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Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento

versão impressa ISSN 1519-0307versão On-line ISSN 1809-4139

Cad. Pós-Grad. Distúrb. Desenvolv. vol.18 no.2 São Paulo jul./dez. 2018

http://dx.doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p83-93 

Efeito da fisioterapia aquática no pós-operatório de quadril em crianças com paralisia cerebral GMFCS V

 

Effect of aquatic physiotherapy in the postoperative period of hip in children with cerebral palsy GMFCS V

 

Efecto de la fisioterapia acuática en el postoperatorio de cadera en niños con parálisis cerebral GMFCS V

 

 

Caio Roberto Aparecido de Paschoal CastroI; José Luis Rodrigues BarbosaII; Douglas Martins BragaIII

IAssociação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: caio.paschoal11@hotmail.com
IIAssociação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: jluis-fisio@hotmail.com
IIIAssociação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: douglasbraga78@hotmail.com

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: Os pacientes com paralisia cerebral, classificados como nível V na Gross Motor Function Classification System (GMFCS), possuem alterações nos quadris que muitas vezes necessitam de cirurgia. Após as cirurgias, a dor no quadril é comum, dificultando a higiene, a alimentação e o vestir. A fisioterapia aquática é uma das modalidades terapêuticas que podem auxiliar na analgesia.
OBJETIVO: Verificar o efeito da fisioterapia aquática na analgesia de quadris em pacientes pós-operatórios de paralisia cerebral e a influência para facilitar as atividades de higienização, vestir e alimentação.
MÉTODO: Estudo retrospectivo. Foram avaliados 137 prontuários e selecionados seis prontuários de pacientes, contendo informações quanto a sexo, idade, tipo de cirurgia, tempo de reabilitação e informações em relação ao quadro álgico, higiene, vestuário e alimentação, utilizando a Escala Visual Analógica, após a intervenção na fisioterapia aquática.
RESULTADOS: A média de idade dos pacientes era de 9,3 ± 3,0 anos e 80% foram submetidos a procedimentos cirúrgicos de partes moles em conjunto com partes ósseas. Tempo médio de reabilitação de 4 ± 0,9 meses. De acordo com a opinião dos pais, a dor foi amenizada (p = 0,034), a higiene (p = 0,034) e o vestuário (p = 0,057) ficaram facilitados após a intervenção.
CONCLUSÃO: A fisioterapia aquática promove analgesia importante nos pacientes com paralisia cerebral nível V na GMFCS, a higiene e o vestuário foram facilitados pós-intervenção.

Palavras-chave: Pós-operatório. Paralisia cerebral. Hidroterapia. Analgesia. Quadril.


ABSTRACT

INTRODUCTION: Patients with Cerebral Palsy (CP) classified as level V on Gross Motor Function Classification System (GMFCS), have hip disorders which often require surgery. After surgeries hip pain is common, making hygiene, food and clothing difficult. Aquatic physical therapy is one of the therapeutic modalities that may help in analgesia process.
OBJECTIVE: To verify the influence of aquatic therapy on hips analgesia in post-operative patients with CP and the influence on hygiene, clothing and feeding activities.
METHOD: It was a retrospective study. A total of 137 medical records and 6 patient charts containing information on the sex, age, type of surgery, rehabilitation time and information regarding pain, hygiene, clothing and feeding were used, using the Visual Analogue Scale, after intervention in the Aquatic Physiotherapy.
RESULTS: Patients mean age was 9.3 ± 3,0 years and 80% were submitted to bone and soft tissue surgical procedures. Average rehabilitation time of 4 ± 0,9 months. According to parents opinion, pain decreased (p = 0,034), hygiene (p = 0,034) and clothing (p = 0,057) were easier after intervention.
CONCLUSION: Aquatic physical therapy promotes important analgesia in patients with CP classified as level V on GMFCS, hygiene and clothing were facilitated post-intervention.

Keywords: Postoperative. Cerebral Palsy. Hidrotherapy. Analgesia. Hip.


RESUMEN

INTRODUCCIÓN: Los pacientes con parálisis cerebral, clasificados como niveles V en la Gross Motor Function Classification System (GMFCS), pose en alteraciones en las caderas, que a menudo requieren cirugía. Después de las cirugías, el dolor en la cadera es común, dificultando la higiene, la alimentación y vestuario. La fisioterapia acuática es una de las modalidades terapéuticas que pueden auxiliar en la analgesia.
OBJETIVO: Verificar la influencia de la fisioterapia acuática, en la analgesia de caderas en pacientes postoperatorios de Parálisis Cerebral y la influencia en las actividades de higienización, vestuario y alimentación.
MÉTODO: Estudio retrospectivo. Se evaluaron 137 prontuarios y seleccionados 6 prontuarios de pacientes, conteniendo informaciones encuanto al sexo, edad, tipo de cirugía, tiempo de rehabilitación e informaciones en relación al cuadro álgico, higiene, vestuario y alimentación, utilizando la Escala Visual Analógica, después de la intervención en la intervención Fisioterapia Acuática.
RESULTADOS: El promedio de edad de los pacientes era de 9,3 ± 3,0 años y el 80% fueron sometidos a procedimientos quirúrgicos de partes blandas en conjunto con partes óseas. Tiempo medio de rehabilitación 4 ± 0,9 meses. De acuerdo con la opinión de los padres, el dolor se suavizó (p = 0,034), la higiene (p = 0,034) y el vestuario (p = 0,057) quedaron facilitados después de la intervención.
CONCLUSIÓN: La fisioterapia acuática promueve la analgesia importante en los pacientes con parálisis cerebral niveles V en la GMFCS, la higiene y el vestuario se han facilitado después de la intervención.

Palabras clave: Postoperatorio. Parálisis cerebral. Hidroterapia. Analgesia. Cadera.


 

 

INTRODUÇÃO

A paralisia cerebral (PC) é um grupo de alterações permanentes do movimento e da postura que limitam atividades diárias ou funcionais, decorrentes do distúrbio não progressivo no desenvolvimento do cérebro imaturo. Essas desordens estão geralmente acompanhadas de alterações do sistema musculoesquelético (RICHARDS; MALOUIN, 2013; ROSENBAUM et al., 2007; RETHLEFSEN et al., 2017), que impactam a vida dos pacientes e da família (RICHARDS; MALOUIN, 2013; ROSENBAUM et al., 2007; RETHLEFSEN et al., 2017). Uma alternativa para essas alterações são as cirurgias ortopédicas, com o objetivo de alcançar o máximo de potencial para esses pacientes (JOHARI et al., 2016).

As deformidades de quadril afetam mais de 90% dos indivíduos com PC nível V na Gross Motor Function Classification System (GMFCS). Essa alteração, se não tratada, pode causar dor e limitar movimentos, afetando a higienização, a postura sentada e a qualidade de vida (DARTNELL et al., 2014). Outro fator relevante para o tratamento cirúrgico nos indivíduos com PC é a subluxação de quadril, que afeta, aproximadamente, 70% dos indivíduos com PC nível V, sendo a principal causa as contraturas em adução de quadris (HAMSTAD; TERJESEN, 2016) A incidência de dor nesses casos varia de 25% a 50% (HAMSTAD; TERJESEN, 2016; COUCEIRO et al., 2009).

Uma das formas de tratamento da dor no momento pós-operatório é a fisioterapia aquática. Essa modalidade terapêutica tem efeitos analgésicos em razão dos princípios físicos como o empuxo, a pressão hidrostática, a viscosidade e a temperatura (SILVA; BRANCO, 2011; FARCETTA JUNIOR et al., 2010). Esses efeitos estimulam os receptores encontrados na pele (exterioceptores), ativando as fibras nervosas aferentes, que apresentam velocidade de condução maior que as das fibras dolorosas, resultando em diminuição da transmissão da dor e sua percepção pelo paciente (SILVA; BRANCO, 2011; FARCETTA JUNIOR et al., 2010).

A temperatura da água entre 32°C e 34°C na piscina favorece o aumento da propriedade viscoelástica que, somada à diminuição da ação gravitacional pelo empuxo, proporciona um relaxamento muscular e, consequentemente, um ganho de amplitude articular na água. O efeito da flutuação reduz a compressão gerada em solo pela força da gravidade nas articulações, possibilitando o aumento dos espaços intra-articulares, a diminuição da dor e favorecendo, assim, a manipulação e a movimentação ativa do paciente (SILVA; BRANCO, 2011; FARCETTA JUNIOR et al., 2010).

Somando a turbulência e a temperatura, que influenciam o aumento do limiar da dor, ao empuxo e à pressão hidrostática que atuam no relaxamento muscular em razão da vasodilatação e a diminuição de sobrecarga corporal, a fisioterapia aquática pode se mostrar eficaz perante os quadros álgicos de quadris (FARCETTA JUNIOR et al., 2010).

Pensando nessas possibilidades, o objetivo deste estudo foi analisar a influência da fisioterapia aquática na analgesia, em atividades de higienização, vestuário e alimentação no pós-operatório de quadril em pacientes com PC.

 

MÉTODO

Trata-se de um estudo retrospectivo de série de casos, realizado na Associação de Assistência à Criança com Deficiência (AACD), aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa dessa instituição, sob o parecer CAAE: 60830416.6.0000.0085, obedecendo à Resolução n. 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

De acordo com os critérios de inclusão, foram selecionados os prontuários de pacientes com paralisia cerebral, classificados como nível V no GMFCS, que tenham realizado cirurgia ortopédica/corretiva de quadril em partes moles, ósseas e ósseas e moles de membros inferiores (MMII). Os aspectos observados nos prontuários foram: sexo, idade, tempo de reabilitação na fisioterapia aquática (meses) e coleta dos dados da entrevista que os pais respondiam nos momentos pré e pós-intervenção. Essa entrevista era estruturada e avaliava as perspectivas dos pais, em que eles atribuíam, por meio da escala visual analógica (EVA), uma nota de 0 a 10 quanto à facilidade de realizar os itens vestuário, alimentação e higiene. A mesma escala era utilizada para avaliar a intensidade da dor nos momentos pré e pós-período de reabilitação na fisioterapia aquática.

Foram excluídos os prontuários dos pacientes com paralisia cerebral nos níveis I, II, III e IV do GMFCS, que foram submetidos a processos cirúrgicos, prontuários com dados faltantes relatados nos critérios de inclusão e pacientes com histórico de doenças concomitantes que impossibilitavam o atendimento no meio líquido.

Uma vez definidos os critérios de elegibilidade do estudo, foi realizada a leitura dos prontuários e preenchida uma ficha estruturada com os dados de inclusão e exclusão por um único examinador, que não participou do processo de intervenção.

O tempo das sessões de fisioterapia aquática foi de 35 minutos, com a água à temperatura de 34°C. Foram realizados exercícios de mobilização passiva de MMII com pacientes em flutuação, alongamento passivo de adutores de quadris, isquiotibiais e flexores de quadris com os pacientes também em flutuação e em posição de sela, quando possível, com nível de imersão em processo xifoide, utilizando os princípios físicos da água como facilitadores, como o empuxo e a viscosidade. A turbulência foi outro princípio físico utilizado, promovido pelas mãos do terapeuta na região dolorosa. Os materiais utilizados foram flutuadores e colares cervicais flutuantes.

Análise estatística

Para caracterização da amostra, foram utilizados a média, o desvio padrão e a porcentagem para as variáveis (vestuário, higiene, alimentação e vestuário), nos momentos pré e pós-período de intervenção. Para a análise intragrupos foi utilizado o teste de Wilcoxon. Os dados estão apresentados em mediana, primeiro quartil e terceiro quartil. Considerou-se um intervalo de confiança de 95%, nível de significância de p < 0,05. O tamanho do efeito (d de Cohen) foi calculado para verificar o impacto do programa de intervenção nos parâmetros que apresentaram significância estatística considerando 0,20 = efeito pequeno, 0,40 = efeito moderado e 0,80 = efeito grande. Foram utilizados os softwares SPSS V17, Minitab 16 e Excel Office 2010.

 

RESULTADOS

Foram encontrados no banco de dados da Clínica Infantil de Paralisia Cerebral 137 prontuários de pacientes que realizaram cirurgia ortopédica (partes moles, partes ósseas moles e ósseas). Destes: 21 prontuários (I GMFCS), 33 prontuários (II GMFCS), 53 prontuários (III GMFCS), 22 prontuários (IV GMFCS) e 8 prontuários (V GMFCS). Dentre os oito prontuários selecionados, dois foram excluídos, pois os pacientes não realizaram a reabilitação pós-cirurgia ortopédica na instituição, residiam em outra cidade, restando seis prontuários que preencheram os critérios do estudo. Os dados contendo as características clínicas estão dispostos na Tabela 1 e a análise das variáveis vestuário, alimentação, higiene e dor nos momentos pré e pós-intervenção, na Tabela 2.

 

 

 

 

Neste estudo foram selecionados seis prontuários de pacientes com diagnóstico de PC nível V no GMFCS, que foram submetidos ao processo cirúrgico em quadris e realizaram a intervenção somente na fisioterapia aquática. Observamos que, apesar de o processo cirúrgico ser indicado para esta população, na faixa etária proposta há um número pequeno de pacientes do nível V submetidos ao processo cirúrgico em relação aos demais níveis do GMFCS (I, II, III, IV). Acreditamos que esse fato ocorra porque esses pacientes têm estados mais graves do ponto de vista motor em relação aos outros níveis GMFCS, e muitas vezes são mais sensíveis a complicações decorrentes do processo cirúrgico, principalmente quando não é realizada a reabilitação adequada. Além de serem mais suscetíveis, apresentam alterações clínicas que impedem o procedimento cirúrgico (FARCETTA JUNIOR et al., 2010). Notamos que a idade média a que essas crianças foram submetidas à cirurgia ortopédica foi de 9 anos. Sabemos que a idade é um fator determinante para o procedimento cirúrgico, mas a indicação cirúrgica pode variar, dependendo da classificação do GMFCS e do tipo de cirurgia indicada (RETHLEFSEN et al., 2017). Entretanto, achados da literatura afirmam que é necessário que haja maturidade óssea para que esses pacientes sejam submetidos a algum procedimento cirúrgico (PARKIN; DEVLIN, 2006), uma vez que pacientes com idade menor ou igual a seis anos realizam novo procedimento cirúrgico em um período menor que cinco anos (PARKIN; DEVLIN, 2006; SHORE et al., 2016).

Outro fator que corrobora nossos achados é que grande parte dessa população realizou cirurgia de quadril (HAMSTAD; TERJESEN, 2016), pois os pacientes PC nível V apresentam espasticidade de quadris, além das displasias e subluxações, que levam os pacientes a sentir dores, dificultando cuidados básicos como higiene, posicionamento e alimentação (HAMSTAD; TERJESEN, 2016). A maioria dos pacientes com paralisia cerebral, níveis IV e V na GMFCS, é submetida às cirurgias ósseas e de partes moles associadas (PARKIN; DEVLIN, 2006). Este fato concorda com os achados do atual estudo, no qual a maioria (80%) dos pacientes realizou esse tipo de procedimento cirúrgico (HAMSTAD; TERJESEN, 2016; KOCH et al., 2015).

A fisioterapia aquática vem sendo utilizada no período pós-operatório de pacientes PC nível V do GMFCS. Esse fato está associado à facilidade de manipulação desses pacientes neste ambiente e aos princípios físicos da água, associado aos efeitos fisiológicos do corpo em imersão (BECKER, 2009; PERINI et al., 1998). O aumento da temperatura da água no corpo em imersão ocasiona a diminuição da atividade do sistema nervoso simpático, levando à diminuição da frequência cardíaca, ocasionando o relaxamento muscular (RICHARDS; MALOUIN, 2013; BECKER, 2009; PERINI et al., 1998), que facilita o manuseio, atuando na melhora da flexibilidade muscular e, consequentemente, diminuindo a espasticidade (BECKER, 2009). Tais evidências estão de acordo com o atual estudo, que toma como base a facilitação do manuseio desses pacientes por meio dos princípios físicos e térmicos da água sobre o corpo em imersão.

A diminuição da dor foi um dos principais aspectos observados após a intervenção da fisioterapia aquática. Achados da literatura com pacientes pós-operatórios reforçam a ideia de que um dos principais efeitos do corpo em imersão é a promoção de analgesia (ROSENBAUM et al., 2007; GORTER; CURRIE, 2011). Existem diversos fatores que podemos relacionar, pois se sabe que a temperatura da água pode auxiliar na diminuição da dor e da espasticidade (BECKER, 2009; GORTER; CURRIE, 2011). Fisiologicamente, quando um corpo está em imersão, há um transbordamento sensorial, que é responsável pela diminuição da percepção da dor na parte afetada (BECKER, 2009; STOLBERG; FRENK, 1995). Podemos sugerir que somente pelo fato de a criança estar em contato com o meio líquido já ocorre diminuição da percepção da dor.

A turbulência é uma grande aliada ao tratamento da dor, uma vez que fornece uma gama de estímulos sensoriais que pode ser intensificada com manuseios oferecidos pelo terapeuta, promovendo a analgesia; além disso, se somada aos efeitos da água aquecida, modula a dor e promove o aumento no limiar de dor (BECKER, 2009).

O componente lúdico foi fundamental no processo de reabilitação e a água, por si só, oferece essa possibilidade para o tratamento de crianças com paralisia cerebral, tornando a terapia prazerosa. Muitas vezes, essas crianças estão limitadas à cadeira de rodas, além de apresentarem dificuldade de interação com o meio, em razão do déficit de comunicação. Na água, elas estão livres, o que facilita a exploração do ambiente e proporciona o "brincar" (FACETTA JUNIOR et al., 2010; DIFAZIO et al., 2016).

Os manuseios realizados se resumiram a técnicas de alongamentos passivos de adutores de quadris, flexores de quadris e isquiotibiais, todos esses com o paciente em flutuação. A escolha desses manuseios foi devidamente feita de acordo com as alterações de quadris já descritas na literatura, como a espasticidade da musculatura dos quadris e alterações ósseas (PARKIN; DEVLIN, 2006).

Durante a imersão, conseguimos realizar a estabilidade articular, que fornece a pressão em todas as direções. Essa estabilidade favorece a permanência desses pacientes em ortostase, postura realizada com dificuldades fora deste ambiente, para a população estudada. Dessa maneira, utilizamos da força vertical oposta à gravidade dada pelo empuxo, auxiliando as musculaturas enfraquecidas que não são capazes de vencer a força da gravidade (DIFAZIO et al., 2016; GORTER; CURRIE, 2011).

O número médio de sessões realizadas no atual estudo foi de 17,8 ± 4,3 sessões, uma vez por semana, com duração de 35 minutos, por um período de 4 ± 0,9 meses. Observamos que foram suficientes para atingir os objetivos propostos. Em uma revisão da literatura sobre intervenção da fisioterapia aquática nos pacientes com paralisia cerebral, foi encontrada uma variação no tempo de tratamento de 6 a 14 semanas, frequência entre duas e três vezes na semana e tempo de terapias variando entre 30 e 60 minutos (GORTER; CURRIE, 2011), não concordando com o atual estudo. Porém, nessa revisão nenhum dos estudos analisados realizavam intervenção em pacientes nível V na GMFCS pós-operatório. Não foi encontrada nenhuma referência na literatura atribuindo número de sessões, tempo e frequência de terapias referentes à fisioterapia aquática para esta população específica.

A opinião dos pais é fundamental nesse processo, pois estamos falando de crianças que apresentam dificuldade de comunicação. Observou-se que a dor foi amenizada e a higiene e o vestuário ficaram facilitados após a intervenção da fisioterapia aquática. Este achado foi relatado pelos pais/cuidadores. Cuidadores de pacientes com paralisia cerebral níveis IV e V observaram ganhos em relação a cuidados pessoais, posicionamento, transferências, atividades diárias, comunicação e interação social após intervenção cirúrgica (DIFAZIO et al., 2015), porém, esses achados não correlacionam a melhora dos aspectos com nenhum tipo de reabilitação. Com essas facilitações, há uma diminuição na sobrecarga de trabalho sobre o cuidador, repercutindo na melhora da qualidade de vida dos cuidadores (DIFAZIO et al., 2015).

Acredita-se que não houve melhora significativa em relação à alimentação dos pacientes, porque uma das mães relatou que a alimentação está mais difícil por causa da evolução da escoliose, e outra mãe relatou que o filho se alimentava por sonda. Porém, esse fator não estava diretamente relacionado com a cirurgia e o período de reabilitação, mas tínhamos a ideia de que, uma vez realizada a correção de membros inferiores, esta facilitaria o posicionamento e, consequentemente, a alimentação. No entanto, o ato de se alimentar é fator dependente de outros fatores.

Como limitações do estudo, apontamos o pequeno tamanho da amostra. O acompanhamento em longo prazo desses pacientes e a criação de protocolos específicos de analgesia, comparando-os com outras modalidades terapêuticas, seriam propostas para futuros estudos com esta população.

 

CONCLUSÃO

Verificou-se que a fisioterapia aquática promoveu analgesia importante nos pacientes com paralisia cerebral nível V na GMFCS participantes deste estudo. Também é possível concluir que a higiene e o vestuário do paciente podem ser facilitados após a intervenção da fisioterapia aquática.

 

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Recebido em: 08.08.2018
Aprovado em: 04.09.2018

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