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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

Print version ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.12 no.1-2 São Paulo June 2010

 

ARTIGOS

 

Uma leitura de algumas dimensões das políticas educacionais atuais sob a ótica da análise do comportamento

 

An interpretation of some current educational policies from a behavioral analysis perspective

 

 

Silvia Sztamfater1

Fundação Carlos Chagas - São Paulo; Ceac - Centro de Análise do Comportamento - São Paulo

Endereço para correspondencia

 

 


RESUMO

Muitas são as questões que vêm sendo estudadas, quando nos referimos à educação básica brasileira. Independente da abordagem que embasa as discussões, um dos temas recorrentes é a qualidade do ensino, desigual entre as regiões do Brasil. A garantia de uma educação de qualidade só ocorrerá a partir do momento em que sejam adotadas políticas públicas que assegurem a igualdade de condições de acesso e permanência dos alunos na escola. À luz destas constatações, o objetivo deste artigo é fazer uma análise, fundamentada no behaviorismo radical, de algumas dimensões das políticas educacionais da atualidade contidas no Plano de Desenvolvimento da Educação, que estejam ligadas à qualidade da educação e às formas de avaliação propostas para a sua medição. As dimensões elencadas para análise são: progressão continuada, avaliação, responsabilização e pagamento por desempenho. Percebemos que todas as problemáticas discutidas têm um ponto central: o poder de controle, fato que comprova a complexidade do tema em questão e a necessidade de compreender a educação, enquanto instituição.

Palavras-chave: Qualidade de ensino; Políticas educacionais; Sistemas de avaliação; Plano de desenvolvimento da educação; Análise do comportamento.


ABSTRACT

When it comes to basic education in Brazil, many questions have already been studied. Regardless of the approach that underlies the discussions, one of the recurring themes is the quality of education, disproportionate across regions of Brazil. High quality education will only be possible from the moment that public policies are adopted that guarantee equality of access and the permanence of students at school. The aim of this paper is to analyze, based on radical behaviorism, some of the dimensions of today's educational policies included in the current Educational Development Plan, which are linked to the quality of education and the forms of assessment proposed for its measurement. The dimensions listed for analysis are: continuous progression, assessment, accountability and performance pay. It can be seen that all the issues discussed have a central theme: the power of control, a fact that proves the complexity of the subject matter and the need to understand education as an institution.

Keywords: Quality of education; Educational policies; Evaluation systems; Educational development plan; Behavior analysis.


 

 

A política educacional é, afinal, uma questão de planejar o homem. (...) Uma política educacional eficiente não pode ficar satisfeita com a réplica das grandes realizações históricas. Não é fácil antever o que serão os artistas, estadistas e cientistas do futuro, mas, com o auxílio da análise experimental do comportamento, as potencialidades do organismo humano podem ser cabalmente exploradas (Skinner, 1972, p.226).

 

Introdução

Parece consenso que a educação deva ser tratada como assunto prioritário em nosso país. A busca por uma compreensão cada vez mais aprofundada sobre qual educação queremos e o espaço que as reflexões em torno do tema vêm ocupando, caracterizam este cenário. Partindo desta concepção, uma das temáticas recorrentes neste campo de estudos é a qualidade do ensino. Tratase de uma polêmica bastante complexa, pelo fato de envolver várias dimensões e múltiplos atores: o Estado, o sistema educacional, a escola, os professores, os alunos e seus familiares. Não obstante, devemos considerar os cenários econômico, social e cultural que influenciam diretamente a temática debatida e geram controvérsias em relação ao fracasso escolar caracterizado pela evasão, repetência e distorção idade-série - desvalorização social e baixas perspectivas de futuro profissional para os menos favorecidos.

Neste sentido, a garantia de uma educação de qualidade só ocorrerá a partir do momento que sejam adotadas políticas públicas voltadas ao enfrentamento desta questão, políticas estas que assegurem a igualdade de condições de acesso e permanência dos alunos na escola.

Diante destas considerações, o objetivo deste artigo é analisar algumas políticas educacionais da atualidade, que estejam ligadas à qualidade da educação e às formas de avaliação propostas para a sua medição. Utilizaremos, como referencial de análise, o behaviorismo radical.

Para tanto, é importante fazer uma breve descrição do panorama educacional ao qual estamos nos referindo, de forma que o leitor possa identificar a partir de quais contingências as políticas públicas foram formuladas.

 

Um retrato da educação básica brasileira

Inicialmente, é importante ressaltar a desigualdade que existe entre as regiões do Brasil. Já em 2000, os dados publicados pelo censo demográfico comprovavam esta desigualdade em relação ao analfabetismo2: a região Sudeste possuia 8,1% de analfabetos com 15 anos de idade em contraste com o Nordeste, que apresentava 26,2%. Neste mesmo ano, os dados obtidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), referentes à taxa de atendimento escolar no ensino fundamental, também demonstravam diferenças entre as regiões: enquanto no Norte e Nordeste eram de 93,4% e 95,2% respectivamente, no Sul e Sudeste configuravamse em 97,4% e 97,7% respectivamente.

Em 2003, a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), desenvolvida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostrou que, com a quase universalização da educação formal para educandos de 7 a 14 anos, houve um aumento na taxa de freqüência observada: de 80,9% em 1980, passou a 97,2%.

Atualmente, uma das preocupações do PDE3 é combater as desigualdades, uma vez que é evidente a variação do IDEB4, entre as escolas e redes de ensino. Fazendo uso das palavras do Plano "... foram encontrados nas redes, índices de 1 a 6,8. Nas escolas, a variação é ainda maior, de 0,7 a 8,5. Tornouse evidente, uma vez mais, a imperiosa necessidade de promover o enlace entre educação, ordenação de território e desenvolvimento econômico e social" (Brasil, 2007, p.23).

Outra informação interessante, que contrasta as desigualdades educacionais entre as regiões do Brasil, pode ser vista a partir da distorção idade-série, que mostra a adequação entre a série e a idade do aluno.

A Tabela 1 revela que as maiores taxas de distorção idade-série encontramse nas regiões Norte e Nordeste, estando acima da taxa média no país. Vale a pena, ainda, observar a diferença marcante entre as taxas destas regiões, quando comparadas com as verificadas nas regiões Sudeste e Sul.

 

 

A falta de equidade na educação brasileira também aparece nos indicadores de fluxo escolar5. De acordo com a Tabela 2, podemos perceber que as regiões Norte e Nordeste apresentam os piores dados, não condizentes com a média Brasil. Fazendo uso de outras palavras, observamos que as taxas de aprovação destas duas regiões são as menores do país, abaixo também da taxa nacional. As taxas de reprovação, por sua vez, são as maiores da federação, estando acima da taxa Brasil. No que diz respeito às taxas de abandono, notamos a mesma tendência, caracterizada pelas maiores taxas nas regiões Norte e Nordeste, taxas estas acima da taxa do país.

 

 

Os dados apresentados neste breve panorama da educação básica mostram que há muito o que investir, para que o ensino seja de qualidade e que problemas relativos à equidade possam ser superados.

 

Afinal, o que é Educação na concepção Behaviorista Radical?

Skinner (1969) afirma que "Educação é o estabelecimento de comportamento que seja vantajoso para o indivíduo e para outros em um tempo futuro" (p.402). Esta afirmação pressupõe que, ao se educar um indivíduo, estamos ampliando o seu repertório, isto é, ensinandoo comportamentos novos ou mudando antigos, de forma que possa responder adequadamente às contingências em vigor e adaptarse ao ambiente. Nesta concepção, Moroz (1993) aponta que "... o ensino terá ou não sido eficiente em função daquilo que o aluno faz fora da escola, em outra ocasião e sem a presença de agentes educativos" (p.34).

Indo mais além, a autora cita que o objetivo das agências educativas é formar o aluno para o auto-governo intelectual, ou seja, atuar por si próprio. Nas palavras de Skinner (1972):

"... o estudante que pode fazer as coisas por si próprio é independente dos outros; quanto maior e mais eficiente for o seu repertório, tanto mais livre será. (...) A autoconfiança fica também em questão quando a educação é concebida de modo que o aluno seja capaz de usar o que aprendeu quando passe a se mover em ambientes não educacionais" (p.163).

Adicionalmente, De Rose (2005) ressalta que na perspectiva da análise do comportamento, qualquer indivíduo é capaz de aprender, mesmo aqueles que apresentam limitações ou dificuldades. Para tanto, acrescenta o autor, é necessário que o professor identifique no repertório do aluno quais comportamentos pré-requisitos estão faltando de forma que, ao invés de esperar que o estudante amadureça, ensine estes comportamentos diretamente. Ainda, de acordo com o pesquisador:

"... o "amadurecimento" envolve a aquisição dos comportamentos precursores da aprendizagem de um novo repertório. Esta aquisição é (...) multideterminada: aspectos internos podem ter um papel importante, mas procedimentos de ensino também podem ter um papel fundamental" (p.31).

Percebemos, então, que a educação está ligada à aquisição de comportamentos que preparem a pessoa para lidar com experiências futuras. Neste sentido, as instituições educacionais têm como objetivo ensinar repertórios que ajudem na adaptação futura do aprendiz ao meio. Assim, as práticas educativas não devem estar somente voltadas para o que será ensinado, mas também para o processo de ensino, isto é, como ocorrerá esta aprendizagem.

 

Está a concepção behaviorista radical de educação presente nas políticas educacionais atuais?

O PDE, atual Plano que gerencia a educação do Brasil, dispõe que o objetivo da educação pública é desenvolver a autonomia do educando, entendendo como autonomia "... a emergência de subjetividades críticas sobre o pano de fundo de uma tradição cultural (...) o que só é possível pelo desenvolvimento de competências para se apropriar de conteúdos e da capacidade de tomar postura crítica frente a eles" (Brasil, 2007, p. 41).

Dito de outra forma e tendo como referencial o behaviorismo radical, o indivíduo autônomo, ou apto para o auto-governo intelectual, é aquele que apresenta um repertório extenso, capaz de enfrentar o mundo. É por este motivo, que a principal função do professor é ensinar o aluno a pensar, isto é, "... resolver os problemas apresentados por um novo ambiente" (Skinner, 1972, p.164).

Outro aspecto bastante ressaltado no PDE, é que está ancorado numa visão sistêmica de educação, o que implica em "... reconhecer as conexões intrínsecas entre educação básica, educação superior, educação profissional e alfabetização e, a partir dessas conexões, potencializar as políticas de educação de forma que se reforcem reciprocamente" (Brasil, 2007, p.10).

Entender esta concepção à luz do behaviorismo radical é partir da própria proposta de Skinner (1998) de uma ciência do comportamento, na qual afirma ser o comportamento complexo, de natureza processual, mutável e fluido. Diante disto, depreendemos o caráter relacional do comportamento, relação esta que se dá entre o indivíduo e o ambiente e na qual o comportamento emitido pelo sujeito opera sobre o ambiente e gera conseqüências, que por sua vez retroagem sobre o organismo. Esta explicação supõe a noção de causalidade enquanto relações funcionais entre o organismo e o ambiente, o que implica dizer que o comportamento é multideterminado. Igualmente, o behaviorismo radical propõe um modelo de seleção por consequências, a partir do qual analisa três níveis de variação e seleção responsáveis pelo comportamento humano: filogenético, ontogenético e cultural. De acordo com Carrara (2004):

"Quando falamos em relações funcionais, ao invés de causas estamos reconhecendo implicitamente a existência de um contexto ambiental em que se dá o comportamento. (...) Em outras palavras, analisase o estar fazendo, o estar realizando, o estar agindo, o que representa uma característica dinâmica em contrapartida a um ato dado como pronto e estático" (pág.45).

Não precisamos dizer que a estas considerações estão atreladas as noções apresentadas na visão sistêmica do PDE: uma relação funcional já implica na interdependência entre as partes, interdependência esta que caracteriza o "estar fazendo" ressaltado por Carrara e que explica o porquê de o comportamento ser multideterminado. Com isto, estamos afirmando que nos pressupostos do behaviorismo radical, o processo, o dinamismo, as relações entre o indivíduo e o seu ambiente estão implícitos, não podendo aquele que parte desta filosofia, para entender o fenômeno educacional, desconsiderar tais formulações.

Percebemos o quanto a autonomia, ou melhor, o auto-governo intelectual, é importante para uma educação de qualidade. Para o analista do comportamento, é possível compreender como os contextos político, econômico e cultural atuam diretamente na produção de um cenário com tantas desigualdades educacionais, como visto no início deste artigo, e também conceber a educação como um fenômeno complexo, que conta com múltiplos sujeitos e é na relação entre eles que, contingências reforçadoras para o estabelecimento de uma educação de qualidade, são produzidas.

O PDE conta com uma série de programas de ações, que estão vinculados com outras iniciativas públicas já existentes. Iremos expor alguns destes programas e/ou iniciativas a seguir:

 

1. Progressão Continuada

Atualmente, com a quase universalização do acesso à educação formal no país, especialmente observável para os estudantes entre 7 e 14 anos, as temáticas enfocadas no campo educacional foram alargadas, havendo especial interesse pela qualidade do ensino, além da preocupação em torno do problema da equidade, conforme verificamos no início do artigo.

Entretanto, no passado, a problematização sobre a qualidade da educação já era tema recorrente de pesquisas e debates na área educacional. A expressão fracasso escolar, caracterizado pela repetência e evasão dos alunos, persistiu em todas as discussões, indicando a dificuldade de enfrentamento do problema. Visando combatêlo, já em 1996, com a criação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), foi proposta a modificação na organização escolar e nas práticas avaliativas adotadas nas escolas brasileiras, através do ensino em ciclos e do regime de progressão continuada. No Estado de São Paulo, este regime foi implantado nas escolas públicas em 19986, com a proposta de eliminar a repetência, garantir o acesso e a permanência do aluno na escola e oportunizar a aprendizagem baseada no respeito às diferenças.

Portanto, enquanto no sistema seriado o aluno podia ser aprovado ou reprovado ao final de cada série, com a adoção da progressão continuada e o sistema de ciclos, ele pode ser reprovado somente ao final de cada ciclo (4ª série ou 8ª série), favorecendo uma aprendizagem progressiva e continuada, de forma que a avaliação não seja mais vista como um instrumento de medida, classificação e repetência. Percebemos, então, que a avaliação passa a ser considerada como um processo contínuo de verificação da aprendizagem do aluno e do próprio ensino, perdendo o seu caráter punitivo e ganhando uma função diagnóstica.

Conceitos que embasam a progressão continuada, como: aprendizagem diferencial, aceleração do estudo, respeito às diferenças e ao ritmo do aluno, já estavam presentes nos estudos de Skinner, na década de 50. Nesta época, o autor afirmava que a educação era "... o mais importante ramo da tecnologia científica" (Skinner, 1972, p.18), por afetar profundamente a vida de todos os seres humanos. Baseado neste fato, declara a importância da aplicação da análise do comportamento à educação, propondo uma tecnologia de ensino.

É a partir deste cenário que Skinner desenvolve a instrução programada e as máquinas de ensinar, permitindo a progressão de cada aluno no seu próprio ritmo de aprendizagem, através do planejamento de contingências de reforçamento. Nesta proposta, o aluno é tido como ativo no processo e interage constantemente, sendo reforçado de forma contingente e diferencialmente na direção do comportamento alvo.

As concepções de ensino individualizado e respeito ao ritmo do aluno também fundamentam o PSI (Personalized System of Instruction), um sistema personalizado de instrução, criado por Fred Keller nos anos 60. Fazendo uso das palavras do autor:

"... Neste Plano, estudantes individuais passam por sucessivas unidades de um curso de estudos na sua própria velocidade, mas é requerido o domínio de cada passo, antes que o próximo possa ser dado. (...) Um PSI seqüencial seria sugerido, no qual um curso levasse diretamente a outro, na medida em que os pré-requisitos fossem preenchidos, sem nenhuma interrupção arbitrária do programa. (...) Posso alucinar o dia em que não existirão primeira, segunda e terceira séries, e assim por diante, e quando os alunos forem avaliados só nos termos das habilidades específicas que tenham adquirido" (Keller, 1983, pág.188).

A citação mostra que Keller já fazia menção a uma outra forma de organização do ensino, que não a seriação, conforme prevê a progressão continuada7, bem como respeito ao ritmo do aluno. Nesta perspectiva, a repetência perde sentido, assim como a avaliação enquanto instrumento de controle baseado na punição.

Utilizando a problemática da punição como referência, Skinner (1987) propõe uma discussão sobre quem deveria ser responsabilizado pelos fracassos obtidos no processo de ensino/aprendizagem: o aluno, os professores, as escolas, os cientistas do comportamento ou a cultura. Pensando na solução a tal discussão, pontua que uma revisão é necessária em cada etapa do processo, envolvendo cada um dos implicados. Assim, o autor comenta que podemos:

1. Punir os estudantes que não aprendem, ignorandoos?

2. Punir os professores que não ensinam bem, descartandoos?

3. Punir as escolas de educação que não ensinam bem os professores, fechandoas?

4. Punir a ciência do comportamento, por se recusar a dar suporte ao ensino?

5. Ou punir a cultura que se recusa a desenvolver uma ciência do comportamento? (p.128)

Indo mais além, o próprio Skinner afirma que se continuarmos procurando respostas fazendo uso da punição, tenderemos a repetir o mesmo padrão de comportamento que julgamos inapropriado. Portanto, o pesquisador propõe:

"... dê a estudantes e a professores boas razões para aprender e para ensinar. É aí que uma ciência do comportamento pode dar a sua contribuição. Uma ciência do comportamento pode desenvolver práticas de instrução tão efetivas e tão atrativas que estudantes, professores ou administradores estarão livres do uso de técnicas aversivas de controle do comportamento" (Skinner, 1987, p.129).

Nesta mesma perspectiva, Sidman (1995) faz ressalvas quanto ao uso da punição como forma de promover a aprendizagem dos alunos. Afirma que "... desde a escola primária e durante todo o caminho, passando pelo colegial, professores se preocupam mais com técnicas coercitivas para manter a disciplina do que com métodos efetivos de instrução" (pág.41). Segundo o autor, além de suprimir o comportamento indesejado, a punição também gera outras mudanças, os efeitos colaterais, que a torna um método sem sentido, destrutivo e indesejável. Acrescenta que:

"... estudantes que são reforçados por notas altas, respeito de seus professores e admiração de seus colegas provavelmente freqüentam regularmente a escola. Estudantes que são punidos com notas baixas, desaprovação e humilhação por parte de seus professores e falta de reconhecimento e até mesmo e formuladores das políticas educacionais desprezo de seus colegas provavelmente se mantêm fora da escola tanto quanto possível. A confiança na punição coloca o selo "coercitivo" em todo o sistema. (...) Para alunos que são punidos em classe, a escola tornase um punidor. Em vez de fazer com que eles aprendam, a punição os leva a se evadir do ambiente onde a aprendizagem supostamente ocorre e talvez, até mesmo, a se esquivar de todo o processo de aprendizagem formal" (Sidman, 1995, pág.102).

A punição, como observa Sidman, controla momentaneamente o comportamento do aluno, mas num longo prazo, pode levar à sua evasão definitiva da escola. Utilizar, então, a repetência como forma de punição aos alunos que não apresentaram o desempenho mínimo necessário para seguir adiante os estudos, está longe de ser uma estratégia pedagógica "saudável". Sabemos que estes alunos acabam desistindo da escola, não porque não se interessam por ela, mas pelo fato de tentar evitar frustrações constantes.

Percebemos que a preocupação com a educação é bastante antiga na análise do comportamento e que iniciativas para um processo de ensino/aprendizagem eficaz sempre estiveram em pauta entre os autores da área nas diferentes épocas. É nítida, também, a evolução dos conceitos, fazendo desta abordagem uma ferramenta essencial para os educadores da atualidade.

 

2. Avaliação e Responsabilização

Até 2005, o ensino básico era avaliado através do Saeb8 (Sistema de avaliação da educação básica), quando passou a contar com um novo exame: a Prova Brasil9.

Em linhas gerais, o Saeb é uma avaliação amostral para diagnóstico desenvolvida pelo INEP/MEC, em larga escala, aplicada de dois em dois anos, a alunos de 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e estudantes do 3º ano do ensino médio das redes pública e privada e das zonas urbana e rural, que objetiva avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro, a partir de testes padronizados e questionários sócioeconômicos. Nos testes, os estudantes respondem a questões de Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas). No questionário sócioeconômico, os alunos fornecem dados sobre fatores de contexto que podem estar associados ao desempenho.

A Prova Brasil também é uma avaliação para diagnóstico desenvolvida pelo INEP/MEC, em larga escala, aplicada de dois em dois anos, mas só para alunos de 4ª e 8ª séries do ensino fundamental da rede pública urbana. Assim como o Saeb, visa avaliar as habilidades em Língua Portuguesa (foco em leitura) e Matemática (foco na resolução de problemas) através de testes padronizados, com uma diferença: é quase universal, isto é, engloba todos os estudantes das séries avaliadas, de todas as escolas públicas urbanas do Brasil, com mais de 20 alunos na série. Sendo universal, expande os resultados do Saeb, fornecendo médias de desempenho para o Brasil, regiões e unidades da Federação, para cada município e escola participante. Os mesmos questionários respondidos no Saeb, também são utilizados na Prova Brasil.

Com esta modificação, foi possível a realização, em 2005, da primeira avaliação universal da educação básica pública, avaliação esta que contou com mais de três milhões de alunos de 4ª e 8ª séries das escolas públicas (estaduais e municipais) urbanas.

Desta forma, os dados do Saeb, que antes eram amostrais, passaram a ser divulgados também por rede e por escola, aumentando de maneira significativa a responsabilização10 da comunidade de pais, professores, dirigentes e políticos, com o aprendizado.

Vale destacar que, com a nova sistemática de avaliação, foi necessária a alteração na forma de realizar o censo escolar, que ao invés de ser feito por escola, passou a ser por aluno. Esta mudança permitiu que os dados do fluxo fossem embasados em dados individualizados de cada estudante. Foi desenvolvido o programa Educacenso11, que juntamente com a Prova Brasil, deram condições para a criação do IDEB. Portanto, se antes os dados obtidos com o Saeb forneciam um diagnóstico representativo da educação básica de cada Estado, com a Prova Brasil este diagnóstico também passou a ser feito por município e escola.

Em 2007, com a criação do PDE e a adoção do IDEB como indicador de qualidade, a polêmica sobre a desigualdade pode ser debatida mais de frente, visto que os dados disponibilizados pelo MEC/INEP abrangeram um período desde 2005 até 2021, oportunizando uma projeção futura da educação, para cada região do país. Nesta oportunidade, foi constatada novamente a falta de equidade na educação brasileira, uma vez que as regiões Nordeste e Norte tiveram os menores IDEB"s, abaixo do IDEB Brasil tanto em 2005, como em 2007, bem como houve uma significativa diferença do indicador entre as próprias escolas (rede estadual em contraste com a privada), de cada uma das regiões.

Estes pressupostos, que embasaram a reforma do sistema de avaliação da educação básica, estão sendo alvo de algumas críticas, por parte dos estudiosos da área. Algumas delas serão elencadas a seguir, acompanhadas de uma leitura da análise do comportamento.

Os sistemas de avaliação em larga escala (por exemplo Saeb e Prova Brasil) ou avaliações externas, como também são chamados, foram criados com o intuito de diagnosticar a situação do ensino e guiar a formulação e implementação de políticas públicas. Entretanto, em seu desenho atual, estão servindo como instrumentos que legitimam a regulação (atuação, intervenção) do Estado, já que o rendimento dos alunos está sendo usado pelo Estado para prestar contas à sociedade, isto é, introduzir a transparência e comprometer as pessoas, em busca da qualidade do ensino. Neste sentido, o governo adotou uma concepção gerencial de atuação, "responsabilizando" principalmente os professores e as escolas pelo rendimento dos alunos nas avaliações externas, não assumindo algum tipo de compromisso com os resultados apresentados. De acordo com Afonso (2005) "... a imputação de responsabilidade aos professores tem sido (...) a estratégia mais freqüente para justificar o que se considera ser a má situação do ensino e das escolas" (p.43), o que leva os professores e alunos a concentraremse apenas nas competências e conhecimentos, que serão necessários para alcançarem bons resultados nos exames.

Nesta perspectiva, a concepção gerencial adotada pelo Estado na educação está ligada à ideologia de mercado, ideologia esta que tem na competição e na comparação os seus valores fundamentais. Assim, através do uso da avaliação para medir o domínio cognitivo e instrucional, os resultados quantificáveis tornamse mais importantes do que qualquer outro resultado que referencia diferentes aprendizagens. Utilizando as palavras de Afonso (2005):

"... a complexidade do processo educativo é tendencialmente reduzida a alguns produtos visíveis que acabam assim por induzir a utilização de testes estandardizados e estes, por sua vez, passam a ter um papel central ao fornecer resultados que são úteis indicadores de mercado" (p.34).

O papel do Estado na educação ficou reduzido, então, a avaliador, havendo uma maior preocupação com o produto, do que com o processo e a predominância da racionalidade instrumental e mercantil (Freitas, 2007). Neste contexto, o IDEB tornouse "... mais um instrumento regulatório do que um definidor de critérios para uma melhor aplicação dos recursos da União visando alterar indicadores educacionais" (Araújo, 2007, p.4).

Diante deste cenário, a análise do comportamento pode enriquecer a discussão, explorando inicialmente a noção de controle comportamental. De acordo com Sidman (1995):

"... controle comportamental não é uma questão de filosofia ou de sistemas pessoais de valor a serem aceitos ou rejeitados de acordo com a nossa preferência. É uma questão de fato. Não faz sentido, portanto, rejeitar ou defender o controle comportamental. Pelo contrário, as leis do controle exigem investigação. A noção pode nos desagradar e mesmo amedrontar, mas as leis do comportamento são uma característica do mundo em que vivemos; não podemos repelilas" (p.46).

Neste sentido, o controle comportamental faz parte da nossa vida. Utilizando os dizeres de Sidman, "... os analistas do comportamento vêem o controle como um fato da natureza, a ser investigado e descrito, mas o público vê os analistas do comportamento como defensores do controle e, portanto da coerção" (p.45). Percebemos que o termo controle é sinônimo para leigos de coerção, o que torna o conceito indesejável e a análise do comportamento como a ciência da coerção. Entretanto, o autor acrescenta que o público desconhece que o controle não precisa ser coercitivo. Quanto a este assunto, Sidman (1995) afirma que:

"se ignorarmos a realidade, o controle comportamental simplesmente acontecerá; os controladores exercerão o controle à sua maneira. Se reconhecermos a existência do controle comportamental e o estudarmos, podemos fazêlo trabalhar em nosso benefício. Quando métodos de controle existentes forem coercitivos, descobriremos que frequentemente podemos substituílos por métodos não coercitivos. Naturalmente, é aí, na realidade, que a ciência da análise do comportamento entra em cena" (p.47).

Neste ponto, vale a pena voltar para a discussão apresentada pelos estudiosos. Fica nítida a presença do controle coercitivo exercido pelo Estado, principalmente quando caracterizado como avaliador. O que percebemos é a avaliação sendo utilizada como uma forma de coerção, que leva os professores a terem de ensinar os alunos somente conteúdos exigidos nos testes padronizados. Assim, as conseqüências do uso do controle aversivo podem gerar não só subprodutos indesejáveis nos alunos, mas também nos próprios professores, o que num longo prazo, têm a possibilidade de causar a fuga/esquiva da situação aversiva, que no caso pode ser ilustrada pela desistência da função de professor e a total ausência do aluno da escola (Skinner, 1972).

A crítica apresentada pelos estudiosos referese à forma de utilização da avaliação externa pelo Estado como instrumento de pressão (responsabilização) e não de diagnóstico para o monitoramento de tendências na educação do país. Nesta perspectiva, cabe uma observação de Zanotto (2000):

"... muitas vezes, o professor não parece ficar sob controle do comportamento do aluno concreto, com o qual está interagindo. O comportamento do professor parece ocorrer em função de outras contingências, que não aquelas específicas que constituem as relações pedagógicas que ele estabelece com seus alunos em sala de aula" (p.135).

Esta citação mostra o valor aversivo que as políticas educacionais assumem no trabalho do professor e como a sua responsabilização pela má educação só gera efeitos indesejáveis à atuação docente, não trazendo nenhum tipo de benefício para o país. É neste sentido que Zanotto destaca a "... importância de identificar contingências sociais mais amplas, que expliquem o comportamento do professor" (p.135), ou seja, partir do pressuposto que a educação é uma agência social de controle do comportamento humano que atua em contingências, nas quais estão presentes certas práticas culturais características da nossa sociedade contemporânea. Este é o referencial, portanto, que o analista do comportamento deve partir ao lidar com as questões educacionais, isto é, "... analisar o comportamento do professor para além das contingências instrucionais" (Zanotto, 2000, p.155).

Skinner (1972) faz observações interessantes quando se refere ao comportamento do sistema educacional. Ressalta que:

"... embora uma tecnologia do ensino se ocupe principalmente com o comportamento do aluno, existem outras figuras no mundo da educação às quais se aplica uma análise experimental. Precisamos ter melhor compreensão não só dos que aprendem como também: 1) dos que ensinam; 2) dos que se empenham na pesquisa educacional; 3) dos que administram escolas e faculdades; 4) dos que estabelecem a política educacional e 5) dos que mantêm a educação. Todas estas pessoas estão sujeitas a contingências de reforço que podem precisar ser alteradas para melhorar a educação como instituição" (p.217).

Com relação à manutenção e política, foco da análise em questão, o autor destaca que a manutenção do sistema quase sempre determina a política adotada, assim como as conseqüências determinam tanto a política quanto a manutenção. Acrescenta que a palavra liberal expressa uma educação em termos de suas conseqüências, educação esta que torna o homem mais valioso para o seu grupo, pois permite que tenha um desempenho mais significativo na ética, religião ou no governo democrático. Desta forma, Skinner amplia o horizonte de discussão ao mostrar o benefício que uma educação liberal pode gerar em termos de adaptabilidade do homem ao ambiente, uma vez que prepara o indivíduo para contingências imprevisíveis. Sua posição vai além das críticas apresentadas pelos demais estudiosos, quando afirmam ser a ideologia de mercado ou liberal prejudicial à educação pelo fato de só se preocupar com os resultados; tratar a educação como uma mercadoria.

Entretanto, indo ao encontro da posição dos pesquisadores com relação ao Estado "avaliador", Skinner (1972) pontua que "... o que é ensinado tende simplesmente muitas vezes a ser o que pode ser medido por testes e exames. O comportamento que não pode ser facilmente submetido a medidas é negligenciado, porque não impressiona as agências de inspeção ou outros que julgam a instituição" (p.224). Desta forma, ao mesmo tempo em que critica um ensino voltado para testes, reforça a importância de políticas educacionais que propiciem a novidade e a diversidade, como formas de aumentar a força de uma cultura, quando submetida à variação e seleção. Complementa ao afirmar que:

"... a diversidade não é (...) um dos pontos fortes na política educacional corrente. A arregimentação parece ser uma conseqüência mais provável dos currículos, programas, pré-requisitos e padrões impostos aos sistemas educacionais pelos governos, pais empregadores e outras instituições mantenedoras. (...) A diversidade (...) tem, sem dúvida, valor de sobrevivência, mas devese planejar, a longo prazo, uma diversidade mais efetiva" (Skinner, 1972, p.225).

A grande contribuição de Skinner, ao campo das políticas educacionais, está no fato de embasar as suas explicações no valor adaptativo que tais políticas propiciam ao homem em relação ao seu ambiente; isto é, na contribuição que uma prática educacional traz à sobrevivência da cultura.

2.1. Um outro olhar sobre avaliação

Na literatura sobre avaliação, é comum nos depararmos com algumas modalidades, entre elas a avaliação formativa. Segundo Afonso (2005):

"... quando os professores praticam a avaliação formativa, a recolha de informação sobre a aprendizagem dos alunos pode ser realizada por uma pluralidade de métodos e técnicas que incluem desde o recurso à memória que o professor guarda das características dos alunos até às mais diversificadas e conhecidas estratégias como a observação livre, a observação sistemática, a autoavaliação (...) e outras diferentes formas de interação pedagógica" (pág.39).

Esta forma de avaliação, também denominada de avaliação qualitativa por alguns autores, surge em contraposição à modalidade somativa ou avaliação quantitativa, focada no desempenho, como é o caso das avaliações externas, que mensuram a qualidade do ensino, a partir de indicadores embasados no resultado da aprendizagem dos alunos.

A concepção skinneriana de ensino pressupõe que a avaliação "tem de ser contínua, permanente e, sobretudo, individual" (Luna, 2000, pág.154), o que significa considerála como um processo. Neste sentido, "... o interesse em avaliar os efeitos do ensino - no caso da Educação - levou Skinner a rejeitar a prática de analisar resultados ao final da intervenção" (Luna, 2000, pág.154). Portanto, neste aspecto, a avaliação segundo a proposta da análise do comportamento, aproximase do modelo formativo, ao priorizar o aluno, avaliálo continuamente, promover a autoavaliação e feedbacks constantes, aumentando a probabilidade de sucesso no redirecionamento das condições facilitadoras para a sua aprendizagem (Luna, 2000). Este autor acrescenta que "... análises gerais podem mostrar quantos aprenderam, mas não nos capacita a lidar melhor com os que não aprendem, especialmente porque não informam em que momento do processo nós perdemos quais alunos" (pág.154). É devido a este fato que existe uma forte polêmica quanto ao uso de indicadores, como por exemplo o IDEB, para avaliar a qualidade da educação.

 

3. Pagamento por Desempenho12,13

Partindo de uma lógica mercantil, as reformas educacionais da atualidade incluem a transferência de mecanismos de gestão do setor privado para a área pública, conforme citado anteriormente. Também vimos que as políticas educacionais que embasam esta lógica estão centradas na busca pela qualidade, responsabilizando os professores pelos resultados dos seus alunos, como forma de aumentar as cobranças para que desempenhem as suas funções com maior eficiência e produtividade. É neste sentido que o pagamento por performance ou desempenho foi idealizado, como maneira de tornar esta cobrança concreta.

No Brasil, estudos sobre o tema ainda são incipientes, dado que a adoção desta proposta é recente. Entretanto, a mídia aponta que há uma crescente polêmica sobre o assunto, que também vem ganhando espaço entre os governantes, responsáveis pela formulação das políticas educacionais.

Esta iniciativa surge como alternativa à estrutura salarial tradicional, que tem como base o tempo de serviço e a formação adicional para progressão na carreira do magistério, além de vigorar na maioria dos estados brasileiros (Dutra, Abreu, Martins & Balzano, 1999)14.

Exemplo de adoção do pagamento por desempenho é o da Secretaria Estadual da Educação de São Paulo. A atual secretária da Educação do Estado de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro, em matéria veiculada em Julho de 200715, defendia que os professores deveriam receber um bônus extra, segundo o desempenho de suas turmas aferido em exames como o Saeb, Prova Brasil e Saresp16.

Independente do tipo de estrutura salarial adotada, é necessário examinar qual é a mais adequada à realidade brasileira, visto que é complicado cobrar uma educação de qualidade dos professores sem que sejam garantidas as condições mínimas de infraestrutura das escolas e formação docente. Países como Estados Unidos e Inglaterra, adeptos do pagamento por desempenho, apresentam realidades bem diferentes do Brasil, o que significa que resultados lá obtidos com esta iniciativa não necessariamente serão alcançados no nosso país.

Explorar esta temática enquanto analistas do comportamento, requer retornar à concepção de que para entender e analisar o comportamento do professor, é imprescindível ir além das contingências instrucionais. Isto porque é visível que o comportamento dos educadores é mantido por contingências aversivas, tendo na "responsabilização", a concretização dos pressupostos que embasam a estrutura adotada.

Desta forma, o pagamento por desempenho faz parte da proposta de "responsabilização", o que funcionalmente significa a manutenção da aversividade do sistema educacional. Esta aversividade vai ganhando espaço e se desenhando na medida em que, no atual momento, além de serem cobrados pelo bom desempenho dos seus alunos, os professores também se sentem injustiçados pelo bônus a ser recebido, visto que a forma de medí-lo é complicada, pois engloba outras variáveis que não dependem apenas do desempenho docente, como as questões que dizem respeito às condições das escolas (as com melhores recursos ou melhor situadas geograficamente tendem a alcançar melhores resultados).

Fazendo uso das palavras de Romualdo Portela de Oliveira, professor da USP, apud Knapp (2007): "... portanto, é preciso cuidado para que um sistema por mérito como esse não termine reproduzindo desigualdades. (...) É preciso não esquecer (...) quem trabalha em condições adversas, quem precisaria dar um salto muito grande para se equiparar aos demais". De acordo com o presidente do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), apud Knapp (2007): "... premiar não é novidade alguma. O professor precisa de salário digno. O que precisamos é de reajuste salarial". Em 2007, o piso salarial dos professores, sem gratificação, era de R$ 668,00, e a categoria reivindicava um mínimo de R$ 1.670,00 (Knapp, 2007).

Acrescentase a esta discussão um aspecto muito bem situado por Zanotto (2000):

"... distanciado das conseqüências naturais de seu comportamento e controlado, quer por regras, quer por contingências aversivas, o professor deixa de assumir, ele próprio, o controle de suas ações e passa a responder fugindo ou esquivandose da situação O comportamento do aluno, que deveria atuar como condição fundamental no controle do comportamento do professor, passa a ser cada vez menos importante. Tornarse alheio, pelas contingências que estabelecem suas condições de trabalho, às conseqüências fortalecedoras imediatas de seu comportamento significa, no caso do professor, tornarse alheio ao evento que deveria, prioritariamente, controlar o seu comportamento: o comportamento do seu aluno" (pág.152).

Em suma, a colocação de Zanotto (2000) mostra que, independente da estrutura salarial adotada, o essencial é analisar a contingência funcionalmente, a fim de identificar qual o tipo de controle exercido sobre o comportamento dos professores, pois em nada adianta oferecer um bônus salarial, se contingências aversivas os mantém ensinando.

 

Considerações Finais

São inegáveis as contribuições da análise experimental do comportamento para a educação, contribuições estas que, como vimos, fornecem um olhar diferenciado às questões atualmente debatidas no campo e mostram a potencialidade da abordagem enquanto ferramenta para os profissionais interessados pela área.

A concepção de política educacional, proposta por Skinner, como uma questão de "planejar o homem", assim como outras colocações aqui expostas, demonstram o peso que a educação tem para a constituição do ser humano, bem como para a sua preservação e adaptação ao ambiente.

No que diz respeito à realidade educacional brasileira, as reflexões desenvolvidas neste artigo mostram que há alternativas para uma educação de qualidade, de forma que as "potencialidades do ser humano possam ser cabalmente exploradas" (Skinner, 1972, p.226).

Mesmo que a educação seja peça chave para o desenvolvimento da sociedade e, ainda que mudanças possam ser feitas para melhorar a qualidade de ensino, há contingências políticas que estão aquém deste olhar e que permeiam outros interesses. Na visão de Luna (2001):

"... no que se refere ao poder público, a situação é mais desalentadora. Nestes últimos anos, vi subirem ao poder pessoas cuja vida acadêmica eu acompanhara e que estava recheada de visões críticas e de compromissos técnicopolíticoideológico com a transformação da situação educacional. Com raras exceções, tenho a sensação de que a política partidária tem sido capaz de vencer os melhores ideais de transformação; seja pela impossibilidade política de dar continuidade a um projeto iniciado por uma outra gestão, seja pela falta de recursos, seja mesmo porque as propostas elaboradas no contexto acadêmico não encontraram sustentação na realidade, a verdade é que houve muita atividade, mas nada sugere que o comportamento dos alunos tenha mudado em uma direção mais efetiva" (p.237).

É difícil pensar que a situação da educação brasileira atual é a mesma que Skinner pontuava, há mais de 30 anos, quando se referia à educação norte americana (Luna 2001). Muito mais do que apenas uma questão de ensino/aprendizagem, temos como ponto central, nesta discussão, o poder de controle. É necessário, portanto, ampliar a análise para compreender que a qualidade de ensino não está pautada somente naqueles que aprendem, mas também nos que ensinam, nos que fazem pesquisa neste campo, nos que administram escolas e faculdades, nos que estabelecem a política educacional e nos que mantêm a educação. Dito de outra forma, entender a complexidade desta temática, é tomar consciência das contingências que controlam os comportamentos de todos as pessoas implicadas no processo educacional e alterálas para melhorar a educação enquanto instituição (Skinner, 1972).

 

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Endereço para correspondencia:
Av. Brigadeiro Faria Lima, 2081 cj 31
01452-001,São Paulo, SP, Brasil
Email: silvia180373@gmail.com

Recebido em: 28/11/2008
Aceito para publicação em: 28/04/2010

 

 

1 Doutora em Ciências da Saúde. Fundação Carlos Chagas, São Paulo, SP. Ceac Centro de Análise do Comportamento São Paulo, SP.
2 Estamos considerando como analfabetos, pessoas que são incapazes de ler e escrever enunciados simples.
3 Plano de Desenvolvimento de Educação, lançado pelo Governo Federal no 1º semestre de 2007, que foi desenvolvido para substituir o Plano Nacional de Educação (PNE).
4 O IDEB foi criado pelo INEP em 2007 e representa a iniciativa de reunir num só indicador dois conceitos igualmente importantes para a qualidade da educação: fluxo escolar e média de desempenho nas avaliações. O indicador é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e médias de desempenho nas avaliações do INEP, o Saeb - para as unidades da federação e para o país, e a Prova Brasil - para os municípios. Estabelece um índice expresso em valores que vão de 0 a 10, semelhante aos índices usados internacionalmente e afere de maneira equânime a qualidade da educação ofertada (informações obtidas no portal do INEP - www.inep.gov.br). Considerações mais detalhadas sobre este indicador serão feitas posteriormente nesse artigo.
5 Entendemos fluxo escolar como a progressão (aprovação, reprovação e abandono) dos alunos pelo sistema de ensino.
6 Deliberação No 09/97 do Conselho Estadual de Educação (CEE).
7 Muito embora isso não signifique que a progressão continuada, tal como se aplica, é uma proposta behaviorista.
Ela tem afirmações com as quais o behaviorismo poderia concordar, mas seriam necessárias outras contingências.
8. Outras informações podem ser obtidas no portal do INEP www.inep.gov.br.
10 O PDE promoveu alterações na avaliação da educação básica, estabelecendo conexões, antes inexistentes, entre avaliação, financiamento e gestão, que serviram de suporte para o aparecimento da responsabilização e, em decorrência, a mobilização social.
11 O Educacenso é um sistema online que visa manter um cadastro único em uma base de dados centralizada no Inep de: escolas, docentes / auxiliares de educação infantil e alunos, possibilitando maior agilidade na atualização das informações, por utilizar diretamente a Internet (informações obtidas no portal do INEP www.inep.gov.br).
12 Os planos de carreira do magistério precisam cumprir as determinações da legislação vigente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) - Lei 9394/96.
13 Para maiores detalhes sobre o assunto, consultar: Harris, D. C. (2007). The Promises and Pitfalls of Alternative Teacher Compensation Approaches. Education Policy Research Unit & Education and the Public Interest Center; Harvey-Beavis, O. (2003). Performance-based rewards for teachers: a literature review.OECD; Peterson, B. (2000). Merit: To Pay or Not to Pay.
14 A estrutura tradicional também adota gratificações e abonos, a partir de critérios diferentes do que os adotados pela estrutura de pagamento por desempenho. Um exemplo são os Estados que incorporam ao salário do professor adicional por local de serviço, adicional por qüinqüênio, gratificação por trabalho em curso noturno, gratificação por trabalho educacional, além da experiência e formação já considerados (Dutra et al, 1999).
15 Notícia veiculada no portal da Folha Online em 25/07/2007, intitulada "Nova secretária quer premiar professores por desempenho". Disponível em http://www1.folha.com.br/folha/educação/ult305u314875.shtml. Acesso em 12/11/2008.
16 Desde 1996, o Saresp - Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo é utilizado pelo governo paulista para avaliar estudantes das 1ª, 2ª, 4ª, 6ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e da 3ª série do Ensino Médio das escolas da rede pública estadual de ensino nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática (informações obtidas no portal da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo www.educacao.sp.gov.br).