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Revista Psicologia Política

On-line version ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.9 no.17 São Paulo June 2009

 

EDITORIAL

 

Temas emergentes para a psicologia política brasileira

 

Emerging themes for the Brazilian political psychology

 

Temas emergentes para la psicología política brasileña

 

 

Alessandro Soares da Silva*, I; Celso Zonta**,II

I Universidade de São Paulo USP
II Universidade Estadual Paulista UNESP

 

 

Quando observamos o desenvolvimento da Psicologia Política no Brasil e o perfil dos textos que são submetidos a esse periódico verificamos não apenas o crescimento do campo, mas a ampliação dos temas que são identificados como sendo pertinentes a esse campo. Em 2008 foram submetidos 59 artigos e apenas no primeiro semestre de 2009 outros 34 artigos. A presente revista que ora apresentamos retrata os temas recorrentes entre esse conjunto de manuscritos. Assim, no primeiro número do volume 9 de 2009 da RPP há um variado conjunto de artigos que apontam para importantes dimensões da vida cotidiana e do desenvolvimento da Psicologia Política no país. Caso voltemos nosso olhar para a coleção RPP, observaremos que, no Brasil, as temáticas mais recorrentes não são comportamento eleitoral, estudos sobre personalidades políticas ou mesmo terrorismo e violência política. Os nove artigos e a resenha que compõem esse número apontam para outras direções e abrem espaço para reflexões no campo da saúde, da família e da adolescência, das relações de gênero e raciais, da organização de movimentos sociais e do terceiro setor. Esses temas têm sido cada vez mais recorrentes na Psicologia Política e apontam para a condição interdisciplinar do campo psicopolítico.

O primeiro artigo Saúde Pública: publicização do Brasil foi escrito por Anita Bernardes (UCDB-MS), Eduardo Pelliccioli (UCDB-MS) e Neuza Guareschi (PUC-RS) e trata da questão do público, visto como um dispositivo da modernidade na articulação com a constituição do campo da saúde pública no Brasil e as formas de subjetivação produzidas nessa articulação. Na esteira dessa discussão, encontramos o artigo de Ana Lucia Monteiro (ILO Office – Brasil) e Wilza Vieira Villela (UNIFESP/UNIFRAN). Nele, as autoras discutem, como bem diz o título, A criação do Programa Nacional de DST e aids como marco para a inclusão da idéia de direitos cidadãos na agenda governamental brasileira. Para tanto, é focada, por um lado, a relação entre Estado e sociedade civil no contexto histórico de estruturação do Sistema Único de Saúde no Brasil e, por outro, o acesso aos serviços de saúde como direito humano. Nesse debate, Ana Lucia e Wilza centram suas preocupações na análise empírica dos processos de formulação e implementação do Programa Nacional de DST e aids.

Um tema bastante relevante e ainda pouco estudado com o qual @ leitor/a terá contato refere-se ao tema da família e da homoparentalidade. Raimundo Gouveia (UFPE) e Leoncio Camino (UFPb) fazem uma Análise psicossocial das visões de ativistas LGBTs sobre família e conjugalidade. Para os autores, "o preconceito tem provocado a estigmatização de homossexuais a partir dos comportamentos sexuais, mas também a sua organização política". O manuscrito procura entender como ativistas do movimento social dos públicos LGBT articulam os seus discursos a respeito da conjugalidade e da realização pessoal. Vale lembrar que as reivindicações do público LGBT ainda não foram reconhecidas de modo a possibilitar-lhes isonomia de direitos com os (as) heterossexuais, fazendo das questões relacionadas ao tema um campo de estudo bastante rico e, ao mesmo tempo, bastante estigmatizado.

Candente também é o tema do artigo de Cândida Alves, Regina Pedroza, Aline Pinho, Luara Presotti, Felipe Silva, autor@s vinculados à UnB. No artigo Adolescência e maioridade penal: reflexões a partir da Psicologia e do Direito, eles debatem como a demanda ao Estado por medidas para acabar com sua insegurança da população põem no centro do debate a questão das crianças e adolescentes autor@s de infrações a partir da polêmica da redução da maioridade penal. O manuscrito debate os principais argumentos a favor e contra da redução. Teriam esses sujeitos consciência de seus atos ao ponto de por eles serem responsabilizados?! Inimputabilidade penal significaria impunidade e o ECA deveria ser revisto, assim como o sistema de medidas socioeducativas nele contidas?!

Certamente, esses dois artigos trazem em seu texto elementos a serem discutidos no que tange aos direitos inerentes à pessoa e que se pautam em princípios como liberdade, igualdade e dignidade.

Em A história da inserção política da mulher no Brasil: uma trajetória do espaço privado ao público, Leila Machado Coelho e Marisa Baptista (UNIMARCO) refletem acerca do papel feminino na sociedade brasileira. Como apontam as autoras, essa discussão passa pelo debate acerca dos espaços público e privado, pois é a partir dela que se pode compreender a pequena presença das mulheres como protagonistas na cena política.

O artigo no leva a refletir sobre as razões que fazem com que a atividade política permaneça associada ao papel masculino e as mudanças que poderiam ocorrer na estrutura social para que houvesse uma maior inserção feminina no cenário político brasileiro. Juraci Maria da Silva (CUNY – EUA) nos brinda com o artigo Racial contact, attitude and decisionmaking in cross-race identification: implications for multiracial societies, no qual se discute como, no campo racial, diferentes medidas de contato apresentaram relações distintas de discernimento e critérios de tomada de decisão. Para Juraci, o reconhecimento dentro da própria raça e fora dela está relacionada ao tipo de interação em grupo e pode depender do mesmo, trazendo importantes implicações para sociedades multirraciais.

A experiência de coletivização em um assentamento de reforma agrária do MST é o artigo de Apoliana Groff (UFSC), Kátia Maheirie (UFSC) e Lorena Prim (FURB-SC). Ele resulta de uma pesquisa sobre os sentidos e significados do singular e do coletivo em um assentamento do MST e discute a experiência de coletivização a luta pela terra como forma de superação do processo de exclusão social e inclusão perversa e o sofrimento ético-político.

Os dois últimos artigos tratam do Terceiro Setor no Brasil. Em A "construção" do terceiro setor no Brasil: da questão social à organizacional Marcelo Gustavo Calegare e Nelson da Silva Jr. (USP) buscam discutir o papel dessas organizações na sociedade, a origem das ONGs no contexto internacional e sua introdução no Brasil e sua agregação ao Terceiro Setor. Nessa linha, os autores problematizam uma dada tipologia organizacional e o papel dos atores políticos dessas organizações, bem como as implicações da eficiência e eficácia na questão social, que focam a avaliação de projetos e o suposto potencial transformador. Já Renato Barboza e Tarcisio Vinicius Lopes (ISAÚDE – SP) fazem, no artigo Organizações não governamentais na região da Amazônia legal brasileira: o caso da saúde, um estudo exploratório que identifica e caracteriza a atuação das Organizações Não Governamentais na região Amazônica brasileira em prol da consolidação da intersetorialidade no Sistema Único de Saúde.

Por fim, a resenha do livro do livro "Zones of Proletarian Development" de autoria de Mastaneh Shah-Shuja escrita por Fernando Lacerda Jr. (PUC-Campinas – SP) apontam para um estado de tensões que tem contribuído fortemente para um a reorientação política da subjetividade na contemporaneidade e, porque não dizer, da própria Psicologia Política.

Nesse sentido, o labor investigativo desse conjunto de autores e autoras visibilizam a urgência de certos debates na sociedade brasileira, bem como a necessidade de uma reflexão acadêmica que ultrapasse a simples descritividade ou mesmo a adesão imediatista a formas lineares de compreender as pluridinâmicas que ordenam a vida e as práticas coletivas.

Temas como políticas públicas de saúde e ordenamento do Estado; relações entre este último, o terceiro setor e os cidadãos/ãs; mudanças sociais advindas da ação política de atores coletivos (como os movimentos sociais, que pautam temas-tabu como família, homossexualidade, acesso e permanência na terra, formações identitárias que transgridem a normalidade dominante etc.) não só forçam a sua discussão, mas contribuem para que a própria psicologia política seja pensada à luz das dinâmicas que põem em marcha a própria história contemporânea.

Esperamos que a leitura do presente número seja enriquecedora e agradável a tod@s!

 

 

* Editor.
** Editor.