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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

Print version ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.7 no.2 São Paulo Dec. 2005

 

ARTIGOS

 

Orientação e auto-orientação em atendimentos de terapeutas analítico-comportamentais experientes e pouco-experientes1

 

Orientation and self-orientation in sessions conducted by experienced and inexperienced behavior-analytic therapists

 

 

Juliana Cristina Donadone2; Sonia Beatriz Meyer3

Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo

 

 


RESUMO

Em busca de uma melhor compreensão do controle por regras em terapia, verificou-se a presença de orientação e auto-orientação em sessões de terapeutas analítico-comportamentais experientes e pouco experientes e se estas se diferenciavam quanto ao grau de especificidade. Foi considerada “orientação” uma indicação do terapeuta do que fazer fora da sessão e “auto-orientação” quando essa indicação era emitida pelo cliente. Participaram seis terapeutas pouco experientes e três experientes, cada um atendendo três clientes adultos por três sessões. Terapeutas experientes apresentaram grande variação quanto ao uso da orientação entre clientes e entre sessões e, em média, orientaram mais que os pouco experientes. A maioria dos clientes dos terapeutas experientes se auto-orientou mais que os dos outros terapeutas. Predominaram orientações e auto-orientações para ação específica. Uma ou mais orientações e auto-orientações ocorreram em sessões conduzidas por terapeutas analítico-comportamentais, sugerindo que emissão e alteração de regras podem contribuir com mudanças no processo terapêutico.

Palavras-chave: Analítico-comportamentais, Experiência, Orientação, Auto-orientação.


ABSTRACT

In order to understand the control by rules in therapy, the study verified the presence of orientation and self-orientation in sessions held by experienced and less experienced behavior-analytic therapists and if there were differences in their degree of specificity. Orientation meant indication given by the therapist outside the therapy session. When issued by the client, self-orientation was registered. Six less experienced and six experienced therapists participated in the study. Each recorded three sessions of three adult clients who had no specific diagnostic. The experienced behavior therapists presented a wide variation in the use of orientation among clients and sessions and in average they oriented more than the less experienced. The majority of the experienced behavior therapists clients self-oriented more than those of the less experienced. Orientation and self-orientation for specific action prevailed. One or more orientations and self-orientations occurred in sessions conducted by behavior-analytic therapists, suggesting that emission and rule alterations can lead to change in the therapeutical process.

Keywords: Key words: Behavior therapists, Experience, Orientation, Self-orientation.


 

 

Processos Responsáveis por Mudanças Psico-terapêuticas

Atualmente, ocorrem debates sobre quais são os processos responsáveis por mudanças ocorridas em psicoterapias. Meyer (2004), por exemplo, analisou quais dos processos comportamentais estudados por Skinner e seus seguidores podem ser responsáveis por tais mudanças, sugerindo que mudanças comportamentais produzidas pela terapia poderiam ou ser prioritariamente modeladas por contingências da relação terapêutica ou principalmente governadas por novas regras produzidas na terapia.

Alguns autores comportamentais apontam que mudanças ocorridas em terapia se dão através de procedimentos estruturados e do controle por regras (Skinner, 1989, Matos, 2001). Já autores como Hayes, Kohlenberg e Melacon (1989) e Follette, Naugle e Callaghan (1996) afirmam que a história de aprendizagem e a modelagem adquirida na interação com o terapeuta são um importante mecanismo de mudança.

É importante produzir evidências empíricas para ajudar na análise teórica sobre os processos de mudança clínica. Entendeu-se que o primeiro passo para isso seria verificar se aparecem regras que poderiam indicar mudanças comportamentais durante atendimentos de analistas do comportamento. Pareceu relevante, também, constatar quem emite tais regras, o terapeuta ou o cliente. As regras analisadas foram as orientações e auto-orientações.

 

Orientação de acordo com Skinner

Para Skinner (1974/1982), orientação pode ser entendida como uma descrição do comportamento feita pelo falante a ser executado pelo ouvinte, com indicação explícita ou implícita das conseqüências da ação desse ouvinte. Com base nessa definição, é possível afirmar que auto-orientação é uma descrição do comportamento feita pelo cliente a ser executado por ele mesmo, com indicação explícita ou implícita das conseqüências da ação. Nesse sentido, a diferença entre a orientação e a auto-orientação é que, no segundo caso, a pessoa descreve o comportamento que ela mesma deverá fazer.

As orientações englobam ordens, avisos e conselhos que são diferentes formas de regras (Skinner, 1974/1982). Uma pessoa que esteja seguindo uma orientação, aceitando um conselho, prestando atenção a um aviso, obedecendo a leis e regras, não se comporta exatamente da mesma maneira que outra que tenha sido exposta diretamente às contingências, porque uma descrição das contingências nunca é completa ou exata (usualmente, é simplificada para poder ser ensinada ou compreendida com facilidade) e porque as contingências de apoio raras vezes são mantidas plenamente. O controle exercido por orientações, conselhos, regras ou leis é mais ostensivo do que o exercido pelas próprias contingências, em parte porque este é menos sutil, enquanto aquele, por isso mesmo, parece significar maior contribuição pessoal e valor interno (Skinner, 1974/1982).

 

Comportamento modelado por contingências e comportamento governado por regras

O comportamento modelado por contingências é aquele mantido por conseqüências relativamente imediatas que não dependem do ato de ouvir ou ler uma regra, mas apenas da interação com contingências. A probabilidade futura de emissão de resposta é determinada pela relação entre a resposta e o reforçador produzido por ela havendo necessidade de uma exposição geralmente longa às conseqüências, o que pode ser pouco prático, especialmente quando as conseqüências produzidas pelo comportamento são muito adiadas ou escassas, tornando-se, portanto, ineficazes na modificação de comportamentos; ou ainda, quando os comportamentos que seriam modelados pelas contingências em vigor são indesejáveis (Skinner, 1969/1975).

O comportamento governado por regras é aquele controlado por uma descrição verbal e que pode induzir homens a se comportarem de modo efetivo sem que haja necessidade de exposição, geralmente longa, às conseqüências descritas (Skinner, 1966).

Matos (2001) descreveu a distinção feita por Zettle e Hayes entre dois tipos de comportamentos governados por regras: aquiescência (em inglês “pliance”) e rastreamento (em inglês “tracking”). Um comportamento aquiescente seria aquele que depende essencialmente de contingências sociais (a pessoa é reforçada diretamente por seguir a regra); um comportamento de rastreamento depende essencialmente de correspondência entre o comportamento verbal e eventos ambientais. Uma norma, uma lei ou um costume controlam comportamentos de aquiescer; uma instrução ou uma descrição de um trajeto controlam comportamentos de rastrear. Pode-se dizer que a conseqüência instrucional típica é a aprovação social, e a do comportamento indicado pela regra é a conseqüência colateral (Matos, 2001). Há casos extensamente pesquisados em que as duas conseqüências produzem comportamentos incompatíveis. Essas situações podem gerar a denominada insensibilidade a contingências colaterais.

Quando o comportamento operante fica mais sob o controle das contingências de aprovação social, dizemos que tal comportamento está 'insensível' às contingências naturais ou às programadas pelo experimentador (Nico, 1999).

A redução na sensibilidade às contingências, entretanto, não pode ser considerada uma característica inerente ao controle por regras, já que tal redução é modulada por diversos aspectos, conforme indicado em estudos experimentais, como: conteúdo das instruções, variabilidade comportamental, densidade de reforços, história de reforçamento, grau de discriminabilidade. Considerando o conteúdo das instruções, quanto mais elas especificam o comportamento a ser executado, maior a insensibilidade produzida (para maiores detalhes ver Donadone, 2004, Abreu-Rodrigues e Sanabio, 2004, Meyer, 2005).

A estratégia de orientação é claramente uma estratégia de controle por regras tanto em sua topografia como em sua função. Na presente pesquisa atentou-se que diferentes tipos de orientação (regras) poderiam produzir diferentes resultados (levando-se em consideração a literatura sobre regras). Dessa forma, orientações para ação genérica e orientações para encoberto, por serem orientações que não descrevem acuradamente o que deve ser feito - e sim qual o objetivo a ser atingido-, são menos especificas e, portanto, possivelmente gerem menos insensibilidade às contingências naturais. Já orientações para ação específica e para tarefa especificam exatamente o que deve ser feito para se chegar a um objetivo determinado. Estes dois últimos tipos de orientações citados têm maior possibilidade de gerar insensibilidade às contingências naturais. Essas afirmações também são válidas para as auto-orientações, não importando que ouvinte e falante sejam a mesma pessoa.

 

Variáveis que podem interferir no uso da orientação em psicoterapia

O uso da orientação como uma das formas de produzir mudanças por regras pode ter vários determinantes: a abordagem teórica comportamental, que tem produzido intervenções bem-sucedidas com o uso de procedimentos padronizados envolvendo orientação; a experiência clínica, durante a qual pode ter havido reforço diferencial do emprego de estratégias diretivas; a história de vida dos diferentes clientes, assim como a própria resposta às orientações (Meyer e Donadone, 2002).

Quanto à abordagem teórica, terapeutas comportamentais são considerados diretivos, e seus programas terapêuticos compreendem procedimentos específicos, guiando e encorajando os esforços do cliente nas sessões de tratamento e na vida diária. Já terapias psico-dinâmicas consideram que dar sugestões não é uma atuação psicoterapêutica “evocativa” ou que propicie descobertas (Garfield, 1995).

No entanto, tais terapeutas consideram que há casos em que a orientação direta se mostra ne-cessária em situações em que o cliente está em risco ou temporariamente não é capaz de fazer opções.

Já quanto à experiência, vários estudos demonstram que quanto à formação de vínculo, não há diferenças significativas entre terapeutas experientes e pouco-experientes (Gar-filed, 1995; Dunkle e Friedlander 1996; Prado, 2002; Novaki, 2003). Mas a experiência pode ser determinante na forma como os terapeutas vão comportar-se ao longo das sessões. Segundo Hackney e Nye (1977), terapeutas iniciantes são mais agitados, falantes e diretivos. Com base na afirmação desses autores, considerou-se necessário comparar se havia diferenças entre a emissão de orientação por terapeutas comportamentais experientes e pouco experientes.

Quanto à história de vida dos clientes, Hayes, Kohlenberg e Melacon (1989) afirmaram que muitas desordens clínicas envolvem problemas no controle verbal, como os quatro a seguir: (a) problemas do cliente na formulação de auto-regras; (b) nas regras aprendidas; (c) no não-seguimento de regras; (d) no seguimento excessivo de regras. Assim, há casos em que o controle por regras é desejável e outros em que é indesejável. Nesse caso, dois cursos terapêuticos parecem disponíveis: evitar controle verbal ou alterá-lo de forma a diminuir os efeitos de produção de insensibilida-de, sendo que o único tipo de regra formalmente estimulado seria a descrição verbal das contingências envolvidas em experiências vividas (Hayes e cols, 1989).

Quanto à resposta dos clientes a orientações, Beutler, Molero e Talebi (2002) afirmaram que clientes são considerados resistentes quando rejeitam conselhos e não respondem à maioria das intervenções de seus terapeutas.

 

Objetivos

Esta pesquisa tinha como objetivo verificar: a) se terapeutas comportamentais utilizam a estratégia de orientar seus clientes; b) se há diferenças quanto à freqüência de orientações por terapeutas comportamentais experientes e pouco experientes; c) se há diferenças quanto à ocorrência de orientação para ação específica, orientação para ação genérica, orientação para tarefa e orientação para encoberto utilizadas por terapeutas experientes e pelos pouco experientes; d) se clientes se auto-orientam; e) quais os subtipos de auto-orientação mais comuns e h) se eles aparecem com freqüências diferentes quando se comparam clientes de terapeutas experientes e pouco experientes.

 

Método

Participantes

Participaram desta pesquisa, seis terapeutas pouco experientes (T.P.E.1A; T.P.E.2A; T.P.E.1B; T.P.E.2B; T.P.E.1C e T.P.E.2C) e três terapeutas experientes (T.E.D; T.E.E e T.E.F.). Os terapeutas pouco experientes tinham o mínimo de dois anos e nove meses de experiência clínica e o máximo de três anos de experiência em atendimento clínico, e foram divididos em três duplas com base na faculdade de graduação e o supervisor em comum. Quanto aos terapeutas experientes, o mínimo de experiência em atendimentos foi de 15 anos e o máximo de 28 anos. Quanto ao número de casos atendidos pelos T.P.E., este variou de 10 a 100 casos. Já para os T. E, variou de 100 a 1400 casos. A Tabela 1 traz informações sobre os terapeutas participantes na época da coleta de dados.

Os nove terapeutas atenderam 27 clientes, sendo 22 do sexo feminino e cinco do sexo masculino. A idade variou de 18 a 54 anos, e o estado civil predominante foi solteiro (19 clientes), seguido de casados (seis clientes) e divorciados (dois clientes). A duração da terapia (na época da coleta de dados) variava de quatro meses a quatro anos (ver Tabela 1).

Ambiente

As sessões utilizadas nesta pesquisa foram, em sua maioria, gravadas em clínicas particulares. As sessões de um Terapeuta Experiente e de um Terapeuta Pouco Experiente foram gravadas numa clínica-escola de uma universidade. As sessões de um outro Terapeuta Pouco Experiente foram gravadas em um ambulatório de um hospital particular.

Procedimento de coleta de dados

Solicitaram-se, aos terapeutas, gravações em áudio ou em vídeo de três sessões com quaisquer três diferentes clientes adultos. Ofereceram-se, a todos os participantes, os gravadores, as fitas e pilhas para a realização da coleta de dados. O tempo de gravação de cada sessão deveria ser de uma hora, e as sessões não deviam ser as iniciais, pois haveria baixa probabilidade de haver orientações nas primeiras sessões, uma vez que o início da terapia é uma fase predominantemente de coleta de dados e de estabelecimento de vínculo. Redigiu-se um documento de consentimento informado, no qual se pediu a autorização dos clientes para a gravação das sessões e para a sua utilização em pesquisas. Esse documento também continha todos os esclarecimentos necessários sobre as pessoas autorizadas a manusearem o material produzido e sobre o sigilo das informações e de qualquer tipo de identificação do cliente. Aos terapeutas, foram entregues um documento de consentimento informado, semelhante ao do cliente e um questionário solicitando informações gerais.

As fitas gravadas foram transcritas, as falas numeradas e categorizadas. As medidas tomadas neste estudo foram: número de palavras emitidas por sessão pelo terapeuta e pelo cliente; número de palavras emitidas em falas contendo orientação/auto-orientação (orientações/auto-orientações novas, repetições, continuação); número de orientações e de auto-orientações; número de cada subtipo da orientação/auto-orientação.

Subtipos de Orientação

1. Orientação para ação específica - orientação para que o cliente se comporte da forma indicada em seu cotidiano, especificando a topografia do comportamento a ser desenvolvido.

2. Orientação para ação genérica - orientação para que o cliente se comporte da forma indicada em seu cotidiano, porém não indicando a ação que deverá ser executada, e sim qual o resultado a ser atingido com qualquer topografia de comportamento;

3. Orientação para encoberto - orientação para que o cliente reflita sobre um tema proposto ou observe suas ações e pensamentos;

4. Prescrição de tarefa - orientação para que o cliente execute uma tarefa proposta.

As mesmas categorias foram utilizadas para as auto-orientações, sendo que a única diferença existente é que, ao invés de ser o terapeuta a emitir tais subtipos de orientação, era próprio cliente que as emitia para que ele mesmo as realizasse.

 

Resultados e discussão

Os dados coletados foram submetidos à análise estatística com o uso do pacote estatístico computadorizado, o SPSS. As análises feitas foram: a ANOVA (e seu complemento - teste de Tukey) e o Teste de Igualdade de Duas Proporções. Realizou-se também uma análise descritiva utilizando-se o Intervalo de Confiança.

Primeiramente, verificou-se se a estratégia de orientação estava presente nas sessões analisadas assim como a proporção de orientação encontrada na amostra.

De um total de 81 sessões, em 79 (97,5%) ocorreu a estratégia de orientação, ou seja, a orientação foi usada em praticamente todas as sessões. Quando se compararam o número de sessões dos terapeutas experientes e o dos terapeutas pouco experientes, constatou-se que 100% das sessões dos terapeutas pouco experientes e 92,6% das sessões dos terapeutas experientes continham orientações a seus clientes, sendo esta diferença estatisticamente significativa.

Auto-orientação ocorreu em 43 sessões (53,1% das sessões analisadas), não havendo diferenças significativas entre o uso e não uso dessa estratégia. Os clientes dos terapeutas experientes se auto-orientaram em 66,7% das sessões, já os dos terapeutas pouco experientes, em 46,3% das sessões. Apesar de os clientes dos terapeutas experientes se auto-orientarem mais que os clientes dos terapeutas pouco experientes, essa diferença não chegou a ser estatisticamente significante. Ao analisar a proporção média (média ponderada) das sessões dedicadas à orientação constatou-se que os terapeutas, experientes ou não, empregaram orientações ou chegaram a usá-la com 63,36% das palavras da sessão, sendo a média de 17,5% das palavras de suas sessões dedicadas à estratégia de orientação. Os terapeutas pouco experientes variaram entre 0% de orientação a 50,42%, utilizando-a em média 9,6% . Destaca-se, nesse resultado, a grande variabilidade encontrada na utilização da estratégia de orientação por terapeutas experientes (ver Figura 1).

Quanto aos clientes dos terapeutas expe-rientes, em média 1,5% do que eles falavam eram auto-orientações (variação entre 0% e 8,15%). Já quanto aos clientes dos terapeutas pouco experientes, em média, apenas 0,6% do que eles falavam foram auto-orientações (variação entre 0% e 4,77%). A diferença encontrada quanto à utilização da estratégia de auto-orientação por clientes dos terapeutas experientes e clientes dos terapeutas pouco experientes foi significativa. Talvez a baixa ocorrência de auto-orientação principalmente pelos clientes dos terapeutas pouco experientes se deva ao fato de que se auto-orientar é um comportamento modelado na relação terapêutica e, sendo mais complexo, sua aquisição também deve ser mais complexa.

Após a verificação da presença e da proporção da estratégia de orientação nas sessões analisadas, realizou-se a comparação entre as duplas de terapeutas pouco experientes. A primeira comparação foi entre os membros de ca-da dupla (TPE1A comparado com TPE2A; TPE1B com TPE2B, e TPE1C com TPE2C). Nesta comparação, observou-se que as duplas apresentaram um desempenho similar em relação à média de palavras emitidas em falas com orientação (ou seja, as diferenças entre as médias de palavras em falas com orientação de cada um não foram significativas), o mesmo ocorrendo para os clientes desses terapeutas quanto à auto-orientação.

Quando se compararam as diferentes duplas de terapeutas pouco experientes (T.P.E.1A e T.P.E.2A; T.P.E.1B e T.P.E.2B; T.P.E.1C e T.P.E.2C), observou-se que, em média, não havia diferenças estatisticamente significativas entre o número de palavras em falas com orientação dos terapeutas pouco experientes das diferentes universidades. Quanto à média de auto-orientações emitidas pelos clientes, não houve diferenças significativas ao se realizar a comparação das diferentes duplas. Pode-se afirmar que, de modo geral, a formação em diferentes universidades não se correlaciona com a utilização da estratégia de orientar. Também não houve diferenças significativas quanto à emissão de auto-orientação pelos clientes desses terapeutas.

Ao se compararem os terapeutas experientes (Terapeuta Experiente D, Terapeuta Experiente E e Terapeuta Experiente F), verificou-se que Terapeuta Experiente E apresentou um maior número de palavras em falas com orientação que os demais terapeutas. Os clientes do Terapeuta Experiente D se auto-orientaram significativamente mais que os clientes dos terapeutas E e F. A comparação entre os terapeutas experientes sugere que, quanto à orientação, não houve diferenças médias significativas, apesar de o Terapeuta Expe-riente E haver orientado mais seus clientes que os terapeutas D e F. Quanto à auto-orientação, o fato de os clientes do Terapeuta Experiente D se auto-orientarem significativamente mais que os outros sugere que o estilo pessoal do terapeuta, a história de vida dos diferentes clientes, assim como a própria resposta à orientações são variáveis provavel-mente responsáveis pela diferença.

Utilizou-se o SPSS para detalhar mais a aná-lise através dos gráficos tipo Bloxplot, em que foram comparadas as distribuições da orientação emitidas por terapeutas experientes e terapeutas pouco experientes.

 

 

Os gráficos da Figura 1 e 2 fornecem as seguintes informações: a) mediana, que são os traços dentro de cada caixa apresentada no gráfico; b) variabilidade, que são os tamanhos das caixas que contém 50% da amostra, c) pontos de máximo, que são os traços acima das caixas; d) pontos de mínimo, que são os traços abaixo das caixas. Os pequenos círculos representam outliers (resultados discrepantes) e os asteriscos representam os resultados extremos.

Ao observar os gráficos do NPFOE (número de palavras em falas com orientação dos terapeutas experientes) e NPFOPE (número de palavras em falas com orientação dos terapeutas pouco experientes) é possível visualizar, com clareza, o que foi analisado anteriormente nos testes estatísticos. Observa-se que há maior variabilidade na utilização da orientação pelos terapeutas experientes do que pelos terapeutas pouco experientes. Esse resultado chama a atenção, uma vez que o número de terapeutas pouco experientes era maior que o número de terapeutas experientes. Uma possível explicação para essa grande variabilidade apresentada pelos terapeutas experientes é que estes ousam mais e respondem mais ao que ocorre nas sessões, ao tema trazido pelo cliente e mesmo à reação do cliente à emissão de orientação. Assim, cada momento da sessão é único, e não há apresentação de um padrão fixo de comportamento por parte desses terapeutas. Já os terapeutas pouco experientes poderiam estar mais sob o controle do como proceder, e não ousando muito. Pareceram responder mais em relação ao procedimento geral do que ao momento terapêutico em particular. Esses dados, no entanto, permitem concluir, apenas, que é muito difícil determinar o que está contro-lando o comportamento de orientar. Ora parece ser o cliente, ora parece ser o terapeuta, ora parece não ser nenhum dos dois e sim outras variáveis como o tema abordado; e, finalmente, há momentos em que o que parece determinar a utilização da estratégia de orientação é uma mistura de todos esses elementos.

Foram utilizados também os gráficos do tipo Bloxplot para comparar a distribuição de auto-orientação emitida pelos clientes dos terapeutas experientes e clientes dos terapeutas pouco experientes.

Ao observar os gráficos do NPFAOE (número de palavras em falas com auto-orientação dos clientes dos terapeutas experientes) e NPFAOPE (número de palavras em falas com auto-orientação dos clientes dos terapeutas pouco experientes) é possível visualizar que os clientes dos terapeutas experientes emitiram um maior número de palavras em falas com auto-orientação que os clientes dos terapeutas pouco experientes. Os clientes dos terapeutas experientes também apresentaram maior variabilidade que os clientes dos terapeutas pouco experientes.

Uma possível explicação para o maior número de auto-orientações nas sessões dos terapeutas experientes seria a de que terapeutas experientes podem ter mais condições de realizarem suas intervenções terapêuticas baseadas na modelagem direta do comportamento verbal, incluindo a modelagem de autoregras. Seria interessante que futuras pesquisas pudessem esclarecer essa questão.

Além de analisar o número de palavras em falas com orientação e auto-orientação, outra análise considerou o número de falas com orientação e o número de falas com auto-orientação, assim como seus subtipos. A Tabela 2 refere-se às análises sobre a média do total de falas com orientação e de cada subtipo de falas com orientação.

 

 

Não há diferenças significativas entre a média de orientações emitidas pelos terapeutas experientes e pouco experientes. No entanto, quando a análise recai sobre os subtipos de orientação, apenas se encontra diferença significativa nas falas com orientação para ação específica mais utilizadas pelos terapeutas experientes. Quanto às falas com orientação para tarefa, houve diferença significativa entre os terapeutas, sendo apenas utilizadas pelos terapeutas pouco experientes. No entanto, como a utilização foi extremante baixa (próxima de zero), deve-se olhar esta diferença estatisticamente significativa com ressalvas e deve-se lembrar que os terapeutas analíticos comportamentais não têm advogado o uso de tarefas. Isso poderia explicar o baixo uso de orientação para tarefa. Quanto às falas com orientação para ação genérica e falas com orientação para encobertos, não existe diferença média estatisticamente significante entre os grupos de terapeutas experientes e poucos experientes.

Usar orientação para tarefa e orientação para ação específica como forma de produzir mudanças terapêuticas merece análise, tendo em vista um corpo da literatura básica que alerta para o fato de que, ao se emitirem regras específicas, corre-se o risco de que a pessoa responda apenas às regras e não às contingências naturais (Abreu-Rodrigues e Sanabio, 2004).

Danforth, Chase, Dolan e Joyce (1990) afirmaram que o conteúdo das instruções é um fator importante, pois quando a regra especifica com exatidão a tarefa, ocorrem respostas estereotipadas e insensibilidade comportamental. Já quando as instruções, ou seja, as re-gras são vagas, há um favorecimento de controle pelas contingências.

A Tabela 3 apresenta os dados referentes à comparação da emissão de auto-orientações por clientes dos terapeutas experientes e pouco experientes.

 

 

Os clientes dos terapeutas experientes se auto-orientaram, em média, significativamente mais que os clientes dos terapeutas pouco experientes. Para o subtipo auto-orientação para ação específica, os clientes dos terapeutas experientes se auto-orientaram significativamente mais. Quanto aos subtipos auto-orientação para ação genérica e auto-orientação para encobertos, os clientes dos terapeutas experientes e pouco experientes não apresentaram diferença média que pudesse ser estatisticamente significante entre os grupos. Os clientes dos terapeutas experientes e pouco experientes não se auto-orientaram para tarefa. Como apontado na literatura, a vantagem da emissão e seguimento de auto-orientação é que não dependeriam da aprovação social do terapeuta, mas manteriam a vantagem da rapidez de mudança.

Dez por cento da amostra da pesquisa foi submetida ao julgamento de um juiz, para cálculo de concordância, que foi de 83% para a localização da fala do terapeuta, 89% para o número de palavras nas falas com orientação, 95% para a categorização da orientação, 91% para a localização da fala do cliente, 100% para o número de palavras nas falas com auto-orientação e 100% para a categorização das auto-orientações.

 

Conclusão

Os resultados sugerem que terapeutas analítico-comportamentais utilizam, em sua prática clínica, orientação, e que emissão de novas regras em terapia poderia ser uma das razões das mudanças comportamentais. Nesta pesquisa, procurou-se controlar alguns determinantes como: a abordagem teórica comportamental, a variação de clientes, as flutuações intra-sessões e a manipulação da variável experiência. No entanto, não foi possível afirmar o que determina o aparecimento da estratégia de orientação, pois houve muita flutuação nos resultados, e nem a variável manipulada e nem as variáveis controladas conseguiram explicar as flutuações. Ou seja, a orientação não foi determinada nem claramente pela experiência do terapeuta, nem claramente pelas características de diferentes clientes e nem pelas diferentes sessões.

Outra variável crítica poderia ser o momento da terapia na coleta de dados. A amostra era bem heterogênea; a coleta foi realizada em diferentes fases de terapia dos diferentes clientes; no entanto, também não se encontrou correlação entre a presença ou não de orien-tação e auto-orientação com a fase da terapia dos diferentes clientes.

Estudos futuros também deveriam verificar o efeito das orientações ou auto-orientações sobre o comportamento do cliente. O objetivo deste estudo foi o de mapear a ocorrência de orientações e auto-orientações, o que permitiu inferir que a orientação, ou seja, a utilização de regras, faz parte do processo de mudança. Julga-se necessário, então, olhar mais atentamente, momento a momento, o que está controlando o comportamento de orientar dos terapeutas através da análise funcional, pois, como Skinner afirmou, comportamentos não acontecem no vácuo. Ao identificar as condições caso a caso, identificam-se as variáveis controladoras. O conjunto da literatura de psicoterapia aponta que as variáveis são complexas, interagem, e é extremamente difícil isolá-las. Ao olhar cada unidade de orientação, podem-se verificar os possíveis diferentes controles, o mesmo ocorrendo no caso da auto-orientação. Futuras pesquisas devem ser realizadas, permitindo um aprofundamento dessas questões.

 

 

Referências

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Recebido em: 06/06/2005
Primeira decisão editorial em: 21/07/2005
Versão final em: 20/10/2005
Aceito em: 15/12/2005

 

 

1 Artigo referente à dissertação de mestrado da primeira autora.
2 Doutoranda em Psicologia Clinica IP/USP-SP. E-mail: judonado@terra.com.br
3 Docente do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo. E-mail: sbmeyer@usp.br