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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

versão impressa ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.4 no.2 São Paulo dez. 2002

 

ARTIGOS

 

Avaliando sessões de Terapia Comportamental: um questionário pós-sessão é instrumento suficiente?

 

Evaluating behavior therapy sessions: a post session questionnaire is an adequate tool?

 

 

Alice Maria de Carvalho Delitti1

Laboratório de Psicologia Experimental - PUCSP

 

 


RESUMO

Uma dificuldade encontrada na aplicação dos princípios de análise do comportamento à prática clínica é a avaliação dos resultados. Os efeitos da terapia são usualmente avaliados comparando o repertório do indivíduo no inicio e ao final do processo terapêutico. Entretanto, algumas sessões especificas de terapia são identificadas pelo terapeuta e/ou pelo cliente como tendo uma maior relevância ou como sendo responsáveis por mudanças comportamentais. Este artigo descreve o uso de um instrumento citado na literatura, o Questionário de Avaliação de Sessões, proposto por Stiles em 1980. O questionário foi aplicado a 10 terapeutas e 60 clientes após sessões de terapia sorteadas como amostra. Os resultados indicam consistência entre as respostas dos mesmos, o que parece indicar que, com este instrumento, terapeutas e clientes identificam os mesmos aspectos da sessão como mais significativos. Entretanto, questiona-se a validade do uso deste tipo de questionário, já que o mesmo não fornece descrição de comportamento e/ou das contingências de controle dos mesmos.

Palavras-chave: Terapia comportamental, Sessão, Avaliação.


ABSTRACT

Therapy outcomes are often evaluated by comparing the client‘s repertoire at the beginning and at the end of the therapeutic procedure. Nevertheless, therapists and clients when evaluating therapy, frequently identify specific sessions either as particularly relevant or as the cause of behavioral changes. The aim of this article is to analyse therapy sessions as a means to develop assessment strategies of the clinical setting. The Session Evaluation Questionnaire (Stiles, 1980) was answered by 10 therapists and 60 clients after chosen sample sessions. Results indicate consistency between their evaluations, which means that both of them considered as significant the same aspects of therapeutic sessions. Therefore, the utility of this kind of instrument is argued, because it does not describe behavior and the present contingencies.

Keywords: Behavior therapy, Session, Evaluation.


 

 

Os princípios da Análise do Comportamento vêm sendo aplicados à situação clínica com indivíduos institucionalizados ou em consultórios. Pesquisas vêm sendo realizadas com o objetivo de isolar as variáveis que existem no processo terapêutico. As limitações decorrentes do uso do relato verbal como fonte principal de dados, a avaliação dos resultados, e a importância do controle recíproco dos comportamentos verbais que se estabelecem entre a dupla terapeuta – cliente são alguns dos temas estudados.

Ferster (1979), em um artigo clássico, afirma que “os especialistas em clinica parecem se comunicar com sucesso entre si e freqüentemente considera-se que algo importante está sendo comunicado quando um clínico está falando. Mas freqüentemente é difícil conhecer em detalhes que parte da terapia causa benefício ao cliente. Como é difícil descrever o que está acontecendo, a comunicação efetiva perece ocorrer entre pessoas que já sabem muito do que está sendo dito” (p.283). Para este autor, como a Análise do Comportamento é uma ciência natural, é importante que se desenvolva uma linguagem que permita observar e descrever os eventos comportamentais na situação em que ocorrem e analisar as mudanças ambientais que esses eventos produzem no indivíduo, no ambiente, e em outras pessoas.

Uma questão freqüentemente levantada por terapeutas e pesquisadores refere-se à avaliação do processo terapêutico em geral, e principalmente de sessões específicas que podem interessar ao terapeuta.

Segundo Barker, Pistrang e Elliott (1994), sempre que possível, devem-se utilizar múltiplos métodos para mensurar as variáveis, métodos estatísticos e dados qualitativos. Estes autores afirmam que, na pesquisa sobre resultados da terapia, é importante utilizar medidas de auto-relato e de observação, e também avaliar a mudança da perspectiva do cliente, do terapeuta e de outros significativos – o que os mesmos chamam de triangulação. Esta postura vem sendo adotada por inúmeros pesquisadores interessados em clinica, que consideram os métodos qualitativos adequados a seus objetivos.

Na realidade, a preocupação sobre avaliação de procedimentos terapêuticos sempre existiu, e vários clínicos desenvolveram instrumentos para avaliação de determinadas variáveis ou de repertórios específicos que se alteram durante a terapia.

Stiles (1996), propõe abordagens empíricas para avaliação de terapia e afirma que a pesquisa sobre resultados de terapia requer múltiplas medidas e métodos variados. Este autor relaciona os resultados a variáveis como aliança terapêutica e habilidades do terapeuta, e enfatiza a importância de dados empíricos que apóiem os procedimentos utilizados.

Há vários anos têm sido realizadas pesquisas que avaliam os resultados de terapia. Eysenck (1952) fez um dos primeiros estudos de análise dos efeitos da terapia. Em seu trabalho, enfatizou a necessidade de estabelecer uma linha de base e a utilização de uma unidade de medida comum e objetiva. Em outro trabalho, este mesmo autor (Eysenck, 1966), apresentou um resumo do uso bem sucedido da terapia comportamental aplicada a diversos problemas, como ansiedade e fobias. Garfield (1981) reconhece a importância do trabalho de Eysenck (1952), mas questiona alguns aspectos do mesmo para a avaliação da terapia. Os instrumentos de medida e a dificuldade de explicitar o grau de mudança obtida são analisados já que naquele trabalho foram utilizados critérios como grau de ajustamento profissional e de relacionamento social dos indivíduos. Ainda, segundo Garfield (1981), estes critérios não são suficientemente objetivos.

Wolpe (1973) desenvolveu um inventário de medos, no qual uma série de eventos ou situações são avaliadas por uma escala que deve ser aplicada no início e no final do procedimento de dessensibilização sistemática. Lazarus (1977), elaborou um questionário de história vital que, sendo aplicado no início da terapia, fornece dados acerca da história de vida dos clientes. Medidas padronizadas, como o inventário de Depressão de Beck, Ward, Mendelson, Mock, e Erbaugh (1961), são aplicadas a um cliente ??ldeprimido no início e ao final de um procedimento, avaliando, assim, o efeito das variáveis introduzidas. Rathus (1973), propôs um questionário de avaliação de comportamentos assertivos, que é respondido pelo cliente no início do treino assertivo, e Stuart & Stuart (1972) desenvolveram um inventário de avaliação para terapia conjugal que o casal deve preencher no início da terapia. Mintz e Kiesler (1982) analisaram o efeito de uma terapia comparando o comportamento do indivíduo no início e no final da mesma e utilizaram, para seu estudo, uma escala que media a obtenção de objetivos terapêuticos.

A literatura mostra, portanto, que há vários procedimentos de medida dos efeitos do processo terapêutico. Hayes, Nelson e Jarrett (1987) estudaram a qualidade da avaliação inicial, e Addis e Jacobson (1996), relatam os resultados da terapia de depressão, traçando relações entre as causas que os indivíduos atribuem à depressão e o resultado da terapia. Seus instrumentos de medida são o Inventário de Depressão de Beck (Beck e cols. 1961), a Escala Hamilton de Depressão (Hamilton, 1960) e o Questionário de Razões para Depressão (Addis, Truax e Jacobson, 1995). Estes autores afirmam que seus dados indicam a necessidade da utilização de múltiplas medidas para avaliação dos resultados. Terapeutas comportamentais, (Kerbauy, 1980; Banaco, 1993; Margotto, 1998; Kerbauy, 1999, Banaco, 1999) também se referem ao impacto das sessões de terapia sobre o terapeuta e o cliente. Estes pesquisadores estudam o comportamento verbal que cliente e terapeuta emitem durante a sessão e investigam quais as variáveis envolvidas. Também é comum o cliente relatar que certa sessão foi fundamental para seu processo terapêutico (por exemplo, “ –nunca me esqueci do dia que você me falou...” ou “ – na segunda vez que eu estive aqui, aconteceu uma coisa que foi muito importante...”). Entretanto, estudos que avaliem ou analisem o impacto de uma determinada sessão de terapia são mais escassos na literatura.

Terapeutas e investigadores em clínica afirmam que cada sessão ou uma determinada sessão podem ter um efeito específico, um impacto maior ou menor sobre determinados padrões comportamentais e estados internos decorrentes do cliente. A este respeito, questões são colocadas por clínicos e pesquisadores da abordagem comportamental: a mesma sessão é avaliada igualmente por clientes e terapeutas? Os clientes e os terapeutas ficam sob controle dos mesmos estímulos durante a interação terapêutica? Sessões avaliadas pela díade terapeuta-cliente como mais “leves” ou mais “tranqüilas” ou sessões consideradas mais “difíceis” se relacionam a mudanças comportamentais específicas dos clientes?

Um dos instrumentos usados para a avaliação de uma sessão específica de terapia é o Questionário de Avaliação de Sessões (Session Evaluation Questionnaire - SEQ) proposto por Stiles (1980). Este questionário tem duas partes. A primeira avalia a sessão e cada frase começa com a expressão: “Esta sessão foi...”; a segunda parte avalia os sentimentos associados à mesma, e cada frase é iniciada com “Neste momento eu me sinto...” Cada parte consiste de 11 pares de adjetivos que nomeiam diferentes emoções. O questionário, que consiste de 22 adjetivos, foi respondido por terapeutas e clientes após sessões de terapia individual. Em seu estudo, Stiles (1980) indagava se o impacto da sessão, isto é, o efeito imediato da mesma sobre as avaliações e estados internos dos indivíduos, variava segundo algumas dimensões comuns, e propôs-se a medir dois fatores:

b) Dificuldade - facilidade, que descreve os resultados da sessão sobre os estados internos de clientes e terapeutas O autor comparou as respostas dos clientes e dos terapeutas em relação à mesma sessão, para levantar dados consensuais quanto à qualidade de sessões. a) Profundidade - superficialidade, que parece descrever o processo da sessão;

Stiles (1980) considerou que, para influir efetivamente sobre a prática clínica, as pesquisas sobre os resultados da terapia deviam ser executadas no mesmo momento em que as decisões terapêuticas são tomadas, isto é, durante as interações terapeuta-cliente que ocorrem a cada instante. Este autor pressupõe que sessões específicas possam ter efeitos que serão discriminados pelos participantes imediatamente, ainda que os efeitos sobre as mudanças na vida do cliente possam requerer mais tempo ou depender de outros fatores ausentes no momento exato da sessão. Não se pode afirmar que o julgamento que cliente ou terapeuta fazem sobre o valor de uma sessão seja diretamente relacionado ao efeito terapêutico da mesma. Entretanto, Stiles (1980) procurou estabelecer, empiricamente, a relação entre as duas dimensões estudadas (dificuldade e profundidade) e os efeitos da sessão de terapia e, assim, explorar que técnicas ou processos interacionais exerciam influência sobre aquelas dimensões, a partir de uma unidade de análise mais simples - a sessão - ao invés do processo terapêutico como um todo. O trabalho é citado por autores que o consideram útil para a avaliação do impacto de sessões terapêuticas (Orlinsky, Grawe e Parks, 1986). Elliot e Wexter (1994) também se referem ao estudo de Stiles (1980), considerando que medidas que avaliem o impacto de uma sessão específica sobre o comportamento do cliente são relevantes para medir a satisfação do cliente, facilitando a pesquisa e o ensino de terapia. Estes autores traçam uma relação entre a escala de Stiles (1980) e a escala de impacto de sessões (SIS) na qual avaliam o conteúdo específico da sessão sem avaliar a qualidade das reações do cliente a estes conteúdos.

A partir destas considerações, o objetivo deste trabalho foi verificar a aplicação desse instrumento para clientes e terapeutas comportamentais a fim de avaliar sessões específicas de terapia e, com isto, contribuir para o desenvolvimento de procedimentos e/ ou técnicas de avaliação da prática clínica.

De fato, a pergunta que parece ser mais relevante é: quais recursos o terapeuta pode utilizar para identificar o impacto de uma sessão específica sobre os comportamentos do cliente e sobre as mudanças comportamentais subseqüentes do mesmo? Estes recursos serão conseqüência do desenvolvimento de metodologias de pesquisa em clínica, as quais vêm sendo cada vez mais necessárias para a atuação e aprimoramento de terapeutas, na supervisão de sessões e no ensino de terapia nas universidades.

 

Método

Participantes

Os participantes foram 10 psicólogos provindos das faculdades de Psicologia da USP ou da PUC. Todos eram terapeutas comportamentais, com dez a 23 anos de experiência clínica e média de 17 anos (aqui denominados terapeutas mais experientes) e 10 terapeutas comportamentais com experiência clínica de 1 a 10 anos, com média de seis anos de experiência (aqui denominados terapeutas menos experientes). Estes terapeutas contribuíram com números diferentes de sessões que avaliaram. Garantiu-se que nenhum cliente avaliasse mais do que uma sessão. No total, foram avaliadas 60 sessões de terapia, e o Quadro 1 mostra o número de terapeutas e clientes que participaram da pesquisa.

 

 

Clientes

Os participantes foram clientes de consultórios particulares, de 15 a 50 anos, sendo 64% mulheres (38) e 36% homens (22). Todos pertenciam à classe sócio-econômica média e tinham, no mínimo, a escolaridade do ensino médio, sendo a menor escolaridade o colegial completo (atual ensino médio) e a maior escolaridade pós-graduação com mestrado.

 

Material

O questionário de avaliação de sessões de Stiles (1980) foi traduzido do inglês para o português por dois profissionais de psicologia (terapeutas), ambos bilingües e que moraram, pelo menos, dois anos nos Estados Unidos da América, com pós-graduação em universidade americana. Em seguida, foi realizada a versão do português para o inglês por dois profissionais de psicologia (também terapeutas, que não foram os mesmos que traduziram) igualmente bilíngües e que moraram, no mínimo, dois anos nos E.U.A., com pós-graduação em universidade norte-americana.

O instrumento foi, então, aplicado a outros cinco participantes, também bilíngües (aprovados pelo TOEFL - Test of English as a Foreign Language). Após um intervalo de 10 dias, estes mesmos participantes responderam ao questionário em inglês. Obtiveram-se coeficientes de correlação de Pearson entre os escores dos questionários aplicados em português e a versão original em inglês. A menor correlação foi de 0,252 para o juiz A e a maior 0,710 para o juiz E. Para os juízes B, C e D, as correlações foram de 0,403; 0,408 e 0,620, respectivamente. Este resultado indica que a tradução para o português se manteve fidedigna ao original em inglês em relação à compreensão das questões.

O questionário(Anexo) foi impresso, colocado em envelopes pardos com instruções anexadas aos mesmos e aplicado a clientes de consultórios particulares dos 20 terapeutas que participaram do estudo.

 

Procedimento

Cada terapeuta foi contatado pessoalmente. Quando concordava em participar da pesquisa, recebia uma explicação e instrução escrita acerca dos objetivos do trabalho. Os terapeutas foram solicitados a entregar o questionário a seus clientes após o final da sessão e a pedir que estes o completassem anonimamente e o colocassem em um envelope pardo sem mostrar ao terapeuta.

O terapeuta também completava seu próprio questionário colocava junto com o do cliente, e o envelope era grampeado e encaminhado ao pesquisador. Para evitar vieses, os terapeutas foram instruídos a aplicar os questionários de forma aleatória, (por exemplo, para o 1º, 3º e 5º clientes em um dia e para o 2º, 4º e o 6º em outro dia de trabalho).

 

Resultados

Após a aplicação dos questionários, os resultados foram analisados em termos de algumas variáveis, como maior ou menor tempo de prática clínica (experiência) do profissional, consistência ou não entre as respostas do terapeuta e cliente quanto aos fatores determinantes de resultados. A avaliação da sessão feita por ambos e sua relação com eventos privados naquele momento e relatados pelos mesmos.

Para o tratamento estatístico, foram realizadas análises fatoriais separadas com os dados de clientes, terapeuta, para a primeira e segunda partes do questionário. Foi utilizado o método de componentes principais para a extração dos fatores, uma rotação ortogonal VARIMAX e o critério de factor loadings maior ou igual 0.70. Foram excluídos da análise, dois questionários incompletos. Para comparar diferenças nos escores de terapeutas e clientes e de terapeutas com maior ou menor experiência, foi realizada uma análise de variância multivariada (MANOVA).

Para a primeira parte do SEQ, foram extraídos dois fatores para terapeutas (N=60), e quatro fatores para os clientes (N=58), sendo que os fatores 3 e 4 continham apenas um item do questionário (excitante-calma e lenta-rápida, respectivamente, explicando 10% da variância, cada). Os resultados estão sumarizados na Tabela 1.

Essa tabela mostra que houve consistência entre fatores apontados por terapeutas e clientes (no destaque) para a primeira parte do questionário, isto é, ambos consideram os mesmos fatores como determinantes dos resultados. Uma análise destes fatores parece indicar que o fator 1 compõe-se dos adjetivos (boa - ruim, valiosa - sem valor, profunda - superficial, cheia - vazia, especial - comum) que se referem a aspectos do conteúdo da sessão, e o fator 2 é composto por adjetivos (tranqüila - perigosa, fácil - difícil, agradável - desagradável, suave - áspera) que enfocam o nível de dificuldade ou o grau de aversividade da sessão.

 

 

A partir da Análise Fatorial, foram derivados dois índices utilizados para análises posteriores no Estudo II: Dificuldade e Profundidade. O índice Profundidade é formado pela média dos escores nas escalas nos itens valiosa, profunda, cheia e especial. O índice Dificuldade é formado pela média dos escores nas escalas tranqüila, fácil, agradável e suave. Uma análise de variância multivariada (MANOVA) levando em conta o papel desempenhado na díade e a experiência do terapeuta, revelou um efeito principal do fator papel desempenhado (Pillai’s Trace = 0.068, p < 0.05). Análises de variância isoladas para cada um dos índices revelaram que essa diferença se deve principalmente a diferenças entre clientes e terapeutas quando avaliam o conteúdo da sessão [F(1,118) = 8.122, p < 0.01].

Para a segunda parte do SEQ, foram extraídos três fatores para terapeutas (N=60), sendo que o fator 3 continha apenas um item do questionário (envolvido - desligado), explicando 10% da variância total e dois fatores para os clientes (N=58). Ver tabela 2.

 

 

Os dados obtidos nesta segunda parte do questionário não permitem afirmar que a sessão de terapia avaliada tenha um impacto direto sobre os estados internos de terapeutas e clientes uma vez que o instrumento de medida não apresentou consistência entre terapeuta e cliente. Portanto, este resultado não garante que, posteriormente, terapeutas e clientes mantenham suas respostas encobertas quando não estiverem sob controle do questionário de pesquisa, ou então quando ficarem sob condições de controle de estímulos semelhantes àqueles da sessão. Dados de outros pesquisadores (Orlinsky, Grave e Parks,1986) sugerem que eventos encobertos, como sentimentos de satisfação ou de frustração, relatados por terapeutas, não decorrem de sessões específicas e são os resultados das mudanças terapêuticas que estes discriminam nos clientes, podendo servir de indicadores do progresso dos clientes.

 

Discussão

Os resultados de terapia costumam ser avaliados fazendo a comparação do repertório do cliente no início e no final do processo. Entretanto, a sessão de terapia pode ser considerada a unidade de análise, pois existem sessões que o terapeuta e/ou cliente avaliam como mais relevantes, ou com especial importância para a mudança comportamental. Este trabalho testou um questionário de avaliação de sessões terapêuticas (Questionário de Avaliação de Sessões, Stiles,1980), e os resultados indicaram que é útil sua utilização como um primeiro instrumento de sondagem.

Elliot e Wexler (1994), analisando o impacto de sessões específicas de terapia, diferenciam entre o impacto que ocorre quando o cliente percebe melhora de seu comportamento e o que decorre da relação terapêutica. A escala que construíram, respondida pelo cliente após a sessão, é composta de frases como, por exemplo: “Definição de problemas para eu trabalhar: como resultado desta sessão eu agora tenho clareza do que necessito mudar em minha vida ou o que preciso discutir mais na terapia; quais são os meus objetivos”. Estes autores relacionam sua escala com o trabalho de Stiles (1980) quanto à dimensão profundidade. Fica claro que essa escala é uma junção das duas partes do SEQ, e poderia ser objeto de estudos posteriores.

Os resultados observados são consistentes com os de Stiles (1980) em alguns pontos. A consistência entre terapeutas e clientes na avaliação dos fatores na primeira parte do questionário parece ser a mais importante, indicando que com este instrumento, dentre os vários itens do SEQ (Session Evaluation Questionnaire), terapeutas e clientes avaliam como mais significativas as mesmas variáveis ou os mesmos fatores na sessão terapêutica.

Uma análise destes fatores parece indicar que o fator 1 compõe-se de adjetivos (boa- ruim, valiosa - sem valor, profunda - superficial, especial - comum) que se referem a aspectos do conteúdo da sessão, e o fator 2 é composto por adjetivos (tranqüila - perigosa, fácil - difícil, agradável - desagradável, suave - áspera, boa - ruim) relativos ao nível de dificuldade ou grau de aversividade da sessão. Outro aspecto a ser considerado é que os itens que compõem o fator 1 referem-se a comportamentos encobertos do terapeuta que geralmente ficam sob controle de regras e da historia de vida dos terapeutas e não de contingências da sessão terapêutica. O par de adjetivos boa - ruim foi assinalado pelos terapeutas e não pelos clientes, o que pode decorrer do fato de que os terapeutas, em função da prática clínica, identifiquem mudanças no cliente (e aí considerem a sessão boa ou ruim). Ou seja, os terapeutas parecem ter mais facilidade na discriminação de mudanças sutis do que os clientes, o que pode ser decorrente da prática clínica.

A análise dos dados dos terapeutas na segunda parte do questionário indica uma maior consistência entre os dados dos mesmos, o que talvez possa ser explicado pelo fato de que os terapeutas geralmente são mais treinados em discriminar seus estados internos através de supervisão ou terapia pessoal. No questionário original de Stiles (1980), encontrou-se uma diferença significativa entre os dados de terapeutas mais experientes (medida em anos de prática) e terapeutas menos experientes (menos anos de prática) e, neste trabalho, a experiência do terapeuta não foi uma variável determinante. A análise de variância entre e média dos escores e estas médias se mostraram iguais para terapeutas mais ou menos experientes. Esta diferença quanto à importância da experiência talvez se explique pelo fato de que, no estudo de Stiles (1980), os terapeutas tinham formação diferente, isto é, alguns foram assistentes sociais, outros foram psicólogos e outros ainda foram médicos psiquiatras. Na amostra utilizada no presente estud A partir dos resultados deste trabalho, pode-se concluir que o Questionário de Avaliação de Sessões - SEQ pode ser um instrumento útil para obtenção de informações sobre como o cliente e o terapeuta avaliam a sessão, segundo os índices propostos, profundidade e dificuldade. Além disso, parece claro que o terapeuta modelou o repertório verbal do cliente, o que se percebe pela crescente similaridade das avaliações dos mesmos. Na última aplicação, ambos apresentaram os mesmos índices. Entretanto, em relação à segunda parte do SEQ, que se propõe a avaliar o impacto da sessão sobre encobertos da dupla terapêutica, parece não ser possível afirmar que haja relação entre a sessão e os encobertos do terapeuta e do cliente após a mesma. Esses encobertos podem estar, e freqüentemente estão, sob controle de outras variáveis, além das presentes na sessão de terapia, tais como, a história de aprendizagem e as contingências de manutenção. Além disso, avaliações semânticas, como a realizada pelo questionário utilizado no Estudo I não oferecem descrições de comportamentos abertos e/ou encobertos do cliente e do terapeuta em sua interação verbal.o, todos os participantes foram psicólogos provindos da USP ou da PUC, ambas faculdades de Psicologia da cidade de São Paulo que tiveram avaliação semelhante da CAPES. Além disso, nestas faculdades, a formação em Análise do Comportamento é reconhecida como de muito bom nível por diferentes sociedades científicas e por autoridades na área. Assim, as diferenças de formação talvez sejam menos expressivas, suprindo a falta de experiência.

Pode-se concluir que o trabalho de Stiles (1980) atinge os objetivos propostos pelo autor, de mensurar o impacto da sessão terapêutica sobre o cliente e o terapeuta através de uma escala diferencial semântica, que utiliza adjetivos antônimos em uma escala gradual. A segunda parte do questionário, que verifica o impacto da sessão sobre os encobertos do terapeuta e do cliente foi respondida por eles, mas as respostas não foram analisadas porque a investigação de eventos encobertos está além do escopo deste trabalho.

Outros estudos que analisem com maiores detalhes outras variáveis da interação, ou que comparem diferentes terapeutas com e sem o uso destes instrumentos de avaliação, poderão fornecer dados mais precisos sobre o impacto de uma determinada sessão sobre o processo de terapia.

Entretanto, as avaliações semânticas não oferecem definições operacionais de comportamentos abertos e/ou encobertos do cliente e do terapeuta em sua interação verbal. Concorda-se com Ferster (1979) que, para a aplicação clínica da Análise do Comportamento, é importante desenvolver uma linguagem objetiva que permita identificar e analisar os comportamentos na situação em que ocorrem e as mudanças ambientais relacionadas a tais comportamentos. Estudos posteriores deverão investigar outros aspectos da avaliação de sessões de terapia com ênfase em descrições de comportamentos e eventos de mudança que ocorram durante a sessão, principalmente na interação verbal entre o terapeuta e o cliente.

 

Referências

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Recebido em: 05/11/02
Primeira decisão editorial em: 13/12/02
Versão final em: 20/12/02
Aceito em: 26/12/02

 

 

1 Endereço para correspondência: Rua Pio XI, 2269- CEP 05468-140-Alto da Lapa-S. Paulo.

 

 

ANEXO

Questionário de Avaliação de Sessões

Prezado cliente:

Gostaria de pedir sua ajuda para uma pesquisa que um psicólogo está realizando. Para colaborar com esta pesquisa, é necessário que você, imediatamente após a sua sessão, marque um X em cada linha deste questionário no espaço correspondente para mostrar sua opinião. Quando você terminar, coloque o questionário no envelope pardo. Não coloque seu nome em nenhum lugar, pois o anonimato é indispensável para o trabalho. O seu terapeuta não terá acesso às suas respostas.

Cada item desta pesquisa pode ser avaliado com 7 pontos de diferentes valores. Preste atenção para que sua anotação corresponda o mais objetivamente possível ao que você está sentindo. Agradeço sua valiosa participação.

Questionário de avaliação de sessão: 1ª parte

Por favor, marque X em cada linha na frente do número que mostra como você se sente Em relação a esta sessão. Verifique o número que corresponde mais fielmente ao que você sente. Observe o que cada número representa:

1-extremamente

2-muito

3-um pouco

4-nem um nem o outro

5-um pouco

6-muito

7-extremamente

 

Esta sessão foi: Boa 1---- 2----3---- 4----5 ---- 6---- 7---- Ruim

Esta sessão foi: Tranqüila 1---2---3-----4----5 ---- 6---- 7--- Perigosa

Esta sessão foi: Fácil 1---- 2----3---- 4----5 ---- 6---- 7---- Difícil

Esta sessão foi: Valiosa 1---- 2----3---- 4---- 5---6--- 7----Sem-valor

Esta sessão foi: Profunda 1---- 2----3---- 4---- 5---6--- 7---- Superficial

Está sessão foi: Excitante 1---- 2----3---- 4---- 5---6--- 7---- Calma

Esta sessão foi: Agradável 1---- 2----3---- 4---- 5---6--- 7---- Desagradável

Esta sessão foi: Cheia 1---- 2----3---- 4---- 5---6--- 7---- Vazia

Esta sessão foi: Lenta 1---- 2----3---- 4----5---6--- 7---- Rápida

Esta sessão foi: Especial 1---- 2----3----4---- 5---6--- 7-- Comum

Esta sessão foi: Suave 1---- 2----3---- 4---- 5---6--- 7---- Áspera

Questionário de avaliação de sessão: 2&ordf parte

Por favor, marque X em cada linha na frente do número que mostra como você se sente em relação a esta sessão. Verifique o número que corresponde mais fielmente ao que você sente agora. Observe o que cada número representa:

1-extremamente

2-muito

3-um pouco

4-nem um nem o outro

5-um pouco

6-muito

7-extremamente

 

Neste momento eu me sinto: Feliz 1----2----3----4----5----6----7---- Infeliz

Neste momento eu me sinto: Amável 1----2----3----4----5----6----7--- Com raiva

Neste momento eu me sinto: Confiante1---2---3--4---5----6--7---- Amedrontado

Neste momento eu me sinto: Confuso 1----2----3----4----5----6----7---- Seguro

Neste momento eu me sinto: Envolvido 1----2----3---4----5----6---7---- Desligado

Neste momento eu me sinto: Bonito 1----2----3----4----5----6----7---- Feio

Neste momento eu me sinto: Poderoso 1---2----3----4----5----6----7---- Impotente

Neste momento eu me sinto: Relaxado 1----2----3----4----5----6----7---- Tenso

Neste momento eu me sinto: Amigável 1--2---3---4---5---6---7---- Não-amigável

Neste momento eu me sinto: Forte 1----2----3----4----5----6----7--- Fraco

Neste momento eu me sinto: Inteligente 1---2--3---4---5---6---7---- Estúpido