SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.9 número4A psicanálise face ao hedonismo contemporâneoNeopentecostalismo: desamparo e condição masoquista índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista Mal Estar e Subjetividade

versão impressa ISSN 1518-6148

Rev. Mal-Estar Subj. vol.9 no.4 Fortaleza dez. 2009

 

AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS

 

Legitimação do laço homossexual: um acolhimento possível na realidade social da hipermodernidade1

 

 

Marta Rodrigues de Morais AndradeI; Ilka Franco FerrariII

IPsicóloga, mestre em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. End.: R. Pasteur, 180, ap. 502, Centro, Juiz de Fora, MG. CEP: 36015-420. E-mail: marta.r.andrade@gmail.com
IIProfessora no curso de graduação e Pós-graduação em Psicologia, na PUC Minas, membro da Associação Mundial de Psicanálise e da Escola Brasileira de Psicanálise, Seção Minas. End.: R. Professor José Renaut, 526, São Bento, Belo Horizonte, MG. CEP: 30350-750. E-mail: francoferrari@terra.com.br, Ilka@pucminas.br

 

 


RESUMO

O texto envolve tema discutido em todo o mundo ocidental: a reivindicação dos homossexuais masculinos por legitimação de suas parcerias e a constituição familiar a partir da adoção e da procriação assistida. Tais reivindicações modificam laços sociais, provocando mal-estar por tocarem em estruturas simbólicas até então resguardadas, tais como a diferença sexual no casamento e nas figuras parentais e a reprodução sexuada. Apesar disso, observa-se que a sociedade vem acolhendo e dando voz aos homossexuais masculinos, o que não acontecia cerca de meio século atrás, quando esses sujeitos viviam estigmatizados, à margem da sociedade. Discutem-se, aqui, a partir de formalizações psicanalíticas, alguns fatores que possibilitaram tal acolhimento. Freud está presente, mas, a grande ênfase recai no ensino de Lacan e de autores contemporâneos orientados pelo mesmo. Hipermodernidade é o significante que se elege para denominar nossa época, aqui contextualizada. Nela se identifica a realidade social em que o Outro não existe, ou seja, em que se observa o declínio e a pluralização do Nome-do-Pai e de seus ideais consistentes, que norteavam a civilização. O Pai, que na fórmula da sexuação, representa o "Outro Todo" declinou, revelando sua inexistência, seu semblante, sua ficção. Subiu à cena o "Outro não-todo", ilimitado e inconsistente, representado pelo lado feminino da fórmula da sexuação. O predomínio do não-todo flexibilizou as morais rígidas e abriu campo para o reconhecimento e a acolhida das diversidades, possibilitando a emergência de reivindicações dos homossexuais masculinos. Identificou-se o discurso e o modo de gozo em que predominam as coordenadas discursivas da ciência e do capitalismo, comandando os sujeitos à caça ao mais de gozar. O imperativo de que todos têm o direito e o dever de serem felizes e gozarem dos recursos que a ciência oferece fez da família um objeto desejado e consumido, contribuindo para a produção das referidas demandas.

Palavras-chave: hipermodernidade, declínio do pai, discurso capitalista, reivindicações dos homossexuais, psicanálise.


ABSTRACT

The text involves a subject discussed throughout the western world: the demand of all male homosexual for recognition of the legal legitimacy of their relationship and the corresponding family unit starting with adoption and assisted procreation. Such demands change social bonds, inciting discomfort for touching symbolic structures so far safeguarded; such as the sexual differences in the marriage, in the parental figures and the sexual reproduction. Despite this, it is observed that society has been accepting and listening to male homosexuals, which did not happened half a century ago, when these individuals lived stigmatised in society's margin.
It is discussed here, from a formalised psychoanalytic viewpoint, some factors that made this acceptance possible. Freud is cited, but, the main emphasis is in Lacan's teaching and in his contemporaries. Hypermodernity, the definition of our time, is here put into context. It identifies the social reality where "the other" does not exist. In other words, there is the observed decline and pluralisation of the Name-of-the-Father and of its consistent ideals that guided Western civilisation. The Father, that in the formula of intercourse represents the 'Other Whole' declined, revealing its inexistence, its resemblance, its fiction. It took over the 'Other Non-Whole', unlimited and inconsistent, representing the female formula of the intercourse. The predominance of the non-whole made more flexible the rigid morals and opened a field for the recognition and acceptance of diversity, making possible the emergence of the demands of male homosexuals. Identified this discourse and the mode of enjoyment in which the discursive coordinates of science and capitalism predominate, commanding subjects to hunt for more enjoyment. The imperative that everyone has the right and duty of being happy and enjoy the resources that science has to offer made the family a desired and consumed object, contributing to the production of the referred demands.

Keywords: hypermodernity, decline of the father figure, capitalist discourse, homosexual demands, psychoanalysis.


 

 

Introdução

Durante séculos, no mundo ocidental a homossexualidade foi vista como pecado nefando, perversão, desvio e crime. Aos homossexuais lhes restava, então, esconder sua homossexualidade, vivendo-a clandestinamente, em silêncio, ou demonstrá-la publicamente e pagar, por isso, o preço de humilhações, agressões, prisões ou de perda da própria vida. Até mais ou menos meio século atrás, segundo Miller, J.-A. (2003a), os homossexuais ainda sofriam interditos implícitos ou legais - tais como prisões - que os estigmatizavam.

Do ponto de vista da psicanálise, a homossexualidade masculina se configura, segundo Freud, S. (1921/1996a), como uma escolha de objeto inconsciente ligada à renegação da castração e ao Édipo. Sua gênese, na maioria dos casos, advém de um intenso vínculo do filho com a mãe, no sentido do complexo de Édipo. Na vida adulta, em vez de o sujeito substituir a mãe por algum outro objeto sexual, ele identifica-se com ela, transforma-se e procura objetos amorosos em quem possa redescobrir-se e a quem possa então amar, tal como ele foi amado pela mãe. Essa identificação remodela o ego em seu caráter sexual, de acordo com o modelo que até então constituira o objeto. Neste processo, o objeto em si mesmo é renunciado inteiramente ou preservado apenas no inconsciente. Roudinesco, E. e Plon, M. (1998), fazem questão de frizar que Freud coloca a homossexualidade como uma perversão de objeto, cujo caráter se dá pela fixação da sexualidade em uma disposição bissexual.

Lacan, J., em O seminário Livro 5, As formações do inconsciente (1957-1958/1999), diz que a homossexualidade é uma perversão "que está intimamente ligada à conclusão do complexo de Édipo"(Lacan, J., 1957-1958/1999, p. 205). Nesse caso, a conclusão do complexo de Édipo acontece invertida e o menino se identifica com a mãe, pois é ela quem dita a lei para o pai, é ela quem tem a chave da situação da saída do Édipo. Segundo Laurent, É. (2005), a identificação fálica, tanto na neurose quanto na perversão é crucial, mas, o homossexual se identifica com o falo morto.

No Seminário VIII, A transferência, Lacan, J. (1960-1961/1992) diz, claramente, que a homossexualidade masculina é uma perversão. Afirma, inclusive, que a homossexualidade observada na Grécia antiga, no amor grego, é uma perversão. Perversão que, enquanto se relaciona com a cultura, implica elaboração, construção e sublimação, não deixando de ser, mesmo assim, uma perversão. Segundo o autor, a homossexualidade grega se diferencia da homossexualidade contemporânea apenas pela qualidade dos objetos, mas, em nada se distingue a estrutura.

De acordo com Miller, J-A. (2003a), se 40 anos atrás - a exemplo do colóquio de Nice, intitulado Des gays en analyse? - fossem fazer um colóquio sobre homossexuais masculinos em análise, certamente o denominariam com o título "Perversos em análise?". Entretanto, na atualidade, o termo "perversão" circula mais discretamente, de preferência escrito com o hífen, père-version, já que para Lacan, "dizer père-version - após ter formulado desde o início dos anos sessenta, que o termo perversão era simplesmente 'ridículo' - é reclassificar o Édipo como uma forma de perversão." (Miller, J-A., 2003a, p. 88, tradução nossa)2. A père-version é um chiste de Lacan, mostrando que não há somente a norma edípica e esta não é de outra matéria, diferente da perversão, ou seja, se dirigir ao pai enquanto este se ocupa de uma mulher para barrá-la e obstruí-la.

Assim, na época em que o privilégio era o Nome-do-Pai, o Édipo clássico era o que se opunha à perversão, e o perverso era aquele que não teria aceitado a norma edípica. Com a pluralização do Nome-do-Pai e com a designação da função paterna como père-version, o Nome-do-Pai perdeu o privilégio de ser a encarnação da Lei, passando a ser um instrumento útil. Enquanto instrumento útil, o Nome-do-Pai é aquele que regula o gozo da relação pai e filho, tornando-se "sintoma ou uma ficção jurídica como outra qualquer." (Laurent, É., 2000, p.179)

Para Laurent, É. (2005), com a crescente demanda de análise de sujeitos homossexuais, em vez de a homossexualidade masculina ser confirmada e classificada a partir de uma perversão, o analista pode "[...] testemunhar acerca da diversidade de modos em que cada um faz frente ao imperativo de gozo" (Laurent, E. 2005, p. 30, tradução nossa)3. Não é sem motivo, então, que, além dessa questão do gozo, Miller, J-A. (2003a) afirma que a homossexualidade masculina impôs o que a questão da feminilidade anunciou à psicanálise: a problemática da metáfora paterna, do Édipo ser somente uma das maneiras de savoir-y-faire com o gozo. E isso aconteceu a partir da homossexualidade masculina e de seu modo de afirmação gay, reivindicando direitos.

Por isso, nesse texto se denomina homossexuais masculinos os gays, que, em comunidade, militam pela causa política de inserção às normas, reivindicando o reconhecimento jurídico dos pares homossexuais e toda sorte de direitos e deveres que isso possa representar. Eles são, portanto, aqueles que, em um movimento comunitário, instituíram um novo significante mestre e colocaram, no "mercado dos valores e das figuras ideológicas, uma representação social da homossexualidade, no que respeita à minoria tendo que reivindicar direitos." (Miller, J-A., 2003a, p. 89, tradução nossa)4. Ademais, os homossexuais masculinos, conforme afirma o sociólogo Bourdieu, P. (1997), totalizam 90% do movimento que abrange os gays e as lésbicas. Segundo Julien, P.(2005), as lésbicas e as mulheres em geral não têm o mesmo comunitarismo que os homens. No caso das lésbicas, elas vivem sua vida privada com menos consequências de homofobia que no caso dos homens, e isso faz diferença quanto ao interesse pela luta política. Outros autores como Cadoret, A. (2004), Théry, I. (2005) e Miller, J-A. (2003a) também confirmam a pouca expressividade das lésbicas enquanto um grupo de pressão política.

A partir do final da década de 1960, de acordo com Cadoret, A. (2003), todo o cenário social e institucional estabelecido teve um franco declínio com a emergência de movimentos sociais que, amparados pela Declaração dos Direitos Humanos, dentre outras bandeiras levantadas, lutaram por igualdade entre homens e mulheres e pela liberação sexual. Foi em 28 de junho de 1969, então, que uma batida policial em um bar gay, em New York, deflagrou a revolta dos homossexuais masculinos àquela condição marginal. Conhecida como a Revolução de Stonewall, a revolta desses sujeitos inaugurou a primeira passeata gay do mundo, surgindo dali um revés, caracterizado por Bourdieu, P. (1997) como a transformação da vergonha em orgulho: o orgulho gay. Desde então, surgiu o Movimento que ficou conhecido como Movimento Gay e Lésbico, que vem arrebanhando, cada vez mais, integrantes homossexuais e heterossexuais simpatizantes da causa.

O Movimento Gay que, inicialmente, exigia o direito a um estilo de vida diferente, a partir da década de 1980 passa a exigir direitos simétricos aos dos pares heterossexuais. Naquela época, o surgimento da então desconhecida Acquired Imune Deficiency Syndrome (AIDS) dizimou homossexuais pelo mundo, deixando os parceiros sobreviventes desprovidos dos direitos básicos inerentes aos casais heterossexuais casados ou em união estável. Para Roudinesco, E. (2003), advém daí a luta política dos homossexuais masculinos pelos direitos ao casamento e à constituição familiar, a partir da adoção de criança e da procriação assistida.

Essa busca dos homossexuais pela legitimação do laço homossexual, de fato, coincide com o aparecimento da AIDS, mas não fecha a questão de se saber o que possibilitou aos homossexuais saírem da condição de marginalizados para a condição de cidadãos que exigem direitos. Também não possibilitou saber o que aconteceu para que a sociedade, até então pautada, predominantemente, pela dominação masculina e heterossexual começasse a acolher os homossexuais e suas reivindicações. Mesmo porque, os direitos reivindicados por essa dita minoria envolvem o contexto cultural de toda a sociedade e, conforme afirma Théry, I. (2005), sacodem os pilares da cultura, naquilo que ainda lhe resta de instituição e tradição: a família e o casamento.

Se ao tocar nas estruturas simbólicas até então resguardadas - como a reprodução sexuada, a diferença sexual no casamento e nas figuras parentais - as reivindicações dos homossexuais provocaram mal-estar no laço social e, ainda assim, conseguiram visibilidade, acolhimento e conquistas, é porque algo aconteceu com Outro social. Da mesma forma, se é possível serem observadas mudanças na significação e na representação social da homossexualidade e dos homossexuais, é porque se trata de mudanças próprias do que se conhece como realidade social.

Diante desse problema, foram buscadas respostas para questões, tais como: o que aconteceu ao Outro social que possibilitou o acolhimento das reivindicações de legitimação do laço homossexual? Em qual contexto e em qual realidade social tais reivindicações puderam acontecer?

 

O momento da queda das instituições e a hipermodernidade

Entre o período da História chamado modernidade e o período de exacerbação dos princípios dessa modernidade, chamado por Lipovetsky G. (2004) de hipermodernidade, houve um estágio de transição de curta duração, um momento intimamente ligado ao estabelecimento da flexibilidade e diversificação das normas sociais e do aumento de opções para a busca da felicidade individual, localizado a partir dos anos de 1950.

De acordo com Charles, S. (2004)5 esse momento histórico da queda de todos os domínios institucionais que se opunham à emancipação individual deixou surgir as manifestações dos desejos subjetivos, do amor próprio e da realização individual. Isso porque, apesar de, no princípio, a modernidade ter sido pensada a partir de valores como a liberdade, a igualdade e da figura do indivíduo autônomo, simultaneamente, o poder estatal seguia sendo ampliado, prevalecendo e quase anulando a autonomia do indivíduo.

Em respeito a esse predomínio do poder estatal sobre a autonomia do indivíduo nas sociedades modernas, pode-se ler o que Freud expõe em sua obra O mal-estar na civilização, sobre o esforço que a civilização faz para conter a agressividade inerente ao ser humano, de forma a não ser extinta. Ele esclarece que a tendência constitutiva dos homens para a agressividade mutua é o "maior estorvo à civilização", e que tanto a agressividade quanto os meios que a civilização usa para defender-se dela podem causar infelicidade (Freud, S., 1930/ 1996b, p. 145). Esse esforço de contenção também é observado em relação à sexualidade, para que a libido não seja toda escoada nas relações amorosas entre os pares, mas, para que parte dela possa ser canalizada para o trabalho, para a criação e para as interrelações humanas, também necessárias à manutenção da civilização.

A civilização, descrita por Freud, S. (1930-1996b), foi definida por Bauman, Z. (1998) como uma descrição da história da modernidade. Calcada na ordem da razão e na segurança coletiva, a história da modernidade, segundo este autor, foi marcada pelo sacrifício da liberdade individual em prol do bem comum. Mesmo porque "a liberdade do indivíduo não constitui um dom da civilização." (Freud, S., 1930/1996b, p. 102). Assim, o indivíduo foi forçado a sacrificar parte de sua satisfação pulsional e a contentar-se, descontentemente, com as bagatelas que lhe sobrou. Nesse sentido, a civilização, ou melhor, a modernidade, manteve-se à custa da renúncia pulsional do indivíduo e o mal-estar foi o preço que se pagou por isso.

Na modernidade, o poder repressor estatal fez com que os homossexuais vivessem, às escondidas, suas sexualidades. No momento de transição para a hipermodernidade, momento da queda das instituições e da busca de felicidade individual, pode-se localizar a ruptura empreendida pelos homossexuais à repressão. Isso pode ser observado a partir de junho de 1969, quando eles rompem com o silêncio e com a clandestinidade de suas sexualidades, reivindicando o direito a um estilo de vida diferente, bem como, o direito de serem respeitados.

A transição desembocou na hipermodernidade, iniciada por volta dos anos de 1980, que nada mais é que uma modernidade elevada à sua extrema potência no "liberalismo globalizado, na mercantilização quase generalizada dos modos de vida, na exploração da razão instrumental, até a "morte" desta, numa individualização galopante" (Lipovetsky, G., 2004, p. 53). Nessa perspectiva, na base da hipermodernidade estão os pilares da modernidade - o mercado, a eficiência técnica, o indivíduo -, em seu ponto mais alto. Como o nascimento de uma nova sociedade moderna, a hipermodernidade é colocada como uma modernidade de segundo tipo (referência a uma segunda revolução individualista), abraçada aos princípios da primeira modernidade: a democracia, os direitos humanos e o mercado. Ao mesmo tempo, recicla e integra elementos do passado, modernizando a própria modernidade, racionalizando a racionalização, destruindo as rotinas burocráticas, pondo fim à rigidez institucional e ao protecionismo, promovendo o mercado global.

Como era de se esperar, a hipermodernidade tem uma relação particular com a temporalidade, tal qual a modernidade e o momento de transição que culminou na hipermodernidade. A era moderna rompeu com o passado, com a tradição, e prometeu um futuro de progresso radiante que, mais tarde, caiu em descrença. Para além da descrença do futuro promissor da era moderna, o consumo, a comunicação de massa e a moda generalizada promoveram a supervalorização da vivência do momento presente, do aqui-agora, instalando o reinado do efêmero, característico do momento de transição para a hipermodernidade. Na hipermodernidade também se vivencia o presente, ainda de forma instantânea, quando se pensa na economia e no mercado global, na comunicação midiática, na informática e no consumo. Entretanto, vive-se o presente sem se perder de vista o passado a ser reciclado e sem tirar os olhos do futuro que, apesar de manter a promessa de progresso científico e tecnológico, é cada vez mais incerto, inclusive do ponto de vista do futuro planetário.

Nesse sentido, seguindo a trajetórias dos homossexuais masculinos, a partir da década de 1980, quando começaram a reivindicar direitos simétricos aos dos pares heterossexuais, pode-se dizer que eles são um claro exemplo hipermoderno, pois suas reivindicações pretendem reciclar e integrar o passado, flexibilizando e adaptando instituições anteriormente rígidas, como é o caso do casamento e da família, às suas realidades. Ao mesmo tempo, com os olhos no futuro incerto, pretendem garantir direitos à herança, à previdência social e a perpetuar seus nomes, através da constituição de uma família.

Quanto ao presente hipermoderno, ele não é vivido somente no hiperindividualismo consumista. Ele também se faz acompanhar pela ampliação do ideal, não do ideal do Pai, mas do ideal de igualdade de respeito,

[...] de um desejo de hiper-reconhecimento que, recusando todas as formas de desdém, de depreciação, de inferiorização do eu, exige o reconhecimento do outro como igual na diferença. [...] o reinado do presente é aquele da satisfação imediata das necessidades, mas ele também é o da exigência moral de reconhecimento estendida às identidades fundadas no masculino ou feminino, na inclinação sexual, na memória histórica. (Lipovetsky, G., 2004, p. 95-96).

Se a hipermodernidade propicia as reivindicações de reconhecimento da igualdade dos indivíduos na diferença, é porque está mais do que ratificada a queda da hierarquia, da autoridade - tanto do pai na família, quanto do Estado - que definia e norteava os rumos das sociedades ocidentais. Conforme dispõe Miller, J-A. (2006), o reconhecimento é uma intersubjetividade sem simetria, e de tal dialética o Outro se origina. Sendo assim, é preciso pensar que houve também uma mudança no Outro social e, consequentemente, no laço social, possibilitando que o silêncio se transformasse em voz, uma voz que reivindica não só direitos, mas também dignidade de tratamento.

 

Declínio dos ideais do Pai e ascensão do feminino: abertura para o acolhimento das diversidades

Miller, J-A. (2006), no Seminário desenvolvido em colaboração com Laurent, É., intitulado "El Otro que no existe y sus comités de ética", faz uma leitura dos dias atuais, tendo como parâmetro o declínio do pai e suas implicações na fórmula da sexuação proposta de Lacan. Diante disso, tem-se que pensar nos elementos envolvidos nessas fórmulas - homem, mulher, todo, não todo, objeto a, gozo fálico, gozo Outro, exceção, conjunto, limitado, sem limites -, para dar conta de que, no título do livro a expressão "Outro que não existe" é uma referência ao aforismo lacaniano, "A Mulher" não existe bem como ao regime de gozo não todo, característico do feminino e predominante na atualidade hipermoderna.

A proposta da fórmula do "Outro que não existe" é a de que o Outro tem estrutura de ficção e "o que está em jogo na inexistência do Outro é sua redução ao semblante. O Outro que dizemos que não existe [...] não é da ordem do real." (Miller, J-A., 2006, p. 115, tradução nossa)6. E é por ser da ordem do simbólico, portanto, um semblante, um ponto de basta ficcional, que essa fórmula revela o atual caráter de inconsistência do Outro, que, na verdade, nem sempre foi assim.

Antes, o Outro era consistente e advinha dos ideais do Pai. Ainda que furado, era um Outro com a estrutura do Todo, fundado pela exceção do Pai, apontada por Freud, S. (1912-1913/1996c), em Totem e Tabu e, por Lacan, J. (1972-1973/ 1985), no Seminário 20, Mais, ainda. Esse Outro Todo, limitado pelo conjunto finito que o constitui, ocupou um lugar central na cena política, familiar e social até meados do século XX.

Nesse contexto, o masculino ligado ao Todo, e o feminino ligado ao não todo tinham papéis bem definidos e delineados pela Lei do Nome-do-Pai. Pode-se dizer que, no cenário moderno, o Outro Todo era o ator principal e ocupava o centro, enquanto o Outro não todo era o coadjuvante e ocupava a periferia da cena. Conforme afirma Vieira, M. A. (2004), não houve uma ruptura da hipermodernidade com a modernidade, mas um novo arranjo entre os atores que compõem a civilização atual. Se, na modernidade, o Outro Todo prevalecia sobre o Outro não todo, agora, na hipermodernidade, não se pode dizer o mesmo. Isso porque o Outro Todo, representado pela figura do pai, seja ele o Deus Pai, o Estado ou o pai da realidade, começou a declinar e, junto com ele, sua hierarquia, sua tradição e os seus ideais. Vale lembrar que, apesar de sua queda e de seu enfraquecimento, o Nome-do-Pai, enquanto encarnação da Lei no desejo, não pode ser totalmente descartado, pois, se assim o fosse, seria um caos.

Desse modo, de acordo com Roudinesco, E. (2003), o enfraquecimento de Deus pai se torna visível quando, em 1757, o criado, François Robert Damiens, fere com um canivete aquele que representava a encarnação divina na Terra, o rei Luís XV. Tal ferimento, sem consequências graves no corpo, deixa marcas indeléveis na mente do rei - já que mergulha na melancolia - e na imagem intocada de Deus. Com esse ato, Damiens não tinha o propósito de matar o rei, mas sim despertá-lo e alertar seu espírito para o perigo de a França ser governada por uma mulher. E o que muitos historiadores dizem é que:

[...] esse ato falho anuncia, por antecipação, o regicídio legal de 21 de janeiro de 1793: a morte de Luís XVI depois da abolição da monarquia, a agonia de Deus pai. Ao cortar a cabeça do rei, dirá Balzac, a Revolução derrubou a cabeça de todos os pais de família. (Roudinesco, E., 2003, p. 33).

Um declínio paulatino do Outro Todo, do pai, pode ser observado, então, desde a época da Revolução Francesa, com seus ideais de liberdade, de fraternidade e de igualdade, assim como o temor da ascensão feminina ao mundo dominado pelos homens. Lacan, J. (1938/ 2003), em Os complexos familiares na formação do indivíduo, chama a atenção para o declínio da função paterna e, mais tarde, já na década de 1960, ratifica sua posição ao anunciar a pluralização do Nome-do-Pai. Nessa época, segundo Miller, J-A. (2006), o Outro Todo tem seu franco declínio, corroborado pelos movimentos sociais, exigindo a proibição da proibição; com as minorias (homossexuais, negros, feministas), reclamando o direito à igualdade e à liberdade; com o advento da globalização, que, por si só, coloca em questão todas as estruturas hierárquicas, e com a ascensão do capitalismo. O Outro Todo perdeu sua força e, com isso, enfraqueceu-se o ideal, já que a identificação com o ideal se refere ao Outro Todo, conforme mostra a fórmula expressa por Miller, J-A. (2006), I(A). Este matema de Lacan representa a identificação simbólica, na qual se opera uma extração significante do Outro.

Dessa forma, tal qual uma balança com pesos diferentes, o enfraquecimento do Outro Todo faz o Outro não todo preponderar. Assim, nesta era que está se chamando de hipermoderna, o Outro que reina é o "Outro que não existe", portanto, o Outro não todo, ilimitado, já que não sendo marcado pela exceção, não se organiza em um conjunto finito. Deve-se ater, entretanto, à advertência de Miller, J-A. (2003b), de que o não todo não é um todo pela metade, incompleto. Ao contrário, o que marca o não todo é sua inconsistência devido a sua inscrição na estrutura do infinito, portanto, de não poder formar o Todo.

A inexistência do Outro marca, então, a impossibilidade de se formar um Todo universal de homens e mulheres. Mostra, também, que o Um ex-sistente, exceção não castrada que constitui o conjunto masculino não existe, ou seja, é só um semblante. O lado masculino da fórmula da sexuação é, pois, posto em xeque e o que se assiste "[...] é o não todo generalizado, não o geral, mas o não todo em todas as partes, que se manifesta pela estrutura de rede." (Miller, J-A, 2006, p. 77, tradução nossa)7. Sendo assim, o que se traduz é que o não todo não é uma totalidade, já que o universal não existe, mas está pulverizado em todas as partes do social. Nessa perspectiva, a Internet exemplifica a estrutura de rede do não todo, naquilo que a impossibilita de formar um conjunto fechado.

Se o não todo está em toda parte, justifica-se dizer que o regime de gozo não todo permeia a contemporaneidade, sendo preciso que se fale um pouco mais sobre ele. Lacan, J. (1972-1973/1985) esclarece que o gozo feminino é não todo fálico. Embora ambos os sexos estejam inscritos na função fálica, nas mulheres ou naqueles que se colocam do lado feminino da fórmula da sexuação pode-se observar um gozo a mais, suplementar, que é da ordem do infinito, o qual algumas delas experimentam, mas não sabem dizer nada sobre ele.

É. Laurent, colaborador de Miller, J-A. (2006), no livro El Otro que no existe y sus comitês de ética, diz que essa generalização do não todo faz com que hoje o discurso das mulheres vá além da praça pública e se espalhe em todo o mundo. O que se faz escutar é um modo de identificação diferente daquele que acontecia com o ideal do pai, cujo modo de gozo se situava pelo gozo fálico. Portanto, submetido às leis da castração, que reprimia o gozo com morais severas, abnegação e sacrifícios religiosos ou não. Agora, o modo identificatório que se faz escutar é com a outra face do gozo de Deus, o gozo feminino, um gozo que não libera qualquer saber e que, portanto, não orienta. Diante disso, o apelo às ficções jurídicas e às normas se torna elementar para regular o gozo, que sobressai frente à debilidade dos ideais (a > I), e também as relações sociais. Isso, entretanto, destaca, indiretamente, o chamado a um sacrifício em nome de um gozo, sem um saber ao qual se identificar. Nesse sentido, o sacrifício não é de renúncia pulsional, mas, ao contrário, é de buscar cada vez mais satisfação.

Laurent, É., no livro El Otro que no existe y sus comités de ética, de Miller, J-A. (2006) afirma que, se há um lado negativo dessa identificação, que se manifesta no vazio de saber sobre como se colocar diante do Outro não todo, de ideais inconsistentes e de seu chamado a buscar sempre mais, há um lado positivo que concerne à diversidade, ao não envolvimento e ao encanto do um por um. Aqui, pode-se pensar na posição do analista em cujo discurso se abstém como sujeito, ocupando o lugar do objeto a, objeto causa de desejo para cada sujeito em particular. E pode-se pensar, também, da forma como colocou Miller, J-A., no debate transcrito no texto de Laurent, É. (1999), ao afirmar que, quando o Outro não existe, também não existem morais rígidas e, em seu lugar, encontra-se certa disposição ao reconhecimento e à acolhida.

A partir desses pontos, esse lado positivo da identificação pública à outra face de Deus, ao gozo feminino, acolhedor das diversidades, não apenas possibilitou como também promoveu a emergência de reivindicações dos homossexuais masculinos. Despojada, ainda que não toda, da moral rígida constituída pelo ideal paterno, a sociedade abraça e dá voz àqueles que foram silenciados, ou que se tentou silenciar: os homossexuais, as mulheres, as crianças e os psicóticos. Em contrapartida, o que Laurent, É., no livro de Miller, J-A.(2006), chama de lado negativo da identificação pública ao gozo feminino, aos ideais inconsistentes, funciona como um imperativo a apontar que não só se pode como também se devem satisfazer os desejos. E, nesse sentido, pode-se pensar que o que era impossível por estrutura é apontado como possível. Se, antes, era impossível ao homossexual masculino realizar a paternidade biológica sem o contato sexual e afetivo com uma mulher, hoje, a ciência e o mercado a possibilitam, com a procriação assistida e a contratação de uma barriga de aluguel.

 

A realidade social da hipermodernidade

De acordo com Tizio, H. (2007a), cada época traz consigo as coordenadas discursivas que caracterizam a sua atualidade. Nesse sentido, Lacan, J. (1972-1973/1985) sustenta que a realidade é inerente ao discurso, pois não existe realidade pré-discursiva. Dessa forma, o discurso é o que possibilita a coletividade formada por homens, mulheres e crianças, que não passam de significantes. São significantes do discurso corrente da linguagem que permitem um laço social, porquanto, o discurso analítico demonstra que, entre homens e mulheres, esse laço supre a impossibilidade da relação/proporção sexual.

A partir do exposto, se não existe realidade pré-discursiva e são os discursos que fundam o laço social, pode-se chamar a realidade, de realidade social. De acordo com Ferrari, I. F.(2007), a realidade social se traduz nas trocas simbólicas transindividuais, impostas ao sujeito, à sua revelia. A realidade social está inscrita desde o início do ensino de Lacan na relação do sujeito com o Outro, sendo o Outro o: "lugar da palavra, da linguagem, do discurso universal e da realidade social, cultural e institucional também." (Miller, J-A., 2006, p. 165, tradução nossa)8.

A realidade social, então, por estar estruturada no simbólico, revela seu caráter de semblante, de ficção, esta entendida não como uma ilusão, mas como criação da linguagem, que, conforme dispõe Lacan, J. (1993), racionaliza o real da não relação sexual. Exatamente por isso, a realidade social é suscetível de mudanças no curso da História, conforme seja o discurso prevalente. Na hipermodernidade - descrita por Miller, J-A. (2006) como a época do Outro que não existe e dos semblantes -, prevalece o discurso da ciência, do capitalismo e dos direitos iguais para todos que possibilita aos homossexuais reivindicarem suas inserções nas normas jurídicas já existentes ou a criação de nova legislação e de ficções jurídicas do casamento/união civil, e da família formada por pares homossexuais.

O que se chama de laço social, a partir da psicanálise é

[...] a relação entre os seres humanos que se sustenta do discurso e, por meio dele, assume as modalidades de época e as marcas de uma cultura determinada. Há laço social porque não há laço natural, na medida em que vivemos em um mundo de linguagem. A esta aproximação geral é preciso acrescentar que o laço social se particulariza com as modalidades do gozo dos sujeitos que o realizam. (Tizio, H., 2007b, p. 2).

Em 1930, Freud, S. (1930/1996b) diz que existem três profissões impossíveis: governar, educar e psicanalisar. Lacan, J. (1969-1970/1992b) retoma essa observação, acrescentando o fazer desejar, aprendido com as histéricas, e formaliza seus quatro discursos. Esses discursos demonstram as quatro formas de laço social entre os seres humanos: governar, educar, psicanalisar e fazer desejar. Estão, portanto, respectivamente, nas seguintes fórmulas: a do discurso do mestre/senhor como aquele que é o poder que domina; a do discurso universitário, como aquele dominado pelo saber; a do discurso do analista como aquele em que o analista se abstém de sua posição de sujeito, ocupando o lugar representado pelo objeto a, causa de desejo, no processo analítico; a do discurso da histeria, como sendo aquele dominado pelo sujeito que interroga o mestre, fazendo-o querer e produzir um saber. A seguir, serão apresentados esses discursos para ilustrar os quatro lugares e os quatro elementos que marcam cada um deles. Ressalta-se, entretanto, que o discurso a ser trabalhado aqui é o discurso capitalista.

 

 

O discurso capitalista e o mal-estar social

Se os quatros discursos citados anteriormente fazem laços sociais, há um que Lacan, J. (1973/1993), em Televisão, refere-se como sendo aquele que não faz laço social, mas que causa a miséria do mundo: o discurso capitalista. O mal-estar contemporâneo tem, portanto, sua fonte no discurso capitalista. Nessa ocasião, Lacan corrige o que tinha dito em 1969/1970, em O avesso da psicanálise, que o discurso dominante na sociedade - aquele cuja dominação é mostrada pelo significante mestre está no lugar do agente dominador - era o discurso universitário com a dominação pelo saber. O discurso dominante, na atualidade, é o discurso capitalista, dominando pelo capital.

 

 

 

 

Segundo Quinet, A. (2006), o matema proposto para o discurso capitalista deriva do discurso do mestre, sendo que há uma inversão dos elementos da primeira fração. É um discurso em que o agente não se relaciona com o outro a quem o discurso dirige. O capital (S1) encontra-se no lugar da verdade; o sujeito reduz-se a um consumidor ($) de objetos, os gadgets (a) produzidos pela tecnociências (S2).

Por ser dominante, o discurso capitalista objetiva sobrepor o mercado à sociedade. Para esse discurso, a sociedade seria extinta, passando a existir somente o mercado, cujas leis são invisíveis. Como se trata de um discurso sem Lei, o discurso capitalista é caracterizado pela "foraclusão da castração, ou seja, foraclusão da sexualidade e da diferença dos sexos." (Quinet, A., 2006, p. 38). Esse discurso se difere do discurso do mestre pelo fato de não fazer laço social, pois exclui o outro desse laço e o sujeito só se relaciona com a mercadoria. Sua política é a do neo-liberalismo, do liberal, do individualismo: cada um por si e um contra todos, não havendo direitos iguais para todos. Nesse sentido, a máxima das sociedades democráticas que permeia a contemporaneidade na luta dos sujeitos por direitos "todos têm direitos e deveres iguais" se perde no abismo da desigualdade do mercado. E isso também torna o discurso capitalista um discurso segregador, sendo que é o mercado que determina quais são os sujeitos que têm ou não acesso aos produtos da ciência. Contrariamente a esse discurso, a psicanálise propõe a ética da diferença em detrimento da ética da separação.

Cabe ainda ressaltar que, segundo Santiago, J. (2001), a ciência, amparada no discurso capitalista, produz objetos que visam à saturação do sujeito, tamponando sua falta com os gadgets que propõe como objetos de gozo, anulando toda a questão sobre o desejo. Os gadgets são objetos que se distinguem "[...] pelo fato de que mais que satisfazer de uma maneira nova uma demanda que já existia, suscita uma demanda nova." (Miller, Judith, 1996, p. 208, tradução nossa)9. Assim, é provável que o sujeito encontre sua satisfação em um simples objeto. Ainda, quem comanda o saber científico é o significante-mestre capital, financiando as pesquisas, patrocinando os pesquisadores, induzindo a elaboração do saber. Então, há um desdobramento para a chamada política dos resultados.

Quinet, A. (2006) retorna a Freud para dizer que "O mal-estar na civilização é o mal-estar dos laços sociais [...] Todo laço social é, portanto, um enquadramento da pulsão, resultando em uma perda real de gozo." (Quinet, A., 2006, p. 17).

Assim, como demonstrativo do que se produziu na cultura, com a fragmentação dos antigos ideais consistentes do Pai, recorre-se, aqui, às observações de Freud, S. (1930/1996b) sobre a importância dos exemplos dos grandes líderes para a formação cultural de cada época. Ele mostra que, em seu tempo, recalcavam-se as satisfações das pulsões sexuais e agressivas do indivíduo em prol da sobrevivência do coletivo, da civilização. Na atualidade do Outro que não existe, entretanto, o que se encontra são exemplos de lideranças isoladas ou restritas a universos específicos, que demonstram valores bastante distintos dos valores modernos. Pode-se citar, como exemplo, o universo da moda, cuja liderança imprime o modelo de beleza magra a ser seguido, bem como as lideranças políticas que revelam - em seus exemplos escandalosos expostos pela mídia - a inversão do valor que qualifica a política como sendo a busca do bem comum, em detrimento da busca de vantagens pessoais, as lideranças econômicas e tecnológicas, exemplo de poder, supremacia e lucro comercial acima de vidas humanas, assim como o universo da mídia que, muitas vezes, sobrepõe a imagem, o supérfluo e o consumo ao essencial, à essência. É importante ressaltar, no entanto, que existem lideranças que dão exemplo de solidariedade e ação social, mas tais lideranças não parecem se destacar tanto. Esse é um dos paradoxos da hipermodernidade.

Se os exemplos dos líderes da modernidade propiciaram a formação do ideal cultural daquela época como uma voz de reprimenda à agressividade e à sexualidade, na hipermodernidade, quando o Outro não existe e predomina o discurso do mestre capitalista, a voz que ecoa é um imperativo ao gozo e "o modo de gozo [...] passa pelo mais de gozar particularizado, não garantido nem organizado pelo ideal da coletividade" (Ferrari, I. F., 2008, p. 25). Nesse sentido,

A sociedade regida pelo discurso capitalista se nutre pela fabricação da falta de gozo, produz sujeitos insaciáveis em sua demanda de consumo [...] A ciência no discurso do capitalismo é a produtora dos objetos de consumo, que operam como causa de desejo (Quinet, A., 2006, p.39).

É dada, então, ao seres falantes, a ilusão de que há objetos - materializáveis - que podem aplacar uma falta que é constitutiva do humano. Como resposta a esse imperativo, prolifera-se a busca pelo prazer individual e pela realização de demandas travestidas de desejo ou desejos travestidos de demandas.

Assim, pode-se pensar que as reivindicações dos homossexuais masculinos pelo direito ao casamento e à constituição da família, a partir da adoção e da procriação assistida, é também produto dessa fabricação da falta de gozo produzida pelo discurso capitalista, que leva os sujeitos a buscarem, insaciavelmente, cada vez mais, objetos que os farão gozar. O discurso do mestre capitalista quer colocar todo mundo sob contrato. Dessa forma,

Fragmentado ou não, casal homo ou pais hetero, todos pretendem ser felizes em família graças à invenção de significantes novos da aliança, por meio da palavra de ordem: construam-se, reconstruam-se (Cottet, S., 2007, p. 4-5).

As reivindicações dos homossexuais masculinos mostram, nesse sentido, que as diversas transformações sociais, ocorridas a partir do fim dos anos de 1960, abalaram a estrutura da família, fundada e mantida, segundo Théry, I. (2005), pelo modelo matrimonial organicista durante um século e meio da era Moderna. Se a família até então se estruturava em um modelo único e nuclear, pautando-se pelas figuras do pai, da mãe e dos filhos, para a psicanálise, entretanto, a família não se restringe ao parentesco. A família "é uma estrutura simbólica que, embora possa se apoiar nos vínculos biológicos, distingue-se deles para impor suas próprias leis." (Bassols, M., 2005, p. 54). Por ser uma estrutura simbólica, a família torna-se uma instituição inscrita e submetida ao campo da linguagem, uma vez que é a linguagem que possibilita a transmissão de um nome e sem a qual "[...] sequer como um nome qualquer o Nome-do-Pai poderia ser reconhecido." (Laia, S., 2001, p. 18). A família, então, origina-se no mal entendido, sendo formada "[...] pelo Nome do Pai como função, o Desejo da Mãe e a criança como resto desta cópula impossível." (Fleischer, D., 2004, p.132, tradução nossa)10. A família é "essencialmente unida por um segredo, ela é unida pelo não dito. Qual é o segredo? Qual é esse não dito? É um desejo não dito, é sempre um segredo sobre o gozo; de que gozam o pai e a mãe?" (Miller, J-A., 2007, p. 3).

Segundo Lacan (1969/2003b), na evolução da sociedade a família desempenha a função de resíduo e o que se destaca, neste resto, é que há algo na família que não pode ser reduzido: a transmissão da constituição subjetiva a partir da nomeação de um desejo. Assim sendo, conclui-se que, para além das mudanças e das transformações sociais, algo da instituição família sempre restará, ainda que seu modelo sofra transformações. Dessa forma, a família é concebida "como resto, objeto a produzido pela história." (Laurent, É., 2005, p. 139, tradução nossa)11. Vale ressaltar aqui a diferença que Miller, J-A. (2006) faz do objeto a, enquanto um objeto real, um vazio topológico, ao redor do qual a pulsão faz seu circuito e a representação do objeto a com substâncias e objetos, que ao materializá-lo, não são mais que semblantes. Nessa analogia da família ao objeto a, pode-se pensar que a transmissão da constituição subjetiva é o imutável vazio topológico e as mutações da família, produzidas pela História, são os semblantes que representam esse vazio topológico.

Então, o resíduo, ou resto da família, segundo o modelo citado, desdobrou-se no pluralismo da família: famílias recompostas, homoparentais, monoparentais e parentais. Sendo assim, a exigência pelos pares homossexuais, do direito ao casamento e de instituir a família homoparental, a partir da adoção e da procriação assistida, mostra, conforme afirma Laurent, É. (2000), que a instituição é um conjunto de normas que o sujeito desmonta, sendo necessário que novas ficções jurídicas sejam inventadas para regular e ordenar a busca de gozo e felicidade promovida pelo discurso capitalista.

Nessa perspectiva, do imperativo para ser feliz e para gozar a felicidade, mais do que um direito é um dever de cada indivíduo. Essa ordem, que acena para a possibilidade do absoluto, pode ser lida na frase de autor desconhecido, estampada em um adesivo de carro, que diz o seguinte: "Sejamos realistas, exijamos o impossível!". O impossível, então, imaginariamente, pode ser conseguido com os objetos gadgets lançados a todo instante e vinculados na mídia como sendo indispensáveis à felicidade.

Assim vendida, a felicidade é um bem de consumo de aspiração totalizante, já que, longe das exigências de outrora, o homem da atualidade não tolera migalhas de felicidade. Ao contrário, quer a felicidade total, quer sua satisfação garantida ou seu dinheiro de volta. Mas como ter garantias e ter o impossível é impossível, resta-lhe o dinheiro e todos os objetos que se pode comprar para travestir o mal-estar em felicidade. Dessa forma, maquila-se o mal-estar com a euforia da cocaína, com a sociabilidade do álcool, com a beleza estética dos inibidores de apetites, com a promessa da ciência à possível realização da maternidade e da paternidade aos casais tidos até então como estéreis (até mesmo o par homossexual), e com o sorriso alienante da fluoxetina e seus derivados.

Fazendo uma analogia ao que Quinet, A. (2006) diz da foraclusão da castração pelo discurso da ciência, pode-se afirmar que essa "operação tapa buracos" - que a sociedade de consumo tenta fazer, oferecendo objetos supostamente indispensáveis à felicidade - remenda, mas, não aplaca o mal-estar latente, devido a este ser constitutivo do humano. Ao contrário, esse engodo só faz aumentar o mal-estar, pois deixa transparecer que não ter a felicidade total não é uma questão de impossibilidade, mas sim de incompetência. É nesse universo que se baseiam os imperativos superegóicos da cultura hipermoderna e é a partir deles que cada homem, a sua maneira, terá de travar uma luta entre atender a particularidade de seus desejos ou se perder no vazio, ao ser comandado por esse imperativo do discurso capitalista.

A perspectiva configurada pelo declínio da lei paterna, pela inexistência do Outro e pelo predomínio do discurso capitalista, na atualidade, parece convergir para uma situação caótica, em que o mundo estaria mergulhado em uma anomia completa. Entretanto, o Outro não todo não pode ser pensado de forma tão independente do Outro Todo. Se assim o fosse, o caos se efetivaria. Conforme lembra Vieira, M. A. (2004), e até já mencionado antes, de outra forma, o Outro não todo, por ser disforme e sem limites, precisa ser entrelaçado a alguma corporeidade para ter um mínimo de forma. Isso faz com que a relação do Outro não todo com a lei seja mais branda sem, contudo, ser inexistente. A lei existe, mas, precariamente, porque o Nome-do-Pai não pode ser totalmente descartado. Assim, de acordo com Laurent, D. (2007), quando o Outro não existe, o Outro da lei, do discurso do Direito - enquanto aquele que trata as particularidades do gozo em termos de identidade - cresce mutuamente com o comunitarismo. Recorre-se ao Outro da lei, para que este distribua o gozo entre os diferentes iguais, ou seja, entre as diferentes comunidades dos diferentes iguais (gays, negros, mulheres, idosos, entre outros.). Desse modo, a procura dos direitos iguais para todos, no sentido de uma universalidade dos direitos, desemboca-se, na verdade, no particular de cada comunidade, e isso não deixa de ser uma forma de segregação.

A esse respeito, Lacan, J. (1967/2003c), em Alocução sobre as psicoses da criança, remete à problemática da segregação promovida pelo progresso da ciência com a destruição da ordem social balizada pelo Nome-do-Pai, fazendo surgir, em seu lugar, o imperialismo planetário. De acordo com Brousse, M-E. (2005), essa segregação, que se observa na época do Outro que não existe, difere daquela que existia quando o Outro era consistente e o Nome-do-Pai, como ex-sistente, ditava as regras para o conjunto universal. A fragmentação do Nome-do-Pai ou sua pluralização, longe de abolir a segregação, multiplicou-a. A segregação que se apresenta, na atualidade, em vez de estar ligada ao Um da exceção paterna, multiplicou-se:

Quanto mais os S1 se multiplicam, mais os limites que sua função implica são numerosos. No lugar da universalidade esperada, assiste-se ao aumento de igrejas, de fronteiras, de limites de bordas sem que nenhum desses limites possa se impor como autoridade superior aos outros. [...] trata-se de um ecletismo onde todas as opiniões se valem em uma lógica de relação de força e de lobby. (Brousse, M-H., 2005, p. 2, tradução nossa)12.

Assim, pode-se observar a emergência das comunidades gays, enquanto um grupo de identificação comunitária e a evidência crescente das sociedades de controle que, de acordo com Foucault, M. (1985), são caracterizadas pelo predomínio da atuação da norma em relação ao sistema jurídico da lei. Isso implica dizer que a vida, a sexualidade e até mesmo o gozo de cada indivíduo entram nos cálculos das estratégias políticas, da biopolítica, fazendo a lei funcionar como norma.

 

Notas

1. Artigo construído a partir da dissertação de mestrado intitulada "Reivindicações dos homossexuais masculinos nas vicissitudes da época do Outro que não existe", no Programa de Pós-graduação da PUC Minas.

2. Pour Lacan, dire père-version - après avoir formulé dès le début des années soixante, que le terme de perversion était tout simplement "ridicule" - c'est reclasser l'Edipe comme une forme de perversion.

3. [...] testimoniar acerca de la diversidad de modos en que cada uno hace frente al imperativo del goce.

4. [...] marché des valeurs et des figures idéologiques une representation sociale de l'homosexuel en tant que minorité ayant à revendiquer des droits.

5. Sébastien Charles escreveu um capítulo no livro, Os tempos hipermodernos, de Lipovetsky (2004), dando uma introdução ao pensamento deste último e, também, em outro capítulo conduz uma entrevista com o mesmo, sobre sua trajetória intelectual.

6. Otro tiene una estructura de ficción [...] lo que está en juego en la inexistencia del Outro es su reducción al semblante. El Outro, del que decimos que no existe [...] no es del orden de lo real.

7. [...] es el no todo generalizado, no lo general sino o no todo en todas partes, que se manifiesta por la estructura de red.

8. [...] el lugar de la palabra, del lenguaje, del discurso universal y de la realidad social, cultural e institucional también.

9. [...] por el hecho de que más que satisfacer de una manera nueva una demanda que existía ya, suscita una demanda nueva".

10. [...] por el Nombre del Padre como función, el Deseo de la Madre y el niño como resto de esa cópula imposible.

11. [...] comme reste, objet a produit par l'histoire.

12. Plus les S1 se multiplient, plus les limites ou barrères que leur fonction implique se font nombreuses. À La place de l'universalité attendue on assiste au foisonnement de paroises, de frontières, de limites, de bords, sans qu'aucune de ces limites ne puísse s'imposer avec une autorité supérieure aux autres. [...] il s'agit d'un écletisme où toutes les opinions se valent dans une logique de rapport de force et de lobbying.

 

Referências

Bassol, M. (1993). La familia del otro. Lapsus (3), 43-49        [ Links ]

Bourdieu, P. (1997). Quelques questions sur la question gay et lesbienne. Liberation (3), p. 7-8.         [ Links ]

Brousse, M.-H. (2005) Fragmentation du père e ultra modernité: L'invention sinthomatique. Quarto (86), Recuperado em 2 maio 2008 da http://www.causefreudienne.net/publications/quarto/linvention-sinthomatique/fragmentation-du-pere-et-ultra-modernite/        [ Links ]

Cadoret, A. (2003). Padres como los demás: Homosexualidad y parentesco. Barcelona, España: Gedisa.         [ Links ]

Cottet, S. (2007). O avesso das famílias: O romance familiar paternal. Revista Eletrônica do Núcleo Sephora, 2 (4), 1-5. Recuperado em 14 setembro 2007 da www.nucleosephora.com/asephallus/numero_04/artigo_01.htm        [ Links ]

Ferrari, I. F. (2007). Realidade social: A violência, a segregação e a falta de vergonha. Revista Mal-Estar e Subjetividade, 7 ( 2), 269-284.         [ Links ]

Ferrari, I. F. (2008). A realidade social e os sujeitos solitários. Ágora , 11 (1), 17-30.         [ Links ]

Fleischer, D. (2004). Clínica de las transformaciones familiares (2ª. ed.). Buenos Aires, Argentina: Grama.         [ Links ]

Foucault, M. (1985). História da sexualidade I: A vontade de saber (6ª ed.). Rio de Janeiro: Graal.         [ Links ]

Freud, S. (1996a) Psicologia de grupo e análise do ego (Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Vol. 18). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1921).         [ Links ]

Freud, S. (1996b). O mal-estar na civilização (Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Vol. 21). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1930).         [ Links ]

Freud, S. (1996c). Totem e tabu (Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Vol. 23). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1912-1913).         [ Links ]

Julien, P. (2005). O desafio de outra cultura. A clínica Lacaniana, (4), 21-25        [ Links ]

Lacan, J. (1985). O seminário: Livro 20: Mais, ainda. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (1992a). O seminário: Livro 8: A transferência. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (1992b). O seminário: Livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (1993). Televisão. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (1999). O seminário: livro 5: As formações do inconsciente. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (2003a). Os complexos familiares na formação do indivíduo. In J. Lacan, Outros escritos (pp. 29-90). Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (2003b). Nota sobre a criança. In J. Lacan, Outros escritos (pp. 369-370). Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (2003c). Alocução sobre as psicoses da criança. In J. Lacan, Outros escritos (pp.359-368). Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Lacan, J. (2005). Nomes-do-Pai. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Laia, S. (2001). A infância revista. Curinga (15/16), 12-25.         [ Links ]

Laurent, D. (2007). Os gays na época do outro que não existe. Revista de Psicanálise, 8 (14), 23-33.         [ Links ]

Laurent, É. (1999). Nuevas normas de la homosexualidad. Revista Psicanalítica (27), 35-46.         [ Links ]

Laurent, É. (2000). Conferências de Eric Laurent. Curinga (14), 152-187.         [ Links ]

Laurent, É. (2005). Ni Ganímedes, ni made in gay. In É. Laurent. Una práctica de la época: El psicoanálisis en lo contemporâneo (pp. 21-32). Buenos Aires, Argentina: Grama.         [ Links ]

Lipovetsky, G. (2004). Os tempos hipermodernos. São Paulo: Barcarolla.         [ Links ]

Miller, J.-A. (2003a). Gays en analyse? Intervention conclusive au Colloque franco-italien de Nice sur ce theme. La Cause Freudiense (55), 82-90.         [ Links ]

Miller, J.-A. (2003b). Uma partilha sexual. Clique Revista dos Institutos Brasileiros de Psicanálise do Campo Freudiano ( 2), 12-29.         [ Links ]

Miller, J.-A. (2006). El Otro que no existe y sus comitês de ética. Con colaboración de: Eric Laurent. Buenos Aires, Argentina: Paidós.         [ Links ]

Miller, J.-A. (2007) Assuntos de família no inconsciente. Revista Eletrônica do Núcleo Sephora, 2 (4), 29-33. Recuperado em 14 setembro 2007 da www.nucleosephora.com/asephallus/numero_04/artigo_01.htm        [ Links ]

Miller, J. (1996). La resistible ascensión del Gadget. In J. Miller, Imaginario y lógica coletiva: Estudios psicoanalíticos. Madrid, España: Ebolia.         [ Links ]

Quinet, A. (2006). Psicose e laço social: Esquizofrenia, paranóia e melancolia. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Roudinesco, E. (2003). A família em desordem (A. Telles, Trad.). Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Roudinesco, E., & Plon, M. (1998). Homossexualidade. In Dicionário de psicanálise (pp. 350-355). Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Santiago, J. (2001). A droga do toxicômano: Uma parceria cínica na era da ciência. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Théry, I. (2005). Différence des sexes, homosexualité e filiation. La Cause Freudienne (60), 77-98.         [ Links ]

Tízio, H. (2007a). El cuerpo en la clínica psicoanalitica (Colleción Grulla). Córdoba, Argentina: CIEC.         [ Links ]

Tízio, H. (2007b). Novas modalidades do laço social. Revista Eletrônica do Núcleo Sephora, 2 (4), 1-5. Recuperado em 14 setembro 2007 da www.nucleosephora.com/asephallus/numero_04/artigo_01.htm        [ Links ]

Vieira, M. A. (2004). (Hiper)modernidade lacaniana. Latusa (9), 69-81.         [ Links ]

 

 

Recebido em 01 de junho de 2009
Aceito em 26 de junho de 2009
Revisado em 04 de agosto de 2009

Creative Commons License