se faz qualquer coisa. Precisa de muita boa vontade, não é impossível. Seria arrogante eu dizer que alguém não conseguiria fazer igual a mim. O que posso te dizer é que a massa, até que alguém consiga fazer igual eu faço, vai demorar bastante. Eu demorei anos para conseguir fazer a massa, com a experiência toda que tive na Itália. Aqui tive que ficar testando por uns seis meses com os insumos daqui para chegar no ponto da massa que eu queria (Franchesco).

Demorar anos para conseguir executar uma receita, conforme menciona Franchesco, indica o gerenciamento das instruções e a mobilização de lembranças e gestos que se inscreveram no corpo do chef, fazendo-o atingir o ponto certo da massa. Conforme lembra Sennett (2009, p. 181), a repetição permite o aperfeiçoamento das técnicas, de modo que os "movimentos, adquiridos com dificuldade, ficam cada vez mais impregnados no corpo".

Depreende-se que o trabalho de chef de cozinha em contexto de imigração pode implicar a perda de território parcial dos movimentos até então apreendidos em outro espaço geográfico, e a retomada do território a partir da prática e apreensão dos movimentos corretos para a produção das receitas com insumos disponíveis no país de destino. Retomar o território não significa, entretanto, retornar ao antigo, mas sim (re)inventar-se como imigrante.

Ritornelos gastronômicos relativos aos sons vocais (ao ensinar o preparo e cantarolar músicas latinas) se misturam e se confundem com sons materiais, seja da faca da chef cortando o frango, do chiado da chapa que selava as carnes, do borbulhar do óleo que fritava a batata ou dos estalos da louça ao ser lavada. A fala de Martim, a seguir, descortina a multiplicidade de elementos sensoriais envoltos no fazer gastronômico. Os sons, em concordância com aromas e texturas, podem anunciar a qualidade de uma receita antes mesmo de passar pelo paladar:

Por exemplo, se estás em um restaurante que tem por hábito do garçom fatiar o pão para entregar à mesa, tu vais escutar a crosta do pão. Então, antes mesmo de olhar o pão, tu já escutaste o "crac crac". Então pensas "bah, este pão é bom!". Todos os sentidos se ativam com a comida. A apresentação não pode ser só pela visão. É o som, o cheiro, é o tipo do prato que tu escolhes (Martim).

A diversidade de sons emitidos contrasta com a necessidade de silêncio e concentração para a organização do processo. Impressões acústicas das percussivas investidas das facas nos alimentos e nas tábuas fazem parte das memórias de Artusi, remetendo à repetição e à seriedade das cozinhas profissionais. "Em dois dias de estágio, lembro que cozinheiros japoneses ficavam lá 'ta ta ta ta ta' e eu comentava baixinho 'não estão na igreja, estão em horário de trabalho'", conta o chef. O intelecto se comunica com as mãos, e as mãos se comunicam com as facas, de forma que estas se transformam em extensões das mãos. Esse conjunto se torna referência da retomada de território por meio da relação mão-ferramenta (Deleuze & Guattari, 1997b).

Elementos se tornam expressivos na composição dos ritmos de trabalho. Têm-se a padronização, a simetria e a uniformidade. Concomitantemente, coexistem sutilezas, originalidade e singularidade. "Quando comecei a ensinar o padrão do meu outro restaurante, demorei uns seis meses pra me liberar e confiar nos cozinheiros para manterem esse padrão", conta Samira. De modo semelhante, Franchesco considera relevante a padronização dos preparos. "Eu não posso fazer um prato hoje, e tu vens amanhã, pede o mesmo e não é o mesmo sabor. Por isso na cozinha tem medidores. É fundamental" (Franchesco).

Na cadência do trabalho, o uso da força para cortar alimentos mobiliza conhecimento sobre o peso do cutelo, quer sobre a sutileza para cortar alimentos macios "como se estivesse tocando pianíssimo", quer sobre a precisão para cortar alimentos crus e resistentes "para criar um forte culinário". "A própria preocupação do chef em não danificar os materiais o treinou para isto", diz Sennett (2009, p. 188).

Para Deleuze e Guattari (1997b), a tecnologia considera equivocadamente as ferramentas nelas mesmas. As ferramentas só existem agenciadas, em conjunto com outros elementos que as tornam possíveis, entendem os autores. Segundo os autores, "a ferramenta está ligada essencialmente a uma gênese, a um deslocamento e a um dispêndio da força, que encontram suas leis no trabalho" (Deleuze & Guattari, 1997b, p. 82).

Acidentes

Acidentes marcam o corpo e evocam a memória dos chefs. Segundo Seydou, "na cozinha, é stress. Você vive sob pressão. Tem que soltar a comida na hora certa, não pode atrasar. Além do barulho de exaustor e das ferramentas", pontua, citando características do ambiente. As altas temperaturas, o som excessivo e repetitivo, as lâminas afiadas das facas, os objetos pontiagudos, o peso dos utensílios e os ingredientes e produtos corrosivos são elementos lesivos que fazem parte do dia a dia nas cozinhas.

Os ritornelos presentes nas cozinhas de chefs imigrantes, embora apresentem variação rítmica entre um e outro espaço, afirmam modos de vida árduos (Chuang & Lei, 2011; Harris & Giuffre, 2010; Pidd et al., 2015). A intensificação do trabalho que se impõe no contexto atual, conforme Mansano (2009), está presente nas cozinhas, que requerem adequação à tradição do trabalho exaustivo e a um ambiente contrário à glamourização e ao romantismo por vezes associado às cozinhas. Envolve, também, elementos de um jogo de forças - insalubridade e periculosidade. A fala de Martim esclarece esse aspecto: "Tu trabalhas com tempo, com temperatura e com ferramentas perigosas. Então é normal tu saíres marcado da experiência. Daqui uns anos tu estás quebrado, estás com hérnia de discos, com dedo deslocado, quebrou ou cortou a mão" (Martim).

Um trabalho que exige esforço manual para cozinhar e limpar implica adquirir calos, como diz Sennett (2009), e também lesões, marcas, queimaduras e ferimentos, como narram os chefs. "Me cortei 'n' vezes, chegava machucado em casa. Se olhares meu braço, está todo marcado. Se olhares as minhas mãos, estão picotadas. Tu trabalhas com o tempo, com temperatura e com ferramentas perigosas. É normal saíres marcado da experiência" (Martim).

Com a entrega dos últimos pedidos, a cozinha, repleta de louças e utensílios sujos utilizados durante o trabalho, precisa ser limpa e higienizada para a próxima jornada. É óbvio que o ambiente é mantido limpo durante a jornada, mas ao final é realizada a limpeza "de cima a baixo", o que inclui a higienização do chão, das paredes, das portas, das janelas, das bancadas, das coifas, dos exaustores, das pias, das máquinas e das louças.

O rigor do ofício requer o vigor dos chefs de cozinha imigrantes. "Tem que ter resistência física. Eu por ter sido atleta consigo aguentar. E resistência vem do treinamento, aguentar 20 horas por dia. Às vezes dizem, dói aqui, dói ali", conta Lorena. Outro elemento, ainda, se refere ao modo de enfrentar os sentimentos de solidão e isolamento, característicos em estudos sobre a adaptação de imigrantes (Freitas & Dantas, 2011). Nesse sentido, a contribuição de Emília orienta a "ocupar a cabeça" trabalhando em dupla jornada de trabalho.

A produção de territórios na imigração perpassa o que os sujeitos trazem consigo e também o que encontram no país de destino. No relato de Andrea, a seguir, percebe-se a naturalização do trabalho pesado e dos acidentes e consequências à saúde física em tom de diversão:

Entras em uma cozinha, tem um fogão do lado, forno funcionando, quatro ou cinco pessoas circulando. Eu estava um dia trabalhando e tinha uma cozinheira bem forte, trabalhando, lavando louça. Eu suava de tal maneira que estava o forno ligado, o lava-louças ligado, oito fogões ligados, quatro caras grandes cozinhando, os garçons circulando, as janelas fechadas, sem ar-condicionado, verão. Teve um momento que achei que tinham jogado um balde de água nas minhas costas. Pensei: "bah, vou ter um treco" (Andrea).

Na fala da chef, a apropriação da expressão regional "bah" aponta uma exaltação da ideia, a surpresa por um acontecimento em uma situação desconfortável até então não vivenciada em sua trajetória. A expressão "bah", como sonoridade local apreendida pela chef no contexto da imigração, foi reiteradamente expressada em diferentes momentos da sua e de outras narrativas para exprimir sentimentos de surpresa, admiração e espanto diante de determinadas situações. Para Rolnik (1997, p. 19), "subjetividades, independentemente de sua morada, tendem a ser povoadas por afetos . . . uma constante mestiçagem de forças delineia cartografias mutáveis e coloca em xeque seus habituais contornos". A adoção de uma gíria local para o próprio vocabulário vislumbra, também, como um modo de entrar em relação afetiva com a cultura do país de destino.

Costumes do país de destino são incorporados na imigração e empregados durante o trabalho e também na experiência que alcança a vida após o expediente, conforme se vê a seguir.

Pausas

Pausas são ritornelos que se caracterizam nos relatos dos chefs a partir de vivências realizadas fora do horário e do ambiente laboral. Constatou-se que chefs estão sempre "plugados", mesmo quando não estão envolvidos em trabalhos considerados fixos. Eles carregam o trabalho consigo por onde quer que transitem, conforme apontou Mansano (2009) sobre as características que compõem o trabalho imaterial. Se o tempo para o trabalho não conhece mais limitações, os espaços de trabalho se diluem da mesma forma. Esse aspecto é marcado por Franchesco, que declara sem rodeios: "tudo que eu faço é relacionado ao trabalho. Por exemplo, gosto muito de informática e desenvolvi um sistema. Quando os pedidos saem no caixa, são falados em uma caixa de som lá na cozinha".

Ser chef, para Andrea, é "um trabalho territorial" e a constituição desse território estende-se para seus momentos de lazer e descanso. "Nas aulas de dança, converso com minhas colegas sobre gastronomia. Pergunto o que elas gostam, o que preferem beber e comer etc.". O trabalho de chef que invade a vida pessoal também foi percebido no relato de Giovani: "O meu horário de diversão é quando vou nas feiras e experimento produtos diferentes para novas receitas". Conforme apontaram May (2016) e Dupuis (2018), os imigrantes investem seus tempos de adaptação no país de destino em prol do trabalho.

As pausas, que são por eles consideradas como momentos destinados ao lazer, são, de fato, utilizadas em busca de uma territorialização no país de destino. Nesse sentido, trata-se de um período que eles investem, sobretudo, para se distinguir perante os demais, em direção à produção de territórios singulares na profissão. Não ter acesso à cultura do país de destino pode minguar o próprio fazer criativo investido nas pausas e direcionado ao trabalho.

Se, por um lado, as pausas possibilitam momentos de comunicação e diversão, ao mesmo tempo são atravessadas e restritas pela intensificação das jornadas de trabalho. Em geral, chefs acordam cedo e dormem tarde. Trabalham durante madrugadas, tanto para encerrar o serviço do jantar como para começar os preparos da manhã seguinte. Nesse sentido, Michel e Andrea teceram comentários sobre as jornadas de trabalho: "A vida de um padeiro é mais complicada, pois eu preparo todas as massas. Chego aqui entre três e quatro da manhã e saio às nove da noite, todos os dias" (Michel). Andrea conta sobre a sua rotina de eventos:

Quando trabalhei em restaurante, começava cedo e entrava em casa depois da meia noite. É muito complicado. Sobretudo quando tu mudou toda a tua vida para morar em outro país, em outro continente, tu casou, mas não vai conviver com a pessoa porque os horários são incompatíveis (Andrea).

A partir de diferentes relatos, depreende-se que o consumo contínuo de cigarros, bebidas alcoólicas e drogas ilícitas é percebido pelos chefs como hábito entre trabalhadores da área. Tal prática investida nos momentos de pausa, segundo eles, é estimulada pelas condições exaustivas características do trabalho que realizam. "Na nossa área, vemos muitas pessoas dependentes de drogas. Quem trabalha na área da gastronomia, seja cozinheiro, chef ou auxiliar, o consumo de álcool e drogas ilícitas é muito alto", diz Seydou, que tem opinião semelhante à de Emília. "A cozinha é um ambiente muito pesado e viciante, todo mundo tem muito estresse, por isso sempre estão buscando a bebida e o cigarro como modos de fuga" (Emília).

Durante as pausas, Emília conta que se refugia no próprio lar. Segundo Guattari e Rolnik (1996, p. 323), "o território pode ser relativo, tanto a um espaço vivido quanto a um sistema percebido no seio do qual um sujeito se sente em casa". Assim, depreende-se que a produção de um território para Emília se dá na ordem íntima, no aconchego da sua casa, na leitura de um livro, na produção das próprias refeições com os ingredientes que mais aprecia. "Termino o dia muito cansada, e aproveito meu espaço individual, particular. Fico em casa escutando música e lendo algo, e sou feliz assim" (Emília).

No caso de Kaori, a jornada de trabalho se estende do restaurante para o ambiente doméstico, onde ela é a principal responsável pelos afazeres associados à limpeza, alimentação e cuidados da família. Exerce, assim, uma dupla jornada, identificada por Meloury e Signal (2014) como adversidade adicional às chefs, o que decorre dos papéis sociais comumente associados às mulheres. Para além desse relato, percebeu-se que as chefs mulheres vivenciam a imigração pautadas na cultura de origem, que estabelece determinados modos de ser mulher.

Das falas dos participantes, depreende-se que as pausas, por eles compreendidas como momentos de descanso, são investidas em prol da territorialização como chefs de cozinha em contexto de imigração. Se o trabalho requer a vida, a divisão entre tempo de trabalho e de não trabalho mostra-se na ordem do não possível, ainda mais para sujeitos na condição de imigrantes, com tanto a desvendar e descobrir.

Tal cenário condiz com a compreensão das pausas musicais, que são, tão somente, um momento para respirar, sendo que a música segue o fluxo sem que se possa compreender a pausa como uma interrupção da canção. De inusitadas a embaraçosas, essas situações vivenciadas pelos chefs acabam se tornando obstáculos no cotidiano.

No que se refere à adaptação como imigrantes, a rotina dos chefs de cozinha mostra-se influenciada pelo contexto social do país de destino, sendo a língua portuguesa o maior obstáculo mencionado, o que também foi identificado no estudo de Freitas e Dantas (2011). Estranhar a língua e, posteriormente, familiarizar-se com ela, faz parte do processo pelo qual passam os chefs na territorialização no país de destino. No que tange às pausas de fato, essas refletem uma tentativa de comunhão com os nativos, o que se mostrou produtivo aos chefs de cozinha imigrantes.

 

Considerações Finais

Os ritornelos indicam como é ritmada e marcada a rotina de chefs de cozinha imigrantes. Para darem conta das demandas próprias da ocupação, depreende-se que sejam capazes de discernir as diversas situações que se apresentam no cotidiano do trabalho e para além dele. Considera-se que a condição de imigração influencia a maneira como vivenciam o trabalho, o que, por sua vez, molda a forma como vivenciam a imigração.

A narrativa reflete como chefs imigrantes arranjam e fazem a gestão de equipes compostas por trabalhadores com códigos culturais distintos dos seus. Além disso, referenciam como os chefs cadenciam o trabalho dessa equipe, como são marcados por acidentes característicos da cozinha e como investem as pausas na rentabilização de si e do trabalho, na busca por qualificação e formação e por conhecimento da cultura local a partir da criação de laços com os nativos. Esses ritornelos ganham função afetiva, social e profissional e, ao se tornarem expressivos, dão visibilidade aos territórios (Deleuze & Guattari, 1997a).

Os sons, os aromas e as ações desdobram-se em ritmos peculiares às cozinhas. A batida que ressoa, provoca, desafia e impele à criação. Ao final, de modo metafórico, chefiar uma cozinha é similar a compor uma música, com as potências e adversidades que lhe são características, com os estriamentos e alisamentos que são peculiares ao próprio processo. Ao mesmo tempo, também implica aos sujeitos uma força-invenção que nutre a produção de capital, mobilizando potência psíquica e física para a atualização desse poder por meio das criações e adaptações e também dos corpos disponíveis para uma configuração de trabalho potencialmente adoecedora.

Os ritornelos identificados explicitam a harmonia e a cacofonia presentes na cozinha. Ora, "se a música é a aventura do ritornelo", e o arranca da sua territorialidade, conforme expressam Deleuze e Guattari, (1997b, p. 108), a gastronomia faz dele um elemento territorializante. É pela via do trabalho e da diferença percebida em cada repetição que chefs imigrantes encontram e produzem um território relativamente seguro para ancoragem e expressão de si. Ao marcarem territórios, os ritornelos permitem ver movimentos de produção territorial de chefs de cozinha imigrantes. Ressalta-se, portanto, a experiência de tempo-espaço vivenciada por chefs de cozinha imigrantes a influenciar a produção dos seus territórios.

 

Agradecimentos

À Capes e ao CNPq, pelos financiamentos concedidos.

 

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Endereço para correspondência
Vanessa Amaral Prestes
vanessa.amaral.prestes@gmail.com

Recebido em: 11/09/2020
Revisado em: 26/08/2021
Aprovado em: 06/09/2021

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