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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

Print version ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.7 no.2 São Paulo Dec. 2005

 

NOTA TÉCNICA

 

Infravermelho de baixo custo para estabelecer respostas de focinhar em ratos1

 

Low-cost infrared device to establish nose-poking response in rats

 

 

Paula DebertI, 2; Maria Amalia Pie Abib AnderyII

I Universidade de São Paulo
II Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

 

 


RESUMO

O presente trabalho descreve um infravermelho de baixo custo para estabelecer respostas de focinhar em ratos. O equipamento foi facilmente acoplado à caixa de condicionamento operante e permitiu que as respostas de focinhar fossem emitidas no mesmo local no qual foi colocado um pequeno alto-falante. O teste de sua efetividade para produzir discriminações foi conduzido a partir de um procedimento de discriminação simples sucessiva entre um som contínuo e um som intermitente. Os resultados do presente estudo demonstraram a efetividade do equipamento analisado para estabelecer discriminações simples sucessivas em ratos. Futuros estudos poderão avaliar a efetividade do equipamento para estabelecer discriminações mais complexas.

Palavras-chave: Infravermelho, Focinhar, Rato.


ABSTRACT

The present study describes a low cost infrared device developed to establish rats' nose poking responses. The infrared device was easily adapted to operant chamber and detected nose poking responses that were emitted in the same location as used for the antecedent stimuli. Acquisition of a simple successive discrimination between one intermittent sound and one continuous sound was analyzed using this device. The results suggested that the infrared device was an effective operandum for establishing auditory simple successive discriminations in rats. Future studies should verify if discriminations that are more complex could be established in rats with this kind of device.

Keywords: Infrared, Nose poking, Rat.


 

 

Experimentos delineados para estudar o desenvolvimento de discriminação (simples ou condicional) em ratos geralmente utilizam barras de resposta que são acopladas à caixa de condicionamento em locais diferentes daqueles em que os estímulos, tais como luzes e sons, são apresentados. Esta disposição dos estímulos e do manipulando pode acabar dificultando o estabelecimento de discriminações (e.g., Dube, Callahan & McIlvane, 1993). Numa das poucas tentativas bem-sucedidas de estabelecer discriminações condicionais em ratos, Iversen (1993) utilizou um equipamento que automaticamente detectava respostas de focinhar emitidas com 1 N de força em uma chave de respostas. O que é digno de nota é o fato de o equipamento utilizado por Iversen permitir que as respostas de focinhar fossem emitidas na mesma localização que os estímulos empregados.

O presente estudo analisa a possibilidade de um equipamento com infravermelho de baixo custo permitir o estabelecimento de discriminações sucessivas simples utilizando estímu-los sonoros (sons contínuos e intermitentes). Diferentemente do equipamento utilizado por Iversen (1993, 1997), o equipamento desenvolvido automaticamente detectava respostas de focinhar quando estas interrompiam um feixe de infravermelho.

Além de o equipamento analisado permitir que respostas sejam emitidas na mesma localização que o suposto estímulo discriminativo e permitir que as respostas de focinhar sejam detectadas automaticamente pelo computador sem a necessidade do rato empregar 1N de força, ele apresenta um custo baixo (média de R$ 30,00 ou US$ 13,00) se comparado aos equipamentos similares existentes.

O equipamento consiste numa caixa retangular de acrílico (medindo 4 cm de profundidade, 7 cm altura e 5 cm de largura) na qual o animal podia introduzir o focinho. Essa caixa foi posicionada 7 cm acima do piso da caixa de condicionamento. O módulo emissor de infravermelho foi colocado num orifício na parte superior da caixa de acrílico e o módulo-receptor em um orifício na parte inferior de caixa de acrílico. Dessa forma, a resposta de focinhar emitida dentro da caixa de acrílico interrompia o feixe de infravermelho produzido por esses módulos e podia ser automaticamente detectada e registrada pelo computador ao qual os módulos foram conectados (ver Figura 1). Um alto-falante pequeno foi acoplado no fundo da caixa de acrílico.

 

 

Para verificar o funcionamento e a adequação do aparelho proposto, um experimento de discriminação simples foi conduzido, e está relatado abaixo.

 

Método

Sujeitos

Um rato McCowley macho e ingênuo (sujeito 82) foi privado de comida até atingir 85% de seu peso ad lib. Ele tinha 3 meses de idade no início do experimento e foi mantido em uma gaiola-viveiro individual ao longo de todo o experimento. O acesso à água era irrestrito.

Equipamento

Foi utilizada uma caixa de condicionamento operante fabricada pela Med Associates, mo-delo Env-008. Essa caixa foi colocada dentro de uma caixa de isolamento acústico equipada com um ventilador.

Numa das paredes da caixa de condicionamento foi acoplado o infravermelho já com o alto-falante instalado. Um som intermitente com intervalo de 0.1s ou um som contínuo podiam ser independentemente ligados nesse alto-falante. A freqüência dos sons era de aproximadamente 4.000 Hz e a altura era de 80 dB.

Um dispensador de comida foi acoplado à caixa de condicionamento na parede oposta à parede com o infravermelho, 7 cm acima do chão da caixa de condicionamento, e liberava pelotas de comida de 45 mg (Standard Noyes 45-mg).

Um computador IBM 486 controlava a apresentação dos estímulos e registrava as respostas do sujeito utilizando o programa MED-PC for Windows.

Procedimento

Fase I. Depois da liberação de 10 pelotas de comida no comedouro, imediatamente seguidas pela movimentação do rato em direção a ele e o consumo das pelotas, as respostas de focinhar no infravermelho foram modeladas. Após a modelagem, cada resposta de focinhar foi seguida de comida e o som permanecia desligado. A Fase I foi finalizada após 100 respostas de focinhar terem sido emitidas.

Fase II. O som contínuo foi apresentado por períodos de 30 segundos. Cada apresentação foi separada por um intervalo entre tentativas (IET) de 10 segundos no qual o som ficava desligado. Respostas de focinhar durante os intervalos com o som ligado foram seguidas de comida a partir de um esquema de razão fixa (FR2, FR3, e FR4) por três sessões consecutivas.

Fase III. Foi conduzido um treino de discriminação simples sucessiva entre um som contínuo e um som intermitente. Cada um desses estímulos foi randomicamente apresentado por 25 vezes em cada sessão. Cada apresentação durava 30 segundos e foi seguida por um IET de 10 segundos no qual os sons foram desligados. O mesmo estímulo não foi apresentado por mais do que três vezes consecutivas. Respostas durante a apresentação do som contínuo foram reforçadas a partir de um esquema VI8s, e respostas durante a apresentação do som intermitente, além de não serem reforçadas, reiniciavam o intervalo de apresentação desse som. A Fase III foi finalizada quando 90% ou mais do total de respostas na presença de ambos os sons foram emitidas na presença do som contínuo, em cada uma de três sessões consecutivas. Cada sessão teve 60 minutos e foi conduzida uma vez por dia.

 

Resultados

A Figura 2 mostra a porcentagem de respostas em presença do estímulo associado ao reforçamento (consideradas como acertos), calculada tomando-se o total de respostas na presença do som contínuo dividido pelo total de respostas na presença de ambos os sons para todas as sessões da Fase III.

 

 

Na primeira sessão, o sujeito apresentou 41% de respostas corretas. A porcentagem abaixo do nível do acaso pode se dever ao procedimento de reiniciar o intervalo da apresentação do som intermitente quando uma resposta fosse emitida diante deste som, até que o sujeito ficasse 30 segundos sem emitir respostas. Isto acabava por aumentar o tempo de exposição ao som intermitente e, portanto, aumentava a chance de um maior número de respostas ocorrer na presença deste som.

A porcentagem de acertos foi gradualmente aumentando com pequenas oscilações até atingir o critério de acertos na 18ª sessão.

 

Discussão

O equipamento com infravermelho mostrou-se efetivo para estabelecer discriminação simples sucessiva entre sons.

Considerando que Iversen (1993, 1997) estabeleceu apenas discriminações condicionais e não discriminações condicionais emergentes, futuros estudos poderão utilizar o equipamento proposto para investigar a possibilidade de se estabelecerem repertórios mais complexos. Discriminações complexas talvez possam ser mais facilmente estabelecidas com este equipamento de infravermelho, uma vez que ele torna possível a ocorrência de respostas na mesma localização que os supostos estímulos discriminativos. Futuros estudos com procedimentos de discriminação condicional comparando os efeitos de utilizar o equipamento ora analisado e barra como manipulando, poderiam avaliar esta possibilidade.

Outra característica importante do equipamento analisado, que pode ser uma vantagem em relação ao utilizado por Iversen (1993; 1997), é que ele não requer força de 1N para que a resposta seja detectada.

Digno de destaque é que a topografia da resposta operante de focinhar estabelecida pelo equipamento analisado tem maior similaridade em relação às topografias das respostas freqüentemente observadas no repertório de ratos. Focinhar seria uma resposta mais natural do que outras (tais como empurrar uma chave com o focinho, pressionar uma barra, puxar um trapézio, etc.) por ser mais semelhante às respostas de farejar do rato.

Além disso, a topografia da resposta de focinhar para ratos também é mais semelhante em termos de dificuldade à resposta de bicar para pombos ou de pressionar uma chave para macacos e humanos, o que facilitaria comparações entre espécies em futuros estudos.

Por fim, o infravermelho é facilmente adaptado aos equipamentos utilizados com a caixa de condicionamento operante e permite registro automático da resposta. Tudo isso por um custo bem menor do que qualquer outro equipamento disponível para este fim, o que o torna uma opção mais viável aos padrões brasileiros.

 

 

Referências

Dube, W. V., Callahan, T. D. & McIlvane, W.J. (1993). Serial reversals of concurrent auditory discriminations in rats. The Psychological Record, 43, 429-440.         [ Links ]

Iversen, I.H. (1993). Acquisition of matching-to-sample performance in rats using visual stimuli on nose keys. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 59, 471-482.         [ Links ]

Iversen, I.H. (1997). Matching-to-sample performance in rats: a case of mistaken identity?. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 68, 27 45.         [ Links ]

 

 

Recebido em: 05/09/05
Aceito em: 17/10/05

 

 

1 Esta pesquisa faz parte da dissertação de mestrado da primeira autora e foi financiada pela FAPESP. As autoras agradecem a David A. Eckerman pelas sugestões e pela cuidadosa revisão final deste trabalho.
2 E-mail: pdebert@uol.com.br