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Revista Mal Estar e Subjetividade

versão impressa ISSN 1518-6148versão On-line ISSN 2175-3644

Rev. Mal-Estar Subj. v.7 n.1 Fortaleza mar. 2007

 

RESENHAS DE LIVROS

 

 

Autora da resenha
Débora Staub Cano

Psicóloga. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC. End.: Rua Vinte Oito de Setembro 47/401. Centro. Santa Cruz do Sul, RS. CEP: 96810-530. E-mail: deborascano@hotmail.com

 

 

 

Câncer: o lado invisível da doença
(Marcelo Collaço Paulo)
Editora Insular, 2004, 112 p.

Os temas que envolvem a Psicologia da Saúde estão sendo ampliados nos currículos dos cursos de graduação e, do mesmo modo, os locais de atuação do psicólogo. Anteriormente, apenas restritos ao âmbito clínico, passam cada vez mais a se fazerem presentes junto a equipes de saúde. Assim, o câncer torna-se uma temática bastante relevante, especialmente ao considerar a publicação da Portaria nº 3.535/98 do Ministério da Saúde, que determina a presença obrigatória do psicólogo nos serviços de suporte, sendo um dos critérios de cadastramento dos centros de atendimento em Oncologia no SUS - Sistema Único de Saúde.

Nesse sentido, o livro "Câncer: o lado invisível da doença", de autoria do médico Marcelo Collaço Paulo, apresenta diversos assuntos relacionados à doença, seu tratamento e sobre a prática do profissional em Oncologia. Numa linguagem acessível aos mais variados públicos, a médicos, enfermeiros e psicólogos, podendo ainda incluir os próprios pacientes, a obra discute temas variados, controversos e atuais, por vezes negligenciados na esfera acadêmica. Discorre-se sobre o estigma do câncer, a comunicação do diagnóstico e as repercussões da doença na família e na mídia, bem como aspectos da vivência do profissional na sua prática cotidiana.

Ancorada na experiência clínica de 22 anos de prática oncológica, o autor revela, sob a ótica da medicina, aspectos que considera importantes e que têm relação direta com a sua prática, possibilitando aos profissionais de outras áreas observar essa realidade a partir de outra lente, subsidiando elementos de análise e incrementado o conhecimento na área. Apesar de caracterizar-se por uma leitura de caráter simples, podendo ser considerada até mesmo introdutória, a obra mostra-se relevante justamente pelo exercício interdisciplinar de contemplar o câncer e seus diversos fatores, sob um prisma diferenciado, baseado na experiência do médico e nas suas leituras.

Dessa maneira, a partir dos exemplos clínicos apresentados, o autor reflete sobre a comunicação do diagnóstico, trazendo para discussão o lado de quem é responsável por essa tarefa. Argumenta que, apesar de ser considerado consenso de que este deva ser explicitado, na maioria das vezes, o diagnóstico envolve outras questões que acabam interferindo nesse processo, como, por exemplo, a compaixão do médico e a realidade de vida do paciente. O profissional antevê as dificuldades acarretadas pela doença para o paciente, freqüentemente agravando dificuldades de cunho financeiro e de interação familiar frente ao quadro clínico, o que torna a comunicação do diagnóstico uma tarefa mais complexa.

Além de desvelar a opinião de um dos profissionais considerado peça chave no tratamento, o médico, a obra também auxilia no debate e na problematização de alguns aspectos sociais que têm relação direta com o câncer e seu tratamento. Como exemplo disso, o autor aponta a mídia e sua influência na propagação de idéias falsas ou sensacionalistas, que podem, em alguns casos, favorecer o medo e o pânico entre pacientes. Nesse sentido, é feito um contraponto ressaltando a necessidade de se publicar em notícias que corroborem para a prevenção da doença, não utilizando a enfermidade como um espetáculo, uma vez que os meios de comunicação têm grande influência sobre as cognições e emoções dos indivíduos.

Ainda são abordados aspectos emocionais, tais como a necessidade de apoio familiar, a questão da religiosidade e seu papel positivo no desenvolvimento do tratamento, caracterizando-se como um recurso importante do paciente frente ao câncer. Também são discutidos assuntos que envolvem o paciente terminal, desde as dificuldades evocadas pela situação, bem como o local ideal para estar nesse momento, se no hospital ou na própria casa.

Por fim, a obra, composta por cerca de 110 páginas, traz também alguns depoimentos de pacientes falando sobre a doença, como receberam a notícia do diagnóstico e lidaram com ela. Sob esse aspecto, há que se ressaltar que durante todo o livro evidencia-se nas entrelinhas o modo como o profissional da medicina lida ele próprio com a doença, suas dificuldades e como se coloca diante dessa realidade.

Em síntese, o relato com base na experiência do autor apresenta-se com um interessante meio de adentrar o campo da Oncologia e, principalmente, um bom instrumento de análise para se pensar a área e a atuação de outros profissionais de saúde nela, uma vez que a Oncologia apresenta diversos discursos de atores envolvidos, não somente o do paciente e seus familiares, mas também o do profissional que se coloca do outro lado, e que também deve ser ouvido para que se possa ter uma compreensão mais completa dos fenômenos envolvidos no câncer e seu tratamento.

 

 

Recebido em 21 de dezembro de 2006
Aceito em 23 de fevereiro de 2007
Revisado em 9 de março de 2007

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