SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.11 número1Alterações ambientais independentes da reposta e sua interação com o relato verbalO que se faz e o que se diz: auto-relatos emitidos por terapeutas comportamentais índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

versión impresa ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.11 no.1 São Paulo jun. 2009

 

ARTIGOS

 

Efeitos de diferentes contingências sobre o uso de tempos verbais na construção de frases1

 

Effects of different contingencies on the use of verbal tenses in sentence making

 

 

Eliana Isabel de Moraes Hamasaki; Gerson Yukio Tomanari2

Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Foram investigados efeitos de ganho e perda de pontos sobre a utilização de tempos verbais na construção de frases. Por meio do aplicativo VERBAL 2.0 (Tomanari, Matos, Pavão, & Benassi, 1990), 101 estudantes foram submetidos a uma tarefa na qual construíam frases utilizando seis possíveis tempos verbais. Na fase experimental, em diferentes grupos de participantes, o uso do Pretérito Imperfeito ou Futuro do Presente foi conseqüenciado por ganho (maior vs. menor), manutenção ou perda (maior vs. menor) de pontos em relação à conseqüência alternativa produzida pelo uso de qualquer um dos demais cinco tempos verbais. Resultados mostraram um aumento na freqüência do uso dos tempos verbais selecionados para reforçamento, demonstrando, assim, o controle operante sobre o uso destes na construção de frases. Pares distintos de contingências (ganho ou perda vs. manutenção de pontos) produziram efeitos reforçadores mais acentuados do que pares similares (ganho ou perda maior vs. menor de pontos), especialmente no uso do Futuro do Presente. Por meio do procedimento proposto, torna-se possível a investigação sistemática dos efeitos de contingências potencialmente aversivas sobre o comportamento verbal humano.

Palavras-chave: Comportamento verbal, Controle pelas conseqüências, Tempos verbais, Humanos.


ABSTRACT

The present study aimed to investigate the effects of earning and losing points contingent on the use of verbal tenses in sentence construction. In the experiment, 101 students were exposed to a computerized task in which sentences were constructed by selecting one of six different verbal tenses. In the experimental phase, and in different participant groups, the use of either Imperfect Past or Future was followed by the maintenance of points, the earning of a higher vs. a lower number of points, or the loss of a higher vs. a lower number of points relative to the use of any of the other five available verbal tenses. Results showed that the contingencies involving earning points (vs. the maintenance of points) and maintenance of points (vs. loss of points) generally produced greater reinforcing effects on the use of verbal tenses than the contingencies involving earning and losing points with higher vs. lower magnitude, particularly with respect to the Future tense. The present procedure describes alternative methods of investigating the effects of potentially aversive contingencies on human verbal behavior.

Keywords: Verbal behavior, Control by consequences, Verb tenses, Humans.


 

 

A relação entre o comportamento verbal e suas conseqüências tem sido estudada teoricamente por Skinner (1957/1978), assim como empiricamente por investigadores que se dedicaram inicialmente a esse tema na década de 1950 (Greenspoon, 1955; Isaacs, Thomas, & Goldiamond, 1960; Krasner, 1958; Taffel, 1955; Wilson & Verplank, 1956).

Mais recentemente, a análise de variáveis que compreendem a natureza operante do comportamento verbal tem se dado em diferentes contextos de pesquisa (c.f., Passos, 2004; Sundberg, 1998), seja em atuações clínicas (por exemplo, Britto, Rodrigues, Santos, & Ribeiro, 2006; Donadone & Meyer, 2005; Silva & Banaco, 2000; Zamignani & Andery, 2005), seja em laboratórios experimentais (por exemplo, Catania, Matthews, & Shimoff, 1982; Hayes, Brownstein, Zettle, Rosenfarb, & Korn, 1986).

No contexto de ensino de Análise do Comportamento, Matos, Cirino, Passos, Damiani e Frochtengarten (1995), Hamasaki e Tomanari (2007) e Tomanari, Carvalho, Góes, Lira e Viana (2007) propuseram estudos no laboratório didático para demonstrar os efeitos do reforçamento diferencial sobre o uso de pronomes na construção de frases por estudantes universitários. A tarefa experimental proposta por Tomanari et al. (2007) consistiu na construção de 72 frases na tela de um computador. Para cada frase, um verbo era apresentado. Diante desse verbo, os participantes escolhiam inicialmente um pronome dentre seis opções existentes em um menu [(Eu, Tu, Ele(a), Nós, Vós, Eles(as)]. Na seqüência, escolhiam um tempo verbal e um complemento, cada qual igualmente dentre seis diferentes opções. As 12 frases iniciais serviam como linha de base sem qualquer conseqüência diferencial programada. Na condição experimental que se seguia, os participantes construíam 60 frases sob a vigência de reforçamento diferencial aplicado ao uso do pronome Ele(a) (vs. os demais cinco pronomes) ou Nós (vs. os demais cinco pronomes), em dois grupos distintos de participantes. O uso do pronome selecionado para reforçamento era seguido por ganho de pontos (vs. manutenção de pontos) ou manutenção de pontos (vs. perda de pontos), em diferentes grupos de participantes. Em linhas gerais, Tomanari et al. (2007) constataram que, durante a linha de base, todos os seis pronomes [Eu, Tu, Ele(a), Nós, Vós, Eles(as)] eram utilizados em freqüências relativamente próximas entre si. Na condição experimental, houve um aumento acentuado no uso do pronome selecionado para reforçamento, Ele(a) ou Nós, a depender do grupo de sujeitos. Esse aumento foi gradual, sistemático e em freqüência média mais elevada sob a condição que envolvia perda de pontos, em contraste à condição que envolvia ganho de pontos.

Os resultados de Tomanari et al. (2007) sugerem uma maior efetividade das contingências aversivas (vs. positivas) sobre o reforçamento do uso dos pronomes. Entretanto, interpretações nesse sentido requerem cautela, tendo em vista uma diferença metodológica destacada pelos autores. Nesse estudo, as conseqüências de ganho e perda de pontos eram seguidas pelo número de pontos ganhos ou perdidos (por exemplo, 1 ou 10), precedido do sinal de adição (“+”, no caso de ganho) ou de subtração (“-”, no caso de perda), ambos piscando e ocupando a tela do monitor por 1,5 s, ao fim do qual o contador geral de pontos era apresentado. A manutenção de pontos, quando da vigência das contingências de perda de pontos, foi programada exatamente dessa mesma forma, exibindo-se o algarismo "0" (zero) sem qualquer sinal. Entretanto, de forma distinta, quando da vigência das contingências de ganho de pontos, a manutenção de pontos foi programada como um timeout de 1,5 s durante o qual a tela permanecia escura. Essa diferença na forma de apresentação das conseqüências, em particular da condição de manutenção de pontos, ainda que aparentemente sutil, pode ter sido potencialmente responsável, nesse estudo, pelos efeitos mais acentuados das contingências de perdas (vs. ganho) de pontos sobre o uso dos pronomes.

A despeito das variáveis que precisam ser investigadas mais detalhadamente, os resultados de Tomanari et al. (2007) alinham-se a dados da literatura que indicam a possibilidade de que perdas de pontos exerçam maior impacto sobre o comportamento reforçado do que ganhos de igual valor (Critchfield & Magoon, 2001; Critchfield, Paletz, MacAleese, & Newland, 2003; Ruddle, Bradshaw, & Szabadi, 1981; Ruddle, Bradshaw, Szabadi, & Foster, 1982). Trata-se de uma linha de investigação repleta de entraves metodológicos, pois a análise experimental dos efeitos das conseqüências reforçadoras e aversivas supostamente comparáveis entre si sobre o comportamento dos organismos requer o controle de uma série de variáveis, dentre as quais a natureza das mesmas. Em experimentos com infra-humanos, por exemplo, como comparar os efeitos de um choque e uma pelota de ração sobre o comportamento de pressionar a barra que o evita ou a produz, respectivamente? Em humanos, Tomanari et al. (2007) e Hamasaki e Tomanari (2007) apresentam uma proposta metodológica em que ganhos e perdas de pontos atuam como conseqüências que estabelecem contingências de reforçamento e punição. Nessa situação, tornam-se mais diretamente comparáveis às condições experimentais que permitiriam a análise empírica das proposições teóricas que consideram assimétricos os efeitos de eventos negativos e positivos equiparáveis (Critchfield & Magoon, 2001; Kahneman & Tversky, 1979; Taylor, 1991).

Por essa razão, em relação à investigação conduzida por Tomanari et al. (2007), Hamasaki e Tomanari (2007) ampliaram o controle das variáveis que permitiriam avaliar os efeitos de contingências de ganho e perda de pontos sobre o uso de pronomes na construção de frases. Nesse trabalho, a metodologia básica empregada por Tomanari et al. (2007) foi mantida, porém passaram a fazer parte do delineamento dois pares adicionais de contingências, o de ganho maior vs. menor de pontos e o de perda menor vs. maior de pontos. Por exemplo: 1) o uso do pronome selecionado [Ele(a) ou Nós] foi seguido pelo ganho de 10 pontos (ganho maior), enquanto o uso de qualquer outro pronome (diferente do selecionado) foi seguido pelo ganho de 1 ponto (ganho menor); ou 2) o uso do pronome selecionado foi seguido pela perda de 1 ponto (perda menor), enquanto o uso de qualquer outro pronome foi seguido pela perda de 10 pontos (perda maior). Com relação a esses pares adicionais de contingências, os resultados mostraram sistematicamente uma freqüência maior do uso do pronome que produzia o ganho maior (vs. ganho menor) ou a perda menor (vs. perda maior) de pontos, tanto com relação ao uso do pronome Ele(a) quanto do pronome Nós.

Adicionalmente, Hamasaki e Tomanari (2007) eqüalizaram as conseqüências programadas para todas as condições experimentais. Ao eqüalizarem as conseqüências de manutenção de pontos por meio da utilização de timeout nestes dois grupos de exclusivamente ganhos (uso do pronome selecionado produzindo a conseqüência “+10” e o uso dos demais pronomes produzindo o timeout) e de exclusivamente perdas (uso do pronome selecionado produzindo o timeout e, portanto a manutenção dos pontos disponibilizados ao início da fase de reforçamento, e o uso dos demais pronomes produzindo a conseqüência “- 10”), Hamasaki e Tomanari (2007) observaram uma freqüência média mais elevada de uso dos pronomes reforçados sob as condições que envolviam ganho de pontos relativamente às condições que envolviam perda de pontos.

Por apresentarem resultados distintos àqueles obtidos por Tomanari et al. (2007) no que diz respeito à efetividade das diferentes contingências de reforçamento sobre o uso de pronomes, o presente estudo buscou verificar e estender os resultados de Hamasaki e Tomanari (2007) a uma nova resposta verbal. Para isso, no lugar dos pronomes, tomou-se o uso de diferentes tempos verbais como operante. De que modo contingências de reforçamento e punição alteram a forma como as pessoas se expressam temporalmente, construindo frases no futuro ou no passado?

 

Método

Participantes

Participaram como sujeitos 101 estudantes matriculados no primeiro semestre do curso de psicologia de uma universidade da Grande São Paulo. A execução do experimento ocorreu antes que estes estudantes tivessem entrado em contato com conceitos da Análise Experimental do Comportamento, especialmente com o conceito de controle pelas conseqüências, assim como qualquer outra prática de laboratório. Todos os estudantes aceitaram participar voluntariamente da tarefa que só foi iniciada após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por cada um dos estudantes.

Equipamento e Situação Experimental

Foi utilizado o programa VERBAL 2.0 (Tomanari, Matos, Pavão & Benassi, 1999), instalado em microcomputadores tipo IBM-PC equipados com monitores coloridos de 14 polegadas e mouse. O experimento foi realizado no laboratório de informática da própria universidade. O laboratório era uma sala que contava com 30 microcomputadores que ficavam sobre bancadas dispostas em duas fileiras, separadas por um corredor. Na sala com os participantes, estavam a experimentadora, três alunos do quinto semestre do curso de Psicologia (auxiliares voluntários) e um monitor responsável pelo laboratório de informática.

Procedimento

A coleta ocorreu coletivamente em uma única sessão experimental. Quatro sessões idênticas de coleta foram realizadas, uma para cada grupo de 25 ou 26 alunos. Na sala, cada participante ficou sentado frente a um microcomputador sobre uma bancada individual.

A instrução para a tarefa, que era exibida na própria tela do monitor, indicava que seria apresentada uma seqüência de verbos no infinitivo e que a tarefa consistia da construção de frases empregando os seguintes elementos: 1) pronome; 2) verbo e 3) possível complemento. Para a finalização de cada frase construída, exigia-se a resposta do participante de clicar utilizando o mouse sobre um botão com a inscrição “Confirma” também na própria tela. Ao final da instrução, havia referência à pontuação que poderia ser acumulada pelo participante.

A tarefa experimental consistiu da apresentação sucessiva de 72 verbos no infinitivo, para que cada um dos participantes construissem uma frase. Cada um dos verbos apresentava-se na parte central da tela do computador, imediatamente abaixo do verbo e alinhadas horizontalmente, três listas do tipo drop-down correspondiam, da esquerda para a direita na tela, à lista referente: aos pronomes; aos tempos verbais e ao complemento. E, finalmente, na parte inferior da tela do computador, havia um botão com a palavra “Confirma”.

Para a construção de cada uma das frases que fizeram parte da tarefa experimental, o participante deveria escolher: 1º) um pronome [de uma lista com os seis pronomes do caso reto: Eu; Tu; Ele(a); Nós; Vós e Eles(as)]; 2º) um dos seis tempos verbais da lista (Presente; Pretérito Imperfeito; Gerúndio; Particípio Passado; Futuro do Presente e Futuro do Pretérito) já devidamente conjugado de acordo com a escolha anterior feita pelo participante do pronome, impossibilitando assim qualquer erro gramatical do participante; e 3º) uma alternativa de complemento para a frase (a partir de uma seleção de advérbios e adjetivos em cinco das opções e uma opção com a alternativa “sem complemento”). Para a conclusão da frase, exigia-se a resposta de clicar com o mouse sobre o botão “Confirma” e um novo verbo no infinitivo era apresentado na tela do computador e uma nova frase deveria ser construída até a conclusão da 72ª frase.

As 12 primeiras frases avaliavam o uso dos tempos verbais em nível operante. As 60 frases seguintes eram acompanhadas de conseqüências diferenciais. Estabeleceu-se, para cada participante, um único tempo verbal para a conseqüência diferencial: Pretérito Imperfeito ou Futuro do Presente (P ou F, respectivamente). Esses dois tempos verbais foram selecionados em função do fato de serem utilizados medianamente, com relação aos demais, segundo os dados de linha de base de Hamasaki e Tomanari (2007). Incluindo os tempos verbais selecionados (sublinhados), fizeram parte da lista disponível para a escolha dos participantes, os tempos verbais:

• Presente (por exemplo, Nós cantamos)

• Pretérito Imperfeito (por exemplo, Nós cantávamos)

• Gerúndio [conjugado com o verbo auxiliar estar] (por exemplo, Nós estamos cantando)

• Particípio Passado [conjugado com o verbo auxiliar haver] (por exemplo, Nós havíamos cantado)

• Futuro do Presente (por exemplo, Nós cantaremos)

• Futuro do Pretérito (por exemplo, Nós cantaríamos)

Os sujeitos foram distribuídos em quatro grupos, conforme mostra a Tabela 1, que sumariza as conseqüências programadas para a utilização tanto do tempo verbal selecionado para o fortalecimento, quanto para a utilização dos tempos verbais diferentes do selecionado para fortalecimento, de acordo com os quatro pares de contingências programadas. Basicamente, durante a fase de reforçamento (apresentação de 60 verbos), o computador aplicava as conseqüências diferenciais da seguinte maneira:

• Para os 28 participantes do grupo submetido às contingências de ganho/manutenção (grupo GX), o contador marcava, inicialmente, zero ponto; o uso do tempo verbal selecionado era seguido por ganho de 10 pontos: o sinal de adição e o número 10 na cor verde (+10) piscando três vezes na tela de fundo branco durante 1,5 s; e o uso de qualquer um dos demais cinco tempos verbais era seguido por zero ponto: a tela de fundo branco não exibia qualquer sinal ou número durante 1,5s (timeout).

• Para os 25 participantes do grupo submetido às contingências de manutenção/perda (grupo PX), o contador marcava, inicialmente, 600 pontos; o uso do tempo verbal selecionado era seguido por zero ponto: a tela de fundo branco não exibia qualquer sinal ou número durante 1,5 s (timeout); e o uso de qualquer um dos demais cinco tempos verbais era seguido pela perda de 10 pontos: o sinal de subtração e o número 10 na cor vermelha (-10) piscando três vezes na tela de fundo branco durante 1,5 s.

• Para os 25 participantes do grupo submetido às contingências de ganho maior/ganho menor (grupo GG), o contador marcava, inicialmente, zero ponto; o uso do tempo verbal selecionado era seguido por ganho de 10 pontos: o sinal de adição e o número 10 na cor verde (+10) piscando três vezes na tela de fundo branco durante 1,5 s; e o uso de qualquer um dos demais cinco tempos verbais era seguido pelo acréscimo de 1 ponto: o sinal de adição e o número 1 na cor vermelha (+1) piscando três vezes na tela de fundo branco durante 1,5 s.

• Pos 23 participantes do grupo submetido às contingências de perda menor/perda maior (grupo PP), o contador marcava, inicialmente, 600 pontos; o uso do tempo verbal selecionado era seguido pela perda de 1 ponto: o sinal de subtração e o número 1 (-1) na cor verde piscando três vezes na tela de fundo branco durante 1,5 s; e o uso de qualquer um dos demais cinco tempos verbais era seguido pela perda de 10 pontos: o sinal de subtração e o número 10 (-10) na cor vermelha piscando três vezes na tela de fundo branco durante 1,5 s.

 

 

 

Resultados

A Figura 1 apresenta o percentual médio de utilização dos tempos verbais Futuro do Presente e Pretérito Imperfeito, representados pelas letras F e P, nos grupos submetidos aos diferentes pares de contingências (GX; GG; PX e PP), tanto na fase de linha de base (LB, composta por 12 frases) quanto no último bloco de frases construídas na fase de reforçamento (REF, composta também de 12 frases).

A Figura 1 permite observar que, de maneira geral, houve aumento sistemático na utilização dos tempos verbais Futuro do Presente e Pretérito Imperfeito em todos os pares de contingências na fase de reforçamento comparada às respectivas linhas de base.

No último bloco da fase de reforçamento, os maiores percentuais de uso do Futuro do Presente ocorreram para os grupos F-GX e F-PX, nos quais, respectivamente, 68,3% e 63,9% das frases foram construídas neste tempo verbal. Ou seja, os grupos submetidos aos pares de contingências de ganho de pontos vs. manutenção (GX) e manutenção vs. perda de pontos (PX). Os grupos que apresentaram os menores percentuais de uso deste tempo verbal foram o F-PP (43,5%) e o F-GG (49,3%). Segundo sugerem os dados relativos ao Futuro de Presente, houve efeitos diferenciados entre os pares de contingências que envolviam as mesmas contingências (i.e., perda e ganho maior vs. menor) daqueles que envolviam contingências distintas entre si (i..e, perda e ganho vs. manutenção de pontos), tendo sido estas últimas acompanhadas de efeitos mais acentuados.

 

 

No que diz respeito ao uso do Pretérito Imperfeito, o grupo P-GG obteve o maior percentual de utilização deste tempo verbal no último bloco da fase de reforçamento (30,8%). O menor percentual de uso desse tempo selecionado foi 19,9% pelo grupo P-GX. Diferentemente dos efeitos observados com relação uso do Futuro do Presente, os efeitos dos diferentes pares de contingências sobre o uso do Pretérito Imperfeito não foram tão acentuados em relação à linha de base e praticamente não se diferenciaram nos diferentes grupos.

A Figura 2 possibilita analisar o percentual médio de utilização dos tempos verbais Pretérito Imperfeito e Futuro do Presente ao longo dos seis blocos de 12 frases que compuseram toda a sessão experimental. São mostrados todos os quatro grupos experimentais, sendo o painel à esquerda referente aos grupos que tiveram o Futuro do Presente como o selecionado e o painel à direita referente aos grupos que tiveram o Pretérito Imperfeito como o selecionado.

 

 

Comparativamente ao uso do Futuro do Presente em linha de base, todos os grupos que tiveram este como o tempo verbal selecionado para fortalecimento revelaram um aumento gradual e sistemático no uso deste ao longo da exposição às contingências diferenciais. A partir do Bloco 2 da Fase de Reforçamento, as frases construídas no Futuro do Presente constituíam acima de um terço de todas as frases. No Bloco 5, observam-se freqüências de uso deste tempo verbal acima de 40% (43,5%, no FPP e 49,3%, no F-GG) e acima de 60% (63,9%, no F-PX e 68,3% no F-GX).

Em comparação ao Futuro do Presente, o uso do Pretérito Imperfeito revelou efeitos menos marcantes em relação à linha de base e indistintos com relação aos diferentes pares de contingências. Ao longo dos blocos de frases, o aumento na freqüência de uso deste tempo verbal foi lento e sutil, tendo chegado ao máximo de 30,8% no grupo submetido às contingências de ganho maior/ganho menor (grupo P-GG).

 

Discussão

O objetivo do presente estudo foi investigar os efeitos do emprego de conseqüências diferenciais sobre o uso de um tempo verbal, o Pretérito Imperfeito ou o Futuro do Presente, em diferentes grupos de participantes. De maneira geral, o foco principal dessa investigação foi demonstrar, assim como se fez com pronomes (Hamasaki & Tomanari, 2007; Tomanari et al., 2007), o controle operante do uso de tempos verbais em construções lingüísticas. Particularmente, a manipulação experimental de diferentes pares combinados de contingências de ganho, perda e manutenção de pontos (i.e., ganho vs. manutenção; perda vs. manutenção; ganho maior vs. ganho menor; perda menor vs. perda maior) permitiu analisá-las e compará-las quanto aos seus efeitos reforçadores.

Os resultados mostraram que os quatro pares de contingências, independentemente de envolverem ganho ou perda de pontos, produziram aumento na freqüência da utilização dos tempos verbais selecionados para reforçamento. Sob condições experimentais idênticas, o uso do Futuro do Presente foi claramente mais fortalecido do que o Pretérito Imperfeito. No mesmo sentido, foi mais fortalecido o uso do Futuro do Presente quando estavam em vigor pares distintos de contingências (i.e., perda ou ganho vs. manutenção de pontos), comparativamente a pares semelhantes (i.e., ganho ou perda maior vs. menor).

Uma característica do procedimento utilizado diz respeito ao fato de que o uso dos tempos verbais é analisado em uma situação de escolha forçada de um tempo verbal dentre seis disponíveis. Nesse contexto, a freqüência aumentada de um tempo verbal específico é função, tanto das conseqüências associadas ao mesmo, quanto das conseqüências associadas aos demais tempos verbais que compõem o rol de escolhas possíveis. De certa forma, seria uma situação análoga de escolha. Nesse caso, consideremos, por exemplo, o fortalecimento do Futuro de Presente cujo uso era seguido pela adição de 10 pontos enquanto o uso de qualquer outro tempo verbal apenas mantinha os pontos acumulados. A escolha por este tempo verbal esteve possivelmente não apenas sob controle do ganho de pontos como também pela esquiva da manutenção de pontos. Nesse mesmo sentido, tomandose agora o par de contingências que envolvia ganho maior ou menor de pontos, seria possível interpretar que, as contingências programadas tenham sido exclusivamente de ganhos, o ganho maior pode ter atuado como reforçador positivo, enquanto os ganhos menores podem ter atuado como punidores e, assim, contribuído para o aumento do uso do Futuro do Presente por reforçamento negativo (esquiva). O par que envolve perda menor vs. maior de pontos torna esse exercício de interpretação mais interessante e contraintuitivo. Nesse caso, o aumento do uso do Futuro do Presente seria a resultante do reforçamento negativo decorrente de evitar, por meio do uso do tempo verbal associado com a perda menor de pontos, a punição por uma perda maior de pontos que ocorreria se outros tempos verbais fossem escolhidos. Ainda que tenhamos programado punição ao uso do Futuro do Presente, o contexto de escolha forçada propiciou o aumento na sua freqüência e, a despeito da ausência de uma análise completa do conjunto das contingências envolvidas, é possível a consideração de que a perda menor de pontos exerceu função reforçadora. Entendendo esses dados como produto de uma tarefa na qual vigorou, de certa forma, um esquema concorrente de escolha forçada (Catania & Sagvolden, 1980), pode-se considerar que o participante demonstrou preferência pela alternativa que produzia a conseqüência “menos punitiva” em detrimento às alternativas que produziam as conseqüências “mais punitivas”.

Um dos dados do presente estudo refere-se aos efeitos menos acentuados dos quatro pares de contingências sobre o uso do Pretérito Imperfeito comparativamente ao Futuro do Presente. É bem possível que o uso destes tempos verbais esteja refletindo a história préexperimental dos participantes no contexto da comunidade verbal em que os participantes se inserem. Por exemplo, Tomanari et al. (2007), Hamasaki e Tomanari (2007) e Matos et al. (1995) mostraram que a distribuição de uso dos pronomes em linha de base mantém-se praticamente inalterada durante a vigência de conseqüências diferenciais, exceto pelo aumento do uso dos pronomes cujo uso fora reforçado. Nesses estudos, realizados em Salvador (Tomanari et al., 2007) e São Paulo (Hamasaki & Tomanari, 2007; Matos et al., 1995), os pronomes Eu e Nós tendem a ser usados mais freqüentemente do que Tu e Vós. Em outras regiões, possivelmente, características próprias da comunidade verbal local poderiam alterar esses padrões.

No que diz respeito à comparação dos efeitos de perdas e ganhos de igual valor sobre o uso dos tempos verbais, os dados do presente estudo replicam Hamasaki e Tomanari (2007). Dentro dos parâmetros empregados por ambos, o aumento no uso de determinados pronomes e tempos verbais foram muito semelhantes, tanto sob contingências de perda quanto de ganho de pontos. Segundo esses resultados, as proposições hipotéticas de que eventos negativos e positivos equiparáveis teriam efeitos assimétricos sobre o comportamento dos organismos não se confirmam (Critchfield & Magoon, 2001; Kahneman & Tversky, 1979; Taylor, 1991). Os dados de Tomanari et al. (2007) dariam suporte empírico a estas hipóteses, não fosse a demonstração de que variáveis de procedimento podem ter exercido um papel relevante para a maior efetividade das contingências de perda (comparativamente às de ganho) de pontos para o aumento no uso de pronomes. Trabalhos futuros poderiam manipular novas combinações de contingências de perda e ganho de pontos (por exemplo, ganho vs. perda) de modo a ampliar o mapa dos seus efeitos e interações. A análise sistemática de variáveis relacionadas aos padrões lingüísticos de uma determinada comunidade verbal poderia, nesse contexto, trazer relevantes contribuições.

 

Referências Bibliográficas

Britto, I. A. G. S., Rodrigues, M. C. A., Santos, D. C. O., & Ribeiro, M. A. (2006). Reforçamento diferencial de comportamentos verbais alternativos de um esquizofrênico. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 8(1), 73- 84.         [ Links ]

Catania, A. C., & Sagvolden, T. (1980). Preference for free choice over forced choice in pigeons. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 34(1), 77-86.         [ Links ]

Catania, A. C., Mathews, B. A., & Shimoff, E. (1982). Instructed versus shaped human verbal behavior: Interactions with nonverbal responding. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 38(3), 233-248.         [ Links ]

Critchfield, T. S., & Magoon, M. A. (2001). On the differential impact of positive and negative reinforcement. Experimental Analysis of Human Behavior Bulletin, 19, 16-18.         [ Links ]

Critchfield, T. S., Paletz, E. M., MacAleese, K. R., & Newland, M. C. (2003). Punishment in human choice: Direct or competitive suppression? Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 80(1), 1-27.         [ Links ]

Donadone, J. C., & Meyer, S. B. (2005). Orientação e auto-orientação em atendimentos de terapeutas analítico-comportamentais experientes e pouco experientes. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 8(2), 219-229.         [ Links ]

Greenspoon, J. (1955). The reinforcing effect of two spoken sounds on the frequency of two responses. American Journal of Psychology, 68, 409-416.         [ Links ]

Hamasaki, E. I. M., & Tomanari, G. Y. (2007). Efeitos de diferentes pares de contingências sobre o uso de pronomes na construção de frases. Encontro: Revista de Psicologia, 12(13), 31-51.         [ Links ]

Hayes, S. C., Brownstein, A. J., Zettle, R. D., Rosenfarb, R., & Korn, Z. (1986). Rulegoverned behavior and sensitivity to changing consequences of responding. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 45(3), 237-256.         [ Links ]

Isaacs, W., Thomas, J., & Goldiamond, I. (1960). Application of operant conditioning to reinstate verbal behavior in psychotics. The Journal of speech and hearing disorders, 25, 8-12.         [ Links ]

Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect theory: An analysis of decisions under risk. Econometrica, 47, 263-291.         [ Links ]

Krasner, L. (1958). Studies of the conditioning of verbal behavior. Psychological Bulletin, 55, 148-170.         [ Links ]

Matos, M. A., Cirino, S., Passos, M. L., Damiani, K., & Frochtengarten, F. (1995). O comportamento verbal como operante: Uma experiência didática. Resumos de Comunicações Científicas - Sociedade Brasileira de Psicologia, 5, 461.         [ Links ]

Passos, M. L. R. F. (2004). Bloomfield e Skinner: Língua e comportamento verbal. Rio de Janeiro: NAU Editora.         [ Links ]

Ruddle, H. V., Bradshaw, C. M., & Szabadi, E. (1981). Performance of humans in variableinterval avoidance schedules programmed singly, and concurrently with variableinterval schedules of positive reinforcement. Quarterly Journal of Experimental Psychology, 33(B), 213-226.         [ Links ]

Ruddle, H. V., Bradshaw, C. M., Szabadi, E., & Foster, T. M. (1982). Performance of humans in concurrent avoidance/positive-reinforcement schedules. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 38(1), 51-61.         [ Links ]

Skinner, B. F. (1978). O comportamento verbal (M. P. Villalobos, trad.). São Paulo: Cultrix (Obra originalmente publicada em 1957).         [ Links ]

Silva, A. S., & Banaco, R. A. (2000). Investigação dos efeitos do reforçamento, na sessão terapêutica, sobre três classes de respostas verbais do cliente. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 2(2), 123-136.         [ Links ]

Sundberg, M. L. (1998). Realizing the potential of Skinner’s analysis of verbal behavior. The Analysis of Verbal Behavior, 15, 143-147.         [ Links ]

Taffel, C. (1955). Anxiety and the conditioning of verbal behavior. Journal of Abnormal and Social Psychology, 51, 496-501.         [ Links ]

Taylor, S. E. (1991). Asymmetrical effects of positive and negative events: The mobilization-minimization hypothesis. Psychological Bulletin, 110(1), 67-85.         [ Links ]

Tomanari, G. Y., Matos, M. A., Pavão, I., & Benassi, M. T. (1999). Verbal 2.0. Laboratório de Análise Experimental do Comportamento. São Paulo: IPUSP.         [ Links ]

Tomanari, G. Y., Carvalho, A. A., Góes, Z. S., Lira, S. B., & Viana, A. C. V. (2007). Pesquisando ao ensinar: Prática no laboratório didático analisa o comportamento verbal sob contingências de reforçamento positivo e negativo. Estudos de Psicologia (Campinas), 24(2), 205-214.         [ Links ]

Wilson, W. C., & Verplank, W. S. (1956). Some observations on the reinforcement of verbal operants. American Journal of Psychology, 69, 448-451.         [ Links ]

Zamignani, D. R., & Andery, M. A. P. A. (2005). Interação entre terapeutas comportamentais e clientes diagnosticados com transtorno obsessivo-compulsivo. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 21(1), 109-119.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Gerson Yukio Tomanari
Instituto de Psicologia, USP
Av. Prof. Mello Moraes, 1721
05508-030, São Paulo, SP, Brasil
E-mail: tomanari@usp.br

Recebido em: 28/10/2007
Aceito para publicação em: 1/7/2008

 

 

1 Esta pesquisa foi parcialmente financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por meio de bolsa de Mestrado ao primeiro autor e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio de bolsa de Pesquisador ao segundo (Proc. nº 302640/2007-0) e auxílio à pesquisa (Edital Universal, Proc. nº 471953/2004-0). Parte dos dados foi apresentada em 2nd International Conference of ABA e 13th Annual Meeting of ABPMC, 2004.
2 Instituto de Psicologia, USP. Av. Prof. Mello Moraes, 1721. São Paulo, SP 05508-030. Email: tomanari@usp.br.

Agradecimenos: Os autores agradecem aos revisores anônimos que contribuíram significativamente para o aprimoramento do texto final.