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Revista Mal Estar e Subjetividade

versão impressa ISSN 1518-6148

Rev.Mal-Estar Subj vol.13 no.1-2 Fortaleza jun. 2013

 

AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS

 

Lugar-escola: espaços educativos

 

Place-school: educational spaces

 

Lugar-escuela: espacios educativos

 

Lieu-école: espaces éducatifs

 

 

Eliane Cristina Gallo AquinordI; Elisabeth Adorno de AraujoII

IArquiteta e mestranda do Programa de Mestrado em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas- PUC-Campinas. E-mail: elianegallo@yahoo.com.br
IIDoutora em Educação Matemática e Docente do Programa de Mestrado em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas- PUC-CAMPINAS. E-mail: elisabetharaujo@puc-campinas.edu.br

 

 


RESUMO

Este artigo apresenta os debates entre autores que avaliam o ambiente físico de instituições educativas, sua ocupação e, principalmente, a relação entre esses espaços e a aprendizagem dos alunos na escola. Nesse sentido, discorre sobre a relevância do meio físico para os alunos e professores durante o processo de ensino e aprendizagem nos espaços escolares. Assim sendo, o objeto de questionamento é a importância do espaço físico para o ato de ensino, visando a aprendizagem dos alunos. Existem lacunas na ciência pedagógica para o uso desses espaços, as quais resultam em perda de qualidade da aprendizagem quando não há uma apropriação adequada dos espaços escolares, devido à má orientação inicial dos projetos de arquitetura escolar estabelecidos pelo antigo paradigma de utilização das salas de aula. Os professores, a sociedade e a comunidade escolar ainda não estão preparados para visualizar novas possibilidades de usos para os ambientes escolares. A conclusão é que se deve reivindicar, junto aos gestores educacionais, a composição de uma nova arquitetura escolar planejada em conjunto com a comunidade, docentes e alunos para transformar esses espaços em lugares efetivos e colaborativos de ensino e aprendizagem.

Palavras-chave: espaço escolar; arquitetura. lugares; aprendizagem; ensino.


ABSTRACT

This article presents the debates among authors who evaluate the physical environment of educational institutions, their occupation and, especially, the relationship between these spaces and students' learning. Accordingly, discusses the relevance of the physical environment for students and teachers in the process of teaching and learning in school spaces. Therefore, the object of inquiry is the importance of the physical space for the act of teaching, aimed at student learning. There are gaps in the science of teaching in relation to use of these spaces, which result in loss of quality of learning when there is an inadequate appropriation of school spaces, due to poor initial orientation of the architectural structure of schools, based in the old paradigm of classrooms use. Teachers, society, and school communities are not prepared to see new possibilities of use for school environments. The conclusion is that one should request with the managers, the planning of a new architecture of schools in conjunction with the community, teachers and students to turn these spaces into effective places and of collaborative teaching and learning.

Keywords: pschool; architecture; places; learning; teaching.


RESUMEN

Este artículo presenta los debates entre autores que evaluación el entorno físico de las instituciones educativas, su ocupación y, especialmente, la relación entre estos espacios y el aprendizaje de los alumnos en la escuela. En este sentido, discute la importancia del entorno físico a los estudiantes y profesores en la enseñanza y el aprendizaje en espacios escolares. Por lo tanto, el objeto de cuestionamiento es la importancia del espacio físico para la ley de educación, destinado al aprendizaje de los alumnos. Hay brechas en Ciencias de la educación para el uso de estos espacios, que resultar en una pérdida de calidad de aprendizaje cuando hay una adecuada apropiación de los espacios escolares, debido a la deficiente orientación inicial de proyectos de arquitectura escolar establecidos por el viejo paradigma del uso de las aulas. Los maestros, la sociedad y la comunidad escolar no están todavía dispuestos a mostrar nuevas posibilidades de aplicaciones para entornos escolares. La conclusión es que debe reclamar, a lo largo de los administradores educativos, la composición de una nueva escuela de arquitectura planeada conjuntamente con la comunidad, profesores y estudiantes para transformar estos espacios en lugares colaborativo y eficaz de enseñanza y aprendizaje.

Palabras-clave: espacio escolar; arquitectura; lugares; aprendizaje; enseñanza.


RÉSUMÉ

Cet article présente les débats entre auteurs qui évaluent l'environnement physique des établissements d'enseignement, leur occupation et, surtout, la relation entre ces espaces et l'apprentissage des élèves à l'école. En ce sens, discute de la pertinence de l'environnement physique, aux étudiants et enseignants au cours de l'enseignement et d'apprentissage des processus dans les espaces de l'école. Par conséquent, l'objet de l'interrogatoire est l'importance de l'espace physique pour la Loi sur l'éducation, visant à l'apprentissage des élèves. Il y a des lacunes en sciences de l'éducation pour l'utilisation de ces espaces, entraînant une perte de qualité de l'apprentissage lorsqu'il y a un crédit suffisant de places dans les écoles, en raison de la mauvaise orientation initiale de projets d'architecture scolaire mis en place par l'ancien paradigme de l'utilisation des salles de classe. Les enseignants, la société et la communauté scolaire ne sont pas encore prêts à montrer les nouvelles possibilités d'utilisations pour l'environnement scolaire. La conclusion est qu'ils doivent réclamer, le long des gestionnaires de l'éducation, la composition d'une nouvelle école d'architecture prévue en collaboration avec la Communauté, les enseignants et les élèves à transformer ces espaces en place efficace et concertée d'enseignement et d'apprentissage.

Mots-clés: espace école; architecture; lieux; apprentissage; enseignement.


 

 

Introdução

Paradoxalmente, quando alguém olha atentamente, tanto pode se aperceber de sua centralidade como da própria pequenez.

Josep M. Esquirol (2008, p. 59)

Estarmos em pleno século XXI, envoltos por uma gama variada de avançadas tecnologias e descobertas científicas não é condição suficiente para o entendimento dos aspectos de nossa condição humana, de ser e estar nessa sociedade. O conhecimento ampliado sobre determinados modos de tempo e espaço vigentes ainda não alcança, em muitos aspectos, a própria condição humana de se relacionar com os seus iguais e compreender-se como indivíduo atuante na sociedade tecnológica/individualista/fragmentada.

O sentido aqui utilizado de indivíduo é o filosófico de Porfírio que considera "o indivíduo como entidade singular e irrepetível", Mora (2001, p.377). Como ser único, entende-se que deveria ter uma vivência valorizada e respeitada pela sociedade na qual está inserido.

A ideia de se prestar atenção nos indivíduos é fomentada pelo filósofo Josep M. Esquirol, cujo debate volta-se para a questão do respeito quando ele lembra que, do ponto de vista etimológico, a raiz latina da palavra respectus (respeito) significa "olhar atrás, olhar atentamente, tornar a olhar", Esquirol (2008, p.54). Respeitar o indivíduo em seu processo de aprendizagem é olhá-lo atentamente, considerando-o um ser único. E, infelizmente, na relação intersubjetiva no espaço escolar, não é incomum o tratamento automático e sem críticas.

Conforme Arroyo (2004) há em cada nome e número de chamada da sala de aula uma pessoa humana que não pode ser ignorada e massificada. É importante observar que o olhar atento pode ser descrito do seguinte modo:

O olhar tem algo de estranho, de paradoxal: a total facilidade de olhar contrasta com a dificuldade de olhar bem. Se há luz, só de abrir os olhos as coisas que nos rodeiam nos aparecem, mas em compensação, é preciso prestar atenção, reparar bem, para perceber conforme que aspectos da realidade e, sobretudo, para perceber as coisas de outra maneira. Ver somente, o mero perceber visual, quase não custa nenhum esforço (daí, por exemplo, o êxito da televisão), enquanto que olhar bem, isso sim, é que custa: dirigir o olhar e concentrar-se em algo já supõe um esforço e acarreta, portanto, um cansaço, Esquirol (2008, p.11).

O respeito do educador no cuidado com a formação do educando se manifesta quando o duplo olhar puder negar a indiferença da maioria das relações que se estabelecem no cotidiano dos indivíduos na escola. Ao notar a indiferença contida nas relações educacionais também é possível fazer o mesmo em relação ao caráter impessoal dos relacionamentos. Para tanto, escreve Heidegger (2008, p.185), "(...) o impessoal retira a responsabilidade de cada presença. (...) Pode assumir tudo com a maior facilidade e responder por tudo, já que não há ninguém que precise responsabilizar-se por alguma coisa." A escola pública brasileira, por pertencer a toda uma sociedade, tornou-se uma instituição impessoal e indiferente às particularidades dos indivíduos que nela convivem, sendo que, paradoxalmente, deveria estar voltada primordialmente para aqueles que são os mais necessitados de seus préstimos e acolhimento.

Afirma Esquirol (2008) que as pessoas deveriam ter um olhar mais atento para se orientarem melhor na vida. Olhar duas vezes para a situação da escola brasileira ensejará aos docentes e aos demais atores envolvidos uma orientação do percurso na busca da melhoria das condições das relações estabelecidas no espaço escolar.

O olhar individual atento para os processos educacionais requer amplitude e respeito para melhor compreendê-los conforme estão dispostos na busca coletiva de uma posterior tomada de decisão por melhores propostas político-pedagógicas. Nesse âmbito, "o primeiro passo para se orientar ou se mudar uma situação consiste em compreendê-la e, consequentemente, o mais escravo de todos os homens sempre é o que nem sequer sabe o que é", conforme Esquirol (2008, p. 23).

O autor aponta que a ignorância, de um modo geral, consiste na falta de respeito para com o outro e consigo próprio, pois é a negação da mudança de orientação das opções de vida. Ignorar as novas possibilidades de escolha é não olhar atentamente para a própria vida e a realidade que está à sua volta. O docente, ao relacionar-se com seus educandos, precisa rever suas práticas pedagógicas para não projetar imagens irreais de alunos em uma situação também suposta e não real. Sobre o olhar docente, aponta-se:

Toda inovação educativa tem de começar por rever nosso olhar sobre os alunos. Inclusive o repensar de nossa auto-imagem docente tem tudo a ver com o repensar da imagem que deles fazemos. Em grande parte nos imaginamos ser o que imaginamos que nossos alunos são, Arroyo (2004, p.56).

O docente que consegue enxergar a dificuldade de sua situação paradoxal deverá saber lecionar de modo diverso que aprendeu a fazê-lo e terá na docência o papel abrangente de desenvolver nos educandos a capacidade crítica e formativa de valores sociais de uma emergente sociedade tecnológica extremamente competitiva e individualista.

O entendimento da sociedade em suas diversidades e complexidades contemporâneas é significativo para a atualização do papel da escola e, por consequência, do professor nela inserido. Ao analisar a situação, Esteve (1999) aponta que o professor em seu mal-estar docente enfrenta alto grau de consciência de suas ações, provocando-lhe uma espécie de vaga sensação de estar só, ou de encontrar-se diante de uma realidade da qual não se pode fugir, recuar, ou mesmo enfrentar. O ato de posicionar-se demanda que a pessoa tenha olhado atentamente para a situação para ter convicção de seus atos. Ainda sobre o olhar docente, pode-se ressaltar:

Reeducar nosso olhar, nossa sensibilidade para com os educandos e as educandas pode ser de extrema relevância na formação de um docente-educador. Pode mudar práticas e concepções, posturas e até planos de aulas, de maneira tão radical que sejamos instigados (as) a aprender mais, a ler mais, a estudar como coletivos novas teorias, novas metodologias ou novas didáticas, Arroyo (2004, p.62).

O educador que se percebe como agente efetivo e reflexivo em sua sociedade terá mais respeito e responsabilidades perante suas posturas pessoais, profissionais e sociais, apesar de encontrar-se em uma sociedade que revê seus valores e está, a todo o momento, passando por divergências culturais, sociais e econômicas.

O educador, como indivíduo comprometido politicamente e pertencente a uma determinada sociedade, não pode ignorar as características intrínsecas à sua profissão. Esse docente, consciente das suas atribuições, quer e deve fazer uso das suas potencialidades para ter uma melhor atuação no ambiente no qual está inserido. Deverá, assim, ter uma atuação responsável e de repúdio em relação às incongruências presentes na sua vida profissional, bem como em relação aos vários problemas inerentes às condições de infraestrutura ou de gestão escolar.

Na abordagem referente aos problemas das condições de infraestrutura das escolas públicas brasileiras, é importante citar alguns autores, tais como, Azevedo e Bastos (2002) e Elali (2003) que avaliaram o ambiente físico de alguns estabelecimentos educativos, sua ocupação, a percepção dos usuários, no contexto educacional público. As pesquisas evidenciaram que as condições estruturais das escolas são fatores primordiais para a garantia de um ensino e aprendizagem de reconhecida eficácia, aliados a professores com formação adequada, entre outros fatores.

 

Condições das Instituições Escolares

O homem, diferentemente dos outros animais, soube construir diversos espaços para cada tipo de atividade humana, inclusive para as atividades educativas. Ao longo dos séculos e com o aprimoramento das técnicas construtivas, os espaços puderam ter uma evolução em todos os quesitos técnicos (iluminação, ventilação e acústica), exigidos para proporcionar maior conforto aos seus usuários. Ao relacionar-se com o espaço, o homem transformou-o intencionalmente para o atendimento de suas necessidades físicas, estéticas, culturais e sociais. A característica de cada construção atendia aos requisitos predeterminados da sua época e localização geográfica. E nesse sentido, acrescenta-se que "o tamanho do espaço depende, pois, da atividade humana", Bollnow (2008, p. 223), sendo que o tamanho do espaço irá determinar, em alguns casos, a realização ou não de determinada atividade.

Olhar duas vezes para o espaço e, assim, respeitá-lo é ter consciência de que estamos lançados, descreve Bollnow (2008), em meio à estranheza de algo que é sinistro e hostil: o mundo externo. Estar no espaço, para o homem, é algo arbitrário, pois ocorreu sem o seu consentimento. Não escolhemos, desde o início, o nosso espaço no mundo. Podemos, em alguns casos, fazer a opção por encerrar nossa vivência nesse mesmo espaço inóspito. Para atenuar a estranheza do mundo, cumpre-se o ritual do acolhimento no início da vida, onde há o espaço protetor da casa. Nesse espaço, estamos protegidos de tudo e de todos os que nos são estranhos. Bachelard (1993, p. 24) considera que "a casa é o nosso canto do mundo" e trará a percepção de abrigo para aqueles que iniciam sua jornada no hostil espaço do mundo. O ter abrigo ou habitar algo aliviará a sensação de estar desprotegido e ameaçado; será o acolhimento criado pelo próprio homem para suplantar a sua dificuldade em se ver sem referência no espaço do mundo. Dessa forma, salienta-se sobre o habitar:

Com o habitar se quer dizer cada forma de encontrar-se no espaço, que se opõe fundamentalmente ao ser jogado, pois habitar significa: não mais estar exposto num ponto aleatório de um meio estranho, mas coberto sob a proteção da casa, Bollnow (2008, p. 294).

O habitar para o homem torna-se algo sagrado, pois é a sua referência no mundo. Aquele que não possui mais nenhuma referência como indivíduo, geralmente se desapega do habitar da casa, abandona-se ao espaço do mundo sem se importar com suas referências e necessidades mais elementares.

O homem criou a casa como abrigo familiar/social e, para seu desenvolvimento, trouxe, na sequência histórica, a escola para protegê-lo das dificuldades intelectuais, sociais e culturais. A escola tornou-se um segundo lar para os indivíduos que puderam dela usufruir com a convivência de suas próprias leis e modos de ser no tempo e espaço peculiares. Sobre a formação da escola em seus primeiros tempos, nota-se:

O desenvolvimento urbano, comercial e cultural do século XII acarreta à expansão do uso da escrita, o desgaste do monopólio da Igreja, a criação de escolas para a transmissão das técnicas de leitura e cálculo, bem como para a formação em práticas jurídicas, médicas e comerciais (Buffa & Pinto, 2002, p.141).

A escola nasceu nos espaços das residências e em outros lugares não especializados para os seus propósitos educativos, desenvolvendo suas funções de acordo com as condições regionais, históricas e culturais da sociedade na qual estava localizada. Sobre essa questão, por fim, "não se deve esquecer que a escola, como qualquer outro tipo de habitação, incluída a própria casa, é uma criação cultural sujeita a mudanças históricas", Escolano (2001, p.45). O autor considera que a casa e o seu entorno são para os indivíduos as primeiras aprendizagens como estruturas espaciais, sendo que a escola será, após a casa, uma das experiências mais importantes da formação cognitiva do ser. Tanto o abrigo da casa ou da escola são construções fundamentais para acolher e proteger o homem no mundo.

Conforme Moraes (2002, p. 7) a União Internacional de Arquitetos (UIA) dispõe de algumas recomendações para as construções escolares e o Fundo de Desenvolvimento da Escola (FUNDESCOLA) adotou-as para o projeto e construção de unidades escolares visando a melhoria das condições estruturais das escolas de Ensino Fundamental das regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste do Brasil. Sendo assim, seguem as suas orientações paras os arranjos físicos das escolas:

A sua construção deve ser realizada utilizando-se a escala do aluno (a criança).

O arranjo dos locais deve ser flexível e diferenciado.

Devem-se evitar salas sistematicamente uniformes, dispostas em alinhamento rígido.

Conforto de espaços em correlação com a forma do habitat do aluno (criança) e seu grau de evolução.

A insuficiência de espaço é tão condenável quanto o excesso.

A iluminação deve ser homogênea.

Ventilação constante, evitando o confinamento e as correntes de ar.

A iluminação e a ventilação devem ser multilaterais, de preferência em faces opostas.

A ação do sol deve ser controlada.

No entanto, as condições estruturais encontradas em várias escolas de Ensino Fundamental de todo o país ainda apontam para resultados opostos aos recomendados conforme Moraes (2002, p. 9). A autora aponta que as relações de vizinhança com creches e pré-escolas possuem "média recomendação", por terem como consequência a possibilidade de utilização conjunta de mobiliários e ambientes. Geralmente, esse fato é constatado quando há grande demanda na quantidade de alunos e a escola precisa emprestar algumas salas de aulas da escola vizinha (pré-escola). Esse aspecto estrutural afeta diretamente o sistema escolar, pois a inadequação do espaço físico, devido à grande demanda de alunos, ocasiona até cinco turnos, em uma mesma escola, comprometendo o tempo/espaço escolar de intervalo entre as classes de alunos, como pudemos constatar em pesquisa de campo realizada na cidade de Campinas.

Da mesma forma, pode-se observar, conforme a autora, que é "pouco recomendada", para a escola a relação de vizinhança com equipamentos de saúde devido ao grande fluxo de pessoas e veículos que serão gerados nesse local ocasionando mais transtornos do que benefícios para a comunidade escolar. Contudo, há em várias escolas brasileiras o predomínio do agrupamento dos serviços de saúde e educação nos mesmos espaços e quarteirões. Tal questão estrutural vem favorecer os fatores econômicos e logísticos, mas cria para os usuários das escolas ruídos, trânsito intenso e possíveis efeitos psicológicos negativos ao conviver com os equipamentos de postos de saúde e seus usuários.

Cabe, então, a revisão dos projetos das escolas para o atendimento dessas recomendações, pois tais incongruências entre os manuais de implantação de escolas e a prática efetiva também poderão gerar conflitos de gestão das diferentes instituições. É necessária uma mudança efetiva das ações para criar discursos e práticas pedagógicas voltadas aos educandos.

O docente, ao olhar com respeito para o entorno do educando, terá a noção da importância da localização e situação do edifício da escola em que trabalha, das relações estabelecidas entre os alunos e suas residências, do bairro e do centro da cidade e também da própria individualidade de seus educandos.

O educador, com olhar atento, não poderá negligenciar as incongruências impostas pelo entorno, pois estará ignorando o educando em sua realidade imposta e vivida. O olhar do docente atento para o processo educacional é dado como um relógio que não pode nunca parar de refletir sobre suas próprias ações e posturas de ensino e aprendizagem. Não é mais possível perpetuar as obrigações diárias mecanicamente, sem o questionamento dos tempos-espaços vigentes. É conflitante ensinar sobre educação ambiental sem voltar-se para o espaço da própria unidade escolar e trazer para o debate dos educandos discussões sobre as realidades do entorno vivido.

A mudança, como cita Arroyo (2004), pode estar em conhecer melhor os alunos nas suas vivências pessoais de trabalho, moradia e experiências sociais, espaciais e históricas. A relação particular do homem com o espaço pode ser descrita da seguinte maneira:

A diferença consiste em não ser o homem alguma coisa dentro das coisas, mas um sujeito que se relaciona com seu meio ambiente, e podemos caracterizar isso, até aqui, por sua intencionalidade. Uma vez que ele se relaciona com as coisas no espaço - o homem não é ele próprio algo interior ao espaço, é sua relação com as coisas que é caracterizada pela sua espacialidade. Ou, em outras palavras: o modo como o homem se encontra no espaço não é uma determinação do espaço cósmico que o circunda, mas de um espaço intencional, referido a ele como sujeito (Bollnow, 2008, p. 290).

O pátio na escola é o espaço onde se constituirão algumas das primeiras interações coletivas entre os colegas de uma mesma instituição educativa, ou seja, "o uso que os seres humanos fazem dos espaços, sua organização e disposição e a percepção que se tem dele, como o tempo, é um produto sócio-cultural, uma construção social" (Viñao Frago, 1996, p.63).

A sociedade humana, no intuito de controlar os impulsos das pessoas (que não fossem interessantes à classe religiosa e às classes dominantes), criou para si diversos espaços e lugares desde a Idade Média, conforme relata Foucault (1984, p. 412). Segundo o autor, pode-se estabelecer o conjunto de diferentes tipos de lugares, ou seja, há hierarquia de lugares sagrados e profanos, lugares protegidos e outros abertos e sem proteção, lugares urbanos e rurais. E apesar da nossa sociedade contemporânea dominar teoricamente a questão do espaço, Foucault indica que a prática social ainda não ousou enfrentar de modo significativo os usos dados aos diversos tipos de espaços, sendo, por exemplo, "entre o espaço privado e espaço público, entre o espaço da família e o espaço social, entre o espaço cultural e o espaço útil, entre o espaço de lazer e o espaço de trabalho; todos são ainda movidos por uma secreta sacralização" (Foucault, 2006, p. 413).

Analisar, aqui, o espaço da escola é também olhar para um espaço sacralizado há alguns séculos. Sua concepção se deu conforme as necessidades de uma determinada época e sociedades diferentes, mas, mesmo assim, ainda permanece o apego à habitação desse espaço já conhecido e íntimo de seus usuários. A secreta sacralização do espaço escolar permanece porque ainda não se soube olhá-lo atentamente com respeito e perceber a necessidade de mudança para o homem contemporâneo no atendimento de seu efetivo ensino-aprendizado. E, sobre esse conceito de espaço-escola, Silva (2006, p.50) reflete:

(...) revolucionar o conceito de escola significava ir às raízes e desconstruir a lógica do modelo precedente, permitindo a multiciplicidade de sentido para um mesmo objeto arquitetônico. Desse modo, não se trata de contradições da arquitetura moderna, mas de uma vontade consciente de tornar explícito um movimento de pensamento capaz de questionar os estereótipos responsáveis pelo desenho padrão de escola.

O funcionamento do espaço escolar é dado como um relógio que não para a fim de refletir sobre suas próprias ações educativas. Viñao Frago (2001, p.130) descreve o método educativo aplicado nos espaços escolares com a finalidade de se evitar o movimento dos educandos, ou seja, um dispositivo mecânico semelhante a um relógio, assim descreve-o "(...) esse método e sua correlativa organização das pessoas e objetos na sala de aula não era senão um dispositivo mecânico, com toda a precisão de um relógio, aplicado a seres vivos num espaço fechado e reduzido".

Conseguir situar os problemas da instituição1 escolar brasileira é também tratar das condições físicas de seus edifícios e das percepções2 que seus usuários possuem do espaço escolar. É importante acrescentar que:

Além disso, todo espaço é um lugar percebido. A percepção é um processo cultural. Por isso, não percebemos espaços, senão lugares, isso é, espaços elaborados, construídos. Espaços com significados e representações de espaços. Representações de espaço que se visualizam ou contemplam, que se rememoram ou recordam, mas que sempre levam consigo uma interpretação determinada. Uma interpretação que é o resultado não apenas da disposição material de tais espaços, como também de sua dimensão simbólica (Viñao Frago, 2001, p.78).

O educador deve olhar atentamente para os espaços escolares onde ocorre sua prática educativa e ser capaz de descobrir novas alternativas para o seu trabalho docente, ampliando suas potencialidades e suas práticas pedagógicas. Terá melhor resultado se trabalhar em coletividade com outros docentes. Essa experiência já é desenvolvida em alguns grupos colaborativos3 e a principal vantagem é a fusão dos esforços individuais em esforços de grupos concentrados que ampliam os potenciais de tempo e espaço.

Vários olhares poderão trazer diferentes percepções sobre um mesmo ambiente e com a produção de várias formas de descrição e maneiras de tratar as questões relativas ao ensino e à aprendizagem dos indivíduos inseridos em um contexto específico escolar. Essa observação revela a intenção do olhar atento e respeitoso com a particularidade pessoal de quem a descreve e está fundada nas interações de memórias, imaginações, percepções próprias de cada um. Portanto, a atual sociedade precisa de lugares de ensino voltados às suas peculiaridades, para atender às demandas da comunidade4 na qual está inserida.

A escola não pode ser mais um elemento do cotidiano que não respeita as características dos indivíduos em suas necessidades mais elementares. Desta forma, é premente instituir e iniciar a construção de lugares de ensino e aprendizagem que respeitem os educandos e tenham sobre eles um duplo olhar atento para as suas características singulares.

 

Espaços Construídos

O espaço construído é a história dos trabalhadores que objetivamente o realizam, no gesto diário de quem faz o tijolo, levanta paredes, recobre pisos, quebra pedras, mistura as tintas, recolhe o entulho... É a história das crianças e dos seus pais.

Mayumi Souza Lima (1989, p.101)

Os laços humanos não se constituem em um modelo absoluto que pode ser calculado, diagnosticado e predeterminado. O entendimento do assunto - homem - passa por entraves históricos, sociais e culturais que demandam tempo e dedicação para a avaliação da possibilidade de construção de uma nova sociedade com valores mais justos para todos os indivíduos.

Nessa perspectiva, pode-se usar a palavra utopia que, conforme Chauí (2008), significa "não lugar" ou "nenhum lugar". A construção de uma sociedade com valores justos para todos é vista como um "não lugar" que não tem semelhança com o lugar em que ensinamos ou aprendemos na sociedade atual. Desse modo, são construídas as utopias burguesas pelo mundo todo, no alento de nos sentirmos bem e de criar ambientes de alegre viver. Botton (2007, p. 107) refere-se ao ideal material e psicológico da sociedade da seguinte forma:

Dependemos do que está a nossa volta obliquamente para personificar os estados de espírito e as idéias que respeitamos e, então, nos lembrar deles. Nós queremos que nossas construções nos mantenham fiéis, como uma espécie de molde psicológico, a uma visão benéfica de nós mesmos. Colocamos ao nosso redor formas que nos comunicam aquilo de que precisamos interiormente - mas estamos sempre correndo o risco de esquecer.

Na atualidade, as pessoas buscam breves momentos de felicidade em refúgios cercados e vigiados durante as vinte e quatro horas do dia. Harvey (2004) refere-se a essa tendência burguesa devido ao individualismo centrado na propriedade e com uma paisagem monótona dependente do automóvel e da infraestrutura urbana desordenada. O autor confere o nome de "privatopias" a essas comunidades fechadas e protegidas.

Ao idealizar alguns espaços das cidades que estão no imaginário das pessoas, estes se tornam vivências idealizadas, pois comunicam mensagens que não são adequadas para o mundo vivido/real, mas apenas para um mundo visualizado. A atual sociedade volta-se para os espaços que são apenas vistos e não vividos, ou seja, os usuários das cidades, casas e espaços em geral são meros espectadores de suas vidas e não têm atuação efetiva no contexto político-social, conforme é explicitado no papel da arquitetura na cidade:

E é ainda correto que as propostas arquiteturais atuais pretendem tornar o habitar (uma cidade ou uma casa) um mero ato de visão: eu vejo a cidade mas não a uso; os habitantes da periferia se deslocam no fim de semana para ver o centro da cidade, ou o bairro "bonito", mas não para vivê-lo (são os turistas residentes, e como turista sua função é essa: ver); o morador de uma casa vê sua sala mas não a usa, ela é quase sempre um quadro que ele apenas vê e conserva para os outros verem (Coelho Netto, 2006, p.78).

A escola pública reflete a política atual da ausência e da negação do papel daqueles que deveriam cuidar dos mais privados das necessidades elementares de sobrevivência. Estar no espaço público de ensino é vagar entre lugares errantes, cujos significados estão indefinidos para seus usuários há algum tempo.

O atendimento das necessidades efetivas das populações mais carentes não são os objetivos efetivos da maioria das políticas públicas e a experiência atual mostra que o poder político-econômico se sobrepõe ao social. Atualmente a escola pública sequer é vista; está privada de lugar de destaque, uma vez que se encontra submersa nos espaços da cidade, mantendo uma atuação medíocre na área político-social com os integrantes das comunidades locais. Desse modo, a cidade não se mostra para seus habitantes:

Caminhar é ter falta de lugar. É o processo indefinido de estar ausente e à procura de um próprio. A errância, multiplicada e reunida pela cidade, faz dela uma imensa experiência social de privação de lugar - uma experiência, é verdade, esfarelada em deportações inumeráveis e íntimas (deslocamentos e caminhadas), compensada pelas relações e os cruzamentos desses êxodos que se entrelaçam, criando um tecido urbano, e posta sob o signo do que deveria ser, enfim, o lugar, mas é apenas um nome, a Cidade (Certeau, 2008, p. 183).

Sua antiga posição de destaque social no cenário republicano ficou no passado e em fotografias guardadas nos museus. Estar no espaço escolar público é acreditar no merecimento de suas precárias condições de atendimento pedagógico e de infraestrutura física, como se pode destacar:

A ideologia da meritocracia está assim também presente nos espaços escolares, através da arquitetura reduzida à mediocridade de obras que mantêm intactos a taxa de lucro e os prazos políticos, e oferece, em conseqüência, a pior qualidade cultural e tecnológica para as crianças e a população de baixa renda (Lima, 1989, p.65).

A existência de espaços educativos públicos de sucesso é, muitas vezes, resultado de ações individuais de bons gestores/educadores ou meros cartões de visitas das políticas públicas locais. É urgente a execução de um plano de ação estruturador para toda a educação pública, com abrangência holística e que contemple um número maior de docentes e comunidades carentes. No entanto, esse plano de ação deverá privilegiar ações e medidas socioeducativas e não apenas as questões políticas para a tomada de decisões como é de praxe na sociedade brasileira.

Para entendimento do funcionamento dos espaços públicos é necessário o esclarecimento de suas práticas ligadas ao cotidiano, ou seja, a prática física e a prática imaginária. Como define Coelho Netto (2006, p.119), as práticas estão relacionadas a um "discurso sobre o espaço", quer dizer, revestem-se de um significado ideológico dependendo do interesse de determinado grupo da sociedade.

Os espaços são elementos dinâmicos, vivos e mutáveis. Na prática efetiva, o espaço pode ganhar ou perder sua função sem se estabelecer qualquer previsão. Assim, bairros inteiros, casas ou prédios perdem seu valor e significado por várias causas que não foram predeterminadas ou planejadas pelo homem. Nas palavras de Montaner (2001, p.161), "toda coletividade necessita de alguns lugares arquetípicos carregados de valores simbólicos; se a cidade não os oferece, estes são criados pelos grupos sociais." Assim, a rua, geometricamente definida por um urbanismo, é transformada em espaço pelos pedestres, como acontece nos bairros mais afastados dos centros urbanos das cidades, com a população ocupando as ruas e os carros se tornando os intrusos nas vias projetadas para o seu tráfego. A prática local torna comum o caminhar dos pedestres pela rua. É a prática física do lugar, tornada efetiva e legitimada pela comunidade.

Os espaços podem ser semantizados, supersemantizados ou dessemantizados, quer dizer, estudados segundo as mudanças sofridas em suas significações e sentidos perante a comunidade em um contexto local, conforme Coelho Netto (2006, p. 120). O espaço da escola pública brasileira encontra-se dessemantizado em sua prática efetiva, tanto física como imaginária, em consequência de um certo discurso sobre ele. O abandono por parte da classe média das escolas públicas para as escolas particulares ao longo dos anos, não importando se as condições da escola pública eram similares às das particulares, em um dado momento, originaram um discurso sobre o espaço da escola pública. Surge no discurso sobre o espaço a dessemantização social e ideológica da escola pública. Assim escreve Certeau (2008, p. 203), "os relatos efetuam, portanto um trabalho que, incessantemente, transforma lugares em espaços ou espaços em lugares". No entanto, em determinadas comunidades, a escola será o único referencial/equipamento para o lazer, para o contato interpessoal e para uma possível mudança de condição econômica, social e cultural.

 

Edificar Espaços ou Lugares Educativos?

A sociedade atual é aquela que pretende desenvolver as atividades de ensino e aprendizado em locais específicos para essas ações. O desenvolvimento industrial proporcionou essa expansão e também houve a exigência de novas ferramentas tecnológicas para o ensino adequado das novas gerações. Com o intuito de verificar as melhores práticas docentes, tem-se os exemplos referenciados na Tabela 1.

 

 

Em 1999, Lackney resumiu em uma conferência regional para estabelecer as principais características que os edifícios escolares deveriam apresentar para se tornarem atrativos e Sanoff (2007, p.10) descreve-os:

(a) Ambientes estimulantes: O uso de cor e textura; disposições criadas pelos estudantes para que eles tenham um senso de conexão e posse com o produto.

(b) Locais para aprendizado em grupo: Lugares especiais como espaços para intervalo, alcovas, agrupamentos em mesas para facilitar o aprendizado social e estimular o cérebro social; transformar espaços de intervalo em salas de estar para conversação.

(c) Conectar espaços internos e espaços externos: Encorajar movimento dos estudantes, engajar o córtex motor ligado ao córtex cerebral, para a oxigenação.

(d) Espaço público: Corredores e espaços públicos que contenham símbolos do propósito maior de prover coerência da comunidade escolar, o que significa um aumento na motivação.

(e) Segurança: Locais seguros reduzem ameaças, especialmente em ambientes urbanos.

(f) Variedade espacial: Variedade de locais com diferentes formas, cores e luzes, cantos e aberturas.

(g) Mudar disposições: Mudar o ambiente; interagir com o ambiente estimula desenvolvimento cerebral.

(h) Disponibilidade de recursos: Prover posições variadas, físicas e educacionais, em proximidades, para encorajar o desenvolvimento rápido de idéias gerado em um episódio de aprendizado. Este é um argumento para que áreas/ciências dinâmicas e espaços de trabalho ricos em computadores sejam integrados e não segregados. Funções múltiplas e fertilização cruzada de ideias são objetivos centrais.

(i) Flexibilidade: Um princípio comum no passado que continua a ser relevante. Muitas dimensões da flexibilidade nos espaços de aprendizado são refletidas em outros princípios.

(j) Locais ativo-passivos: Os estudantes precisam de locais para reflexão e isolamento em relação a outros, para a inteligência intra-pessoal, bem como de locais para engajamento ativo, para a inteligência inter-pessoal.

(k) Locais personalizados: O conceito de uma base primordial precisa ser enfatizado além de um armário de metal ou da mesa. A necessidade de permitir que os alunos expressem a sua própria identidade, personalizem os seus locais especiais e espaços para expressar comportamento territorial.

(l) A comunidade como um ambiente de aprendizado: Utilizar todo o ambiente urbano e natural como a localidade de aprendizado primária. A escola como fortaleza de aprendizado precisa ser desafiada e conceitualizada mais como um centro rico em recursos de ensino que suplementa aprendizados para toda a vida. A tecnologia do ensino à distância, a comunidade e parcerias empresariais, aprendizado baseado no lar, tudo isso precisa ser explorado como estruturas alternativas de organização, para instituições educacionais do presente e do futuro. (Tradução nossa).

E quando não há uma prática suficiente e adequada, a contrapartida é o desinteresse dos educandos. Portanto, edificar lugares com apelo emocional e educativo e aliado a uma prática docente de boa qualidade se faz necessário para criar uma maior integração entre alunos e professores.

O professor é ainda, atualmente, o protagonista das aulas e para essa configuração prevalece o sistema tradicional de ensino: aulas expositivas com alunos pouco participativos no processo da busca do conhecimento. Nesse sentido, há uma contradição com os atuais paradigmas educacionais que se direcionam para uma participação efetiva do aluno na construção do seu próprio conhecimento e a não separação do "mundo da escola" e o "mundo real", Armstrong (2008, p.96).

É necessário que seja proporcionado aos docentes uma sólida formação inicial e continuada para o uso de todos os recursos possíveis ao ensino/aprendizado dos alunos. Na visão de Paulo Freire, a construção da escola se dá além dos aspectos físicos, ou seja, devem-se priorizar as relações entre os sujeitos envolvidos no processo de ensino/aprendizagem.

A ideia de que se educa "em qualquer lugar" significa uma outra concepção de educação na sociedade brasileira, algo ameaçador para uma sociedade que sempre viu na educação e em suas edificações uma forma de manutenção dos seus interesses políticos e econômicos (Lopes, 2007, p. 87).

A partir disso, é importante estabelecer para o arranjo físico da escola, como argumenta Viñao Frago (1996, p.92), a necessidade de se abrir os espaços internos e dispor de outras maneiras os ambientes escolares, buscando, assim, a ausência de separações ou limites entre as pessoas e os objetos. Dessa forma, não haverá restrição ao uso pedagógico nem será necessária a constante adaptação/improviso para as diferentes circunstâncias de ensino/aprendizado. É importante ressaltar que o "espaço sempre hierarquiza. Estabelece continuidades e descontinuidades, comunica e separa, classifica e esquematiza" (Viñao Frago, 1996, p. 77).

Nesse âmbito, o professor detém o papel fundamental para a determinação da melhoria da qualidade da escola e, através de sua função docente aliada ao espaço físico, pode ser um agente que:

Seja como elemento associado à estrutura física, seja como fator independente no processo educacional, aquele que tudo pode fazer, o professor é (...) aquele que age, que coloca as estruturas em funcionamento ou até mesmo consegue superar os limites impostos por elas. Contudo, não é qualquer professor; este precisa ser qualificado, ou seja, precisa ter condições para pôr em ação a estrutura, condições essas dadas pelos seus investimentos na profissão, especialmente os relativos à obtenção dos títulos escolares, e pelas aptidões necessárias para tal, (Sales & Passos, 2008, p. 302).

A atual formação pedagógica docente não tem aliado a prática pedagógica ao espaço físico escolar. Portanto, há que se pensar no investimento da qualificação dos professores e melhorar as condições da infraestrutura da escola pública e da formação acadêmica. E também em estreitar os laços de cooperação entre os profissionais envolvidos na construção dos espaços escolares tais como arquitetos, engenheiros, secretários e demais profissionais da educação e da gestão política.

 

Considerações Finais

Este artigo pretendeu apresentar os debates entre autores que avaliam o ambiente físico de instituições educativas e a sua ocupação, a interação dos usuários e, principalmente, a percepção dos docentes. Nesse sentido, discorreu sobre a relevância do meio físico junto aos docentes em ações de ensino/aprendizagem nos espaços escolares públicos. Para isso, foi necessário compreender parte do complexo universo escolar em seu cotidiano, dentro do espaço físico escolar.

Nesse ambiente escolar, os usuários estão em caráter provisório e os espaços para as atividades pedagógicas são muitas vezes insuficientes para a grande demanda de alunos. A permanência desses usuários se dá de modo breve e desarticulado com as atuais discussões pedagógicas democráticas.

A atual arquitetura escolar ainda não reflete as necessidades intrínsecas ao processo da construção do conhecimento, ou seja, não consegue criar elementos funcionais, estéticos e participantes do ato educativo. Os espaços escolares se apresentam inflexíveis e mal dimensionados para atender às necessidades de seus usuários. Ao mesmo tempo, a escola não apresenta espaços que possam abrigar diversas atividades individuais ou pedagógicas diferenciadas. Por isso, há dificuldade em desenvolver atividades interdisciplinares nessa escola, pois é necessária a criação de espaços físicos adequados para o bom resultado desses projetos. Conforme Viñao Frago (2001, p.116-117):

(...) todo educador, se quiser sê-lo, tem de ser arquiteto. De fato, ele sempre o é, tanto se ele decide modificar o espaço escolar, quanto se o deixa tal qual está dado. O espaço não é neutro. Sempre educa. Resulta daí o interesse pela análise conjunta de ambos os aspectos - o espaço e a educação -, a fim de se considerar suas implicações recíprocas.

O ambiente escolar poderia ser composto por lugares no qual a comunidade, docentes, direção e os alunos se identificassem como algo que lhes pertencesse afetivamente. A modificação da arquitetura escolar deve ser feita com a opinião e a participação de todos os sujeitos envolvidos; deve ser um projeto que atenda aos interesses da comunidade local, pois serão os indivíduos que efetivamente o vivenciarão. Dentro desse projeto encaixam-se os sujeitos envolvidos no processo de ensino/aprendizagem da escola pública, tais como, alunos, professores, diretores, orientadores educacionais, funcionários, a comunidade local, envolvidos em adequadas políticas públicas para a composição do Lugar-Escola (Fig. 1), um ambiente de ensino e aprendizagem, democrático e com duplo olhar para docentes e educandos na intenção de integrar todos os interessados nesse processo tais como as políticas públicas, a infraestrutura física da escola, o docente com uma formação pedagógica continuada e o projeto político pedagógico (P.P.P.).

 

 

Nessa configuração, a sala da aula poderá atuar como lugar condutor da ação-educação e viabilizar a realização de jogos, tarefas, representações, discussões e experiências, desde que os docentes e demais agentes da educação estejam preparados uma formação inicial ou continuada que possibilite utilizar estes recursos.

Na atualidade, não é mais possível determinar um espaço educacional ideal sem conhecer e interagir com a comunidade que vivenciará esse local. Este artigo teve a intenção de mostrar alguns caminhos na construção de lugares educativos e também que cada comunidade poderá ser responsável pela criação da própria arquitetura escolar. O mundo mudou, mas a escola continua em moldes do passado; pouco adiantará mudar o espaço físico das escolas se não se mudarem as práticas docentes, e vice-versa. Não se alcançam práticas inovadoras, interdisciplinares se não houver condições físicas para que elas ocorram. É necessário um projeto de escola que envolva todos os integrantes da comunidade escolar e sociedade para obtenção de um ambiente escolar ideal para o ensino e aprendizagem que denominamos Lugar-Escola: espaços educativos.

 

Referências

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Recebido em 20 de setembro de 2010
Aceito em 15 de agosto de 2011
Revisado em 02 de janeiro de 2012

 

 

1 "Instituir significa dar início a uma coisa, fundar algo" (Esquirol, 2008, p. 101).
2 " Percepção: "Síntese de sensações simultâneas" (Chauí, 2008, p. 133).
3 O GEPEC - Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Continuada - é um grupo colaborativo que tem por objetivo produzir trabalhos que deem subsídios aos professores em suas práticas docentes, através das reuniões realizadas com os professores na Unicamp (Geraldi, Pereira, & Fiorentini, 1998, p. 12).
4 Horkheirmer e Adorno (1979) designa o termo comunidade para um grupo social formado de indivíduos com interesses, sentimentos e comportamentos comuns.

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