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Revista Mal Estar e Subjetividade

Print version ISSN 1518-6148

Rev.Mal-Estar Subj vol.13 no.1-2 Fortaleza June 2013

 

AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS

 

Formação de grupos, narcisismo e alteridade: uma investigação psicanalítica e antropológica

 

Groups formation, narcissism and otherness: a psychoanalytical and anthropological research

 

Formación de grupos, narcisismo y alteridad: una investigación antropológica y psicoanalítica

 

Formation de groupes, narcissisme et altérité: une recherche anthropologique et psychanalytique

 

 

Manuella Mucury TeixeiraI; Ondina Pena PereiraII

IAluna do curso de graduação em Psicologia da Instituição de Ensino Superior de Brasília, da graduação de filosofia da Universidade de Brasília. E-mail: mucury_rev@yahoo.com.br
IIMestre em Filosofia pela UFMG, Doutora em Antropologia pela UnB e Professora da Universidade Católica de Brasília. E-mail: ondinapena@gmail.com

 

 


RESUMO

O presente artigo investiga, no processo de formação de um grupo, as relações que seus componentes estabelecem com o que a psicanálise freudiana intitula ideal do eu, articulando tal conceito às noções antropológicas de diferença e alteridade tal como trabalhadas por Baudrillard. As discussões são feitas a partir de dados obtidos em trabalho de campo realizado com adolescentes de uma escola pública da periferia do Distrito Federal, os quais participaram, durante um ano, de oficinas práticas de fotografia, texto literário e conversação livre, que foram compreendidas como oficinas de trocas simbólicas, em referência ao trabalho da linguagem que as atravessava. Durante os trabalhos das oficinas, procurou-se observar o processo de transformação do que era, de início, um mero amontoado de adolescentes, em um grupo constituído como tal. Busca-se, aqui, apresentar os resultados a que chegaram os jogos de rivalidade e de solidariedade que se estabeleceram durante as oficinas, dando ênfase aos acontecimentos que trouxeram à tona as tensões entre indivíduos e entre sub-grupos que se formaram em oposição um ao outro e que se relacionam ao narcisismo das pequenas diferenças e à recusa da alteridade. Tais oposições aparecem em várias dimensões das relações intergrupais, principalmente aquelas que dizem respeito à dimensão econômica e à dimensão etária.

Palavras-chave: ideal do eu; grupo; psicanálise; narcisismo; alteridade.


ABSTRACT

This article investigates - in the process of group formation - the relationships that their members establish with the ideal self, linking this concept, created by Freudian psychoanalysis, to the anthropological notion of difference and otherness as proposed by Baudrillard. Discussions are made based on data obtained in a fieldwork with ten adolescents from a public school in the outskirts of the Federal District, who participated for one year, of practical workshops on photography, literary text and free conversations. Such practical workshops have been called workshops of symbolic exchanges, in reference to the language work that they contain. During the workshop sessions, we tried to observe the transformation of what was initially just a bunch of teenagers in a group constituted as such. We intend to present herein the results reached by the games of rivalry and solidarity established during the workshops, with emphasis on events that have stirred tensions between individuals and between sub-groups formed in opposition to each other. Such oppositions can be related to the so called narcissism of small differences and the refusal of otherness, because they appear in several dimensions of intergroup relations, especially those concerning the economic dimension and age of group members.

Keywords: ideal self; group; psychoanalysis; narcissism; otherness.


RESUMEN

Este artículo investiga, en el proceso de formar un grupo, las relaciones que sus miembros establezcan con lo que el psicoanálisis freudiano del ideal de jo que, articulando un concepto a nociones antropológicas de la diferencia y la otredad como trabajado por Baudrillard. Las discusiones se hacen de los datos obtenidos en trabajo de campo realizado con adolescentes de una escuela pública en las afueras del Distrito Federal, que participó, durante un año de talleres prácticos de fotografía, texto literario y conversación libre, que se entendía como talleres de intercambio simbólico, en referencia a la labor de la lengua que la travesía. Durante los talleres, trató de observar que el proceso de transformación de lo que era al principio un mero revoltijo de adolescentes en un grupo constituido como tal. Búsqueda, aquí presentamos los resultados alcanzados por los juegos de rivalidad y de solidaridad que se establecieron durante los talleres, centrándose en los eventos que trajeron a las superficie las tensiones entre personas y entre subgrupos que han formado en oposición a los demás y que se relacionan con la negativa de la alteridad y el narcisismo de las pequeñas diferencias. Tales oposiciones aparecen en diversas dimensiones de las relaciones intergrupales, especialmente aquellos que se relacionan con la dimensión económica y soporte de tamaño.

Palabras-clave: ideal de jo; grupo; psicoanálisis; narcisismo;, otredad.


RÉSUMÉ

Cet article examine, en train de constituer un groupe, des relations que ses membres établir avec ce que la psychanalyse freudienne est l'idéal de je, articuler cette notion aux notions anthropologiques de la différence et l'altérité comme travaillé par Baudrillard. Les discussions sont fabriquées à partir des données obtenues dans le travail de terrain effectué avec des adolescents d'une école publique à la périphérie de Distrito Federal, qui a participé, pour une année d'ateliers pratiques de la photographie, le texte littéraire et la conversation libre, qui ont été interprétées comme un ateliers d'échange symbolique, en ce qui concerne le travail de la langue que le passage à niveau. Au cours des ateliers, a cherché à observer que le processus de transformation de ce qui fut d'abord un simple fouillis d'adolescents dans un groupe constitué en tant que tel. Recherche, ici, présenter les résultats atteints par les jeux de rivalité et de la solidarité qui se sont installés au cours des ateliers, en mettant l'accent sur les événements qui a amené les tensions de surface entre individus et entre les sous-groupes qui ont formé opposition à l'autre et qui concernent le narcissisme des petites différences et le refus de l'altérité. Ces oppositions apparaissent sous divers aspects des relations intergroupes, notamment celles qui ont trait à la dimension économique et le support de la taille.

Mots-clés: l'idéal de je; groupe; narcissisme; psychanalyse; altérité.


 

 

Introdução

Pretende-se, no presente artigo, investigar, no processo de formação de um grupo, as relações que seus componentes estabelecem com o que a psicanálise freudiana intitula ideal do eu. Segundo a perspectiva freudiana, um grupo se constitui na medida em que seus componentes instituem um ideal em comum (Freud, 1914/1996a). É esse ideal em comum que esclarece a diferença entre o que é chamado de grupo - onde se supõe haver vínculo entre os sujeitos participantes - e um mero amontoado de pessoas.

Além da visão psicanalítica sobre grupos, o próprio desenvolvimento das reflexões no decorrer da pesquisa de campo exigiu o apoio de noções antropológicas de diferença e alteridade (Baudrillard, 1991). Tais noções auxiliaram na compreensão dos diversos jogos de rivalidade e solidariedade que se dão no processo de formação grupal da adolescência, no qual pode ser observada - além dos laços libidinais que, principalmente nessa fase particular da vida, alcançam um âmbito maior do que o familiar - a dimensão política do agrupamento de sujeitos em torno de determinadas ações.

A investigação tornou-se possível através do acompanhamento de um grupo em formação, na comunidade do Areal, periferia de Brasília - DF. Assim, um grupo de adolescentes, estudantes da Escola do Areal, foi convidado a participar de várias oficinas de produção de textos, diálogos e imagens fotográficas, ao longo do segundo semestre de 2007 com encontros semanais de quatro horas de duração. Tais oficinas constituíram-se como o campo empírico no qual se pôde observar o processo da transformação de uma série de dez adolescentes em um grupo de dez adolescentes.

 

Fundamentação Teórica

Uma limitação do narcisismo, segundo Freud, seria o laço libidinal com outras pessoas. O amor por si mesmo só conhece uma barreira: o amor pelos outros, o amor por objetos (Freud, 1921/1996b, p.113). Assim, os laços libidinais ou amorosos que constituem os grupos visam, sobretudo, o amor dos demais integrantes. O aparente abandono da distinção entre eles se dá pela necessidade de estar em harmonia com os demais e assim poderem desfrutar de seu reconhecimento.

Na perspectiva psicanalítica, um grupo surge a partir da relação simbólica entre seus integrantes, no intuito imaginário de tamponar uma falta por meio de determinado modelo. Desta relação pode surgir o líder, que encarna o ideal, isto é, uma pessoa que será vista como um modelo a ser seguido. De acordo com Freud (1921/1996b), ao eleger um modelo, o sujeito inscreve no aparelho psíquico uma instância mediante a qual medirá seu próprio eu. Desta relação aparecem dois sentimentos: o amor e a rivalidade. Ao mesmo tempo em que os componentes de um grupo têm certa amizade, eles competem entre si para saber quem vai ter a atenção dos pares e principalmente do líder. Sendo assim, um grupo se forma a partir das interações entre seus componentes que têm um ideal em comum e que se agrupam em nome dele.

Em sua obra "Psicologia de grupo e análise do eu", Freud (1921/1996b) desconstrói a oposição, tão utilizada no senso comum, entre psicologia individual e social. Na sua perspectiva, é justamente o laço emocional entre o indivíduo e o grupo que constitui o aparelho psíquico. Portanto, o sujeito da psicanálise é um ser social. Podemos pensar, a partir dessa perspectiva, que os fenômenos que participam da construção do sujeito são totalmente transferíveis para as situações grupais.

No narcisismo primário, o eu é tomado como principal alvo de investimento libidinal. Ama-se aquilo que se supõe ser - o eu ideal. Trata-se aqui de recurso imaginário baseado em uma relação especular, na qual o sujeito procura ocultar sua castração, sua falta a ser, colocando-se numa posição muito próxima de seu ideal. Sua intenção aqui é a de fazer desaparecer o hiato existente entre o eu e o ideal do eu.

Um processo análogo ocorre na constituição de grupos. Os sujeitos pertencentes a certas agremiações identificam-se entre si com base na relação que mantem com o ideal do eu, algo em comum que lhes falta e que os move em determinadas direções, numa lógica que - além da dimensão imaginária - parece apontar para a castração e, portanto, para o Real, tal como o compreende Lacan (1998).

Geralmente, este ponto em comum inscrito por meio do ideal do eu, sendo encarnado por um líder ou através de alguma ideia privilegiada, contém a promessa de algum tipo de satisfação que deverá advir a partir da sua realização. Freud (1921/1996b, p. 26) esclarece esse ponto quando diz: Um grupo primário desse tipo é um certo número de indivíduos que colocaram um só e mesmo objeto no lugar de seu ideal do ego e, conseqüentemente, se identificaram uns com os outros em seu eu.

Por meio da força do modelo e do laço entre os irmãos, fica-se sujeito à influência exercida pelo grupo e às modificações psíquicas que isso pode trazer. Entretanto, o líder, caso encarne o ideal do eu, tem prestígio sobre os outros componentes apenas se reconhecido, aceito e nomeado como tal. Só tem poder na medida em que o grupo o fornece a ele. Assim, ao mesmo tempo em que o líder possui poder perante o grupo, sua posição fica na dependência da admiração despertada nos demais. Este poder não é estável, mas circula, é produto da relação, não pertencendo essencialmente a ninguém. Ou seja, a questão é a forma como os vínculos se atualizam.

Para Freud (1914/1996a, p.111), a idealização é um processo que diz respeito ao objeto; por ela, esse objeto, sem qualquer alteração em sua natureza, é engrandecido e exaltado na mente do indivíduo. Compreende-se porque a idealização do líder promove a identificação entre os pares. Sendo coletivo o ideal, o eu percebe uma semelhança significante com o outro: o mesmo modelo. Tal mecanismo de idealização grupal do líder promove o movimento do grupo na direção da realização do seu modelo, isto é, o ideal pode ser uma instância que mobiliza. No entanto, se o ideal do eu é inalcançável, terá um efeito paralisante. Percebe-se, pois, que há um sutil paradoxo no manejo do ideal, que faz deste um gerador de movimento, mas também um agente de estagnação. Assim, se não se estabelece uma nítida separação entre o ideal e a realidade presente do eu, pode-se estagnar na ilusão de totalidade e de completude. Por outro lado, a falta de um modelo é também paralisante, inibidora do desejo. Vê-se, pois, que os extremos geram estagnação. Sair desses extremos exige um manejo equilibrado do ideal do eu.

Os ideais são diversos e a posição em que os sujeitos se encontram em relação a eles também. Em torno disso é gerada uma dessimetria que costuma aparecer no discurso dos grupos (Elias, N., Scotson, J. 2000), por exemplo: um grupo carente de certa característica valorizada é visto como menor. Um grupo pode tanto assumir um lugar de superioridade quanto se colocar em uma posição de menos valia. É claro que esses fenômenos não são fixos e podem tomar diversas formas de acordo com esse atributo, ora presente, ora ausente em cada um dos grupos. Cria-se, portanto, uma hierarquia e um jogo de poder entre os grupos envolvidos e interdependentes. A negociação de qualquer possibilidade de diferença, de alteridade, para a manutenção deste ideal de laços sociais mais fortes entre os iguais é o que Freud (1921/1996b) denominou em sua obra de narcisismo das pequenas diferenças.

Um grupo é claramente unido por poder de alguma espécie; e a que poder poderia essa façanha ser mais bem atribuída do que a Eros, que mantém unido tudo o que existe no mundo? (Freud, 1921/1996b, p. 103). Essa união não aparece de forma pura, pois, juntamente com os impulsos amorosos de união, aparecem os de destruição e criação, que fazem parte do conceito freudiano de pulsão de morte. Portanto, se essa força destrutiva, se essa agressividade, inerentes ao humano, forem lançadas sobre o grupo, este não se sustenta e seus laços acabam se rompendo. Para se evitar a destruição do grupo e se manter a coerência grupal, há que se buscar alguma saída para este impulso agressivo. O narcisismo das pequenas diferenças parece constituir-se justamente como forma de evitar o risco de ruptura. Constrói-se, pois, um estranho, uma ameaça que, sendo identificada e nomeada, será expulsa para preservar a unidade. Assim, alguém ou algo externo é eleito como alvo dos sentimentos de hostilidade, sem colocar a integridade do grupo em jogo. Tudo é feito em nome dessa coesão interna.

Pode-se falar que nesse laço fraternal entre supostos iguais há fissuras. Assim como há fissura nos próprios sujeitos, que são estranhos para si mesmos, na medida em que são sujeitos divididos (Lacan, 1998). Em sua relação com o grupo, seu próprio estranhamento e o do outro precisam ser mascarados, para que o laço possa existir. Dessa maneira, o estranho é expulso e passa a ser visto como algo de fora. O apontamento dessas pequenas diferenças recalcadas das relações internas do grupo é também uma forma de preservação da sua identidade.

Temos aqui, portanto, a problemática da construção de identidades conectada à expulsão da diferença, da alteridade. Se no pensamento de Freud as identidades se preservam com o banimento das diferenças, Baudrillard (1991), em suas reflexões sobre o mundo contemporâneo, radicaliza essa posição tentando mostrar como os sistemas de identidade que se fundam dessa forma tendem a soçobrar em sua própria virulência interna, gerada exatamente pela ausência do outro. Assim, a tentativa de preservar a identidade, nos termos de Freud, tem uma terrível consequência, nos termos de Baudrillard: a geração de um sistema asséptico, com tendência à positivação total, o que significa a entrada em um processo de dessimbolização, isto é, um afastamento da forma social que se baseia nas trocas simbólicas.

Com a ideia de troca simbólica, o autor pretende inscrever um lugar estratégico a partir do qual pode realizar uma crítica política da nossa sociedade. Assim, nas sociedades econômicas, modernas, organizou-se um sistema de valor na base de oposições distintivas, lá onde as culturas primitivas, da troca simbólica, estabeleceram a reversibilidade dos termos. Tais oposições distintivas, tais como sujeito/objeto, feminino/masculino, bem/mal, passam a regular nossa relação com o mundo, de forma a que o primeiro termo das oposições é sempre positivo, o segundo sempre negativo. Diz o autor:

Qualquer sistema inventa para si mesmo um princípio de equilíbrio, de troca e de valor, causalidade e de finalidade, que joga com oposições regradas: as do bem e do mal, do verdadeiro e do falso, do signo e de seu referente, do sujeito e do objeto- todo o espaço da diferença e da regulação pela diferença, que quando funciona, assegura a estabilidade e o movimento dialético do conjunto. (Baudrillard, 1999, p. 11)

Essa exigência de termos nitidamente separados, que não podem se reverter um no outro, acaba por dar origem a um processo de positivação total do sistema, do qual são banidos todos os elementos considerados negativos. É esse o fundamento da nossa ordem econômica, da significação, do valor, a qual, por subtrair os elementos julgados negativos, que resulta em uma realidade que só podemos ler em termos operacionais de cálculo e de valor.

Nesse sistema inteiramente racional e positivo, não há mais rituais ou mitos através dos quais se possa viver a troca simbólica, tornada alteridade absoluta. Mas, seus elementos estão presentes e vivos e, na falta de lugar, retornam de forma anômala, explosiva, como uma espécie de retorno do recalcado. São esses elementos banidos que conservam o potencial de reversibilidade dos termos, porque expõem os limites, atestam a ruína da forma moderna de representação do mundo, cujo objetivo é o de tudo erigir em cifras, em evidências. Assim:

Há uma consequência aterrorizante na produção ininterrupta de positividade: pois se a negatividade engendra a crise e a crítica, a positividade absoluta engendra a catástrofe, por incapacidade justamente de destilar a crise. Toda estrutura, todo sistema, todo corpo social que acua, que expulsa, que exorciza seus elementos negativos e críticos corre o risco de uma catástrofe por reversão e implosão total, como todo corpo biológico que acua e elimina todos os seus germes, seus bacilos seus parasitas, todos os seus inimigos biológicos, corre o risco de câncer, isto é de uma positividade devorante de seus próprias células, corre o risco de ser devorado por seus próprios anticorpos, daqui para a frente sem utilidade. (Baudrillard, 1999, p.13)

Na concepção de Freud (1930/1996c, p.136), entretanto, é sempre possível unir um considerável número de pessoas no amor, enquanto sobrarem outras pessoas para receberem as manifestações de sua agressividade. Ou seja, mesmo que os elementos negativos sejam jogados para fora do sistema, este ainda permanece como uma possibilidade de vida social, de laços afetivos. No entanto, um grupo estabelecido pode se esvaecer, basta que não se aposte mais nos ideais comuns para que cesse a cumplicidade entre os membros. A própria identificação, promessa de união entre os sujeitos, é ambivalente e também possui uma carga de hostilidade, já que deriva da primeira fase de organização libidinal na qual o objeto privilegiado é assimilado pela ingestão, sendo dessa maneira aniquilado como tal (Freud, 1921/1996b, p. 115). A situação edípica e o canibalismo tendem para um ponto comum na medida em que o quê se ama no outro é aquilo que o eu deseja tomar para si.

Como as instâncias psíquicas participam da regulação desses modelos ideais que possibilitam a identificação? Pode-se falar do supereu como uma espécie de voz que propaga o imperativo de gozo ao mesmo tempo em que mostra a impossibilidade de se aceder ao gozo como se exige. Na sua condição de nascimento prematuro, o ser humano depende do Outro para sua sobrevivência. O próprio tornar-se humano depende desse contato, da apreensão da linguagem que o cerca e nesse sentido o complexo de Édipo possui papel fundamental na formação do sujeito. A princípio, as identificações privilegiam certos modelos da relação familiar, mas ao contrário da conquista de uma certa identidade, a partir dos traços que toma para si, entende-se o eu como algo que está em constante construção, evidenciando uma falta a ser que acompanha o sujeito por toda a vida e que o impele na busca pela realização.

Tal descrição das relações humanas nos obriga a algumas consequências teóricas, a saber: um grupo é forte na medida em que constrói a aliança de seus membros através do ideal e na medida em que é capaz de jogar para fora seus impulsos agressivos. Segundo esse esquema, parece não haver a possibilidade de uma associação entre humanos que se realize com base na assunção da fragilidade desses laços, constantemente ameaçados, seja por fatores psíquicos, seja por fatores externos.

A impossibilidade do reconhecimento do caráter frágil dos laços e a necessidade de fortalecê-los através da eleição do outro como alvo da agressividade é politicamente problemática e aqui se encontram, em germe, as análises de Baudrillard (1990, 1999) sobre a sociedade moderna e suas relações com o outro.

A nossa incapacidade de lidar com a fragilidade da existência nos exige a camuflagem da falta e a criação da ilusão de completude. Nesse movimento, construímos sentidos sobre o vazio, insuportável para o pensamento ocidental. Essa produção exagerada de sentidos culmina naquilo que Baudrillard (1990) chama de ordem do simulacro em que o sentido vai perdendo cada vez mais o lastro na nossa experiência com o real e se faz através de pura simulação. O que define o simulacro é a precessão do modelo sobre a realidade, submetida a uma codificação forçada, tornando difíceis as tentativas de abolição da referência ao sentido. É preciso que o vazio da significação retome força de instância e seja positivado como valor.

 

A Pesquisa de Campo

A pesquisa de campo aconteceu durante os encontros do grupo de adolescentes no Areal, onde foi possível observar e participar da sua construção.

Tendo sido escolhida uma escola no Areal, foram selecionados os 10 participantes que tinham idade entre 12 e 16 anos, e cursavam a 6a série. Feito isso, estavam previstas oficinas que auxiliassem o propósito da pesquisa sobre a interação entre membros do grupo e que contavam com a participação dos mesmos. Eram três oficinas: oficina de produção de texto, oficina de diálogos e oficina de produção de imagens fotográficas.

A observação participante foi pontuada por questões relacionadas às principais condições para a formação de um grupo, a saber, os fatores que concorrem para a manutenção de sua coesão, a contribuição do Ideal na construção da identidade do grupo, e, por último, as possibilidades de utilização da teoria psicanalítica no trabalho com grupo.

Ao longo das oficinas, o que mais chamou a atenção na convivência semanal com o grupo foi a cisão interna entre seus integrantes, criando assim dois subgrupos, no qual um deles parecia se colocar em lugar privilegiado em relação ao outro e em relação à posição que mantinham com o ideal comum a ambos, estando supostamente mais próximos deste. A princípio não há uma diferença marcante da posição social que os subgrupos ocupam, do nível escolar, ou mesmo da escola que frequentam e da comunidade a qual pertencem. Mas nem por isso deixou de haver uma clara hierarquia, onde um podia mais e era mais que o outro, ao menos imaginariamente. Porém, mesmo colocando-se em posição privilegiada, este grupo algumas vezes parecia se apresentar desvalorizado em relação aos coordenadores das oficinas, já que o grupo por eles julgado inferior demandava de nós uma atenção especial, justamente por encarnar e se favorecer desta posição desprivilegiada na qual eram colocados pelos membros do outro subgrupo. Embora se procurasse não responder a esta demanda, tornou-se evidente que o subgrupo que se julgava superior se incomodava com uma suposta resposta de demanda, ou como eles intitulavam, preferência.

Apesar de fazerem questão de apontar suas diferenças, os subgrupos possuíam mais coisas em comum do que conseguiam perceber. Quando, por exemplo, era-lhes perguntado sobre o que gostariam de ser ou fazer no futuro, as respostas eram praticamente as mesmas. Ideais de ascensão social passavam por todos os integrantes, de ambos os subgrupos, sem exceção. Desejo de fama, reconhecimento, seja no papel de atores, cantores ou artistas de um modo geral, também fazia parte do discurso deles. A vontade de serem populares, admirados e amados através dessas conquistas, parecia ser a meta e modelo ideal de cada uma dessas pessoas. Mas o que será que induzia os membros de um desses subgrupos a se afirmarem como superiores em relação aquele outro supostamente mais fraco? O que eles utilizavam como base para essas afirmações?

Sabe-se que os integrantes do subgrupo superior se diferenciam por possuírem, em grau ínfimo, melhores recursos econômicos que os demais: têm dinheiro para comprar balas na escola, por exemplo. São também mais populares por lá. Moram em ruas onde as casas são mais valorizadas, segundo o relato e a opinião de membros de ambos os subgrupos. Todas essas características comuns os reúnem em oposição ao subgrupo inferior, que não parece desfrutar desses mesmos benefícios.

A lógica que envolve os grupos parece ser esta: quem está mais perto do ideal comum de riqueza e reconhecimento percebe-se detentor de certo poder e subjuga os demais. Porém, os subjugados, no caso, também tinham suas formas de afirmação como um grupo diferenciado. A união destes girava em torno de certo valor moral. Descreviam-se como pessoas melhores, de caráter superior ao de seus colegas. Buscavam notoriedade, mas através da compaixão despertada em relação à sua posição menos privilegiada, que não se mantinha por acaso. Já que não eram reconhecidos por aquilo que tinham, seriam, talvez, por aquilo que lhes faltava? A posição de vítima em que se colocavam, muitas vezes, parecia uma forma de demandar certo cuidado e atenção por parte das pesquisadoras e monitoras que coordenavam as oficinas, como também do grupo rival.

Assim, as oficinas nos permitiram investigar como se estabelecem os laços entre seus membros, como eles interagem entre si e como isso se reflete na sua produção. Em geral, os resultados dos trabalhos que lhes propúnhamos dependiam de como haviam sido agrupados para realizá-los. Dessa forma, por exemplo, quando pedíamos para que trabalhassem em duplas, nunca se alcançava o objetivo proposto e muitas vezes se recusavam a realizar qualquer atividade se os pares não fossem pessoas com proximidade entre si. Porém, quando trabalhavam com um componente mais próximo não havia queixa e o trabalho ocorria mais rapidamente.

Em uma das oficinas, propôs-se ao grupo que criasse uma história qualquer, de autoria exclusiva deles. O tema eleito abordava a rivalidade entre dois grupos, que foram denominados grupos dos pobres e dos ricos. Os pobres, segundo o enredo, eram rejeitados e excluídos pelo grupo de pessoas ricas por não possuírem uma vida com determinados privilégios materiais, o que era exaltado por ambos os subgrupos como ideal. Depois de pronto o enredo, ao se solicitar que escolhessem o papel que gostariam de representar, os integrantes do subgrupo superior só aceitavam encarnar o papel de ricos, ainda que estes, no enredo, fossem considerados como personagens antipáticos e arrogantes. Já os adolescentes do subgrupo inferior mostraram-se mais abertos a representar qualquer papel, podendo ocupar qualquer lugar na história por todos inventada. Por outro lado, eram apontados pelos demais como naturalmente destinados a compor o grupo dos pobres. Um deles, que só aceitava interpretar um dos ricos, justificava-se dizendo tenho medo de virar realidade, referindo-se à possibilidade de se tornar pobre por fazer o papel. Outros concordavam: se é pra eu ser pobre, saio da história.

Na acepção dos subgrupos, houve uma concordância na forma como descreviam pessoas ricas e pessoas pobres. Pessoas ricas são aquelas que possuem bens materiais, geralmente filhos de professoras, médicos, advogados. Gente metida e antipática frequentam lugares como boites, clubes e que costumam promover festas. Já pessoas pobres são virtuosas, porém, feias, cafonas, bregas, que não sabem se vestir, usam sandália velha. Seriam filhos de jardineiros, faxineiros.

Assim, ao se verem ocupando um lugar que é descrito com significantes tão desvalorizados pela cultura hegemônica, preferem se identificar com o lugar de valor, apesar da constatação, nesse mesmo lugar, de algumas falhas de caráter, através de termos como antipáticos e metidos que se contrapõem à virtuosidade suposta nas pessoas pobres. Fica ainda mais evidente essa posição quando nos deparamos com as redações escritas nas oficinas de texto, nas quais destacam-se certos signos de ascensão social e beleza relacionados a atrizes e atores de novelas.

Na narrativa da relação entre ricos e pobres, há uma passagem em que uma menina, que faz parte dos ricos, retira-se do grupo, pois sua família passa a ter problemas financeiros e perde muito dinheiro. Os laços com os antigos amigos do mesmo nível sócio-econômico se rompem, acabando também com a amizade que se sustentava por essa via de identificação que não é mais possível. Ambos os grupos são descritos como moradores do mesmo bairro, porém, são de ruas diferentes. Quando o grupo dos pobres decide sair para jogar bola, passam pela rua dos ricos e gritam frases como: odeio esse tipo de gente, esse povo metido, o que leva a uma briga entre eles.

Outra cena acontece no shopping, onde os ricos estão fazendo compras. A menina cuja família perdeu o dinheiro fica impossibilitada de acompanhá-los, mas não revela nada a seus amigos. Encontra, então, o outro grupo e pede para ser acolhida entre eles, com a justificativa de não ter mais amigos. O grupo silencia, pensa a respeito, zomba dela, mas por fim a deixa entrar, pois sentem dó dela. A menina conta, então, aos pobres, o que de fato aconteceu, porém, esconde dos ricos porque sente vergonha dos antigos amigos. E esse é o final escolhido para a história.

Importante destacar a semelhança da narrativa com os impasses ocorridos entre os adolescentes durante as oficinas. A própria cisão interna do grupo possuía uma demarcação baseada no suposto poder econômico mais elevado de certos integrantes. Na prática, alguns se diziam moradores de uma rua mais privilegiada, quando na verdade quem realmente habitava essas casas eram seus parentes próximos.

Em certo momento da discussão do enredo, surge uma frase, dita por um dos integrantes: É só uma rua que liga uma coisa à outra. O que poderia ser lido como: é só uma rua que separa um subgrupo do outro, o que revela o ponto onde o narcisismo das pequenas diferenças se faz valer, um detalhe eleito para justificar a separação, por onde pode escoar a agressividade, tornando o grupo possível. No caso em discussão, o inimigo encontrava-se no seu interior, a rivalidade se instalava aí e produzia a ruptura que, por sua vez, fortalecia os subgrupos - a união em nome da diferença.

Essa questão da diferença aparece claramente também na escolha do nome do grupo. Ao pensar em um algum nome que os identificasse, tendo por base características compartilhadas, ou mesmo algum ponto comum entre os integrantes, instalou-se uma enorme discórdia, com uma participação ativa de todos os integrantes. A dificuldade de escolha do nome colocou em evidência a bipartição do grupo. Dá até vergonha de mostrar isso pra alguém. O que eles vão achar da gente?, diz uma das integrantes do grupo dos pobres, preocupada com a imagem moral que certo nome escolhido pelo grupo oposto poderia passar. E o acordo só pôde se dar quando surgiu o significante que acolheu a ruptura: Os diferentes, ou os difes, como passaram a se nomear.

Após a nomeação, o grupo se estabilizou, e as atividades propostas puderam ocorrer de modo mais fluente, com a participação ativa dos adolescentes que faziam questão de expor suas idéias mesmo quando essas se mostravam conflitantes com as dos demais membros. Os ataques se tornaram menos frequentes, mas essa tranquilidade não perdurou. Certo dia, uma das participantes do grupo apareceu em um dos encontros acompanhada pela irmã mais nova. Disse, justificando-se, que a menina não poderia ficar em casa sozinha, pois ainda era muito pequena (tinha 6 anos de idade à época). Para não faltar à reunião do dia, teve a idéia de trazê-la para o grupo, já que ela era responsável por cuidar da irmã enquanto sua mãe estivesse trabalhando fora. Pediu permissão às professoras para que a irmã frequentasse as reuniões do grupo. Foi dito a ela que poderia trazer a menina sempre que precisasse, pois o importante é que ela não desistisse de ir aos encontros semanais por esse motivo.

A princípio não conseguimos prever as complicações e efeitos dessa simples permissão. A irmã participava das atividades como o restante, afinal passar quatro horas apenas assistindo aos demais poderia ser completamente enfadonho e inviável para ela.

A permanência da irmã mais nova foi mexendo aos poucos com a harmonia do grupo e esse episódio sofreu muitas retaliações por parte dos integrantes, como se sua presença ali ameaçasse ainda mais a possibilidade de união e reconhecimento daquele grupo como tal. Tal como afirma Baudrillard (1999) a respeito dos sistemas que produzem uma positividade absoluta, estes tendem à autodestruição. A irmã representou essa negatividade, o fator estranho que seria o causador da crise entre os integrantes. Tornou-se, então, emergencial o seu banimento. E foi exatamente essa a demanda do grupo, que realizou um abaixo assinado contra a permanência da menina nas reuniões. Quase todos deram a sua contribuição e não houve momento de maior concordância entre eles do que este. A irmã foi rechaçada, pois sua presença explicitava a dessimetria do grupo.

É interessante notar a importância desse elemento - a irmã mais nova - na formação do grupo de adolescentes. Houve várias atividades ao longo desse tempo, diversos encontros que pretendiam unir essas pessoas em torno de um ideal de produção comum, o que surpreendentemente não obteve maior sucesso do que a ligação estabelecida entre eles no momento de crise, a partir do aparecimento da irmã. É como se, já que eles não conseguiam se reconhecer através de traços comuns, podendo dizer isso somos nós, a lógica passou a ser não sabemos o que somos, mas com certeza não somos isso. Mais uma vez a coerência do conceito de narcisismo das pequenas diferenças acontece no fenômeno grupal estudado.

A menina, motivo de toda essa revolta interna, não retornou mais ao grupo. Não houve a proibição por parte das professoras, nem o acolhimento dessa demanda dos adolescentes por elas, pois a ideia era exatamente deixar que eles pudessem se expressar, mesmo que dominados por seus impulsos agressivos, sem qualquer interferência, com o objetivo de observar, o mais imparcialmente possível, a organização que eles iam tomando para si. O elemento estranho foi expurgado, mas trouxe consequências, o ataque teve seu retorno e implodiu.

 

Notas Conclusivas

Percebe-se, nos subgrupos analisados nesse artigo, a tentativa de positivação das relações interpessoais, na medida em que cada agremiação busca para si o que supõe ser a posição de vantagem em relação aos outros participantes, afirmando assim a sua verdadeira identidade como grupo, que ao mesmo tempo é capaz de fundar um lugar comum, compartilhado pelos irmãos, e de alteridade, diante de seus rivais. A ruptura de certos laços, o banimento de certos elementos que estão em oposição aos ideais dos subgrupos, são mecanismos de pureza identitária, que os transforma em sistemas fechados, sem possibilidade de trocas simbólicas entre si. Porém, esta estabilidade e coerência interna buscam se sustentar através da expulsão da diferença e da incerteza. A brutalidade desse modelo não permite espaço para o outro, apenas um narcisismo desenfreado que acaba por empobrecer os grupos em seu regime totalitário. Ambos os subgrupos tentam encarnar o Bem e a Verdade, seja através de seus ideais morais, de riqueza, ou sucesso. É, de saída, uma tarefa falha, pois, como afirma Baudrillard: a confusão entre Bem e o Mal que é o próprio sinal do Mal, como a indistinção entre o verdadeiro e o falso é o próprio sinal da simulação (Baudrillard, 1999, p. 98).

Já na teoria freudiana, o conflito entre grupos segue a lógica do narcisismo das pequenas diferenças, resultando na afirmação veemente das características conflitantes, ao mesmo tempo em que provocava a sua expulsão. No caso dos adolescentes observados durante a pesquisa, há um apelo explícito para a percepção das discrepâncias entre eles, fazendo da pulsão de morte protagonista no processo de ruptura dos ideais sustentados por cada subgrupo. Qualquer detalhe valia para chamar a atenção da diferença de posição dos indivíduos. A própria cisão interna criou a necessidade de oposição, que só se desfez com a entrada em cena de um estranho contra o qual se uniram. No entanto, essa união durou pouco tempo. A reflexão sobre o que havia acontecido produziu o fim do grupo.

 

Referências

Baudrillard, J. (1991). Simulacros e simulação. Lisboa, Portugal: Relógio d´Água.         [ Links ]

Baudrillard, J. (1999). A troca impossível. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.         [ Links ]

Elias, N., & Scotson, J. (2000). Os estabelecidos e os outsider. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

Freud, S. (1996a). Sobre o narcisismo: Uma introdução. In J. Strachey (Ed.), Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 14, pp. 89-122). Rio de Janeiro: Imago (Originalmente publicado em 1914).         [ Links ]

Freud, S. (1996b). Psicologia de grupo e a análise do ego. In J. Strachey (ed.), Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 18, pp. 91-182). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1921).         [ Links ]

Freud, S. (1996c). O mal-estar na civilização. In J. Strachey (Org.), Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud (Vol. 21, pp. 81-174). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1930).         [ Links ]

Lacan, J. (1998). O Seminário 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar.         [ Links ]

 

 

Recebido em 18 de fevereiro de 2010
Aceito em 01 de agosto de 2011
Revisado em 16 de Janeiro de 2012

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