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Revista Psicologia Política

versão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.9 no.17 São Paulo jun. 2009

 

ARTIGOS

 

Organizações não governamentais na região da Amazônia legal brasileira: o caso da saúde

 

Non-governmental organizations in the Brazilian Amazon region: the case of health

 

Organizaciones no gubernamentales en la Amazonía brasileña: el caso de la salud

 

 

Renato Barboza*, I ; Tarsio Vinicius Lopes**, I, II

I Instituto de Saúde – SES/SP – Brasil
II Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo apresenta um estudo exploratório que identifica e caracteriza a atuação das Organizações Não Governamentais na região da Amazônia Legal brasileira, no marco do desenvolvimento do Terceiro Setor no país. A coleta de dados utilizou como principal fonte de informação, o quadro de instituições filiadas da Associação Brasileira de ONGs. Posteriormente, as entidades foram agrupadas em duas tipologias: "ONGs responsáveis por redes que congregam outras entidades" e "ONGs que não atuam prioritariamente em redes". Dada a relevância dessas organizações no Setor Saúde para a consolidação da intersetorialidade no Sistema Único de Saúde, as ONGs que atuam nesse Setor, foram discutidas como um caso específico. O artigo indica alguns caminhos para o fortalecimento das políticas públicas de saúde, na interface entre o Estado e as ONGs da Amazonia Legal, onde o poder público ainda apresenta uma baixa institucionalidade, na oferta de serviços de promoção e prevenção para população.

Palavras-chave: Terceiro setor, ONG, Gestão, Relação Estado/sociedade civil, SUS.


ABSTRACT

This article presents an exploratory study that identifies and characterizes the role of NGOs in the Brazilian Amazon region in the context of developing the Third Sector in the country. The main source data collection used were the informations of the institutions affiliated in the Brazilian Association of NGOs. Subsequently, the organizations were grouped into two types: "NGOs responsible for developing networks organizations" and "NGOs that doesn't work primarily on the networks". These organizations are very important to the consolidation of the intersectoral actions in the Health System. The NGOs that operate in this sector were discussed as a particular case. The article suggests some ways to the strengthning of public health policies at the interface between the State and NGOs in Amazonia, where the government still has a low institutional framework to provide promotion and prevention services to the population.

Keywords: Third sector, NGO, Management, Relationship State/civil society, Unified Health System (SUS-BR).


RESUMEN

Este artículo presenta un estudio exploratorio que identifica y caracteriza el papel de las ONG en la Amazonia brasileña, en el marco del desarrollo del Tercer Sector en el país. Para la recogida de datos utilizou como la principal fuente de información las instituciones afiliadas a la Asociación Brasileña de ONG. Posteriormente, las entidades fueron agrupadas en dos tipos: "ONG responsables por redes que agrupan a otras entidades" y "ONG que no actúan principalmente en redes". Dada la importancia de estas organizaciones en el sector de la salud para la consolidación de las acciones intersetoriales del sistema de la salud brasileño, las ONG que operan en este sector se han analizado como un caso particular. El artículo sugiere algunos caminos para el fortalecimiento de las políticas de salud pública en la interfaz entre el Estado y las ONG en la Amazonia, donde el gobierno presenta todavía un marco institucional de baja en la prestación de servicios de promoción y prevención a la población.

Palabras clave: Tercer sector, Organizaciones no gubernamentales, Gestión, Relación Estado / sociedad civil, Sistema Único de Salud (SUS-BR).


 

 

Introdução

Nos países latino-americanos desde a década de 70, o papel do Estado, enquanto instância responsável pela definição e pela gestão de políticas públicas e a sua relação com a sociedade civil vêm sendo objeto crescente de debates e estudos. Nesse contexto, a discussão sobre a função do Estado de Bem Estar Social tem se tornado cada vez mais relevante, especialmente quanto à análise dos processos decisórios.

"As políticas públicas podem ser definidas como conjuntos de disposições, medidas e procedimentos que traduzem a orientação política do Estado e regulam as atividades governamentais relacionadas às tarefas de interesse público" (Lucchese, 1996: 3). O desenvolvimento das políticas públicas está relacionado aos aspectos econômicos, sociais, políticos, e também às formas de organização e participação dos diferentes atores sociais.

Quanto às políticas públicas em saúde, estas dependem da atuação e da ação social do Estado e do seu grau de compromisso com a melhoria das condições de saúde da população. Entende-se que é papel do Estado articular e organizar as funções públicas governamentais para a promoção, proteção e recuperação da saúde nas dimensões individual e coletiva.

A Constituição Federal de 1988 inseriu pela primeira vez uma seção específica referente à saúde, destacando no artigo 3º "a saúde como um direito social e um dever do Estado que deverá ser conquistado por meio da participação de pessoas, famílias, da sociedade e das empresas" (Carvalho, 1998: 135).

Os fundamentos e os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) estão definidos na Constituição Federal e sua regulamentação foi equacionada através das Leis Orgânicas da Saúde. Em dezembro de 1990, foi promulgada a Lei Federal Nº. 8080, de caráter amplo, que regulamenta os objetivos, as atribuições, os princípios e diretrizes, a gestão, a organização e o financiamento da assistência à saúde. Posteriormente, a Lei Nº. 8142, que trata de dois aspectos que não foram incluídos na lei anterior – a participação popular e o controle público instituindo, as Conferências de Saúde e os Conselhos de Saúde nos três níveis de governo.

Apoiado nesse arcabouço legal, o SUS é uma política pública de saúde, fundamentada em princípios éticos que devem garantir a qualquer cidadão brasileiro, o acesso universal, integral e equânime a uma rede de atenção à saúde, estruturada segundo os princípios organizativos do sistema, ou seja, a hierarquização com comando único em cada esfera gestora, a descentralização e a regionalização das políticas de saúde. A participação popular também integra os princípios do SUS, e deve ser assegurada para que se efetive o controle social das políticas públicas implementadas por meio de programas e outras ações que visam preservar a saúde individual e coletiva.

Lowi (1964) classifica as políticas públicas como intervenção do Estado em quatro tipos: ‘distributivas' (de curto prazo para as decisões que envolvem a seleção de quem serão os beneficiários); ‘redistributivas' (buscam um maior impacto, entendendo que a sociedade está organizada em classes e em setores sociais); ‘regulatórias' (buscam um impacto mais restrito, entendendo a sociedade como um todo homogêneo); e ‘constituintes' (normalizam as regras que impõem o poder e a autoridade do Estado, definindo regras sobre regras). Nessa tipologia, as políticas de saúde, assumem mais um caráter regulatório e constituinte.

No contexto latino-americano, a intervenção social do Estado se dá principalmente por meio de políticas de caráter redistributivo e regulatório. Nesse sentido, as políticas sociais assumem função de distribuição e redistribuição dos serviços e dos recursos, e as econômicas, de produção de bens e de serviços.

Maingón (1991) também destaca a tensão existente entre o particularismo e o universalismo dos impactos ou benefícios das políticas sociais. Na prática, o particular predomina sobre o universal, uma vez que os valores centrais são a busca do bem-estar de segmentos da população e a eqüidade na distribuição dos recursos.

Nessa perspectiva, na América Latina, até o final dos anos 90, os gastos com o setor saúde apresentavam uma tendência descendente, apontando para uma redução significativa na quantidade e na qualidade dos serviços. Torna-se, então, fundamental identificar as diferentes modalidades de prestação de serviços de saúde e os mecanismos de regulação destes, sendo que caberia ao Estado atuar em diversas dimensões do setor (como ente regulador, prestador de serviços e gerenciador dos recursos humanos).

Defendemos que é necessária a presença ativa do Estado como regulador e coordenador das políticas de saúde voltadas para a busca da eqüidade. Nessa ótica, Hulshof (1987) destaca que a intervenção direta do Estado no setor saúde se efetua a partir de duas funções: a) função normativa exercida por meio de leis, regulamentos, subsídios e indução de programas que visam controlar a prestação dos serviços; b) a intervenção direta do Estado na produção dos serviços de saúde em função das políticas estabelecidas.

Para Cohn (1997), em diferentes países da América Latina, bem como no Brasil, o Estado continua tendo um papel privilegiado capaz de ordenar as disputas de interesse e orientar o processo de desenvolvimento econômico e social. Porém, ainda é preciso aprimorar sua interlocução com a sociedade civil e as demais instituições políticas, qualificando sua capacidade técnico-administrativa através da gestão pública descentralizada.

A concretização desse processo depende necessariamente da transferência de poder decisório para o nível local, onde os beneficiários das políticas sociais possam atuar como protagonistas. Para tanto, a descentralização deve ser capilarizada, proporcionando não só a transferência e a responsabilidade executiva pelas ações, mas também as decisões quanto à definição, formulação e o estabelecimento de prioridades para as políticas públicas, contribuindo assim, para a transparência da atuação governamental e para o envolvimento da população na busca de soluções para problemas do seu cotidiano.

No cenário nacional, nas últimas décadas, há uma tendência de crescimento na prestação de serviços executados por organizações vinculadas ao Terceiro Setor. Também se constata um incremento da participação da sociedade civil no exercício do controle público. É crescente a contribuição desse Setor na formulação e no monitoramento das políticas públicas, bem como na defesa de direitos sociais no campo da Saúde Pública, da Educação, da Habitação, entre outros.

Assim, nos parece, que os desafios das agendas das políticas públicas, remetem para a construção de um novo projeto de sociedade, a partir da ação de um Estado competente e democrático, capaz de promover o desenvolvimento sustentável e a justiça social para a diminuição das desigualdades em nosso país. No contexto atual, as interfaces com as instituições do chamado Terceiro Setor, ainda nebuloso no país, assumem cada vez mais relevância para a concretização desse projeto.

 

O Terceiro Setor

Nas últimas décadas, pesquisadores do campo da Psicologia Política têm conduzido investigações interdisciplinares acerca do comportamento político e suas implicações na sociedade pós-moderna. Destacam-se nesse campo, temas emergentes, como a questão da participação social em suas várias modalidades de organização no âmbito das políticas públicas, como por exemplo por meio das Organizações Não Governamentais, bem como, os estudos "clássicos" que abordam a dinâmica dos movimentos sociais e a organização comunitária (Prado e Sandoval, 2002).

Como discutimos anteriormente, com a redefinição do papel do Estado, temos observado a transferência de funções públicas para as Organizações Não Governamentais, corroborando para fortalecer a tendência de crescimento do Terceiro Setor no país. Paiva e Yamamoto (2008), pesquisadores do campo da Psicologia Política, ao discutirem a inserção profissional dos psicólogos nesse setor, alertam para as contradições e armadilhas presentes no discurso e nas práticas institucionais, por vezes despolitizadas dos membros dessas organizações. Indicam ainda, que a Psicologia deve debater o Terceiro Setor, com vistas a fortalecer os movimentos sociais e sua atuação para organizar a sociedade civil, como uma "prática social" potente para promoção da inclusão social e da cidadania.

O Terceiro Setor é um fenômeno recente e importante para compreensão do desenvolvimento econômico e social das sociedades contemporâneas. Diversos autores apontam que sua conceituação e abrangência dependem das relações e interfaces estabelecidas com o Estado (Primeiro Setor) e o mercado (Segundo Setor), bem como a natureza jurídica das suas organizações.

Trata-se de um setor que engloba organizações privadas, com finalidades e interesses públicos, atuando de forma paralela e complementar ao primeiro e segundo setores. Essas instituições "visam à produção de bens e serviços públicos" (Fernandes: 21). Nas últimas décadas, na Europa e nos Estados Unidos, há uma tendência de consolidação do Terceiro Setor, evidenciada pelo crescimento de novas organizações sem fins lucrativos.

Ao estudar aspectos estruturais e operacionais das organizações do Terceiro Setor em diferentes países, Salamon (1997), definiu cinco características ou atributos comuns, que nos auxiliam numa primeira identificação dessas instituições, pois todas:

a) possuem alguma forma de organização institucional legal ou não, com um calendário de reuniões e atividades periódicas;

b) são privadas e não vinculadas a estruturas governamentais;

c) possuem gestão própria;

d) não possuem fins lucrativos e os excedentes financeiros são investidos na própria organização;

e) apresentam em seu quadro de profissionais, algum grau de trabalho voluntário.

No cenário brasileiro, no marco da globalização nos anos 90, o desenvolvimento do Terceiro Setor está intimamente relacionado à discussão da Reforma do Estado, que instituiu novas formas de gestão pública, através do "Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado", concebido em 1995, no governo Fernando Henrique Cardoso. Na sua concepção sustentadora, a produção de bens e serviços, cabe ao mercado e ao Terceiro Setor, e o Estado deve assumir o papel regulador e gerenciador, utilizando-se dos meios administrativos empregados no setor privado.

Como resultado dessa política econômica, a administração pública nas esferas federal, estadual e municipal, em diferentes setores, tem transferido a prestação de serviços sociais para as entidades da sociedade civil em suas diversas modalidades de organização institucional. Essa delegação de funções, também tem contribuído para reduzir a participação do poder público nas fases de implementação, monitoramento e avaliação das políticas públicas, fragmentando e desarticulando as funções de gestão e gerência do Primeiro Setor. A aceleração desse processo conduz a uma substituição da atuação do Estado, por meio da terceirização de programas, projetos e serviços, que passaram a ser contratados junto às instituições do Terceiro Setor (Montaño, 1999).

Outro ponto, que merece destaque nesse cenário das parcerias entre o Estado e as entidades do Terceiro Setor, refere-se às mudanças na administração dos recursos públicos e à sua direcionalidade. Gohn, chama a atenção para "a nova política de distribuição e gestão dos fundos públicos, em parceria com a sociedade organizada, focalizados não em áreas sociais (como moradia, saúde, educação etc.), mas em projetos pontualizados, como crianças, jovens, mulheres etc., contribuiu para desorganizar as antigas formas dos movimentos fazerem suas demandas e reivindicações" (Gohn, 2004: 26).

Ao discutir a origem e trajetória social das entidades brasileiras que constituem o Terceiro Setor, Fernandes afirma que o mesmo, "é composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela ênfase na participação voluntária, num âmbito não governamental, dando continuidade às práticas tradicionais da caridade, da filantropia e do mecenato" (Fernandes, 1997: 21).

No Brasil, tem se observado, desde os anos 60, um crescimento no número de Organizações Não Governamentais (ONG), que são instituições não tipificadas como estatais ou privadas, pertencentes ao Terceiro Setor. Essas organizações atuam em diversas áreas e causas sociais, como a educação, a saúde, o meio ambiente, a defesa de segmentos minoritários, o combate ao estigma e a discriminação de gênero e geração, os direitos sexuais e reprodutivos, a prevenção das DST/Aids, entre outras.

A heterogeneidade e intencionalidade das organizações do Terceiro Setor é bem definida por Gohn, ao afirmar que:

o terceiro setor é um tipo de ‘Frankenstein': grande, heterogêneo, construído de pedaços, desajeitado, com múltiplas facetas. É contraditório, pois inclui tanto entidades progressistas como conservadoras. Abrange programas e projetos sociais que objetivam tanto a emancipação dos setores populares e a construção de uma sociedade mais justa, igualitária, com justiça social, como programas meramente assistenciais, compensatórios, estruturados segundo ações estratégico-racionais, pautadas pela lógica de mercado. Um ponto em comum: todos falam em nome da cidadania (Gohn, 2000: 60-74).

O fenômeno social das Organizações Não Governamentais no Brasil é marcado por uma grande diversidade e complexidade que se expressa tanto no âmbito do foco de ação dessas instituições, quanto nas suas especificidades e intencionalidades. Nesse sentido, Nerfin (1988) ao problematizar a insuficiência, os limites e a generalização do conceito do Terceiro Setor, aponta que para compreendermos melhor as especificidades dessas organizações, faz-se necessária à utilização de outros conceitos, como o de "economia social" e "economia solidária".

Serva (1997) destaca que, as organizações baseadas na "economia social" são caracterizadas por instituições que exercem atividades econômicas, tendo como princípio a prestação de serviços para comunidade não baseada na geração de lucro, e uma gestão estruturada em processos democráticos. A maioria dessas instituições é formada por cooperativas ou associações, e sua missão prioriza as pessoas e o trabalho, em relação ao capital.

Quanto às organizações orientadas para a "economia solidária", o mesmo autor, refere que podem ser caracterizadas por objetivos sociais, operados a partir de uma lógica fundamentada na solidariedade e no sentimento de pertencimento e proximidade com a comunidade local. A gestão dessas instituições é realizada por atores que possuem vínculos como assalariados, voluntários e usuários e os recursos financeiros são provenientes de diferentes setores do poder público e de doações.

As parcerias estabelecidas entre o Estado e as ONGs orientadas pela economia solidária apresentam vários problemas operacionais na sua gestão. Muitas vezes essas parcerias são pontuais e as entidades apenas assumem tarefas na fase de execução dos programas ou projetos setoriais induzidos pelo Estado. Em última instância, essas parcerias são pouco produtivas e significativas, apresentando baixo impacto e efeito sinérgico limitado.

Nessa ótica, Oliveira e Junqueira (2003: 236) apontam que o Terceiro Setor no Brasil, ainda está em fase de construção e que as organizações tendem a ser manipuladas e tuteladas pelos interesses do governo e dos financiadores, sejam eles nacionais ou internacionais. Os autores debatem criticamente a presença de "características unicamente assistencialistas que marcaram e ainda marcam parte dessas organizações sem fins lucrativos", entretanto, defendem que a parceria Estado-ONG pode ser estratégica para viabilização do projeto da Reforma Sanitária brasileira, dada à complexidade do setor saúde, o tamanho do território nacional, e as necessidades de saúde crescentes da população.

 

A Amazônia Legal Brasileira

No intuito de fortalecer o planejamento, a implementação e a avaliação de políticas públicas regionais para a Amazônia, o governo brasileiro instituiu um dispositivo legal, através da Lei 1.806, de 06/01/1953, passando a denominá-la de Amazônia Legal, funcionando como uma região político-administrativa.

A Amazônia Legal brasileira abrange os estados do Amazonas, Amapá, Acre, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão (oeste do meridiano de 44º), com uma superfície de aproximadamente 5 milhões de Km2, correspondendo a 60% do território nacional (Censo, 2000). Ela abriga uma rica e diversificada biodiversidade, além da maior bacia hidrográfica do mundo, com aproximadamente 80 mil quilômetros de rios navegáveis.

A população da região, segundo dados do censo de 2000, atingiu 21,1 milhões de habitantes, com uma densidade demográfica de 4,0 habitantes por Km2, correspondendo a 12,4% do total da população brasileira, em contraste com a contribuição de 5,8% registrada em 1950 (Censo, 2000).

Nas últimas décadas, houve um intenso processo de transformação e diversificação do perfil sócio-econômico e populacional na Amazônia Legal. Alguns autores, como Becker (2001: 140) destacam que esse fenômeno contribuiu para o desenvolvimento de uma "floresta urbanizada", onde atualmente estão distribuídos 761 municípios (Censo, 2000).

Entretanto, o crescimento da população, sobretudo a urbana, não foi acompanhado de políticas públicas nas áreas sociais, que pudessem oferecer e manter uma infra-estrutura adequada para a população amazônica. Na maioria dos municípios, os índices de saúde, educação e renda, indicam a baixa qualidade de vida da população local (Becker, 1995).

Atualmente, na Amazônia Legal, estão instalados 24 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), dos 34 existentes no país, sob gestão da Fundação Nacional de Saúde. Segundo dados do Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena, 55,9% da população indígena brasileira, cerca de 80 etnias, pertencem a região. Esse sistema, implantado em 2002, é uma ferramenta importante para avaliar as políticas públicas de saúde direcionadas aos povos indígenas, oferecendo informações vitais aos gestores, sobre as condições de vida e situação de saúde indígena no país. Contudo, ainda precisa ser aperfeiçoado, quanto aos instrumentos de coleta e interface com outros sistemas utilizados no Sistema Único de Saúde – SUS (Sousa, 2007).

Em 38 municípios da região, a população indígena corresponde a mais de 10% da população municipal e em nove deles a mais de 50% (Ministério da Saúde, 2008). Observa-se desde a década de 1980, um movimento crescente para a formação de organizações indígenas, constituídas ou não como ONGs, lutando pela demarcação de suas terras e, nos anos 90, aumentam as pressões para reivindicar um acesso equânime e integral aos serviços públicos de saúde.

No quadro sanitário da Amazônia Legal, dentre as moléstias endêmicas, a malária, responde por 99% dos casos registrados no país; a dengue também apresenta uma incidência elevada, perfazendo 433 casos por 100.000 habitantes, superior a média nacional que é de 141 casos por 100.000 habitantes (Ministério da Saúde, 2008).

Os casos de Aids também apresentam tendências epidemiológicas preocupantes, uma vez que diferentemente de outras regiões brasileiras, verifica-se um aumento na incidência, principalmente nos casos de transmissão sexual. Enquanto no país, no período de 1993 a 1999, houve uma redução de 7,3% dos casos notificados, na região Norte ocorreu um incremento de 19,5%. O mesmo foi observado em relação à mortalidade, sendo que no país houve uma queda de 7,5% e na região um aumento de 5%. Os dados corroboram para demonstrar a precariedade das condições de vida e o baixo acesso da população aos serviços de saúde da rede pública, bem como aos meios de prevenção primária e secundária (Ministério da Saúde, 2008).

Dados do Ministério da Saúde (2008) mostram que o número de óbitos por causas mal definidas na região corresponde a 24,4%, muito superior à média nacional que foi de 15,1% nesse período e no estado do Acre, atingiu 31,7%, ou seja mais que o dobro do país. Os dados indicam, que o governo federal, mas principalmente os gestores estaduais e municipais da saúde, devem investir arduamente em ações de vigilância à saúde e controle epidemiológico para reverter esse quadro. É importante destacar que a presença do setor privado é muito reduzida na região e a rede pública responde por 78% dos equipamentos de saúde, tendo que organizar a oferta de serviços e o acesso da população na rede básica, na média e na alta complexidade no SUS.

Em consonância com as dificuldades apontadas no quadro sanitário da Amazônia Legal, os conselhos de saúde estaduais e municipais, responsáveis pela fiscalização e pelo controle social das políticas implementadas no âmbito do SUS, apresentam grandes dificuldades de estruturação e organização interna para desempenhar o seu papel e cumprir suas funções, atuando na maioria das localidades de forma precária.

Nos últimos anos, para enfrentar os diferentes contextos de vulnerabilidade social e programática no setor Saúde da região, o governo federal vem desenvolvendo vários programas e projetos intersetoriais. As ações visam o fortalecimento das funções estaduais e municipais na gestão de políticas loco-regionais, com capacidade para ampliar o acesso equânime e integral da população amazônica aos serviços da rede pública. Os eixos priorizados foram: educação e trabalho em saúde; saúde indígena; gestão descentralizada e participativa; atenção à saúde; ciência, tecnologia e inovação e vigilância em saúde.

Nessa ótica, destaca-se, o "Plano Saúde Amazônia Legal", uma resposta às reivindicações das Conferências de Saúde, assumindo caráter estratégico para o fortalecimento do SUS na região. Com o plano, houve a definição de uma agenda de cooperação técnica, política e institucional inter-gestores; a criação de Grupo de Trabalho, envolvendo várias secretárias do Ministério da Saúde; a implantação do Núcleo de Acompanhamento, Integração e Desenvolvimento, atuando em interface com as Comissões Intergestores Bipartite dos nove estados, responsáveis pelo monitoramento e avaliação do plano (Ministério da Saúde, 2006).

Viana e colaboradores (2007) ao analisaram a gestão da política do governo federal envolvendo vários setores da Amazônia Legal, no período de 2003 a 2005, identificaram dificuldades associadas a fatores estruturais, institucionais e políticos que interferem diretamente no desenvolvimento e consolidação de uma política intersetorial e de base regional para a saúde. Apesar dos esforços envidados pelo Ministério da Saúde para a redução das iniqüidades no campo da saúde pública nessa região, ainda se observa o desenvolvimento dos mesmos programas e estratégias empregadas no restante do país, apresentando baixa institucionalidade na gestão e um impacto reduzido para melhoria das condições de vida e situação de saúde da população amazônica.

Para consolidar uma política regional de saúde na Amazônia Legal, faz-se necessária a implementação de ações gerais e específicas continuadas e contextualizadas, com engajamento dos gestores das três esferas governamentais, com vistas à sustentabilidade técnica, política e financeira da região. Para a gestão adequada dessa política, o estudo recomenda que devem ser considerados: "o alto crescimento demográfico; a expansão de pequenos e médios municípios; o pouco desenvolvimento institucional do processo de descentralização na área social (limitada autonomia e baixa qualidade da gestão); limitado impacto das mudanças no financiamento federal da saúde na região; o caráter dos investimentos federais, geradores mais de governabilidade do que de equidade; e a persistente dificuldade de fixação de recursos humanos" (Viana e cols., 2007: 129).

Os desafios da consolidação das políticas públicas na Amazônia Legal também envolvem a relação com as organizações do Terceiro Setor. Corroborando com essa questão, Becker (2005) destaca que as mudanças na organização estrutural da região foram enormes nas últimas décadas, agregando novos atores com papel decisivo e capacidade de intervenção, como as ONGs, os governos estaduais e municipais e a cooperação internacional.

Tomando como ponto de partida a presença crescente nas últimas décadas das Organizações Não Governamentais em diversas áreas da Amazônia Legal brasileira, procuramos identificar e analisar as formas de atuação dessas instituições e suas interfaces com a área da saúde pública.

 

Método

O presente estudo é um recorte de um projeto mais amplo denominado "Desafios para a proteção social em saúde no Brasil em um contexto de iniqüidade", desenvolvido por meio de uma parceria entre o Ministério da Saúde e instituições de pesquisa: o Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, responsável pela coordenação do estudo, a Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, e o Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. A investigação teve como objetivo geral analisar a política federal de saúde para a região da Amazônia Legal no período de 2003 a 2005, sob condução do Ministério da Saúde, inserida em uma agenda mais ampla do Governo Federal.

Para a identificação das Organizações Não Governamentais, utilizamos como fonte principal, o cadastro eletrônico das instituições vinculadas a Associação Brasileira de ONGs (ABONG), registradas em novembro de 20081, em todos os estados da Amazônia Legal brasileira. Optou-se pela inclusão do estado de Goiás, pois cinco municípios pertencentes a essa unidade da federação, compõem os 761 municípios da Amazônia Legal; e também porque foram encontradas duas ONGs filiadas, que atuam em âmbito estadual.

Para complementar as informações que não estavam disponíveis nesse cadastro, adicionalmente foram realizadas pesquisas em sites específicos das organizações. Um dos elementos que limitou o levantamento foi à falta de informações atualizadas, seja no cadastro definido pela ABONG ou nos sites das entidades pesquisadas.

É importante destacar que as organizações filiadas a ABONG não abarcam a totalidade de instituições que atuam no Terceiro Setor na Amazônia Legal brasileira. Contudo, não há ainda no país, outra fonte de informação ou cadastro nacional atualizado e acessível através de sistemas on-line, que nos permita com agilidade, mapear esse universo.

No intuito de ampliar a identificação das ONGs na Amazônia Legal, também pesquisamos no mesmo período, as instituições registradas no portal dos convênios (SICONV)2, recentemente implantado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Contudo, a transferência de recursos para as denominadas "entidades privadas sem fins lucrativos" para execução de programas governamentais, não está disponibilizada, segundo unidade federada e tipo de instituição, inviabilizando o levantamento dos dados por meio dessa plataforma. O sistema também não informa o detalhamento técnico dos projetos, atividades e serviços conveniados. Considerando esses pontos, optamos como fonte privilegiada para o levantamento de dados secundários, sobre as instituições do Terceiro Setor na região, a base de dados da ABONG.

A ABONG é uma organização reconhecida e legitimada entre os seus pares e entre os órgãos governamentais de vários setores e esferas públicas. A Associação utiliza os seguintes critérios para filiação das suas instituições:

a) possuir CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), personalidade jurídica própria como associação civil sem fins lucrativos ou fundação;

b) ter autonomia frente ao Estado, às igrejas, aos partidos políticos e aos movimentos sociais;

c) manter compromisso com a constituição de uma sociedade democrática e participativa, incluindo o respeito à diversidade e ao pluralismo; o fortalecimento dos movimentos sociais de caráter democrático; a ampliação do campo da cidadania, a constituição e expansão dos direitos fundamentais e da justiça;

d) entidades que tenham caráter público em relação aos seus objetivos e ações;

e) ter pelo menos dois anos de experiência comprovada.

Além desses critérios, o Conselho Diretor da ABONG, órgão responsável pela avaliação da filiação das entidades, exige como pré-requisito para habilitação, que as ONGs interessadas em compor o seu quadro, apresentem cartas de indicação de outras duas instituições já filiadas à Associação.

Para organizar e analisar as informações coletadas foi desenvolvido um banco de dados em Excel. As instituições foram categorizadas quanto à unidade federada do país na região da Amazônia Legal; ano de fundação; razão social no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ); missão; área de atuação; faixa orçamentária em reais; fontes de recursos; participação em conselhos e fóruns; âmbito de atuação nas três esferas governamentais; existência e número de voluntários.

Optamos pela identificação e análise desse conjunto de variáveis, porque foram os itens que apresentaram o maior número de informações preenchidas pelas ONGs no cadastro da ABONG. O detalhamento técnico de cada projeto desenvolvido pelas ONGs, quanto aos seus objetivos, metodologias, resultados, parcerias, orçamentos e fontes de recursos, não foram considerados na presente análise, uma vez que o item "principais projetos" não foi informado pela grande maioria das ONGs, apesar de constar da plataforma eletrônica. Essa limitação não nos permitiu uma análise mais detalhada sobre as ações implementadas por essas instituições. Essas informações também foram investigadas no site de cada entidade informado pela ABONG, e a grande maioria delas na ocasião da coleta dos dados, não disponibilizou informações sistematizadas sobre os projetos.

Posteriormente, as instituições foram agrupadas em duas tipologias: "ONGs responsáveis por redes que congregam outras entidades" e "ONGs que não atuam prioritariamente em redes". Nas tipologias, procuramos identificar e analisar as entidades do setor saúde, como um estudo de caso, investigando a especificidade das instituições e suas áreas de atuação, frente o quadro sanitário da Amazônia Legal brasileira.

 

Resultados

O mapeamento resultou na identificação de 48 instituições, sendo que 11 ONGs foram categorizadas como instituições responsáveis por redes que congregam outras ONGs e 37 instituições que não atuam prioritariamente em redes. Para desenvolver essa tipologia foram consideradas as informações declaradas pelas instituições, quanto à sua missão e área de atuação.

No âmbito do Terceiro Setor na Amazônia Legal, as organizações responsáveis por redes, geralmente caracterizam-se pela articulação política e pela organização de fóruns que ocorrem com alguma periodicidade, visando à sustentabilidade e o fortalecimento técnico e político de outras entidades. A nucleação dessas redes se dá em torno de temas comuns, vinculando ONGs que atuam em uma determinada frente de trabalho e/ou por localização geográfica, geralmente estadual ou ainda por região (Amazônia Oriental e Ocidental).

O número de organizações congregadas por essas ONGs apresentou uma grande variação. O menor número informado foi de 39 ONGs, na Associação de Organizações de Mulheres Trabalhadoras do Baixo Amazonas (PA) e o maior foi verificado no Grupo de Trabalho Amazônico, sem unidade da federação declarada, que atingiu um total de 513 organizações.

A maioria das instituições que atuam em rede está sediada no Pará (6), seguida do Acre (2) e São Paulo (1). Dentre essas ONGs, uma entidade é vinculada a Universidade Federal do Pará (Núcleo de Altos Estudos Amazônicos), tendo sido o único caso, dessa natureza, constatado no conjunto das entidades investigadas.

As informações sobre o âmbito de atuação, as fontes de recursos, a faixa orçamentária anual e a participação em conselhos e outros fóruns, não foram informadas pela maioria dessas instituições nos sites pesquisados, dificultando o aprofundamento da análise dessas variáveis.

As principais áreas de atuação referidas por essas ONGs foram: o desenvolvimento sustentável; a geração de renda; a formação de pesquisadores e docentes; a saúde; as relações de gênero e o combate a discriminação sexual. Destacam-se as ações voltadas para os segmentos das mulheres e dos povos indígenas.

Quanto ao campo da Saúde Coletiva, aferiu-se que apenas três ONGs (27%) atuam na região, prioritariamente articulando outras entidades nas áreas de gênero, prevenção e combate à discriminação sexual, mobilização de parteiras tradicionais e políticas para ampliação do acesso aos serviços de saúde. Duas entidades localizam-se no Acre – Mulheres da Amazônia Legal em Movimento e Rede Acreana de Mulheres e Homens, essa última, com inserção no Conselho Estadual de Saúde e Conselho Estadual de Direitos das Mulheres; e uma no Pará – Centro de Estudos Avançados e Promoção Social e Ambiental.

Quanto as ONGs que não atuam prioritariamente em redes, constituem a maioria do universo investigado, onde foram identificadas 37 organizações sediadas em oito unidades federadas: Acre, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Tocantins, Goiás e São Paulo. O conjunto dessas instituições pertence a 66% dos estados da Amazônia Legal brasileira. A maior presença de ONGs está concentrada no Pará, onde foram encontradas 13 entidades, seguido por Mato Grosso (7), Maranhão (7) e Tocantins, com 5 organizações. Também foram registradas: uma organização sediada nos estados do Acre e Amapá, duas em Goiás e uma em São Paulo.

Ao todo 22 entidades referiram o ano de sua fundação. A ONG mais antiga foi fundada em 1967 no Pará (Movimento de Promoção da Mulher) e a mais recente em 1997 no Mato Grosso (Associação Brasileira de Homeopatia). A maioria das entidades (12) foi constituída na década de 90; cinco na década de 80; quatro na década de 70; e uma nos anos 60.

Quanto à faixa orçamentária anual em reais movimentada pelas organizações, no ano base de 2007, variou de menos de R$ 50.000,00/ano até mais de R$ 11.631.000,00/ano, sendo que 23 entidades disponibilizaram essa informação no cadastro da ABONG e 14 não o fizeram.

Dentre as que disponibilizaram essa informação, a maioria (6) movimentou recursos anuais na faixa de R$ 300.001,00 a 600.000,00. Cinco organizações, entre R$ 100.001,00 a R$ 300.000,00; quatro entre R$ 50 a 100 mil; três até R$ 50.000,00; duas entre R$ 600.001,00 a um milhão; e três mais de 1 milhão. As fontes foram variadas envolvendo recursos internacionais, federais, estaduais, municipais e de doações e venda de produtos. Todas as entidades receberam recursos de Agências Internacionais.

Quanto à missão, as organizações autodefiniram-se nas seguintes áreas: Desenvolvimento Sustentável; Qualidade de Vida; Equidade; Direitos Humanos; Participação; Educação Popular; Cidadania; Geração de Renda e Articulação e Ativismo Social. As áreas de atuação referidas em primeiro lugar por essas instituições foram: Educação (14); Meio Ambiente (4); Organização Popular (3); Saúde (3); e Questões Agrárias (2). Um número significativo de ONGs atua na associação entre Educação e Meio Ambiente e Educação e Saúde.

Todas as ONGs investigadas, participam de conselhos e fóruns representativos. Os mais citados foram àqueles vinculados aos direitos humanos; a defesa da criança e do adolescente; aos direitos das mulheres; dos povos indígenas; à assistência social; ao segmento da rede feminista; ao meio ambiente; à reforma agrária; à violência e ao conselho municipal ou estadual de saúde.

Quanto ao âmbito de atuação, 27 ONGs declararam essa informação. O principal âmbito de atuação foi o estadual (48%), seguido do municipal (22%) e do nacional (18%). Três organizações referiram atuar em âmbito regional.

A referência a voluntários vinculados ao quadro das organizações foi verificada em 46% das instituições. O numero de voluntários variou de dois até 63, com exceção de uma organização que informou possuir 1.200 voluntários (Instituto Sócioambiental).

Nessa tipologia, foram encontradas 9 ONGs (24%), que atuam na área da Saúde Coletiva, localizadas no Mato Grosso (4); Pará (3); Maranhão (1); e Goiás (1). A maioria foi constituída na década de 90 e a mais antiga no ano de 1967. O principal âmbito de atuação nas ONGs da Saúde foi o estadual.

Vinculadas ao segmento da Saúde Coletiva, essas entidades desenvolvem ações voltadas principalmente às relações de gênero; ao combate e prevenção da discriminação sexual; à geração de renda; à educação em saúde; e organização e participação popular.

Todas referem participar de fóruns relacionados à sua área de atuação. Os espaços de participação são focados e direcionados, na maioria das ONGs, especialmente entre aquelas que atuam nas áreas de relações de gênero, discriminação sexual e educação em saúde.

Quanto ao assento em Conselhos de Saúde, apenas três organizações referiram essa prática em colegiados municipais do SUS. Duas ONGs do Mato Grosso – Associação Brasileira de Homeopatia e Grupo de Saúde Popular, e uma do Pará – Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade.

As instituições investigadas movimentaram recursos que variaram de menos de R$ 50.000,00/ano até mais de um milhão/ano. Duas ONGs não informaram a faixa orçamentária. Verificou-se que quatro ONGs movimentaram entre R$ 100.001,00 e R$ 600.000,00/ano. A ONG com maior volume de recursos, foi a Organização Amazônia Nativa, que atua junto aos povos indígenas no Mato Grosso. As entidades que possuem os maiores orçamentos anuais são aquelas têm mais de 20 anos de existência. Seis organizações receberam recursos de fontes internacionais e cinco diversificaram as suas fontes de captação de recursos.

Quanto ao trabalho voluntário, apenas seis instituições relataram possuí-lo em seu quadro. O número de voluntários variou de 4 a 63.

Nas duas tipologias, não foram identificadas a presença de ONGs em três estados da Amazônia Legal: Amazonas, Rondônia, Roraima. É importante destacar que as unidades da federação, externas a essa região, foram São Paulo e Goiás. Em São Paulo, está sediada uma importante instituição que atua junto aos povos indígenas, denominada ISA – Instituto Sócioambiental e o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. Em Goiás, foram consideradas as ONGs: Grupo Transas do Corpo, que desenvolve trabalhos nas áreas de Educação e Saúde, articuladas ao movimento feminista; e o Instituto Brasil Central, na área de Meio Ambiente. Ambas são organizações que foram fundadas na década de 1980.

 

Discussão

A caracterização das ONGs que atuam na Amazônia Legal brasileira, indicou que sua inserção no Terceiro Setor é bastante ampla, assim como foi problematizado por Nerfin (1988). Ao analisarmos as informações levantadas para caracterização dessas entidades, constatamos que as mesmas têm apresentado uma complexidade crescente nas últimas décadas, especialmente durante os anos 90, época em que verificamos não só o aumento no número de organizações na região e no país, mas também uma acentuada diversificação nas áreas de atuação.

O incremento das atividades dessas entidades, pode ser atribuído também à incorporação em suas agendas de trabalho de questões relacionadas à geração de renda associada ao desenvolvimento sustentável da região da Amazônia, e à defesa e promoção de direitos, especialmente entre mulheres de baixa renda e povos indígenas.

Esses temas refletem, em grande parte, prioridades elencadas nas políticas públicas pelo governo federal, sobretudo nas áreas de Desenvolvimento Social, Meio Ambiente e Saúde, operando como instrumento de pressão para sua incorporação nas agendas estaduais e municipais. Os convênios firmados entre a União e os Estados e Municípios na Amazônia, muitas vezes, transferem recursos financeiros ‘engessados' em rubricas definidas assimetricamente pelos Ministérios, além de investimentos tímidos para serem aplicados na formação e no fortalecimento técnico e político dos gestores e gerentes, responsáveis pela sua execução.

Destaca-se, também, a indução realizada por programas e projetos governamentais em vários setores e esferas, cuja execução foi fortemente transferida para as ONGs a partir da década de 90. Na mesma linha, também há uma indução importante das agências internacionais, que aparecem como uma das principais fontes de recursos das organizações mais estruturadas na região.

Na Amazônia Legal, essas agências financiam projetos, principalmente voltados para as áreas da Saúde e do Meio Ambiente. Elas atuam em consonância com as diretrizes econômicas do Banco Mundial, baseadas na política de ajuste estrutural, fomentando e intensificando o repasse de recursos diretamente para ONGs ou para ações em parceria com o poder público, atrelando sua execução às organizações do Terceiro Setor, o que também contribui para sua expansão. Nesse cenário, podem ser inseridas as ONGs que não atuam prioritariamente em redes e estão vinculadas a esses setores, pois todas recebem recursos internacionais.

Ao analisarmos a redação da missão, verificamos a intencionalidade pretendida por essas organizações, e constatamos que a maioria delas, expressa valores como solidariedade, justiça social, equidade e proteção ou promoção de direitos humanos, aproximando-as da definição de economia solidária, discutida anteriormente por Serva (1997). Contudo, ao investigarmos a área de atuação, que nos permitiu um maior detalhamento das ações e dos segmentos priorizados pelas ONGs, podemos inferir que as mesmas podem ser caracterizadas como pertencentes tanto a economia social, dado o número expressivo de instituições responsáveis pela implementação de cooperativas para geração de renda, quanto à chamada economia solidária.

A parceria do poder público com a sociedade civil, por meio das ONGs na região da Amazônia Legal é um fenômeno crescente e de grande relevância para o desenvolvimento das políticas públicas. Entretanto, apesar da implementação de ações conjuntas envolvendo as três esferas governamentais e as ONGs, a participação dessas entidades tem sido efetivada principalmente na fase de execução das ações, sendo pouco referida durante o processo de formulação das políticas públicas.

Por outro lado, esse fato também está condicionado pela capacidade técnica e política da ONG em exercer pressão sobre o Estado na sua área de atuação. As instituições mais estruturadas, tendem a ser mais seletivas e pragmáticas no momento das parcerias, utilizando-se inclusive, de estratégias de advocacy para influenciar as prioridades e o desenho das políticas públicas em um determinado setor governamental. É possível que essa situação seja muito freqüente na Amazônia Legal, pois a maioria das ONGs possui fontes de recursos diversificadas e o financiamento do Estado acaba assumindo um caráter complementar.

A consolidação dessas parcerias ainda representa um grande desafio tanto para os gestores governamentais, quanto para os profissionais e militantes das ONGs, e tem sido objeto de tensão na relação entre esses atores, nos diferentes estados da Amazônia. Esse fato também é agravado pela incipiente experiência acumulada dos atores no exercício da participação conjunta, seja no momento da definição ou do monitoramento e avaliação das políticas públicas nos espaços de pactuação.

Quanto ao poder de pressão das ONGs que atuam em rede na Amazônia, a grande variação no número de instituições congregadas, evidencia que as redes encontram-se em diferentes estágios de estruturação e articulação política na relação com o poder público.

Outro fato relevante que contribui para esse quadro é a falta de transparência na gestão dos processos decisórios, envolvendo diferentes setores governamentais, especialmente na Saúde, na Educação e no Meio Ambiente, e sua relação com as entidades sociais. A questão da transparência no âmbito da administração pública brasileira ainda é marcada por práticas que reproduzem o clientelismo, a troca de favores e o patrimonialismo. Esses elementos, ainda precisam ser superados na relação entre o Estado e as instituições parceiras, pois muitas vezes, influenciam e até em alguns casos, direcionam a forma como as ONGs acessam e utilizam os recursos destinados à implementação das políticas públicas.

Nos últimos anos, temos acompanhado, principalmente pela imprensa, um número crescente de denuncias de entidades e órgãos governamentais na região da Amazônia Legal brasileira, que desviam recursos ou os utilizam de forma indevida, muitas vezes em torno de interesses privados. Nessa ótica, a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Anões do Orçamento, na década de 90, apurou que parlamentares fizeram emendas orçamentárias para ONGs que atuavam em seus estados de origem e eram dirigidas por seus familiares, transformando, em última instância, projetos destinados às populações socialmente excluídas em instrumentos de captação de votos. Em 2001, o Senado Federal, instalou outra CPI que não conseguiu avançar devido à falta de um cadastro nacional de instituições que permitisse aprofundar o levantamento das informações necessárias para sua condução. Contudo, essa CPI também apontou a fragilidade do poder público na Amazônia Legal para desempenhar funções de fiscalização e controle público das ONGs na região, recomendando a instituição de um cadastro nacional unificado para maior conhecimento da atuação do Terceiro Setor brasileiro.

Vale destacar, que é preciso fortalecer a atuação dos órgãos de defensoria pública, como o Ministério Público, os Tribunais de Contas da União e dos Estados, as Ouvidorias, e demais fóruns e colegiados do Executivo, assim como os conselhos setoriais, que atuando sinergicamente, constituem-se como instrumentos essenciais para o avanço da fiscalização, da apuração de denuncias e punição de instituições responsáveis pela malversação dos recursos públicos, contribuindo para o avanço do controle público no país.

O portal dos convênios, implantado recentemente pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, pode ser um primeiro passo para a transparência no repasse de recursos públicos da União para Estados, Municípios e ONGs, mas ainda precisa ser aperfeiçoada para se tornar uma ferramenta útil aos gestores públicos. No caso das ONGs, além da falta de um cadastro unificado e de fácil acesso, constatamos que ainda não há uma plataforma eletrônica, que disponibilize informações mais detalhadas sobre os projetos financiados com recursos nacionais e internacionais.

Essas informações são fundamentais para a gestão das políticas públicas, especialmente no tocante ao monitoramento, a avaliação dos resultados e a prestação de contas para o poder público e para a sociedade como um todo, o que nos permitiria conhecer o real perfil das entidades do Terceiro Setor no país. Nessa perspectiva, concordamos com Neto (2007: 34) ao propor a "adoção de um bom sistema classificatório, padronizado e regulamentado para utilização em todos os órgãos públicos, de todos os níveis de governo, [...] facilitando sobremaneira os procedimentos legais em relação às ONG e à atuação da administração pública".

Considerando-se que as atividades das ONGs são de interesse público e que elas também acessam recursos dos contribuintes, por meio do Estado ou por doações de pessoas físicas, a declaração da movimentação financeira anual dessas entidades, deveria ser publicizada pela Receita Federal, pois os próprios órgãos públicos e os cidadãos não têm acesso a essas informações.

Nos Estados Unidos, onde o Terceiro Setor está consolidado, esse controle é realizado pela Receita Federal, que também assume a função de avaliar o desempenho das instituições no cumprimento de metas, por meio de relatórios técnicos detalhados e disponibilizados para consulta pública. Um mecanismo semelhante poderia ser adaptado à realidade brasileira, o que também poderia contribuir para a implementação da "Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro – ENCCLA 2007"3, sob coordenação do Poder Executivo, que pretende integrar as informações de bancos de dados fragmentados sobre o Terceiro Setor; e disciplinar o repasse, controle e avaliação de resultados dos recursos públicos transferidos para esse Setor.

Outro mecanismo importante, implementado com sucesso em órgãos vinculados ao Executivo na área da saúde, é o acesso das ONGs aos recursos públicos, por meio de editais de seleção e concorrência pública de projetos, avaliados por pareceristas e comitês assessores externos às instituições governamentais. Nesses editais são previstas e definidas regras para o monitoramento e avaliação dos projetos executados, sob a responsabilidade dos gestores públicos, bem como a prestação de contas, não apenas financeira, mas dos resultados e metas previstos e alcançados pelas entidades executoras.

O Ministério da Saúde, por meio do Programa Nacional DST/Aids em parceria com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, têm intensificado essa prática, investindo desde o ano 2000 na descentralização e fortalecimento do papel dos gestores na regulação e fiscalização dos recursos públicos transferidos às ONGs, com acompanhamento e aprovação dos conselheiros de saúde. Contudo, ainda há desigualdades a serem enfrentadas nas diferentes regiões do país, na assunção desses papéis pelos gestores e particularmente entre os Estados e Municípios da Amazônia Legal.

Entretanto, não basta apenas criar e aperfeiçoar os mecanismos e instrumentos existentes, sem a assunção do papel controlador e regulador pelos entes federados, que devem se responsabilizar por uma gestão solidária e democrática das políticas públicas, o que ainda é um grande desafio para a governança e para o aprimoramento da interlocução com as ONGs na Amazônia em vários setores.

Também é necessário fortalecer os diferentes conselhos existentes na região, pois enquanto órgãos colegiados que agregam a representação tanto do poder público, quanto da sociedade civil, os mesmos podem e devem atuar consistentemente na discussão, proposição e fiscalização das políticas públicas, aperfeiçoando o processo da gestão democrática.

Algumas experiências êxitosas em municípios brasileiros indicam que o funcionamento adequado dos conselhos, pode contribuir para a transparência da gestão e dificultar o uso indevido dos recursos públicos, reduzindo as práticas clientelistas, ainda presentes em nossa realidade.

Da mesma forma, as ONGs que desempenham funções na área da Saúde Coletiva na Amazônia Legal, também enfrentam os impasses e os desafios elencados anteriormente. Entre as instituições que não atuam prioritariamente em redes, ao considerarmos sua missão e a área de atuação, verificamos que sua maior contribuição está relacionada ao desenvolvimento de metodologias, fundamentadas na educação por pares, assim como na implementação de programas e projetos voltados à promoção da saúde, em consonância com as diretrizes do SUS.

Nessa ótica, a educação por pares é uma metodologia altamente relevante, pois valoriza o protagonismo de indivíduos que possuem atitudes e comportamentos comuns, frente aos diferentes problemas de saúde. Na região, as ONGs têm adotado essa estratégia para enfrentar contextos de vulnerabilidade, associados às questões de gênero, discriminação sexual e DST/Aids. Projetos voltados à educação em saúde e a participação popular também tem sido implementados, sobretudo a partir da década de 90, período em que houve um incremento na atuação das ONGs que atuam no setor Saúde na Amazônia.

Essas ações são fundamentais para o avanço das políticas intersetoriais no âmbito local do SUS, pois na região, a rede de atenção básica, que deve ser responsável pela resolução da maior parte dos problemas de saúde da população, ainda não está suficientemente estruturada nos Municípios, ou faltam recursos humanos preparados para desempenhar ações de promoção à saúde.

As parcerias entre o poder público estadual e municipal e as ONGs que atuam com as temáticas destacadas anteriormente, pode ser uma estratégia factível para a redução das iniqüidades no quadro sanitário da Amazônia Legal brasileira, ampliando a cobertura das ações de prevenção primária e secundária. Para tanto, ainda é preciso investir, do ponto de vista da gestão em saúde, no fortalecimento e ampliação do número de equipes do Programa Saúde da Família, consolidando políticas e ações descentralizadas que são preconizadas pelo Ministério da Saúde na região. Também se faz necessário aprimorar a interlocução do poder público com essas ONGs, potencializando os recursos transferidos e o papel regulatório dos entes federados.

Para a implementação de políticas intersetoriais na região, a articulação dos setores da Saúde, Educação, Desenvolvimento Social e Meio Ambiente são fundamentais. A gestão intersetorial ainda é um desafio para o avanço das políticas públicas, não só na Amazônia Legal, mas também em outras regiões brasileiras. É preciso que os gestores atentem para o fato de que essa prática gera uma maior complexidade na condução das políticas, exigindo processos decisórios mais compartilhados e negociados, entre os gestores e desses com as entidades do Terceiro Setor.

Do ponto de vista da sustentabilidade técnica e financeira, contatamos que houve avanços, entre as ONGs da área da saúde, que possuem uma longa trajetória na região, superior a 20 anos de existência. Essas instituições têm como público prioritário, o segmento de crianças, adolescentes e jovens, onde há uma grande preocupação com a prevenção das DST/Aids e da gravidez não programada; ou atuam na formação de novas lideranças vinculadas ao movimento feminista; ou ainda apoiando povos indígenas em ações de educação em saúde.

É possível inferir que essas organizações, captam um volume maior de recursos financeiros, por terem investido na valorização da competência técnica dos seus quadros profissionais, associada à profissionalização da militância. O segmento dos povos indígenas movimenta o maior volume de recursos aferido entre as ONGs do setor Saúde, sendo utilizados na administração dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas, através de transferências da Fundação Nacional de Saúde, bem como pela captação de recursos estrangeiros, dada a priorização desse público pelas agências internacionais.

Esses elementos têm sido observados na atuação de várias ONGs da região, principalmente nos setores da Saúde e do Meio Ambiente, a partir da década de 90, provavelmente resultado da indução das exigências dos órgãos financiadores – Ministérios e Secretárias Estaduais e Municipais e agências internacionais. Vale salientar, que esse perfil institucional também contribui para uma maior autonomia frente aos recursos públicos e para diversificação das fontes de captação.

A participação em Conselhos de Saúde, ainda é pequena, tendo sido indicada, apenas por três instituições sediadas nos estados de Mato Grosso e Pará. Contudo, todas as ONGs que atuam na área da Saúde, participam de fóruns e redes em sua área de atuação específica, sendo essa a principal estratégia utilizada para fortalecer a legitimidade e a transparência, essenciais para sustentabilidade política dessas entidades.

A participação em fóruns promovidos por instituições governamentais, também é um meio de interlocução e vinculação dessas organizações com o poder público, em uma região, onde os governos estaduais e municipais, na área da saúde, ainda apresentam uma baixa institucionalidade na oferta de serviços de promoção e prevenção para população, optando cada vez mais, pela transferência dessas funções para as entidades do Terceiro Setor.

Assim, reforçamos a constatação de que, quanto mais forte for o Estado na Amazônia Legal no setor Saúde e sua interface com os demais setores públicos, maior será o potencial sinérgico de atuação junto ao Terceiro Setor para a implementação e consolidação das políticas públicas de saúde.

Sublinhamos, que o modo de inserção e participação das ONGs nas políticas públicas implementadas na Amazônia Legal, associada ao perfil de profissionalização da militância, comentado anteriormente, também contribuem para despolitização das entidades e dos movimentos populares de saúde na região. O presente estudo, em função do desenho metodológico que privilegiou a análise de dados secundários, não investigou essa questão, mas recomendase a realização de outros estudos de caso para compreender a percepção da rede de atores governamentais e não governamentais, o que poderá contribuir para o campo da Psicologia Política.

 

Considerações Finais

Na Amazônia Legal brasileira, a articulação entre o Estado e o Terceiro Setor é um fato relevante, evidenciando uma relação que deve ser aprimorada para promover o fortalecimento das políticas públicas em diversos setores. No caso da Saúde, onde predominam políticas de caráter regulatório e constituinte, a atuação dos gestores está direcionada para programas específicos, como é o caso do Programa Saúde da Família. Contudo, ainda é preciso investir em várias frentes de trabalho, abarcando diferentes complexidades, para que se possam assegurar os princípios da universalidade, integralidade e equidade preconizados pelo Sistema Único de Saúde.

Para tanto, é preciso melhorar a capacidade de resposta institucional dos gestores estaduais e municipais no desenvolvimento de políticas públicas regionalizadas e intersetoriais fundamentadas nos pilares da sustentabilidade. Da mesma forma, as funções gestoras de regulação e fiscalização das ONGs parceiras e prestadoras de serviços devem ser aperfeiçoadas na região.

O Terceiro Setor também deve aumentar sua visibilidade na Amazônia Legal. A precariedade das informações disponíveis nas poucas bases de dados existentes e a baixa qualidade dos dados secundários, aliada a heterogeneidade das instituições, ainda dificulta o aprofundamento das análises desse setor e sua relação com o Estado ou com as agências internacionais.

Considerando-se a potencialidade dessas análises, ainda pouco exploradas, recomenda-se a realização de estudos de caso para qualificar a apreensão das interfaces entre esses setores e sua repercussão no campo das políticas públicas, especialmente na área da Saúde Coletiva. Adicionalmente, recomenda-se o aprimoramento e detalhamento técnico do cadastro nacional de ONGs, como uma ferramenta útil aos gestores e aos pesquisadores que atuam nessa área.

 

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Endereço para correspondência
Renato Barboza
E-mail: renato@isaude.sp.gov.br

Tarsio Vinicius Lopes
E-mail: trsk8vin@hotmail.com

Recebido em: 23/12/2008
Revisado em: 11/05/2009
Aceito em: 08/06/2009

 

 

* Cientista Social, Mestre em Saúde Coletiva, Pesquisador Científico III do Instituto de Saúde – SES/SP – Brasil.
** Graduando em Cîências Sociais pela Universidade de São Paulo, estagiário do Instituto de Saúde – SES/SP – Brasil.
1 Disponível em www.abong.org.br.
2 Disponível em www.convenios.gov.br/sincov.
3 Disponível em www.mj.gov.br/drci/.