SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.3 número2Subjetividade, gênero e poder: a expressão cultural da emoção na integração médico-pacienteAfastamento para tratamento de saúde: sintoma institucional e recurso precário no enfrentamento do sofrimento psíquico no trabalho docente índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista Mal Estar e Subjetividade

versão impressa ISSN 1518-6148versão On-line ISSN 2175-3644

Rev. Mal-Estar Subj. v.3 n.2 Fortaleza set. 2003

 

ARTIGOS

 

Subjetividade e saúde coletiva: produção de discursos na re-significação do processo saúde-doença no pós-moderno

 

 

Cristian Fabiano GuimarãesI; Stela Nazareth MeneghelII

IPsicólogo, Aluno do Programa de Pós-Graduação de Mestrado em Ciências da Saúde, Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos - São Leopoldo/RS. End: Av. T. P. Fonseca, 28/504 - Centro - São Leopoldo/RS - 93020-080. e-mail: cfguima@uol.com.br
IIMédica, Doutora em Medicina Clínica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, Professora do PPG em Ciências da Saúde - Unisinos - São Leopoldo/RS. e-mail: smeneghel@hotmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo aborda a construção da saúde a partir do nascimento da medicina social, no século XVIII, e do advento da clínica individual. Analisa o desenvolvimento do conceito de saúde, demonstrando que as práticas em saúde, o trabalho dos profissionais neste campo e a (des)organização do mundo pós-moderno inferem novos significados para o processo de saúde-doença ou para a representação da enfermidade. Os modos de subjetivação contemporâneos assumem lugar de destaque, pois afirmam a ideologia neoliberal e confirmam a cadeia normativa e disciplinar das ciências da saúde, oferecendo reconhecimento social para tais práticas em saúde coletiva. Com isso, vemos a multiplicação dos efeitos iatrogênicos das ciências da saúde e a destituição da autonomia do sujeito sobre si mesmo e sua saúde, a captura do desejo e o investimento narcísico no gozo da técnica. Por fim, aponta a necessidade da psicologia social de se apropriar da saúde coletiva, contribuindo com o entendimento da saúde e da subjetividade do sujeito.

Palavras-chave: saúde coletiva, subjetividade, relações de trabalho


ABSTRACT

This article is focused on the construction of health from the birth of the social medicine in the XVIII century and from the individual clinic advent. It analyses the improvement of the health concept demonstrating that health practices, the work of professional in this field and the (dis)organization of the pos-modern world, infer new meanings to the health-illness process or to the representation of the illness. The contemporary way of subjectivity assume an important place, because they affirm the neoliberal ideology and confirm the normative and discipline chain of the health sciences, offering social recognition for those practices in collective health. Thus, we see the multiplication of iatrogenic effects of the health sciences and the destitution of the subject's autonomy about himself and his health, the desire's capture and the narcissistic investment in the technique's joy. At last, this article aims the necessity that social psychology seizes collective health, contributing to a better understanding of health and the subject's subjectivity.

Keywords: collective health, subjectivity, work relations


 

 

Os discursos das ciências humanas e sociais na área da saúde coletiva têm buscado enquadre no modelo de racionalidade das ciências naturais. Desde o século XVIII, vemos o desenvolvimento da medicina social como modelo historicamente construído sobre estas bases epistemológicas (Foucault, 1975; 1979; 1987). Os saberes em saúde, por sua vez, reproduzidos pelos profissionais desta área, também são organizados de forma a sustentar uma prática de discursos neste paradigma, tomando como objeto o corpo bio-político como resultado de uma tecnologia disciplinar de poder de organização subjetiva e social.

O Cartesianismo, o Liberalismo, a Revolução Francesa, o Iluminismo e as Ciências Humanas fundaram uma noção de sujeito ligada à interioridade, ao individualismo e à norma. O próprio sistema capitalista necessita de um modo-indivíduo de produção de subjetividade para que sua engrenagem funcione, ou seja, os indivíduos são resultado de uma produção de massa, serializados, modelados, fabricados no registro do social (Guattari, 1986), e o desejo é desterritorializado ao máximo, facilitando assim sua captura. Com isso, estamos diante de um mesmo modo de subjetivação desde pelo menos o século XVIII, composto de linhas liberais, românticas e do regime disciplinar.

Este modo de subjetivação - o modo indivíduo - reproduz relações de poder, cujo foco já não é mais centrado unicamente no estado, mas passa a ser exercido na prática através das instituições totais. É uma forma de poder denominada de disciplina ou poder disciplinar (Foucault, 1983), processo contínuo de normatização através da imposição de regras aos corpos dos indivíduos, esquadrinhamento do espaço, olhar panóptico e estratégias de confinamento. Resultado disso é a modelagem dos corpos com finalidade de fortalecer corpos produtivos e controle demográfico da população, com olhos ao capital-mercantil emergente. A saúde como bem-estar da população é colocada na agenda política da sociedade européia, como direito do cidadão e dever do Estado de assumir compromisso com o bem-estar social.

Os processos de subjetivação são máquinas de produção de subjetividade (Guattari & Rolnik, 1986/1999), conjuntos de elementos originários dos equipamentos sociais e dos dispositivos políticos de poder, da cultura, dos modos de produção econômicos e das instituições que engendram a subjetividade individual e coletiva, encarregados da produção de subjetividade. Eles definem "estilos" do sujeito ser e estar no mundo e constituem o indivíduo, este que:

não cessa de passar de um estado fechado a outro, cada um com suas leis: a família, depois a escola, (...) depois a caserna, (...) depois a fábrica, de vez em quando o hospital, eventualmente a prisão, que é o meio de confinamento por excelência (Deleuze, 1992. p.219).

Entendemos o sujeito como aquele que não é um indivíduo e que não se centra no indivíduo, que não é universal e não se separa de seus objetos, não se prendendo a uma ontologia em particular. A subjetividade, por sua vez, é algo que não é passível de totalização e também não está centrada no indivíduo, porque uma coisa é a individuação do corpo, e outra é a multiplicidade de processos que fabricam subjetividade (Teixeira, 2001). São múltiplos os vetores de formação de subjetividade e, neste sentido, a subjetividade toma o lugar de "coisa", é "coisa produzida", é concebida como algo modelado e produzido nos processos coletivos, sociais e institucionais que não se dão no indivíduo, mas que o atravessam e o constituem como sujeito, dando forma e matérias de expressão ao desejo. Birman (1995) destaca corpo e afeto como dimensões essenciais da subjetividade, sendo que o sujeito é aquele que vivencia afetivamente determinada situação.

O que se passa com o sujeito é uma naturalização das coisas tais quais se apresentam, através da idéia de que o mundo é isso mesmo que está colocado aos olhos, devendo agir conforme o que lhe é dado a priori. Porém, os autores apontam ainda, que relação à idéia de máquina de produção de subjetividade se opõe a idéia de que é possível desenvolver modos de subjetivação singulares, chamados de processos de singularização, como alternativa aos modos de manipulação e telecomando pré-estabelecidos.

Os processos de singularização re-constroem novas maneiras de se relacionar com o outro, novas sensibilidades, diferentes estilos de criatividade através de uma alteridade que coincida com o desejo do sujeito, um gosto de viver, a partir da instauração de dispositivos capazes de mudar a sociedade e os tipos de valores que, em sua maioria, não são os do sujeito. Porque os modos de subjetivação capitalísticos definem coordenadas semióticas determinadas, docilizando o indivíduo e naturalizando práticas e discursos. Assim, os movimentos de singularização geram resistências e rupturas nestas cadeias homogêneas de produção de subjetividade.

Para Michel Foucault o sujeito é invenção, por isso, a partir da análise genealógica, busca entender as condições de possibilidade para a produção do sujeito (Foucault, 1979). Nela, o conhecimento é tomado como invenção, no sentido de oferecer um olhar para o mundo que se faz no olhar, não revelando algo próprio da natureza, mas o que inventamos sobre ela.

Portanto, a subjetividade é produto das redes da história, descentrada do indivíduo, coletiva e nunca individual; é inventada e atende a interesses determinados. A subjetividade é produzida nos registros coletivos da sociedade e da cultura, através de mecanismos e estratégias das mais diversas, definindo modos de existência regulados por leis, verdades, crenças, valores, configurando formas de vida que definem o jeito do sujeito se experienciar no mundo. A invenção de formas de vida nada mais é do que a produção de subjetividades.

O movimento da história da medicina social que nos parece mais presente e que reflete o modelo assistencial de saúde brasileiro é o da medicina inglesa, denominado de medicina para os pobres, mas isso não significa que os outros dois movimentos apontados por Foucault (1979) - a medicina de estado e o urbanismo - também não estejam presentes. Dissemos anteriormente que o movimento da medicina social explora um exercício do poder denominado de bio-política do corpo, que, através do disciplinamento, passa a imprimir uma certa normatividade na saúde, para o controle das populações.

Com isso, a medicina passa a assumir em nível individual, um modo de subjetivação que privilegia o indivíduo, centrado no corpo orgânico e racional, excluindo qualquer outra possibilidade do indivíduo tornar-se sujeito, e negando a condição inacabada do ser humano. A normatividade que está colocada sobre a saúde e o corpo reproduz um conjunto de regras, de estilos de vida, que impedem o sujeito de agir com autonomia sobre si mesmo e seu corpo. Os efeitos deste modo de subjetivação podem ser observados no que é suscitado no indivíduo, a partir do que denominamos de imagens da saúde no cotidiano: toda a parafernália técnica utilizada, as roupas brancas, os hospitais e seus muros, a disposição dos consultórios, os sons de sirenes de ambulâncias, as pessoas morrendo no chão dos hospitais e em filas de postos de saúde, reproduzindo um modo-de-ser individualista e de sociedade de classes na sociedade.

Compreendido como se atualiza a subjetividade e como funcionam os modos de subjetivação, visualizaremos agora seus atravessamentos no campo da saúde. O ator de saúde - peça-chave da relação clínica e agente de produção de discursos - seria aquele sujeito capaz de provocar diferença no contingente homogeneizante instituído pelos modos de subjetivação capitalísticos, através da valorização e criação de processos singularizantes e linhas de fuga que atendam às demandas emergentes neste contexto. Num exercício constante da sua criatividade e do usuário, o ator deve buscar alternativas para a promoção e invenção da saúde que extrapolem os tecnicismos imediatistas (como por exemplo, a utilização de medicamentos).

No que se refere à governabilidade e gestão das organizações de saúde e as relações de trabalho que aí se configuram, podemos observar, de modo geral, nos serviços uma brutal desvalorização da vida individual e coletiva, sustentada por argumentos como a insuficiência de recursos financeiros e políticas de sucateamento do setor público de saúde, que acarretam a deteriorização da qualidade dos serviços e o aumento da desigualdade geográfica e social do acesso à saúde. Com isso, verificamos a crescente banalização da dor e do sofrimento, manifestada na apatia burocrática, no corporativismo, na omissão, na falta de ética e de respeito dos profissionais entre profissionais, e destes para com os usuários.

Dejours (1999) fala da banalização da injustiça social, apontando que há uma tolerância social cada vez maior para com as injustiças sociais e os sofrimentos infligidos a outrem em nossa sociedade, através de um mecanismo que funciona como uma defesa contra a consciência dolorosa da própria cumplicidade e responsabilidade no agravamento da adversidade social. Neste sentido, poderíamos inferir que a dificuldade de muitos profissionais de saúde de se solidarizarem com a dor e sofrimento alheios residiria na incapacidade de lidarem com seu próprio sofrimento psíquico, resultado da forma segmentada e descontínua da organização do trabalho. Pois sabemos que, além da precarização das condições de trabalho, nos serviços de saúde, o fato de lidar com a morte, com a dor, com o sofrimento alheio é ansiogênico, e conseqüentemente, produtor de defesas.

Vemos, nos serviços, uma supervalorização da dimensão econômica e uma obsessão pela modernização, a partir de uma idealização da técnica e da tecnologia em nome da intensificação da produção. A sociedade pós-moderna se coloca sob o signo da urgência, onde a necessidade de tempo se apresenta como uma exigência para o sujeito não ser rejeitado, associado à situação de incerteza radical da vida cotidiana.

Para provocar a massa consumidora e absorver a intensificação da produção da indústria da saúde, no pós-moderno, é necessário produzir sujeitos sempre em constante busca de "sonhos" - desterritorializar o desejo ao máximo, facilitando assim sua captura pelas máquinas. É necessário que um ideal de saúde sustente toda a máquina burocrático-comercial de serviços e de saúde, agregando valor a si mesma, a partir da supervalorização das técnicas terapêuticas como meio para obter uma saúde idealizada, objeto de investimento narcísico que se coloca no gozo da técnica.

Vemos hoje a insuficiência de propostas formuladas com o objetivo de mudar a realidade dos serviços de saúde, enquanto que a alocação de recursos e a racionalização dos resultados são sustentados pelo paradigma positivista cartesiano, via discurso da epidemiologia e dos modelos convencionais de planejamento, sem levar em conta a dimensão humana e a subjetividade. Nenhuma destas abordagens tem sido suficiente para fazer face ao predomínio da racionalidade na relação entre os sujeitos, no interior dos serviços, sejam eles profissionais ou usuários.

Luz (1999) questiona a importância da saúde na cultura atual e elabora a hipótese de que o apelo à saúde se tornou importante na cultura contemporânea porque os valores que asseguram sua presença estão ausentes. E vai além, supondo que 80% dos atendimentos em ambulatórios da rede pública das metrópoles brasileiras são motivados por queixas relativas "ao que poderia ser designado como síndrome do isolamento e pobreza" (p.35) ou pela busca de reorganização do corpo e da saúde, em função da necessidade de o sujeito estar normalizado para o mundo do trabalho. Enquanto isso, aqueles que não estão nas filas de atendimento dos serviços públicos aparecem "despojados de autonomia em relação a sua saúde, irreversivelmente medicalizados" (p.35-36), e dependentes de fármacos, talvez uma nova categoria de dependência química, como já havia apontado Boltanski (1979).

A normalização do sujeito está ligada às representações sobre o corpo, porque o corpo é a instância básica de reconhecimento e classificação social estabelecida entre as pessoas. Neste sentido, as representações e práticas de saúde se ligam a propostas médicas vitalistas ou naturistas atravessadas por representações estéticas relativas ao corpo, grudadas nos referenciais narcisistas da cultura pós-moderna.

Junto aos modelos de governabilidade e gestão dos serviços e o sofrimento psíquico emergente nas relações de trabalho, vemos a necessidade do sujeito de ser cuidado - ser olhado - , e observamos a emergência nos serviços de saúde do profissional e sujeito do desamparo - tão cheios de tudo e de nada, ao mesmo tempo - reproduzindo os sintomas e efeitos colaterais do mundo pós-moderno, na busca constante do gozo ideal da saúde, cada um ao seu jeito.

Fazer funcionar o modo-indivíduo que acompanha as sociedades contemporâneas atende a uma produção de massa que se nutre da serialização do desejo, alinhando o sujeito às exigências do capital. Na saúde, imprimir um diagnóstico e alinhar o sujeito a uma categoria nosológica significa esquadrinhar o espaço entre a saúde e a doença, definindo e administrando o sujeito e suas características através do controle da autonomia sobre si mesmo. Trata-se do exercício da bio-política (Foucault, 1979) do corpo individual e social.

Nesta perspectiva, os serviços de saúde hoje atendem a um contingente de sujeitos disciplinarizados e submetidos a práticas de controle, expostos a efeitos iatrogênicos. A sociedade, de modo geral, através das relações sociais que estabelece, fortalece um sistema de saúde de modelo privatista, que sustenta o projeto neoliberal através da afirmação social da medicina supletiva e de toda a parafernália hospitalocêntrica e tecnológica. A sociedade contribui com esta prática da medicina a partir da manipulação da subjetividade com a oferta de meios narcisistas que exaltam a supervalorização da técnica, como fim para o gozo imediato do sujeito. Tomando como exemplo o discurso da enfermidade, veremos que a forma como as representações sobre a doença aparecem no campo social mostra a maneira como a máquina do capital organiza o desejo.

No entanto, o que aparece, como desvio da norma, pode ser compreendido como uma nova linguagem, outra maneira de aprendizagem cultural que insistimos em desqualificar como inferiores aos modos padronizados de experiência do processo de saúde-doença. Como exemplo, podemos tomar o delírio, considerado pela psiquiatria como um sintoma de um quadro de funcionamento psicótico e exigindo, de acordo com as normas, contenção medicamentosa e, por vezes, física. É ignorado que o delírio pode estar sendo a maneira pela qual o sujeito consegue se apoderar, aprender e se relacionar com a realidade, sendo necessário para o sujeito como processo. Portanto, trata-se de avaliar a doença não apenas como loucura, mas também como sabedoria do corpo, ou seja, como uma experiência de re-formulação positiva do modo de vida e não apenas como privação (Canguilhem, 1966/2002). Assim, saúde passa a ser a capacidade de reação às influências externas, num constante processo de calibração e readaptação aos novos padrões de normalidade e criação de valores de si mesmo.

Alves & Rabelo (1994), em um estudo antropológico da construção da enfermidade como realidade social, levando em conta os processos narrativos pelos quais os indivíduos constroem e expressam a aflição, elaboraram uma compreensão hermenêutica dos significados das construções culturais sobre o discurso da enfermidade. Apontam que "a relação entre a facticidade objetiva dos processos, por um lado, e as significações subjetivas, por outro, constituem uma 'realidade sui generis' e é no entrelaçamento e nos efeitos recíprocos entre essas duas instâncias que a realidade social é construída" (p.223). Levar em conta a produção de subjetividade na saúde é entender que o significado da enfermidade é, em parte, moldado pelas experiências subjetivas, mas, para que tenham uma significação, necessitam ser confirmadas pelo olhar de uma consciência, estruturada sob uma base social específica que acompanha os processos sociais para sua conservação.

Tomando esta idéia, é importante considerar que os profissionais de saúde têm o poder de nomear a enfermidade no sujeito, dando sentido subjetivo ao processo do sujeito, significando-o culturalmente. Tendo em vista os aspectos levantados ao longo deste capítulo, desde a experiência subjetiva ligada à limitação das práticas de saúde fortemente marcadas por uma ideologização, percebemos que as relações que se estabelecem, entre profissionais e usuários, são atravessadas por modos-indivíduos que sustentam a gorda saúde dominante, denominação utilizada por Pelbart (2000), ou seja, uma certa saúde inteiriça do mundo, redonda, perfeita e acabada, fortalecendo um indivíduo destituído de autonomia sobre si mesmo.

O cenário dos serviços de saúde marcado pelas contradições do Sistema Único de Saúde, as relações sociais entre profissionais, usuários e sociedade, bem como a produção de subjetividade na saúde, são elementos que não podem ser considerados separadamente, correndo o risco de reproduzirmos estratégias viciadas de promoção de saúde. Agora, resta analisarmos os efeitos iatrogênicos da saúde, entendida hoje como demanda de cuidado médico e vivência de estilos de vida e sua relação com a subjetividade.

 

O conceito de iatrogênese ou os efeitos da gorda saúde dominante

Entendemos a medicina como uma instituição, ou seja, um saber que organiza um sistema de relações de poder, definindo modos de subjetivação e regras para a sociedade. Esta instituição tem, como papel fundamental fazer com que o ambiente seja visto de forma artificial, elegendo o profissional da saúde muitas vezes como um burocrata responsável pelo destino dos sujeitos, administrador de corpos.

Saúde é objeto das ciências da saúde, por sua vez composta de diversas disciplinas que tomam como objeto a saúde e as práticas em saúde. A medicina ocupa lugar de destaque dentro deste campo do saber e grande reconhecimento social, sustentando o paradigma dominante das ciências da saúde. Com isso, é importante destacar que o que estamos inferindo, neste texto como efeitos iatrogênicos da medicina, pode ser ampliado para os efeitos do campo disciplinar da saúde, de modo geral.

A expropriação do subjetivo e a supervalorização do orgânico vincularam o sujeito ao objeto, fazendo com que houvesse um deslocamento da responsabilidade pela doença, do sujeito para o técnico responsável pela cura do mal, neste caso, o médico, principalmente porque este acumula um campo de saber que faz a leitura deste objeto.

Portanto, compreender os efeitos das ações técnicas diretas do fazer médico, bem como seus efeitos, em nível social e estrutural, permite entender os efeitos iatrogênicos da prática médica. Iatrogênese, do grego iatros=médico e gênesis=origem, refere-se a ocorrência de doenças ou efeitos deletérios provocada pela medicina, os quais não existiriam, se o tratamento aplicado não fosse o que as regras da profissão recomendam; ou seja, são os efeitos não desejados provocados pela empresa médica sobre a saúde, não apenas pelo seu impacto direto, mas igualmente pelas transformações que opera a nível social, simbólico e subjetivo (Illich, 1978).

O efeito iatrogênico gera uma produção profissional de traumatismos psicológicos, não apenas de exclusividade da atenção do psiquiatra, mas em todo o contato com a empresa médica, porque este contato expõe o paciente ao perigo de danos psíquicos, cuja angústia e ansiedade são os efeitos mais comuns. A iatrogênese clínica, específica do contato clínico onde ocorre ato médico, revela que quanto mais o ato exigir intervenção do especialista ou de infra-estrutura dispendiosa, maior as chances de não haver modificação no prognóstico do usuário, maior período de invalidez e a necessidade cada vez maior de tratamentos adicionais para suportar danos, mutilações, angústias e dores provocados pela intervenção médica.

Na história da medicina, há uma evolução do médico artesão para o médico técnico: enquanto o médico artesão exercia sua atividade com indivíduos que conhecia, o médico técnico aplica regras científicas a categorias de doentes; suas falhas saem do campo da ética e desembocam no campo da técnica, provocando um movimento de despersonalização do diagnóstico e da terapêutica, aumentando de forma significativa, a iatrogênese de sua atuação. Não há comprometimento ético com seus efeitos, mas sim uma moral da técnica, revelando qualquer falha como uma falha da técnica. Quando não é problema da técnica, a responsabilidade do erro ou da falha é colocada sobre o paciente, que não soube cuidar de si mesmo.

A iatrogênese social constitui o efeito social não desejado e danoso do impacto social da medicina, refletida na desarmonia dentro do grupo e meio social e físico em que o sujeito se encontra, resultando na perda de autonomia e controle da ação do meio. Ela não está ligada ao comportamento individual do médico, mas ao monopólio radical exercido pela profissão como tal. Trata-se de um controle social pelo diagnóstico, com a etiquetagem das diferentes idades da vida humana de acordo com o sexo. Como exemplo, temos o fato de que as pessoas têm necessidade de cuidados médicos de rotina na gestação, ou porque são crianças ou velhas, ou deficientes, e assim por diante, ampliando cada vez mais o espectro passível de receber cuidados médicos.

A vida, neste sentido, já não é mais uma sucessão de diferentes modos de expressão de saúde, mas uma seqüência de períodos que exige forma particular de consumo terapêutico e intervenção técnica. Neste sentido, a maior parte das despesas com médicos destina-se a diagnósticos e tratamentos, cujos benefícios muitas vezes são nulos ou duvidosos, tendo em vista que qualquer análise de tendências de morbidade, conclui que o modo de vida e o meio são fatores determinantes do estado de saúde global de qualquer população. O estado de saúde é determinado pela alimentação, condições de habitação e de trabalho, a coesão do tecido social e os mecanismos culturais que estabilizam a população.

Enquanto que a cada idade corresponde um meio-ambiente especial para otimizar essa saúde-mercadoria, existirá também o lugar apropriado para cada caso: o hospital, o manicômio, o asilo, a clínica particular, etc., e em cada um desses lugares o indivíduo será instruído por médicos-pedagogos a seguir um comportamento que convém a uma administração da saúde e instrumento de uma sociedade de classes. Vemos o sujeito encaixotado em um meio característico para os membros de sua categoria, e "o homem domesticado entra em entabulação permanente para se fazer gerir numa seqüência de celas especializadas" (Illich, 1978. p.57), através de uma arquitetura de hospitalização dos espaços e medicalização dos desejos.

Chegamos no momento em que já não há mais necessidade de existir concretamente alguma morbidade no corpo, porque a simples probabilidade de surgimento de alguma moléstia, num determinado prazo ou fase de desenvolvimento, já se coloca como motivo de intervenção técnica, ou seja, entra em cena o modelo de risco. Contudo, resta nos darmos conta de que as práticas e procedimentos rotineiros de diagnóstico precoce reforçam a convicção nas pessoas de que são máquinas cuja durabilidade depende da freqüência de visitas à oficina de manutenção, colocando o sujeito na obrigação de consumir uma série, cada vez mais extensa, de artefatos programados pela indústria médica (Illich, 1978).

Assim, concordamos que a intervenção técnica sobre o doente se revela uma estratégia de resultados decrescentes e até negativos, tendo em vista que a administração de remédios - prática mais corriqueira da medicina contemporânea - não é o único tipo de mediação entre o homem e sua doença. Para compreendermos isto, basta lembrar que a mágica do impacto emocional do cerimonial da relação médico-paciente, a cura pela sugestão do xamã ou a interpretação do sofrimento pela religião, também constituem formas de mediação entre o homem e a doença.

A prática médica curativa, sustentada nas intervenções ténico-científicas, não pressupõe mobilizar ou ativar a capacidade do sujeito para se livrar do mal ou a comunidade para curar dele, transformando este em espectador mudo e mistificado pelo teatro médico, fetichizado pelas intervenções técnicas. Além disso, os rituais que se desenvolvem nestas encenações levam o sujeito a acreditar que os tratamentos farão bem à sua saúde, tendo como resultado a privação da atividade de exercer controle sobre suas condições de vida. O doente tornou-se alguém a quem aos poucos se vai tirando a responsabilidade sobre sua doença, resultando numa sociedade mórbida que exige medicalização universal e uma instituição médica que diagnostica e atesta morbidade universal.

Seguindo esta linha de pensamento, observamos que as ciências da saúde mostram uma contraprodutividade paradoxal, tendo em vista que cada instituição, racionalmente planejada com um objetivo técnico, produz efeitos não técnicos que resultam na diminuição do sujeito e no empobrecimento de seu meio, reduzindo a capacidade de modificá-lo. Também podemos perceber que, além de suas funções técnicas, existem outras porque a medicina é sinal de status, tendo como principal objetivo a satisfação simbólica, tornando privilégio qualquer internação em hospital de alta tecnologia, exames, receitas médicas ou psicoterapias. O gozo da técnica médica é o brilho da sociedade narcisista.

O termo gozo está sendo utilizado, neste contexto, para problematizar o sentido que é dado à saúde no pós-moderno, entendida como consumo e mercadoria. Ou seja, o gozo da técnica é o prazer obtido pelo exercício de um desejo subjetivado, acompanhado de satisfação imediata. Este desejo subjetivado é o que é construído na saúde como necessário, como bom, movimentando o desejo para a realização desta necessidade. É o prazer que advém da compensação narcísica de obter o que é socialmente recomendado, de valor estético e identificado com os valores narcisistas da sociedade atual. A técnica é o meio pelo qual se chega ao gozo, é o espetáculo de uma sociedade que pede palco.

O que nos está colocado é que a valorização da saúde-mercadoria é um sintoma dos poderes em favor de uma produção que não busca, em momento algum, a autonomia do sujeito. Ela é valor necessário à justificação do poder econômico e político da nossa sociedade. A única maneira de reverter esta situação é limitando o monopólio radical exercido pelo ato médico. Isso porque a profissão médica se tornou um grupo de administradores burocratas que aplicam princípios e métodos científicos a categorias inteiras de casos clínicos. Em tal medicina alopática, quanto mais a 'variável' paciente é controlável, mais o resultado é previsível e adequado.

Temos então o mundo como um hospital para pacientes por toda a vida, através de ações radicalmente medicalizadas e do crescimento de teorias com o poder de diagnóstico, definição de tratamento e multiplicação iatrogênica dos efeitos médicos. A saúde está relacionada com a significação ativa do indivíduo no corpo social e a instituição médica como gestora do narcisismo, do desejo e da fragilidade do sujeito, paralisando a relação autônoma do indivíduo com o ambiente e com alternativas criativas de levar a vida, de ser e estar no mundo. Portanto, percebemos que as condições de saúde da população vêm se deteriorando, enquanto que as terapêuticas e as técnicas que se destinam ao consumo da saúde e a programação da vida cada vez se complexificam mais e, com isso, percebemos que ao longo de sua história, a medicina não tem conseguido resolver problemas básicos de saúde das populações.

É dada a necessidade da psicologia social de se apropriar e estabelecer diálogo com a saúde coletiva, e, de forma interdisciplinar, junto às outras disciplinas que compõe o campo da saúde, questionar o poderio médico que atravessa os fazeres em saúde, aproximando, cada vez mais, a discussão sobre saúde mental, subjetividade e sofrimento psíquico dos usuários e profissionais de saúde. A promoção da saúde é uma prática que se produz no coletivo, a partir da reflexão do que está instituído e da libertação dos processos instituintes, que em última instância seria a liberação da capacidade criativa dos sujeitos e da possibilidade do indivíduo tornar-se sujeito de si mesmo e de sua saúde.

Questionar o modelo epistemológico das ciências da saúde e ampliar o conceito de saúde-doença, bem como problematizar as práticas pedagógicas que consideram o sujeito como depositário de um conhecimento normativo, são possibilidades para a abertura de novas frentes de intervenção para os trabalhadores de saúde, inclusive os de saúde mental. O trabalho em grupos e a participação popular têm contribuído para a ruptura com os ideais de saúde normativos e homogeneizantes, ajudando a construir sujeitos mais cidadãos e implicados com processos de mudança, no interior dos serviços de saúde.

A saúde coletiva é um campo de conhecimento interdisciplinar, empenhado em explorar oportunidades de diálogo com outras disciplinas; firmando alianças interdisciplinares para experienciar inovações e intercambiar experiências. Com isso, a saúde coletiva analisa as organizações de saúde e os sujeitos da saúde através de uma dinâmica de trabalho em rede, aprimorando as concepções teóricas e técnicas do trabalho em prol da saúde do sujeito. Para isso, entendemos como importante refletir sobre os modelos operatórios vigentes como formas possíveis de organização social de práticas em saúde. A psicologia social é uma disciplina afim à saúde coletiva, compartilhando conceitos e instrumental metodológico, vejamos, por exemplo, os seus esforços na problematização da loucura e o movimento de desisntitucionalização, que correu paralelo à reforma sanitária, contribuindo para o remodelamento do modelo assistencial de saúde mental no Brasil.

Em nível epistemológico, a saúde coletiva se tem esforçado em romper com o conceito de saúde ligado ao paradigma bio-médico, tomando, como objeto de estudo, o processo saúde/doença e as práticas sociais em saúde. A psicologia social pode contribuir como agente e sujeito das práticas sociais em saúde, influenciando e se deixando influenciar pelo paradigma sanitário, o que torna a saúde coletiva e a psicologia social disciplinas complementares, no trabalho com indivíduos, grupos e populações.

 

Referências

Almeida Filho, N. (1997). Transdisciplinaridade e saúde coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, 2(1), 5-20.         [ Links ]

Almeida Filho, N., & Pain, J. S. (1998, August). Saúde coletiva: Uma "nova saúde pública" ou campo aberto a novos paradigmas. Rev. Saúde Pública, 32(4), 299-316.         [ Links ]

Almeida, E. S., Chioro, A., & Zioni, F. (2001). Políticas públicas e organização do sistema de saúde: Antecedentes, reforma sanitária e o SUS: Estado, políticas públicas e saúde: a história dos serviços de saúde no Brasil e o sentido político do SUS. In: M. F. Wescphai, & E. S. Almeida, (Org.), Gestão de serviços de saúde: Descentralização, municipalização do SUS (pp. 13-50). São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo.         [ Links ]

Alves, P. C., & Rabelo, M. C. (1995). Significação e metáforas: Aspectos situacionais no discurso da enfermidade. In A. Pitta (Org.) Saúde e comunicação: visibilidades e silêncios (pp. 217-234). São Paulo: HUCITEC/ABRASCO.         [ Links ]

Benevides, R. (1993). Dispositivos em ação: O grupo. Cadernos de Subjetividade, 1(1), 97-106.         [ Links ]

Birman, J. (1997). Estilo e modernidade em psicanálise. São Paulo: Editora 34.         [ Links ]

Boltanski L (1979). As classes sociais e o corpo. Rio de Janeiro: Graal.         [ Links ]

Campos, G. W. S. (1997). Reforma da reforma: Repensando a saúde (2a ed.). São Paulo: Hucitec. (Originalmente publicado em 1992).         [ Links ]

Campos, G. W. S. (1997a). Análise crítica das contribuições da saúde coletiva à organização das práticas de Saúde no SUS. In S. Fleury (Org.), Saúde e democracia: A luta do CEBES (pp. 113-124) São Paulo: Lemes.         [ Links ]

Campos, G. W. S. (1997b). Subjetividade e administração de pessoal: Considerações sobre modos de gerenciar o trabalho em equipes de saúde. In E. E. Merhy & R. Onocko (Orgs.), Práxis em salud: Un desafío para lo público (pp. 229-266). São Paulo: Hucitec.         [ Links ]

Canguilhem, G. (2002). O normal e o patológico (5a ed). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Originalmente publicado em 1966).         [ Links ]

Cecílio, L. C. O. (1997, julho/setembro). Modelos técnico-assistenciais em saúde: Da pirâmide ao círculo, uma possibilidade a ser explorada. Cad. Saúde Pública, 13(3), 469-478.         [ Links ]

Dejours, C. (1999). A banalização da injustiça social. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas.         [ Links ]

Deleuze, G. (1992). Conversações. Editora 34: Rio de Janeiro.         [ Links ]

Foucault, M. (1979). Microfísica do poder (15a ed.) Rio de Janeiro: Graal.         [ Links ]

Foucault, M. (1983). Vigiar e punir. Petrópolis, RJ: Vozes.         [ Links ]

Foucault, M. (1987). O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária.         [ Links ]

Foucault, M. (1994). Doença mental e psicologia (5a ed.). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. (Originalmente publicado em 1975).         [ Links ]

Foucault, M. (1997). História da sexualidade: A vontade de saber (12a ed.). Rio de Janeiro: Graal.         [ Links ]

Guattari, F. (1986). Revolução molecular: Pulsações políticas do desejo. São Paulo: Brasiliense.         [ Links ]

Guattari, F. (1998). Caosmose: Um novo paradigma estético (2a ed.). São Paulo: Editora 34. (Originalmente publicado em 1992)         [ Links ]

Guattari, F., & Rolnik, S. (1999). Micropolítica: Cartografias do desejo (5a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes. (Originalmente publicado em 1986).         [ Links ]

Illich, I. (1978). A expropriação da saúde: Nêmesis da medicina. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.         [ Links ]

Luz, M. T. (1999). La salud en forma y las formas de la salud: Superando paradigmas y racionalidades. In R. Briceño-León & M. C. Minayo (Orgs.), Salud y equidad: Una mirada desde las ciencias sociales (pp. 25-40). Rio de Janeiro: FIOCRUZ.         [ Links ]

Magalhães, R. (2001, maio/junho). Integração, exclusão e solidariedade no debate contemporâneo sobre as políticas sociais. Cad. Saúde Pública, 17(3), 569-579.         [ Links ]

Nunes, E. D. (1994). Saúde coletiva: História de uma idéia e de um conceito. Saúde e Sociedade, 3 (2), 5-21,         [ Links ]

Palbert, P. P. (2000). A vertigem por um fio: Políticas da subjetividade contemporânea. São Paulo: Iluminuras.         [ Links ]

Paul, P. (1998). Visão transdisciplinar na saúde pública. Conferência realizada em 30 de Setembro de 1998 na Faculdade de Saúde Pública da USP - São Paulo. Recuperado em: 12 maio, 2002: http://www.cetrans.futuro.usp.br/textos/artigo/centro_textos_artigos_saúdepública.htm.         [ Links ]

Rodrigues, A. D. (2002). O devir nómada da sedentarização. Recuperado em: 12 maio 2002: http://www.geocities.com/Paris/Bistro/5657/adr001.htm         [ Links ]

Rolnik, S. (1989). Cartografia sentimental: Transformações contemporâneas do desejo. São Paulo: Estação Liberdade.         [ Links ]

Teixeira, R. R. (2001). Agenciamentos tecnosemiológicos e produção de subjetividade: contribuição para o debate sobre a trans-formação do sujeito na saúde. Ciência e Saúde Coletiva, 6(1), 49-61.         [ Links ]

 

 

Recebido em 17 de março de 2003
Aceito em 07 de abril de 2003
Revisado em 22 de julho de 2003

Creative Commons License