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Revista Mal Estar e Subjetividade

versão impressa ISSN 1518-6148versão On-line ISSN 2175-3644

Rev. Mal-Estar Subj. v.6 n.2 Fortaleza set. 2006

 

ARTIGOS

 

Body Modification (BM): o corpo e a experiência de si no contemporâneo

 

 

Sócrates A. Nolasco

Professor do Instituto de Psicologia da UFRJ. End.: R. Carlos Góis 375 sala 312. CEP: 22440-040 - Rio de Janeiro. E-mail: socrates.alvares@terra.com.br

 

 


RESUMO

Este texto foi elaborado a partir do trabalho de pesquisa que venho realizando junto à população de jovens universitários. Em meu trabalho, busco identificar o uso psíquico que a experiência de marcar o próprio corpo tem para um sujeito, bem como o papel que a consciência de si desempenha neste processo. No Brasil, as modificações corporais têm sido praticadas por pessoas sem habilitação técnica. A prática da modificação corporal está sendo adotada por estes indivíduos como uma ferramenta de afirmação de si mesmo no mundo. No contexto das sociedades cibernéticas e informacionais, as alterações de aparência resgatam o corpo como processo vivo, fazendo-o reaparecer como lugar onde se passa a cena subjetiva. As modificações corporais podem ser analisadas como uma tentativa de pessoalizar o impessoal que perpassa a existência contemporânea. Tais alterações surgem em uma sociedade em que o conceito de natureza humana vem se alterando e se aproximando de um modelo em que a técnica se tornou o seu eixo norteador.

Palavras-chaves: subjetividade, modificações corporais, corpo, consciência, cultura contemporânea, dor, fenomenologia


ABSTRACT

This paper is based on the research work that I have been doing within a population of young college students. The practice of body modification is being adopted by such young individuals as a way of affirming themselves in the world. In Brazil, body modification has been practiced by people without proper technical habilitation, consisting in a high risk practice. In the context of cybernetic and informational societies, the alterations in appearance stand as an attempt to retrieve the body as a living process and make it reappear as the territory of the subjective scene. Body modification can be viewed as an attempt to personalize existence, in the context of an impersonal and image oriented society. Such alterations arise in contemporary culture, where the concept of human nature has been altered over the years, approaching a model in which technical advances became the guiding axis.

Keywords: body modification, body, awareness, conciousness, contemporary culture, pain, phenomenology, subjectivity.


 

 

Introdução

Este trabalho foi elaborado a partir de uma investigação que venho realizando junto à população de jovens universitários, correspondendo à primeira etapa desta pesquisa. Nesta fase, foram feitos um levantamento bibliográfico sobre BM e algumas entrevistas com sujeitos tatuados e com piercing. A bibliografia científica produzida sobre o assunto, publicada pela American Psychological Association, entre os anos de 1990 a 2006, pode ser classificada em três eixos. O primeiro adota um enfoque clínico; o segundo, uma perspectiva da arte (body art) e o terceiro psicológico (psicométrico). Se, por um lado, os estudos psicológicos realizados por Armstrong e MacConnell (1994), Armstrong, Ekmark e Brooks (1995), Armstrong (1998) e Armstrong, Owen, Roberts e Koch (2002) analisam as modificações corporais à luz do primeiro enfoque, por outro, os trabalhos de Braithwaite (2001), Burger (2002), Carrol (2002) e Ceniceros (1998) monitoram a relação existente entre comportamento de risco (risk-taking behaviour), impulsividade e as BM.

Analiso as BM a partir de um enfoque fenomenológico, situando-as como objetos cuja função é ampliar a consciência que o sujeito tem de si mesmo, pois essa relação que ele estabelece com o objeto é característica da consciência. Esta consciência é a um só tempo horizonte1 de si, e do mundo do qual ele faz parte. Merleau-Ponty (1942) diz que devemos nos instalar em uma experiência. Isto vale também para o Eu, pois não há coincidência do ideal do Eu com o Eu mesmo. O Eu é uma intuição empírica indeterminada. Por seu intermédio, sabemos que não possuímos nem a chave do mundo nem a de nosso Eu. Tudo aquilo que aprendemos, diz ele, são apenas manifestações, fenômenos. Portanto, só podemos apreender a unidade do Eu em suas produções.

Compreendo as BM como uma prática que serve ao sujeito como uma possibilidade para determinação do Eu. Deste modo, ele atenua alguma dúvida cética que ameaça o seu existir, tomando as modificações corporais como uma ação de potência que lhe confere uma experiência de continuidade. Marcando-se, o sujeito reivindica uma certeza de sua permanência, diluída pelas sociedades do efêmero.

No contemporâneo, as BM podem ser analisadas como instrumentos cuja função é propiciar ao sujeito a posse de si mesmo, em um mundo que o destitui continuamente deste lugar. As democracias de mercado não o reconhecem enquanto um Eu singular, apesar de sustentarem um discurso a favor da individuação.

Encontrei, nas entrevistas feitas com sujeitos tatuados, uma menção de que estas marcas lhes serviam como elementos através dos quais sentiam-se donos de si mesmos. Por intermédio desta BM, o sujeito se esforçava para elaborar a experiência de possuir a si. Neste caso, o corpo era mais do que um suporte sobre o qual se desenrola a cena subjetiva; ele também funcionava como um agente promotor do esforço de individuação, através do qual o Eu aspira determinar-se. Sentir-se sendo um corpo era uma conquista necessária à determinação do Eu.

Analiso o fenômeno das BM à luz de uma estreita relação entre Psicologia, Biologia e Cultura como algo que vai além do reducionismo biológico, herdeiro da formulação cartesiana que norteou um grande número de teorias Psicológicas, bem como de um construtivismo desencarnado, adotado para definir a experiência subjetiva. A Psicologia muito se beneficia das descobertas da Biologia.

Os sujeitos, quando se tatuavam, narraram que durante o processo de implantação das tatuagens, eram surpreendidos por algumas fantasias e lembranças de cenas que já haviam vivido. Estes elementos subjetivos se associavam a essas imagens, dando-lhes um realismo emocional incorporado e registrado pela consciência.

As tatuagens eram objetos segundo os quais podia-se identificar um modo de subjetivação. Por meio delas, percebi a existência de um processo de aquisição e posse de si mesmo, consolidado através da afirmação de alguma singularidade no mundo. O que quer dizer que o corpo não pode ser compreendido como algo menor em relação à cognição, como formulou Descartes, mas também parte da matriz subjetiva. Tomando por base esta perspectiva, Keleman (1999) afirma que o inconsciente é corpo, lembrando que, em seus estudos, Freud inseriu a natureza dentro do sujeito, quando formulou o conceito de pulsão. Até Freud, a natureza esteve fora do sujeito.

Isto nos abre uma perspectiva para pensar as BM mais como uma estratégia de apropriação do Eu no mundo, do que como um recurso de integração do sujeito a uma estética da superfície. Assim sendo, pensar a experiência sensorial e perceptiva como aquela que não é somente subjetiva é compreender os tipos de processos psíquicos que conferem significado às BM. Os dois tipos de consciência descritos por Edelman (1992), apresentados posteriormente neste texto, serão úteis para compreendermos que o conhecimento de si é uma experiência encarnada.

Hipócrates, De Cós (420 AC), quando escreveu Corpus Hippcraticum, apresentou o corpo segundo uma perspectiva hidro-climatológica, cuja compreensão se aproxima de um enfoque fenomenológico. Por sua vez, Lacan2 não foi o primeiro a falar sobre a idéia de uma subjetividade desencarnada, privilegiando dimensões da linguagem para se referir a ela. Hobbes (1655) apresentou no livro De corpore, uma aritmética dos corpos, no qual a lógica e a linguagem desempenham papéis de destaque.

Para as Ciências Humanas, as análises sobre as questões do corpo seguem tanto uma vertente naturalista quanto uma construtivista, que o reconhece como produto de determinantes culturais. Ainda nos anos 70, o corpo era compreendido ora como parte da natureza, divorciado da experiência subjetiva, ora como produção da cultura. Ambas as perspectivas são produtos do problema cartesiano, pois se a matéria se opõe ao espírito, como se constitui o fenômeno humano? A Filosofia apresentou quatro alternativas para resolver este problema, das quais Merleau-Ponty (1942) faz parte de uma delas. Ele dedicou-se a compreender o viver para além de uma cisão fundadora, mas como fruto de uma tensão criativa.

Segundo um entrevistado, as BM foram utilizadas para marcar uma passagem importante de sua vida, como foi o nascimento de seu filho. Um outro entrevistado empregou as BM como uma forma de registrar a morte de um ente querido. Também havia aqueles que as utilizavam como um amuleto protetor. Um dos jovens entrevistados afirmou que, com as modificações, ele não queria ser diferente, mas ser ele mesmo. Esta parece ser a questão que as BM procuram solucionar no contemporâneo.

Quando escolhe modificar-se, o sujeito opta por submeter-se a procedimentos que inicialmente o diferenciariam dele mesmo, pois modificando sente-se assertivo em relação à posse de si mesmo. O resultado desta diferenciação aspira fortalecer os sentimentos de continuidade e integração do Eu, concretizado por meio das incisões feitas sobre a pele. Neste processo, a consciência estabelece uma série de conexões entre as sensações geradas pela realização das marcas e a experiência emocional de sentir-se vivo.

Por ser uma experiência encarnada, a experiência do viver determina dois tipos de processos segundo os quais o Eu se reconhece. Um deles pode ser identificado como consciência primária e um outro chamado de consciência elaborada. Keleman (1985) afirma que o sujeito pode intervir sobre seu processo de subjetivação, através do contato e do uso de seu corpo. Para desenvolver esta premissa, ele articula a postura somática à experiência emocional, apresentando os tipos somáticos e constitucionais3. Assim sendo, o corpo é um lugar onde é possível experimentar novas possibilidades de encontro consigo mesmo. Se marcar o corpo põe o sujeito em contato consigo, a forma de marcá-lo, o que sente e imagina quando realiza esta escolha, bem como as conexões internas que faz ao se submeter a elas, isso passa a ser um modo de produzir conhecimento sobre si mesmo.

Comumente encontramos relatos de dor associados às BM. Portanto, pensar de que maneira esta experiência está associada aos mecanismos de consciência, através dos quais o sujeito amplia a compreensão que tem sobre si, passa a ser relevante para este estudo. Não penso as BM como um produto de mecanismos sádicos ou masoquistas, mas, como lembra Atikinson (2004), um ato de comunicação que envolve afetos, consciência e corpo. Procuro identificar se as BM transformam a consciência que o sujeito tem de si mesmo, mais do que investigar as patologias que possam fazer parte destas modificações.

Fizemos algumas entrevistas para um estudo piloto, as quais, posteriormente, serão estendidas a um grupo de 100 estudantes universitários. O grupo investigado será subdividido em três subgrupos. O primeiro que já fez uma ou mais BM, o segundo que já decidiu por fazer e será acompanhado antes e depois das BM, e o terceiro que não fez e não pretende fazer. Com isso, procuro identificar não só os conteúdos subjetivos que estão associados à idéia que cada participante dos grupos tem sobre si mesmo, mas também como eles se definem, quando articulam a marca com o modo como experimentam a si mesmos.

Não procuro descrever traços de personalidade ou, ainda, elaborar uma etnografia4 sobre as BM, mas analisá-las como um evento que faz parte do corpo fenomenal.

 

As Modificações Corporais (BM)

Compreensão das práticas de modificação corporal compreendendo-as como ações mutilatórias em nome de algumas tradições, ou ainda como patologias do sujeito.

Todavia, a presença de BM é muito antiga. Por exemplo, o primeiro sacrifício humano do qual temos registro, ocorreu no ano 20 000 a.C., definido pelo uso da mutilação de dedos em cerimônias religiosas, como apresenta Taylor (2000) em seu trabalho. Nas análises feitas por este autor, encontramos referências a outras práticas sacrificiais, dentre elas, destaca-se a primeira castração humana ocorrida no ano 4000 a.C. (Uruk). No ano de 1200 a.C., as leis assírias puniam a sodomia com a castração. À exceção dos filisteus, os hebreus, cananeus e outras nações antigas se valiam da circuncisão como rito.

Este tipo de mutilação também se fez presente no início da era cristã. Taylor diz que o primeiro eunuco surgiu no ano de 399 d.C. Entre os anos de 1492 e 1496, os europeus encontram no Caribe práticas de canibalismo e castração. No ano de 1520, o celibato clerical foi comparado a uma autocastração, um ato de circuncisão pela fé, dizia Luther. Referências sobre a existência de eunucos apareceram até o ano de 1721 (caso de Farinelli). Em 1894, foi realizada a primeira vasectomia humana. Em 1908, Freud formula o complexo de castração.

Marcar o corpo não é uma característica de nosso tempo. Essa prática esteve presente em sociedades antigas5. As modificações assumem, hoje, uma particularidade nas pesquisas em Ciências Humanas e Sociais: elas estão sendo analisadas como indícios de delinqüência ou de alguma psicopatologia, a exemplo do que acontecia no passado. No rosto dos criminosos, em torno de seus olhos, era tatuada a palavra thug.

Atualmente, existem dúvidas sobre quais seriam as fronteiras que definem as BM. Uma cirurgia plástica seria uma BM? E uma bárica? Por que a tatuagem e o piercing são considerados BM? Para este trabalho, tomo as BM como tipos de intervenção que o sujeito faz sobre seu corpo e cuja técnica se vale de pouquíssimas doses de anestésicos. Portanto, elas podem ser classificadas como sendo:

1) Comuns (perfurações, tatuagens, marcas por queimaduras e cortes);

2) As consideradas Extremas (Suspensão, implantes transdérmicos, incisões subcutâneas);

3) Sexuais (castração, penectomia, circuncisão masculina e feminina);

4) Radicais (amputação);

5) Não cirúrgicas (anorexia, coletes modeladores, alargadores, bodybuilding e foot binding ).

Existem incisões (mutilações) que envolvem perfurações, como por exemplo, as escarificações, marcas na pele deixadas por ferimentos profundos cuja função é produzir fibroses. Tanto este procedimento quanto os implantes se destacam pelo alto potencial de dor que causam, quando são realizados.

Uma das diferenças entre as BM e as cirurgias plásticas é o grau de distanciamento que as primeiras têm dos padrões estéticos e de beleza, valorizados socialmente. Um dos sujeitos entrevistados disse que quando decidiu pelas modificações o fez considerando a importância que um evento tinha tido para ele, pois desejava mantê-lo vivo em seu corpo. A tatuagem atende a este propósito de reter o caráter efêmero e transitório da experiência vivida. A relação entre as BM e a cultura contemporânea é diferente da que existia entre elas e as sociedades tradicionais, a exemplo dos Maoris. Hoje em dia, as BM circulam como valor individualista que se afirma cada vez mais como algo radical.

Sua busca de originalidade é singular, pois as BM podem ser pensadas como um apelo individual para vencer a soberania do vazio em que o simbólico ficou exaurido, e do qual ele possa novamente emergir.

Nos EUA, o número de jovens que se submete a diferentes tipos de modificações corporais aumenta a cada dia. Segundo Cronin, T.A. (2001), estima-se que, nos últimos três anos, a taxa de crescimento anual daqueles que realizaram estas transformações seja de aproximadamente 25%. No Brasil, não existem estatísticas a este respeito. Aqui as BM têm sido praticadas por pessoas sem habilitação técnica, o que tem aumentado o potencial de risco cirúrgico e ampliado o impacto da experiência traumática.

As BM em uma cultura des-naturalizada

No contemporâneo o conceito de natureza humana vem se alterando, aproximando-se cada vez mais de um modelo mediado pela técnica. Contudo, as BM se diferenciam dos procedimentos cirúrgicos em que a técnica mais avançou, como é o caso das cirurgias plásticas, por conta do esforço feito pelo sujeito para estar mais perto da singularização de si mesmo. Para ele, elas servem para conectá-lo com vários níveis de subjetivação, que vão desde a experiência sensória, até o valor que agrega a si mesmo com esta experiência. Para o sujeito, um dos problemas que este tipo de modificação tenta solucionar é o de lhe conferir um corpo em uma sociedade na qual ele é fabricado. As BM podem ser consideradas como tentativas subjetivas de resolver o problema de se viver em um mundo sem corpo, ou ainda, em que a natureza do corpo foi substituída pela da máquina. Neste cenário, o apagamento do simbólico corresponde ao esforço de uma cultura que manipula cada vez mais o corpo, fazendo emergir uma subjetividade que exclui o corpo, não tem sombra porque se diluiu na transparência. Desta maneira, Baudrillard, J. (1995) fala das democracias de mercado, como sendo aquelas que se apóiam sobre as ideologias de felicidade e igualdade. Ele nos diz que um dos efeitos da aceleração da modernidade, quer seja técnica, mediática, política ou sexual, foi nos conduzir a "uma tal velocidade de liberação que acabamos por escapar a esfera referencial da historia e do real". As BM também são frutos disto.

O sujeito, ao modificar seu corpo, busca resgatar-se num lugar onde a experiência de si ainda é indeterminação. Impossibilidade para as sociedades de hoje, nas quais tudo está determinado e definido somente enquanto economia, ou mercado. Neste caso, inexiste possibilidade de subjetivação que se constitua como uma intervenção criativa de si no mundo.

No contexto das sociedades cibernéticas e informacionais, produtos da radicalidade da cultura, as alterações de aparência podem apresentar o corpo como um lugar através do qual se desenrola a cena subjetiva, bem como um modo de o sujeito incorporar o mundo e parte do que nele viveu. A partir de Descartes, uma compreensão sobre o corpo o colocou como um objeto menor em relação ao pensamento. Para a Filosofia Moderna, a noção de consciência é o de uma relação da alma consigo mesma, de uma relação intrínseca ao homem, "interior" ou "espiritual", pela qual pode conhecer-se (moral) de modo imediato e privilegiado e, portanto, julgar-se de maneira segura e indefectível (teórico).

Enquanto Keleman (1985) apresentou o corpo como um processo vivo e articulado à cena subjetiva, Merleau-Ponty (1942, 1945) buscou superar o problema cartesiano conferindo ao "sou" uma prioridade sobre o "penso". Na compreensão deste filosofo francês, crítico das pesquisas que investigam os limites da consciência, deve-se voltar a um mundo de antes do conhecimento e a um sujeito "fadado ao mundo", para fazê-lo apropriar-se de si mesmo. Deste modo, a percepção é caracterizada como uma operação que está vinculada à relação entre o sujeito e o mundo. Esta premissa nos auxilia a problematizar a noção de cogito cartesiano, na medida em que a consciência se torna uma via por intermédio da qual o sujeito se descobre como "ser-no-mundo". A consciência une a um só momento os processos fisiológicos e psíquicos, sendo a existência o terceiro termo entre o "psíquico e o fisiológico".

As BM podem ser pensadas como fenômenos que fazem coexistir a um só tempo natureza e cultura, distanciando-se da formulação cartesiana que fundamentou a diferença entre ambas. Percebo que, através das BM, podemos discorrer sobre a interdependência entre natureza e cultura, usando para isso a concepção de consciência criada por Edelman (1992)6. Segundo ele, mesmo que a Consciência Primária se diferencie da Consciência Elaborada, tomando por base os processos que caracterizam uma e outra, ambas existem para dar suporte à dinâmica subjetiva. Neste caso, estar consciente não é se aperceber dos próprios estados, idéias, sentimentos, dentre outras coisas, nem é o que a Filosofia Moderna e Contemporânea apresentaram como tal, pois para a Filosofia Moderna, a consciência foi compreendida como correlata à esfera de interioridade, a que retorna sobre si mesma, criando para si uma indagação interior.

Para Eldeman, a consciência é um processo calcado na anatomia neural e vinculado a processos neuromotores, se aproximando das formulações feitas por Heidegger (1927), que descaracterizam o primado metafísico da consciência e as distinções apresentadas por ela no que tange às distinções entre "interior" e "exterior", entre o que está na e o que está fora da consciência. Tudo isto deixa de fazer sentido para ele.

Se considerarmos as definições de natureza e cultura, bem como a de Consciência Primária e Elaborada, não encontraremos uma hierarquia entre elas segundo a qual uma dimensão submeteria a outra. Assim como não há valor maior conferido a nenhuma delas. Por este motivo, sabemos que não existe qualquer análise externa objetiva, mesmo que ela seja possível, que possa suplantar as respostas individuais e a troca intersubjetiva que tem lugar dentro de uma determinada tradição ou cultura.

 

O corpo e a consciência de si

Na história da Filosofia, localizamos determinados eventos que foram responsáveis pelo modo como a Psicologia apreendeu a consciência, o corpo e a experiência de si. Tanto do ponto de vista reducionista, quanto universalista, a Psicologia se valeu do percurso filosófico para formular o psíquico e sua relação com a consciência.

A história da filosofia moderna foi marcada pelo norte da prerrogativa cartesiana, assim como pela tentativa de resolver os problemas criados por ela. Este problema, conhecido como o problema de Descartes, como apresenta Abbagnano (1991), marcou o início da Filosofia Moderna e serviu de ponto de partida para desdobramentos que nortearam muitas reflexões filosóficas, bem como inspirou determinadas correntes psicológicas. Descartes fundou a oposição entre natureza e cultura, que serviam de apoio para delimitar o Consciente do Não-consciente. Neste sentido, a consciência deixou de fazer parte do corpo, passando a se definir como uma propriedade do espírito.

Keleman (1985) afirma que não há distinção entre o corpo e o eu. Assim sendo, não existe um eu sem um corpo. Essas afirmações buscam compreender a imbricada relação entre soma, psiquismo e consciência. Ele sinaliza que diferentes estados de tensão e sofrimento emocional vividos por um indivíduo definem padrões de organizações somáticas.

Freud, no prefácio à edição alemã de Scatologic Rites of All Nations, de John G. Bourke, recordando as aulas dadas pelo professor Brouardel, em Paris, no ano de 1885, comenta que uma vez, enquanto ele ilustrava as características pelas quais se pode adivinhar a condição social, o caráter e a procedência de um cadáver anônimo, ouviu o tal professor dizer que les genoux sales sont le signe d' une fille honnête. Sobre isto, Sigmund Freud, em 1913, comentou que a higiene do corpo acompanha mais o pecado que a virtude e que ele se deteve mais tarde a isto, quando o trabalho psicanalítico o permitiu perceber o modo como os homens civilizados encaram o problema do próprio corpo. Em uma outra passagem ele retorna esse ponto comentando que o consumo de sabão é tomado diretamente como medida de civilização.

O corpo não é um ente, mas um processo vivo, através e a partir do qual a experiência de si mesmo acontece. Enquanto realidade somática, o corpo demonstra como a vida pessoal foi e está sendo continuamente organizada, afirma Keleman (1985), através de sua Psicologia Formativa.

O corpo na Filosofia

A filosofia moderna prosperou a partir da oposição entre corpo e espírito (psiquismo e mente). Descartes (1637) foi o responsável pelo abandono do conceito de corpo como um instrumento7. Segundo este autor, todo movimento e calor existentes no humano pertencem exclusivamente ao corpo, não dependendo em absoluto do pensamento. Descartes afirma que o corpo de um homem vivo difere do corpo de um morto do mesmo modo que um relógio ou outro autômato que está carregado. Ele complementa dizendo que o corpo contém em si o princípio corpóreo dos movimentos para os quais foi projetado, juntamente com todos os requisitos para agir; todavia difere do mesmo relógio ou da mesma máquina, quando estes estão avariados ou quando o princípio do movimento deixa de agir.

A tese cartesiana se manteve ao longo da história como um pressuposto teórico que norteou durante muito tempo as investigações científicas sobre os corpos vivos.

No que diz respeito à filosofia, a formulação cartesiana trouxe um problema até então desconhecido pela filosofia clássica que definia o corpo como instrumento. Este problema se refere à relação entre corpo e alma.

Diante do dualismo, podemos pensar: como e por que substâncias independentes se combinam para formar o humano? E como o humano, sendo uma realidade única, pode resultar da combinação de duas realidades independentes?

Para estas formulações, a filosofia moderna e contemporânea produziu quatro "soluções". Apresento a seguir cada uma delas com seus respectivos representantes. Em meu trabalho, utilizo a quarta posição por ela me oferecer um conjunto de idéias através das quais foi possível pensar de que forma os registros psíquicos gerados pelas modificações corporais interferem na experiência de si mesmo e no vínculo que estes indivíduos estabelecem com o mundo.

A primeira nega a diversidade das substâncias reduzindo a substância corpórea à substância espiritual. São seus representantes: Leibniz (1721) e Bergson (1896).

A segunda considera o corpo como um sinal da alma. Esta formulação é próxima à anterior e encontra ressonância nos escritos de Hegel , diz ele:

A alma, em sua corporeidade, inteiramente formada e constituída como sua, está para si mesma como sujeito singular; e a corporalidade é, desse modo, a exterioridade enquanto predicado no qual o sujeito se reconhece só a si. Essa exterioridade não se representa a si mesma, mas à alma: e é um sinal desta (Hegel, 1807, p. 138).

A terceira nega a diferença das substâncias, mas não a diferença entre alma e corpo, e, portanto, considera a alma e o corpo duas manifestações de uma mesma substância. Encontramos em Spinoza (1988) que deu suporte para a doutrina do paralelismo psicofísico que deu origem à formação da Psicologia Científica Moderna, servindo-lhe como hipótese de trabalho.

A quarta solução considera o corpo como uma forma de experiência ou como um modo de ser vivido, que tenha um caráter específico ao lado de outras experiências ou modos de ser. Os precedentes desta formulação estão presentes nas reflexões de Schopenhauer (1818/2001) e Bergson (1896) citado, anteriormente, na primeira. Todavia, é na Fenomenologia de Husserl (1913) que encontramos sua forma típica de encaminhamento. Diz ele:

Na esfera do que me pertence, o que chamamos natureza pura e simples não possui mais o caráter de ser objetivo e, portanto, não deve ser confundido com um estrato abstraído do próprio mundo ou do seu significado imanente Entre os corpos desta natureza reduzida a 'o que me pertence', encontro meu próprio corpo, que se distingue de todos os outros por uma particularidade única: é o único corpo que não é somente um corpo, mas o meu corpo, é o único corpo, no interior do estrato abstraído, recortado por mim no mundo ao qual, de acordo com a experiência, eu coordeno campos de sensação de modos diferentes; é o único corpo de que disponho de modo imediato, assim como disponho de meus órgãos (Husserl, 1913, p. 121).

Sartre (1946) e Merleau-Ponty (1945) também são representantes desta perspectiva.

 

Consciência

Minha intenção não é fazer um inventário ou análise sobre os conceitos de consciência. Contudo, os estudos realizados por Edelman (1988, 1989, 1992), Freud (1900), seguido aos de Mandler (1984), Lakoff (1987) e Modell (1989), me serviram de suporte para construção do quadro teórico a partir do qual defini o eixo metodológico de minha pesquisa.

Lakoff, no trabalho citado, elabora uma história das idéias e uma crítica das teorias do espírito que não recorrem à Biologia, apresentando a importância de reconhecermos que a vida do espírito é experiência encarnada. Modell (1989) aplica a teoria da seleção de grupos neuronais à Psicanálise, enquanto Mandler (1984) analisa a natureza das emoções em seus múltiplos níveis segundo uma perspectiva não filosófica. Diante disto, considerei importante investigar o modo como o corpo foi pensado pela Filosofia e o quanto este percurso contribuiu para a crença contemporânea de que corpo e espírito têm substancias distintas.

A consciência se constitui de processos que são difíceis de analisar. Lembrando William James, "sabemos o que é a consciência desde que ninguém nos peça para definir". Edelman utiliza algumas propriedades para defini-la. Para ele, a consciência é pessoal; sofre modificações, sendo, no entanto, continua, lida com objetos independentes de si própria e é seletiva no tempo, ou seja, não esgota todos os aspectos dos objetos com os quais lida.

A consciência possui intencionalidade - ela é sempre consciência de coisas ou de acontecimentos. Para Edelman (1989), ela confunde-se com a volição, não sendo considerada uma cópia da experiência, um retrato da "realidade", uma instância mental marcada pela presença de imagens mentais e de sua participação nos padrões de comportamento. Tanto para este autor quanto para Keleman, S. (1985), a consciência não é uma categoria, mas um processo vivo que se altera a partir do vivido. Esta contribuição nos faz pensar, por exemplo, que o que movemos nunca é nosso corpo objetivo, mas o nosso corpo fenomenal, como diz Merleau-Ponty (1945).

Utilizo as definições de Consciência Primária e Elaborada, formuladas por Edelman (1992), para acompanhar os tipos de processos psíquicos e a seqüência dos qualia8, que marcam os momentos da experiência imediata do sujeito, quando ele se submete à modificação corporal, bem como para identificar o modo como o sujeito categoriza cada uma delas.

Sabemos que alguns tipos de aprendizagem de processos conceituais e mesmo algumas formas de indução se fazem sem a participação da consciência. Edelman (1992) distingue a Consciência Primária (percepção, sensações) da Consciência Elaborada (linguagem). Enquanto a primeira é definida como um estado segundo o qual é possível estarmos mentalmente cientes das coisas que se passam no mundo, em termos de imagens mentais, a segunda envolve o reconhecimento por um sujeito pensante, de seus próprios atos e afetos. A decisão por uma modificação corporal envolve dimensões da consciência elaborada e sua realização, impactos perceptivos e sensórios pertencentes aos processos primários de consciência. Desta maneira, o fenômeno que examino encarna um modelo do que é pessoal, do passado e futuro, bem como do presente. É a consciência elaborada que permite ao sujeito saber-se consciente, seus mecanismos são postos em ação para que modificações corporais sejam realizadas. Todavia, a experiência de dor provocada pelas incisões no corpo recoloca em cena determinadas dimensões da consciência primária.

Os processos pertencentes à Consciência Primária não estão habilitados para possibilitar ou conferir sentido a uma pessoa e, com isto, vinculá-la a seu passado ou futuro. Eldeman (1992) a compara a estados não-lingüísticos e não semânticos.

A consciência primária é o estado em que nos encontramos mentalmente cientes das coisas que se passam no mundo, considerando imagens mentais no presente. Este estado não é acompanhado por qualquer sentido de uma pessoa com passado e futuro. Já a consciência elaborada envolve o reconhecimento por um sujeito dos seus próprios atos ou afetos. Ela encarna um modelo do que é pessoal e do passado e futuro, tal como o presente. Uma de suas propriedades é o modo que permite ao sujeito um conhecimento de si, um saber não-inferencial ou imediato dos eventos mentais, sem envolvimento dos órgãos dos sentidos. Pode-se dizer que é aquilo que o sujeito tem além da consciência primária, permitindo-o estar consciente de ser consciente. Quando as incisões são feitas sobre o corpo, a consciência primária atua por meio de seus processos, categorizando as sensações geradas por elas. As marcas favorecem o aparecimento de um contínuo entre a experiência tátil e a subjetiva. O contínuo, que foi gerado por uma experiência intencional, usa a memória como um recurso para identificação de novos qualia que o sujeito incorpora para si.

Os fenômenos das modificações corporais recriam uma situação adversa à qual o sujeito precisa se adaptar. Para isso, ele convoca sua memória de experiências anteriores de dor e privação que tenha sofrido. Isto serve para reforçar sua capacidade de adaptação a uma situação adversa provocada por um mundo que não controla e que o ameaça.

Edelman afirma que a conquista da consciência é um dos ganhos obtidos durante o percurso evolutivo, pois a aquisição desta conferiu ao sujeito um aumento de sua capacidade de adaptação. Para Edelman, a consciência é um processo que emerge durante a evolução e o desenvolvimento do sujeito, articulando-se com outros processos mentais, tais como a produção de conceitos, a memória e a linguagem. Os qualia, ao serem sistematizados pelos processos da consciência, servem ao sujeito como aberturas para o mundo exterior, através das quais ele se reconhece. Ele não considera a consciência como algo fechado sobre si mesmo, pois, para ele, assim como para Merleau-Ponty, o mundo não é aquilo que o sujeito pensa, mas o que ele vive. Por estar aberto ao mundo, o sujeito se comunica com ele; apesar de não possuí-lo, ele é inesgotável. Por meio dos processos da consciência, o sujeito elabora mapas neurais e desenvolve cartografias cuja importância é a de lhe permitir fazer reconhecimentos. Este sistema gerador de idéias tem como função categorizar a experiência, criando uma compreensão sobre si mesmo e sobre o mundo. Portanto, a categorização perceptiva, a memória e a aprendizagem fazem parte das funções superiores que auxiliaram o sujeito na aquisição de novas funções, como, por exemplo, a memória especializada e a capacidade conceitual. Esta tríade nos permite entender melhor como funciona a consciência e a intencionalidade.

As BM são atos intencionais que envolvem recategorizações e procedimentos da memória9 dinâmica. O que isso quer dizer? Quando o sujeito realiza uma modificação corporal, produz inputs que acionam procedimentos de memória. Por meio de associações, uma seqüência de lembranças o conduz até situações cuja experiência sensória corresponde ao ato de marcar, perfurar ou escarificar seu corpo, conferindo continuidade onde havia indeterminações do Eu. Ao realizá-las, o sujeito faz um ajuste na imagem que tem de si mesmo, transformando-a em um qualia que lhe confere valor.

Quando o sujeito marca em seu corpo o nome do filho que acabou de nascer, ele utiliza um procedimento através do qual recategorizará a imagem que tem de si mesmo, pois o processo de marcar lhe permitirá categorizar a experiência de ser pai, diferenciando-a em relação a outras experiências, incluindo-a em si como um novo valor. Este nome marcado é uma memória do presente, cuja intencionalidade é preservá-lo na consciência. Posto deste modo, o sujeito, quando marca seu corpo, retorna a um mundo anterior ao da reflexão, ao mundo vivido, inserindo-se numa cadeia através da qual se sente encarnado. As sensações e sentimentos que essa marca lhe propiciará, o introduzirão em um mundo anterior ao do conhecimento que ele tem dele mesmo, favorecendo a criação de uma nova dimensão de si, agora visível ao mundo.

Do modo como alguns sujeitos descrevem a experiência de marcar ou perfurar o corpo, percebemos que tudo aquilo que sentem, quando o procedimento está sendo realizado, fica articulado a uma elaboração de uma consciência que eles estão formando de si mesmos. As sensações geradas garantem autenticidade ao significado da marca, e, com isso, podem alterar a memória que têm de si.

Creio que as modificações corporais afetam os estados de consciência no que tange à percepção que o sujeito tem dele mesmo. Para tanto, faço uso da noção de qualia refletindo, através de suas falas as impressões geradas pelas modificações, pensando em que sentido elas conferem continuidade à experiência de si mesmo. Considero que as propriedades da consciência são pessoais; sofrem modificações, sendo, no entanto, contínuas; lidam com objetos independentes de si própria e são seletivas no tempo, ou seja, não esgotam todos os aspectos dos objetos com os quais fainam.

 

Considerações Finais

As práticas das modificações corporais têm sido compreendidas segundo a perspectiva de Gray (1987), que tenta estabelecer uma correlação entre elas e alguma psicopatologia do sujeito. Muito embora essa relação possa ser possível em alguns casos, não podemos correr o risco de generalizá-las para todos aqueles que se tatuaram ou tenham piercing.

As BM também podem ser compreendidas como um processo que articula em torno de si diferentes dimensões do sujeito. Quando estas experiências são realizadas, geram conexões, contínuos que oferecem ao Eu uma nova estatura de existência. A experiência sensória e estética serve como aquela que agrupa em torno de si uma nova possibilidade de afirmação do Eu para si mesmo, no mundo. Em última instância, a experiência de dor que aparece descrita nestas práticas contemporâneas, serve para iniciar um contato do sujeito consigo mesmo, à luz de lembranças e experiências que já viveu e que foram superadas. Superar talvez seja o esforço que o motive a, intencionalmente, marcar seu corpo.

No passado, essa era uma aspiração da cultura em relação a seus membros; o crescimento era coroado por uma superação. Esta premissa que norteou ritos de passagem, estabelecendo padrões de continuidade e de inclusão para o sujeito, desapareceu das sociedades tecnológicas e informacionais.

Para o sujeito que realiza uma BM, a dor faz parte da experiência de autenticidade reivindicada por ele. Os entrevistados não fazem um relato de prazer, quando passam pela experiência de dor. Todavia, parece que a dor provocada pela BM fica menor diante da falta de receptividade do mundo para suas angustias. Elas que, ao serem elaboradas, poderiam marcar um caminho pessoal e singular para o sujeito.

Se não há distinção entre o sujeito e o corpo, se ele é o corpo, marcá-lo pode ser compreendido como um modo de apropriar-se de si mesmo.

 

 

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Recebido em 12 de maio de 2006
Aceito em 08 de junho de 2006
Revisado em 20 de junho de 2006

 

 

Notas

1 Apresentado na Fenomenologia da Percepção.
2 Baudrillard (1995) afirma que, no contemporâneo, o corpo é visto como um objeto precário, sem força imaginativa. Por sua vez, Lacan, (1966) disse que uma criança não tem, primitivamente, experiência de seu corpo como uma totalidade unificada. Ele é percebido como dispersão de todos os seus membros, por isso a expressão "fantasma do corpo despedaçado". Para ele, a unidade do corpo é o resultado de uma árdua conquista, sendo que o primordial seja a angústia do corpo despedaçado. O que constitui o homem como tal se descentraliza em favor do mundo que lhe escapa, portanto a intersubjetividade não se constitui como uma experiência encarnada. O que acentua a dificuldade de compreendermos um psiquismo funcionalmente independente do soma.
3 Cf. Love: a somatic view, p. 23-60. Ver também Emotional Anatomy.
4 Considerando a noção de Gilbert Ryle.
5 As perspectivas de Levi Strauss, Marcel Mauss e José Carlos Rodrigues foram de grande valia para este trabalho, particularmente no que tange às análises que constroem sobre a relação entre corpo e cultura. Todavia, diante da necessidade de estabelecer um recorte sobre o qual eu desejo trabalhar, privilegiei os estudos dos autores mencionados no corpo deste artigo.
6 Para compreendermos as bases sobre as quais Edelman formula suas teses sobre a consciência, talvez seja importante pensarmos no esforço feito por Kant, através do qual ele evidencia que existe uma relação do sujeito com o mundo. Segundo ele, temos somente consciência imediata do que está em nós, isto é, da nossa representação das coisas externas. Ter consciência de nossa representação significa termos consciência empírica de nossa existência, pois só somos determinados em relação a alguma coisa que está fora. Portanto, a consciência de nossa existência no tempo é a consciência de relações tecidas com alguma coisa exterior.
7 O corpo como instrumento da alma aparece tanto nos escritos de Platão (aspectos órficos) quanto nos de Aristóteles e, posteriormente, em Hobbes e Santo Agostinho. A doutrina da instrumentalidade dominou toda filosofia medieval e só foi abandonada por Descartes, que instituiu uma separação entre corpo e alma, estabelecendo a independência da alma em relação ao corpo.
8 Os qualia (Aristóteles) são um conjunto de experiências, sentimentos e sensações pessoais e subjetivas que acompanham o estar consciente. Edelman os chama de estados fenomenais. A cor vermelha de um objeto é um qualium. Os qualia são porções discrimináveis de uma cena mental que possui, entretanto, uma unidade global. Eles podem ter, segundo Edelman, variações de intensidade e de clareza que se entendem desde os "sentimentos brutos" até discriminações muito sofisticadas. No estado de vigília, os qualia estão acompanhados de uma sensação de continuidade espaço-temporal.
9 Existem dois tipos de memória. Uma entendida como memória replicativa e outra dinâmica. A memória replicativa corresponde ao armazenamento de informação codificada com precisão. Ela é chamada replicativa, porque a recordação tem que reproduzir sem erro o mesmo padrão codificado. Diferente da anterior, a memória dinâmica é inexata, embora capaz de um grau muito grande de generalização. Segundo Edelman, a memória é um procedimento que envolve uma atividade motora contínua e uma prática repetida em contextos diferentes.

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