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Revista Psicologia Política

versão impressa ISSN 1519-549X

Rev. psicol. polít. vol.14 no.31 São Paulo dez. 2014

 

ARTIGOS

 

Memória e esquecimento: pacto denegativo e contrato narcísico guerrilheiro

 

Memory and forgetfulness: negative pact and guerrilla narcissistic contract

 

Memoria y olvido: pacto denegativo y contracto narcisista guerrillero

 

Mémoire et oubli: pacte dénégatif et contrat narcissique guérrillero

 

 

Domênico Uhng Hur

Psicólogo, mestre e doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo. Participa do Núcleo de Estudos e Pesquisas Crítica, Insurgência, Subjetividade e Emancipação (CRISE). Professor da graduação e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Goiás, Goiânia, GO, Brasil. Hurdutchwild@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

Este artigo pretende discutir os conflitos da memória sobre o período da ditadura militar a partir da construção da figura de traidor da Revolução sobre o ex-guerrilheiro Celso Lungaretti. Debatemos as versões da memória legitimadas sobre a guerrilha com a sua, que são radicalmente diferentes. Utilizamos a apropriação que o psicanalista Kaës faz do conceito de memória coletiva de Halbwachs. Realizamos uma revisão da literatura sobre os trabalhos que versam sobre esse acontecimento e uma entrevista com Lungaretti. Consideramos que a memória coletiva construída sustenta um pacto denegativo e um contrato narcísico, ao encobrir as lembranças traumáticas e constituir um mito fundador comum. De um lado, guerrilheiros heroicos que lutaram bravamente contra a ditadura e de outro, traidores que receberam toda a carga negativa pelo fracasso do projeto da guerrilha, construindo-se assim a figura de bode-expiatório. Apoio: CNPq e CAPES.

Palavras-chave: Ditadura Militar, Psicanálise, Guerrilha, Memória, Psicologia Política.


ABSTRACT

This article intends to discuss the memory's conflicts over the period of the military dictatorship from the construction of the character of Revolution's traitor on the former-guerrilla fighter Celso Lungaretti. We debated the instituted version of guerrilla's memory with his version, which are radically different, through the concept of collective memory, appropriated by the psychoanalyst Kaës. The method was developed through bibliographical review about this event and an interview with Lungaretti. We noted that the constructed collective memory supports a negative pact and a narcissistic contract, covering the traumatic memories and constituting a common founding myth. On the one hand, heroic guerrilla-fighters who struggled bravely against the dictatorship, on the other, traitors who received the negative attributions for the failure of guerrilla's project, becoming themselves the scapegoat. Support: CNPq and CAPES.

Keywords: Military Dictatorship, Psychoanalysis, Guerrilla, Memory, Political Psychology.


RESUMEN

Este artículo discute los conflictos de la memoria sobre el período de la dictadura militar desde la construcción de la figura del traidor de la Revolución sobre el exguerrillero Celso Lungaretti. Discutimos las versiones de la memoria legitimadas sobre la guerrilla con la suya, que son radicalmente distintas. Utilizamos la apropiación que el psicoanalista Kaës hace del concepto de memoria colectiva de Halbwachs. Realizamos una revisión bibliográfica sobre los trabajos que discuten este acontecimiento y una entrevista con Lungaretti. Consideramos que la memoria colectiva construida sustenta un pacto denegativo y un contracto narcisista, al encubrir las recordaciones traumáticas y constituir un mito fundador común. De un lado, heroicos guerrilleros que lucharon bravamente contra da dictadura, y de otro, traidores que recibieron todos los atributos negativos por el fracaso del proyecto de la guerrilla, construyéndose así la figura de chivo expiatorio. Apoyo: CNPq y CAPES.

Palabras clave: Dictadura Militar, Psicoanálisis, Guerrilla, Memoria, Psicología Política.


RÉSUMÉ

L'objectif de cette étude est de discuter les conflits de mémoire sur la période de la dictature militaire à partir de la construction de la figure de traître de la révolution sur l'ancien guérillero Celso Lungaretti. Nous avons débattu deux versions de mémoire légitimées sur la guérilla, qui sont radicalement différentes, à partir de l'appropriation du psychanalyste Kaës sur le concept de mémoire collective de Halbwachs. Nous avons effectué une revue de la littérature sur les travaux relatifs à cet événement et un entretien avec Lungaretti. Nous considérons que la mémoire collective soutient un pacte dénégatif et un contrat narcissique, pour couvrir les souvenirs traumatiques et de construire un mythe fondateur commun. D'une côté, les guérilleros héroiques qui ont cambattu bravement contre la dictature et, d'une autre côté, traîtres qui ont reçu toute la charge négative pour l'échec du project de la guérilla, construisant ainsi une image d'un bouc émissaire. Soutien : CNPq et CAPES.

Mots clés: Dictature Militaire, Psychanalyse, Guérrilla, Mémoire, Psychologie Politique.


 

 

Introdução

A memória não apresenta uma fixidez estática. Deleuze (1999), Vázquez (2001) e Ansara (2008) nos ensinam como é dotada de plasticidade e fluidez, num perpétuo movimento. A memória está no campo da construção e não da mera reconstituição de fatos passados e acabados. A construção do passado configura-se em diversas versões, que trazem um conflito de memórias (Dobles, 2009). Neste campo, encontram-se distintos discursos sobre o que se passou no período da ditadura civil-militar brasileira. Martins Filho (2003) e Gaspari (2002) fazem uma divisão em dois grupos. O primeiro é o dos militares, que defendem, justificam e encobrem a violência exercida pelo Estado como forma de defender a nação contra o "terrorismo" da esquerda. Personagem exemplar é o Cel. Ustra, ex-comandante do Doi-Codi, que publicou dois livros (Ustra, 2003; 2006) em que justifica seus atos opressivos contra a tentativa de tomada de poder pelas organizações de esquerda. O segundo é o de exguerrilheiros, e simpatizantes, que, de modo geral, tratam de denunciar a intensa violência do Estado e as sevícias sofridas nas sessões de tortura, expressar os ideais revolucionários e fazer uma autoanálise crítica do que se viveu. Há centenas de obras publicadas desde o fim da década de 1970, autobiográficas, não ficcionais ou romanceadas.

Mas será que os diversos livros de ex-guerrilheiros trazem o mesmo discurso, a mesma versão dos fatos? A partir de revisão da literatura constata-se que há diferenças nas memórias dos ex-participantes da guerrilha. O fato de eles terem lutado contra a ditadura não significa que haja uma homogeneidade em seus discursos e práticas. Havia distintas concepções políticas e estratégias de ação que fizeram com que a guerrilha no Brasil se dividisse em dezenas de organizações. E na reconstrução do passado dos ex-guerrilheiros há diferentes versões dos fatos, por exemplo, o debate entre Betto (1982) e Gorender (1998) sobre o assassinato do líder da Ação Libertadora Nacional - ALN - Carlos Marighella traz duas versões bastante díspares.

Neste artigo busca-se discutir outro caso emblemático da guerrilha brasileira: a construção da figura de traidor da Revolução sobre Celso Lungaretti, ex-guerrilheiro da Vanguarda Popular Revolucionária - VPR. Com o intuito de fazer uma discussão acerca dos conflitos da memória, são debatidas as versões que o colocam neste lugar com a sua própria, pois divergem radicalmente. Para tal reflexão, utiliza-se a apropriação que o psicanalista René Kaës (2006) faz do clássico conceito de memória coletiva de Halbwachs (2004).

Este é um caso emblemático, pois Lungaretti ficou conhecido por ser um dos guerrilheiros "arrependidos". Sob tortura foi forçado pelos órgãos de repressão a aparecer na televisão em rede nacional, no ano de 1970, renegando o projeto da guerrilha armada. Antes disso, seus excompanheiros de guerrilha atribuíram a ele a delação do campo de treinamento da VPR no Vale do Ribeira/SP e de muitos outros militantes. Devido a tais fatos foi abandonado pelas organizações de esquerda. Nas diversas publicações e na versão hegemônica das histórias da guerrilha, Celso foi colocado como um dos traidores da Revolução. Apenas três décadas depois é que expressou publicamente sua versão dos fatos. Publicou o livro "Náufrago da Utopia" (Lungaretti, 2005) e passou a ter participação mais ativa nos debates acerca das memórias da ditadura, no intento de desconstruir seu estereótipo de traidor. Desde então, criou blogs na internet, dá palestras e milita por questões políticas do cenário cotidiano, por exemplo, teve grande participação no movimento pela não extradição do italiano e exmilitante dos Proletários Armados pelo Comunismo - PAC - Cesare Battisti.

Para a investigação realizou-se revisão bibliográfica sobre obras publicadas acerca desse acontecimento e uma entrevista semi-diretiva (Creswell, 2003) com o próprio Lungaretti (2008). Foi solicitado que nos contasse sua experiência na guerrilha. Das obras publicadas que se referem ao tema, sua quase totalidade corresponde a livros. Ressalta-se que não se pretende advogar para nenhum dos lados, trazer um veredito final, ou construir uma versão da verdade. A partir de nosso papel enquanto pesquisador que não experienciou diretamente os conflitos da ditadura, propõe-se trazer à tona o dissenso existente na literatura para refletir o que ele pode enunciar sobre as tramas da memória.

Inicia-se o artigo com uma discussão sobre memória e intersubjetividade, de como se constitui num fundo de coletividade. Em seguida são debatidos os discursos dos distintos atores sociais que explicitam as divergências das interpretações sobre os fatos, utilizando-se também como fonte a entrevista de Lungaretti, cedida para esta pesquisa. Finaliza-se ao analisar os distintos discursos e suas decorrências a partir da perspectiva de memória de Kaës.

 

Memória e intersubjetividade

No senso comum a memória é individual, é interna a uma pessoa, bem como é restitutiva de fatos já acabados, de um passado fechado e delimitado. Entretanto, pensadores das Ciências Humanas trazem concepções que a abordam de outra forma; de individual passa a ser coletiva (Halbwachs, 2004) e de restituição de um fato acabado passa a ser construção (Vázquez, 2001). Halbwachs (2004) considera que a memória se estrutura num fundo de coletividade. Afirma que os indivíduos não perdem o hábito de se lembrar como membros de um grupo, nunca estando isolados. O indivíduo pertence a uma coletividade que é referência para a constituição da memória do conjunto social. A memória é produzida intertranssubjetivamente, a partir de consensos e pactos; nunca é produção somente individual. Assim, a memória construída dos distintos atores sociais parte de consensos e dissensos do que se passou durante o período da ditadura, numa experiência compartilhada, coletiva, mas que pode ter sentidos distintos para cada um que a viveu.

A psicanálise traz alguns aportes para pensar a memória e a coletividade. A memória é um processo psíquico importante, abrangendo temas como a rememoração, esquecimento, repressão, etc. Dentre estes, há trabalhos sobre lembranças traumáticas relacionadas às guerras e à violência de Estado na época das ditaduras latino-americanas e do holocausto, como as obras de Kaës (2006), Riquelme, (1993), Viñar e Viñar (1992), Naffah Neto (1985), Puget (2000) e Nestrovski e Seligmann-Silva (2000). Kaës distingue três tipos de memória que se inter-relacionam: do sujeito em sua singularidade, da espécie (sua herança arcaica) e dos conjuntos transsubjetivos que sustentam a identidade e os vínculos de pertencimento. Para cada uma delas há distinção entre tempo psíquico e tempo histórico, em que "hay a veces conexión, contradicción e incompatibilidad" (2006:174).

Kaës (2006) nos ensina que o aparelho psíquico realiza um trabalho complexo da memória que se distingue em dois tipos: fazer ligação com uma experiência passada, ao desocultar aquilo que estava apagado ou reprimido, e também reprimir e esquecer aquilo que não pode ser suportado. O trabalho da memória não consiste apenas na função da recordação, mas também na de esquecimento. Na produção de esquecimento há um trabalho de repressão coletiva, denominado de pacto denegativo. O pacto é uma aliança inconsciente que atua no laço intersubjetivo com uma função recalcante, que expulsa, reprime, recalca, aquilo que é intolerável para ser suportado e recordado pelo coletivo (Fernandes, 2005). Gera esquecimento e desloca a memória para lembranças encobridoras comuns (Freud, 1899). Os mitos, as ideologias e o passado "vitorioso" de um povo podem ser vistos como lembranças encobridoras comuns de um coletivo e que provém de um pacto denegativo (Kaës, 2005).

Para o processo de rememoração, dispõe-se de duas perspectivas: da interpretação e da construção. A primeira consiste na produção de enunciação, na forma de associação livre, em que se tem que como meta des-cobrir as representações reprimidas. A segunda (Kaës, 1979) enfoca a tarefa de elaborar-criar representantes e experienciações, prover figurações, para uma experiência ainda irrepresentada, numa perspectiva de construção. Freud (1937) instaura esse enfoque ao afirmar que o trabalho psíquico não consiste apenas na rememoração, mas também num processo de construção simbólica. Passa a falar em construção ao invés de interpretação, pois há um movimento construtivo, enunciativo, que vai além das tradicionais interpretações de um material passado. Isso significa trazer à tona, além de aspectos reprimidos, os conteúdos não representados, indiscriminados, e trabalhar sua entrada para o campo dosimbólico. É a possibilidade de um espaço de abertura para a produção de novas associações e afecções. Percebe-se então a distinção entre o irrepresentado, que corresponde à ordem do não inscrito no campo simbólico, para o de recalque, que corresponde à ordem do inscrito, mas suprimido do consciente.

Para abordar os processos de recordação de grupos maiores e do conjunto social, Kaës (2006) traduz a noção de memória coletiva de Halbwachs para a gramática psicanalítica. A memória coletiva é um continente metapsíquico compartilhado de um coletivo que é um depósito dos valores atribuídos à experiência passada, o que reforça assim o vínculo comunal. Mas também é depositária do que é reprimido, do não aceito, pelo conjunto. Ao mesmo tempo provê uma ligação com o passado e sustenta uma repressão do coletivo. Então restitui o que o coletivo deseja ou reprime, funcionando como lembrança encobridora comum, pois oculta representações da experiência deslocando para outras construções mnemônicas. Considera-se assim que os atores sociais estão num campo em que suas memórias são constituídas e se referem à coletividade, havendo processos de construção e rechaço de recordações, em que a memória traz processos de construção, repressão e elaboração.

 

O analisador Lungaretti: a construção do bode expiatório

Lourau (1975) entende que o analisador é um acontecimento que se enuncia por si só, sendo elemento revelador de processos até então encobertos e desconhecidos. Tratamos o caso Celso Lungaretti como um analisador, que serve para debater as distintas versões do passado. Há a versão hegemônica, presente em importantes livros sobre a guerrilha no Brasil, e a minoritária, enunciada por Celso. Ao apresentar e debater os distintos discursos, analisamos o conflito das memórias a partir de hipóteses pautadas em teorização da psicologia social psicanalítica de Kaës (2006). O acontecimento a ser discutido ocorreu no ano de 1970, quando as organizações guerrilheiras sofreram muitas baixas, com elevado número de prisões e assassinatos. Marighella, comandante da ALN, já havia sido assassinado e a VPR sofreu uma cascata de prisões, em que Lungaretti foi preso e o campo de treinamento da VPR no Vale do Ribeira foi descoberto poucos dias depois. Celso era um militante jovem, entrou na guerrilha com apenas dezoito anos de idade. Ele já contava com um "ponto negativo" perante a Organização, por ser afastado do treinamento de guerrilha no campo em Vale do Ribeira.

Tinha estado lá no ano anterior, no primeiro grupo. Como não se adaptara, Lamarca o tinha mandado de volta, com instruções expressas para sair do país. Não podia ficar nas cidades ninguém que conhecesse aquela área de treinamento. Mas Lourenço1 não quis sair e convenceu o comando urbano de que podia assumir um cargo de poucos riscos, o setor de inteligência. Ficaria sem entrar em ações armadas. Assinou um compromisso, de, a nenhum preço, revelar o segredo que conhecia. Dupla imbecilidade da organização! (Sirkis, 1980/2008:267)

Lungaretti (2005:127), ao contrário, afirma que foi sua decisão e de Massafumi Yoshinaga, outro militante da VPR "arrependido", pedirem para sair do campo e voltar à cidade. Mas mesmo assim, atribuiu-se a Celso a culpa de boa parte das quedas, como consta nas citações a seguir. Os fatos citados estão dentro do seguinte contexto. O militante da VPR "Mário Japa", Chizuo Osawa, foi preso e tinha informações importantes sobre a organização e o campo de treinamento do Vale do Ribeira. Foi torturado e não deu informações para os órgãos de repressão. Para que não fosse continuada a tortura, a VPR sequestrou o cônsul japonês Nobuo Okuchi para trocar pela libertação de Mário Japa e de mais quatro companheiros presos. Lograram êxito (Vieira, 2008). Mas num curto período de tempo foram presos muitos militantes da VPR, dentre estes Lungaretti. José e Miranda, na biografia sobre Lamarca, afirmam: "Mário Japa não falou, mas as prisões continuaram; Massafumi Yoshinaga e Celso Lungaretti delatam a área de treinamento" (1980:70). No livro biográfico sobre a psicóloga e guerrilheira da VPR, Iara Iavelberg, Patarra através das suas entrevistas redige: "Pouco depois do sequestro de Okuchi, haviam caído na Guanabara dois militantes da FLN. Nos pontos abertos a polícia prendeu Wellington, Celso Lungaretti e iniciou a nova devastação na VPR. Lungaretti revelou a área de treinamento; em julho iria à tevê renegar a militância" (1993:379). Gorender, ex-militante do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário - PCBR - e escritor de um dos livros históricos mais importantes sobre a luta armada no Brasil, "Combate nas trevas", relata o mesmo: "Em princípios de abril, uma cascata de prisões no Rio envolveu Celso Lungaretti, excluído da escola de Jacupiranga por inadaptação. Por elementar precaução, deveria ter ido para o exterior. Ao invés, permitiram que ficasse no Brasil. Lungaretti forneceu ao Exército a primeira informação precisa sobre o campo de treinamento da VPR" (1998:210-211). Sirkis, em livro vencedor do Prêmio Jabuti, intensifica a crítica, atribuindo a Celso inúmeras delações: "A VPR fora quase totalmente desbaratada. Entre quadros, aliados, simpatizantes, no Rio, São Paulo e no Sul, eram mais de cem. Só o tal de Lourenço, derrubara mais de trinta simpatizantes" (Sirkis, 1980/2008:221). Guarany (1984), em suas memórias, não discorda do refrão: "Celso Lungaretti, um militante da VPR que acabou indo para a televisão (na época uma troca: o cara ia para a tevê sentar o pau no terrorismo e, além de não apanhar mais, era solto pouco depois), assim que foi preso, entregou, na bandeja, grande parte da estrutura da VPR que ele conhecia bem. Assim, além do Vale do Ribeira, Lungaretti entregou o sítio" (p. 18). Os órgãos de repressão, ao descobrirem a localização do campo de treinamento da VPR, cercaram o local enviando milhares de soldados para prender Lamarca e os militantes que ali treinavam. Os guerrilheiros, mesmo padecendo de intensa inferioridade numérica, espetacularmente conseguiram romper o cerco do Exército (José & Miranda, 1980).

Soma-se à culpa das delações e queda da mítica área de treinamento, a aparição de Celso na mídia criticando a guerrilha. A estratégia do governo em forçar jovens guerrilheiros a criticar os projetos da guerrilha na mídia, claramente empregada como aparelho ideológico do Estado (Althusser, 1985), começou com a publicação de matéria publicada no jornal Folha da Tarde no dia 22/05/1970 intitulada "Terrorismo é uma farsa, denunciam jovens presos". Cinco militantes da VPR são coagidos a mostrar seus arrependimentos (Kushnir, 2007). Já Lungaretti apareceu na mídia no mês de julho de 1970. Sob severas torturas, sentiu-se abandonado pela VPR, pois além de não receber assistência da organização, seu nome não foi incluído para ser libertado na troca pelo sequestro do embaixador alemão Von Holleben. Sirkis justifica: "Pedíamos todos os militantes da VPR caídos em abril, menos Lourenço e Januário. Lourenço, porque, além das trinta e tantas quedas que provocara, era quem abrira a escola de treinamento do Vale do Ribeira" (1980/2008:267). A manifestação de Celso na mídia causou repúdio geral na esquerda brasileira, constituindo-se assim sua figura do traidor:

Acusou minorias alucinadas de promoverem uma luta inútil. O objetivo era matar, destruir, envolver o país numa sangrenta guerra civil. Lamarca desejava duelar pessoalmente com Fleury para exibir rapidez no gatilho, citaram os jornais.

- Pô, que baboseira - entristeceu-se Lamarca - Sacanagem, sempre nos demos bem.

A imprensa publicou documentos apreendidos da VPR, o informe de Iara sobre o militante perturbado. E novos trechos da longa denúncia de Lungaretti: esbanjamento de dinheiro, alguns pareciam nababos; Darcy Rodrigues tentara violentar uma companheira; Maria do Carmo tinha ambições desmedidas; Lamarca quis assassinar Marighella e Câmara Ferreira. (Patarra, 1993:397-398)

Boca torta e flácida, dentes de coelho meio retorcidos. Ao falar, juntava uma babinha no canto dos lábios. O cabelo cortado à reco realçava as orelhas de abano. O tom da voz, porém, era duro e empostado. Lourenço repetia a lição diante das câmeras. Crispado de horror, eu assistia, na televisão de um bar de esquina, o ex-companheiro abjurar. Sabíamos que ele tinha aberto tudo o que sabia, provocado dezenas de quedas, inclusive o Vale do Ribeira. Mas uma coisa era o sujeito abrir na tortura, outra era o nível de colaboração que implicava aquele espetáculo degradante.

- Não se pode dizer que os presos à disposição da justiça brasileira estejam sendo submetidos a uma situação carcerária desumana. Chega a ser irônica a afirmação de semelhante disparate, quando nos é permitido possuir os mais sofisticados aparelhos eletrodomésticos, receber visita regular dos familiares. Há mesmo alguns que têm continuado seus estudos na prisão. Um ou outro desentendimento que se tenha verificado entre presos e autoridades carcerárias é mera questão de rotina administrativa, que se dilui no cotidiano. (Sirkis, 1980/2008:295)

O entendimento dos ex-guerrilheiros é que uma coisa era delatar companheiros em momento de extrema tortura, mas outra totalmente distinta era falar na mídia renegando os ideais da luta guerrilheira. Sirkis faz intensa crítica, pois Celso não apenas denunciava as ações da guerrilha, como a reprovava e proferia mentiras sobre as supostas condições dignas que havia na prisão, falsas em relação às sevícias que eram impostas aos presos políticos:

E por aí vai. Passou quase uma hora de horário nobre a jogar merda nos companheiros, cantar loas ao governo Médici e fazer propaganda da colônia de férias do DOI-CODI. Já era o sexto, em menos de um mês. O anterior fora Massafumi. Um militante da organização lá de São Paulo que se queimou, perdeu o contato e pediu ajuda à família para sair do país. O pai fez um trato com os homis e convenceu-o a se entregar. O caso de Lourenço era diferente. Foi muito torturado na PE da Barão de Mesquita, o que era um atenuante. Primeiro fizeram dele o "pele" da prisão, pois se submetia a tudo. Obrigavam a imitar galinha, ele cacarejava; rodava a manivela da máquina de choques elétricos para os outros torturados. E depois passou a um nível de colaboração continuado, já sem coação: ajudava nos interrogatórios, saía de carro com as equipes de busca para tentar localizar algum de nós na rua. Agora estava na televisão. Aquilo era uma diabólica arma de guerra psicológica, pois tinha um poder desmoralizante intenso, além de dar verossimilhança às mentiras veiculadas a nosso respeito. (Sirkis, 1980/2008:296)

A indignação da esquerda política contra o comportamento de Lungaretti foi geral. Sirkis afirma que Celso teve colaboração ativa com a repressão, contribuindo no interrogatório de guerrilheiros, reconhecendo outros na rua e até ajudando na tortura, ao ministrar choques elétricos. No entanto, é propagado que ele mesmo, no passado, era contra dar informações da guerrilha sob momentos de tortura. A ex-militante Maria do Carmo Brito rememora: "Ouvia Celso Lungaretti, também muito jovem, ricto ao defender o fuzilamento de militantes que falassem sob tortura" (Patarra, 1993:369). "Creio que sabiam muito de Lungaretti. Depois, a questão da tortura é única. Ainda hoje há gente torturada por Hitler, em tratamento. A complicação, talvez, esteja no heroísmo. Quem, como Lungaretti, condenava a capitulação paulatina, destruía-se" (Patarra, 1993:380). Do ocorrido, "Lamarca lhe dizia ter mais raiva de Lungaretti, que tinha melhor formação teórica. Massafumi era extremamente individualista, problemático" (José & Miranda, 1980:67). Sirkis coloca Celso como o protótipo do traidor: "Lourenço teve o chamado 'péssimo comportamento'. Entregou tudo o que sabia e colaborou no interrogatório dos outros presos, num nível pior do que a simples quebra momentânea, diante do terror. Passou a colaborar de maneira continuada. Era considerado traidor" (1980/2008:267-268). Sua história poderia ter terminado de forma mais trágica, pois havia guerrilheiros da VPR que clamavam por seu justiçamento, pela sua execução. Houve quatro casos de justiçamento de guerrilheiros no Brasil (Gorender, 1998).

Houve um movimento na VPR a favor de justiçar Massafumi e Lungaretti [...] Lamarca manifestou-se. Descreveu Massafumi um militante omisso e Lungaretti ativo, sem 'vacilação ideológica a não ser desvios de individualismo [...] e falta de cuidado com o patrimônio da Revolução' [...] Terminava afirmando que à repressão interessava o justiçamento pois 'ganha a massa pelo sentimentalismo... O Comando firma posição contrária à eliminação dos dois traidores [...] e assim bloquearemos a jogada'. (Patarra, 1993:398)

Já a história de Massafumi terminou de forma bastante trágica. Não foi justiçado fisicamente por seus companheiros, mas pode-se dizer que foi no nível simbólico e social. Foi excluído e sofreu isolamento político. Recebeu apoio familiar, mas enlouqueceu:

Massafumi não encontra compreensão nem volta a sentir o calor das massas. Ele sai da VPR logo ao retornar da área 1 de Registro, procuradíssimo e sem ter quem o ajude. Passa três meses dormindo nas barracas do Mercado Municipal (SP). Finalmente com os préstimos do Chapita, negocia sua rendição, recebendo a garantia de que não vai ser torturado nem terá de entregar ninguém. Acordo fechado e cumprido por ambas as partes. É logo libertado, mas malvisto nos meios que freqüenta, começa a enlouquecer. Acredita que seus pensamentos estejam sendo captados pelos órgãos de repressão. Busca o litoral porque, estando no nível do mar, suas ondas mentais não se propagarão até o planalto. Suicida-se em junho de 1976, deixando uma carta insana. (Lungaretti, 2005:181)

Ao ser excluído dos círculos da esquerda política e rechaçado por seus ex-companheiros, perde sua estabilidade psíquica. Sofre extrema persecutoriedade em que fantasia ser constantemente vigiado pela ditadura. Ao ser justiçado simbolicamente, prefere assim a morte ao invés da morte em vida. Num momentâneo descuido de um familiar que o observava, aproveitou para se enforcar com a mangueira do chuveiro. A personagem de traidor da guerrilha encaixou de maneira fácil nos atos cometidos por Celso e Massafumi. Na literatura encontram-se passagens em que são criticadas não apenas as condutas políticas de Lungaretti, como também suas características físicas (Sirkis, 1980/2008:197), sendo por isso até alvo de pilhérias dos outros guerrilheiros (Patarra, 1993:423). Consideramos que tal recurso tem uma função narrativa pragmática de intensificação da construção da personagem do vilão, que é associado com características negativas, tanto de condutas, quanto estéticas.

Também foi produzido certo apagamento da história, em que Lungaretti é rechaçado do seu lugar protagonista no acontecimento histórico guerrilheiro da cisão da VAR-P - Vanguarda Armada Revolucionária Palmares - que gerou o retorno da VPR. Nesse episódio, sete guerrilheiros iniciaram a ruptura defendendo uma atuação militarista radical, apoiados nas famosas "teses do Jamil" (Hur, 2013). "Dá-se, então, o 'racha dos sete' - Lamarca, o exsargento Darcy, o ex-sargento José Araújo Nóbrega, o ex-marinheiro Cláudio Ribeiro, Celso Lungaretti, Mário Japa e mais um. Todos com uma visão bem guerrilheirista: queriam ir para o campo, fazer a guerra, libertar o povo. Não admitiam ficar perdendo tempo nas cidades, e se põem a discutir separadamente" (José & Miranda, 1980:63). Tal apagamento da história aparece quando Gorender não cita Lungaretti como um dos sete dissidentes que coordenaram o racha da VAR-P (1998:148), citando outras pessoas no lugar deste. Talvez um "traidor" não pudesse figurar como um dos protagonistas de um acontecimento histórico. Por outro lado, Celso coloca-se como um dos articuladores do racha (2005:115-122), considerando este um dos momentos mais importantes de sua participação na guerrilha (2008:385-3902).

Ao publicar seu livro, Lungaretti (2005) refuta as versões legitimadas e traz o seu lado da história, não aceitando ser o único culpado da derrota da guerrilha. Confronta a memória instituída da guerrilha, instaurando um conflito de memórias. Assume seus erros e algumas delações, num número muito inferior às três dezenas que lhe foram imputadas. Discorda que tenha contribuído ativamente com a repressão e não cita os casos atribuídos por Sirkis, como contribuir com sessões de tortura de guerrilheiros, ao aplicá-los choques elétricos. Relata detalhadamente todo o processo de tortura que o levou a manifestar-se publicamente na televisão contra a guerrilha, colocando-se no lugar de vítima e não de algoz e colaborador ativo da ditadura. Na entrevista, emociona-se ao recordar tais momentos e denuncia que foi culpabilizado por ações que não cometera: "entraram também problemas pessoais, o fato que os caras me jogaram culpas que eu não tinha" (Lungaretti, 2008:555-556). Sente-se muito culpabilizado no processo, inclusive por abrir informações de que não tinha domínio:

É, como bode expiatório da Ribeira, o que foi uma coisa de má fé. O Lamarca dava as cartas ainda, e sabia muito bem que eu desconhecia a área para qual ele foi, que ele simulava ser distante, provavelmente no Paraná, não lá perto. Ele sabia de tudo isso, assim como ele sabia de onde que veio o golpe, porque eu fui preso numa quinta-feira, 16 de abril de 70, ele ficou tranquilamente na área, aí com as quedas do sábado, 18 de abril, ele correu a desmobilizar a operação rural. Então ele sabia muito bem onde estava o perigo, quem era o perigo. Acho que foi um negócio terrível, que uma pessoa, de caso pensado, tomasse a decisão de transferir a culpa de uma pessoa para outra. Não sei quem mais pudesse saber que eu era inocente, mas ele, com certeza, sabia. Quem mais eu não sei, quem mais entrou de má fé e quem mais acreditou, mas ele sabia perfeitamente que eu não tinha nada a ver com o cerco da área. Então isso me detonou por completo, porque, por causa disso me deixaram sofrendo, me escolheram como pato para levar a culpa, ao mesmo tempo em que a pessoa culpada eles mandaram lá para o exterior, colocaram-na na lista de troca pelo embaixador alemão. (Lungaretti, 2008:572-584)

Celso refere-se à culpa que recebeu pela delação da área de treinamento da VPR no Vale do Ribeira. Havia duas áreas e ele apenas conhecia uma que estava desativada (área 1), pois treinou ali. No entanto lhe atribuem a culpa pela delação da área 2, onde Lamarca e os guerrilheiros estavam, mas que ele afirmou desconhecer (Lungaretti, 2005:151), pois era informação extremamente sigilosa. Realizou uma busca por anos para provar que não sabia onde era a localização da área 2, para comprovar sua inocência em relação à delação. Sua versão, após trinta anos, é reforçada por Gorender (2004), que reavaliou sua afirmação anterior (1998) e tirou de Celso a culpa pela delação da área 2, que resultou no cerco aos guerrilheiros: "A respeito dessa segunda área, nenhuma responsabilidade cabe a Celso Lungaretti, que ignorava a sua existência. Sua vinculação com o episódio restringiu-se, por conseguinte, à informação sobre a área que sabia desativada, fornecida, segundo afirma, sob tortura irresistível" (p. 3). Entretanto, como a ele foi depositada a culpa pela queda da área 2 de treinamento da VPR, Celso não foi libertado no caso do sequestro do embaixador alemão, sendo deixado na prisão:

Em me deixando, eles deixaram o único cara que tinha responsabilidade pelo fato de a repressão ter sido desmoralizada naquele sequestro do alemão, eu fui o único cara que era culpado disso e continuava nas garras da repressão. Provavelmente nem se tocaram desse pequeno detalhe, mas o fato é que eu sabia da existência de duas unidades de combate no Rio de Janeiro, a unidade do Juarez Guimarães de Brito tinha sobrado incólume, quer dizer, eu e outros companheiros presos evitamos contar para a repressão que eram duas unidades. A repressão acreditou que existisse no Rio só a unidade do Roberto Gordo, totalmente desbaratada. Mas existia uma unidade inteirinha que permaneceu incólume, e era essa que tinha feito o levantamento para a ação do sequestro do embaixador alemão, itinerário que ele percorria até chegar à embaixada, tudo isso era a Unidade do Juarez que estava fazendo. [...] Aí o cara é sequestrado [...] E aí quem estava lá para pagar o pato? O trouxa aqui. Aí me arrebentaram, aí tomei porrada de bobeira, não queriam nem saber nada. [...] Continuei sendo torturado, passei vários dias numa solitária imunda, sem conseguir dormir à noite por causa do frio (estava só de cueca). Chegou um ponto em que acabei entrando nessa jogada de TV porque chegara ao limite, é muito tempo para um cara da minha idade, dois meses e tanto assim de pressão, tortura, tinha já quase estourado o coração logo no começo, passei perto do enfarte, muita coisa junta, vai, vai, vai que você acaba quebrando. (Lungaretti, 2008:584-617)

Celso tenta desconstruir a figura de grande delator, ao afirmar que não abriu informações que sabia aos órgãos de repressão, como a existência da outra Unidade de Combate da VPR, que não foi desmantelada e operou o sequestro do embaixador alemão. Entretanto considerase bode-expiatório, pois com a libertação de 40 presos políticos, afirma que sofreu a fúria da retaliação da repressão com a intensificação das torturas. Avalia que Lamarca foi o culpado pela sua situação, então lhe atribui "a culpa pela quebra dos compromissos que a VPR tinha consigo. Sofreu demais para cumprir sua parte da melhor maneira possível e considera infame a contrapartida que recebeu da Organização" (Lungaretti, 2005:161). Por isso quando apareceu na televisão criticou o capitão da guerrilha. Com o segmento abaixo justifica sua escolha de aparecer na televisão:

Não era uma retaliação, mas era um negócio que fiz à força. Puta, você está numa situação dramática. Pô, se você acha que os companheiros são leais, você está defendendo eles e isso te dá força; mas se você acha que os caras te ferraram, são culpados daquilo que você está passando, isso, pelo contrário, te enfraquece, enfraquece, o negócio, você fica... Você é humano, então isso tira força da gente, claro. Muitas pessoas ficaram julgando sem levar em conta, pô, que as decisões que eu tomei foram nas circunstâncias mais extremas possíveis, agora os que me ferraram estavam lá soltos e livres, numa boa, e decidiram meu destino dessa maneira, me deixaram lá numa situação absurda. O fato é que eu não tinha uma vivência de esquerda a ponto de julgar que algo assim fosse possível, acreditava nas pessoas. Não era nenhum otário, mas nunca imaginei ser abandonado daquela maneira, de não darem a mínima ajuda, não pagarem advogado, deixarem-me entregue às feras. Pô, isso realmente debilita sua vontade, você tem menos motivo para resistir. (Lungaretti, 2008:621-633)

Na sua entrevista denuncia informações que não aparecem no seu livro e nem em registros impressos sobre a guerrilha no Brasil, revidando contra aqueles que lhe culpam:

[...] vim a saber de coisas muito graves: 1) que a pessoa responsável pela delação da área foi julgada por não ter se comportado diante da repressão à altura da posição dela na Organização, foi julgada no Chile, não foi inocentada, mas o Major Cerveira convenceu que os revolucionários não deveriam se matar uns aos outros, foi uma exortação assim mais moral, e acabou livrando essa pessoa do tiro na nuca; 2) que tudo isso foi escondido, só apareceu agora do lado da repressão, as coisas deles publicadas nos sites deles é que me colocaram nessa pista, aí eu encontrei gente de esquerda que confirmou, houve mesmo esse julgamento e tudo isso foi escondido. (Lungaretti, 2008:644-651)

Celso não somente afirma sua inocência como diz saber quem foi a pessoa que delatou a área 2. Contudo, não quis culpabilizá-la. Outra denúncia é mais bombástica:

Outra coisa que eu fiquei sabendo é que quando o Gorender começou a escrever o Combate nas Trevas e fazia a pesquisa de campo, ele procurou essas pessoas que haviam sido trocadas pelo embaixador alemão, pediu depoimentos e esse pessoal se reuniu em Lisboa para combinar versões, de forma que a culpa do desbaratamento da Organização ficasse com os outros. Houve quedas em cascata em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, tudo em abril de 70, e isso foi jogado nas costas alheias. (Lungaretti, 2008:651-657)

Lungaretti afirma que houve articulação de alguns guerrilheiros exilados para a produção de uma memória comum. Essa reunião é analisador do pacto de um coletivo para a constituição de uma memória consensuada, em que certas ocorrências devem ser omitidas, apagadas, deixadas de fora, num pacto denegativo, em que alguns foram culpabilizados pelos percalços da guerrilha, sendo neles depositado a culpa de outros. Sente-se assim como bodeexpiatório da guerrilha. Justifica que não poderia ser responsável por tantas quedas:

Eu estava colocado no cantinho da estrutura, só tinha contato com o Gordo e o Juarez, que eram minhas únicas pontes com o resto da organização, eventualmente eles marcavam encontros meus com outras pessoas, com o Jamil, a Maria do Carmo, mas na verdade eu só tinha dois pontos de contato com Organização; e esses dois não caíram por minha culpa, nem nos encontros que teriam comigo. Aí o Sirkis veio e disse que eu era culpado por nada menos que trinta e duas quedas, no livro dele (Os Carbonários). Quando tomei conhecimento dessa afirmação [...], mandei-lhe uma mensagem refutando isso. O Sirkis respondeu que hoje ele não tem mais como apurar, nem interesse, então ele ia encaminhar para publicação como nota de rodapé o meu e-mail; e que o que eu fiz depois é muito mais importante do que isso, blá blá blá. Ridículo né, como se a moral de um homem valesse tão pouco, não justificasse nem uma retificação de acusações feitas levianamente... (Lungaretti, 2008:657-668)

Dessa forma, considerando que Celso não foi o responsável pela queda da área 2 e nem de três dezenas de guerrilheiros, será que ele não apenas foi vítima da repressão, como também dos seus ex-companheiros de Organização? Será que partiram de alguns fatos para consolidar uma imagem muito pior de Lungaretti? Abaixo a resposta de Sirkis ao e-mail de Celso, publicada em seu livro (1980), na edição de 2008:

Recebi de "Lourenço" um e-mail pedindo a retificação de afirmações feitas nesta passagem do livro. Na época, essas informações tiveram mais de uma fonte, e tantos anos depois o confronto com a versão dele não seria mais necessário. De qualquer modo, considero justo registrar seu desmentido: Com grande atraso tomei conhecimento das afirmações que fez a meu respeito em seu livro Os carbonários. Peço-lhe que retifique tais ocorrências, pois são absolutamente improcedentes: 1) nunca fui levado pela repressão para tentar identificar companheiros pelas ruas, nem imagino quem tenha sido a fonte de imputação tão estapafúrdia; 2) os próprios arquivos da repressão estão aí para comprovar que não fui responsável nem pela delação da área ativa de treinamento de Registro, nem por "dezenas de quedas" da VPR, tendo, inclusive, o Jacob Gorender escrito à Folha S. Paulo uma carta para me inocentar da primeira calúnia. (Sirkis, 1980/2008:493)

Constata-se que Sirkis legitima a sua versão pelo número de fontes que corroboram com o que colocou. Mas se essa versão foi consensuada, o critério quantitativo não é bom indicador, pois distintos atores sociais tratariam por reproduzi-la. No entanto, Sirkis diminui a crítica a Celso, em que reconhece sua grande hostilidade dirigida ao protagonista deste artigo:

Ao reler Os carbonários, 18 anos depois, penso ter sido demasiado duro e hostil com "Lourenço". Por maior que tenha sido seu grau de colaboração, não se deve perder de vista sua condição, primordial, de vítima de tortura. O fato de ele ter sido detestado por outros presos e ter se transformado, depois de sua aparição na tevê, aos nossos olhos, numa espécie de "protótipo do traidor" não altera esse fato. Torna ainda mais culpados seus torturadores que, nesse caso, pelo terror, pela dor e pelo medo, não só conseguiram arrancar informações mas quebrar sua personalidade. (Sirkis, 1980/2008:495)

Percebe-se que por mais que Sirkis atualmente se solidarize com a perspectiva de Celso, em nenhum momento reavalia suas afirmações, tal como Gorender (2004) fez. Mantém a versão de que é o grande delator, com uma "personalidade quebrada", mesmo que culpe mais os torturadores. Lungaretti considera que um importante dirigente da VPR, Juarez Guimarães de Brito, também foi colocado como bode-expiatório. Juarez foi um guerrilheiro elogiado em todos os registros sobre a guerrilha. Ele e Maria do Carmo Brito foram pegos ao fazer um ponto, ao encontrar-se com um guerrilheiro, Wellington, que já estava sob o poder da repressão. Quando a polícia os cercou, ocorreu uma das cenas mais dramáticas da guerrilha, a de Juarez cumprir o acordo de suicídio do casal: de não serem presos vivos para não serem torturados e revelarem segredos da VPR. Pegou a arma da mão de sua esposa e deu um tiro contra sua própria cabeça, suicidando-se. Antes de qualquer ação dela, os policiais conseguiram prendê-la. No "aparelho" em que residiam, descoberto pela polícia, estavam documentos importantes da VPR, que levou a um fluxo de prisões de militantes (Gorender, 1998:211). Celso critica essa versão da existência de arquivos de Juarez no apartamento, considerando que foi inventada para encobrir as delações de outros companheiros:

Porque caiu muita gente então, na verdade essas quedas estão pulverizadas, todos os caras contribuíram para algumas. Agora eles jogaram para cima de mim, jogaram para cima do Juarez, que estava morto, aí disseram que ele forneceu postumamente pistas à repressão, está no 'Combate nas Trevas', que eles chegaram a muitas pessoas a custas de documentos encontrados no aparelho do Juarez. Olha, o Juarez não deixava nada assim dando sopa. Em primeiro lugar, não tinha endereços, o que a gente tinha era pontos de encontro, nenhum de nós sabia onde os outros moravam, nenhum de nós tinha condição de arquivar em lugar nenhum pistas que levassem diretamente à outra pessoa, a gente se encontrava na rua. Foi uma cascata homérica, até o Gorender entrou nessa. (Lungaretti, 2008:673-681)

E esqueceram de perguntar como é que a repressão chegou ao aparelho doJuarez. É um absurdo, até deixei no meu blog uma anotação sobre isso, se eu morrer, que fique lá consignado que isso é uma mentira. Juarez jamais teria arquivado, o cara era inteligentíssimo e extremamente cioso de segurança, era a última pessoa do mundo que ia deixar uma caderneta, como a famosa do Luis Carlos Prestes dando sopa, sabe, foi ignóbil essa colocação. Então esse pessoal mentiu para o Gorender, mentiu para a Judith Patarra; é a mesma turminha [...] (Lungaretti, 2008:685-691)

Na sua interpretação houve a articulação de ex-guerrilheiros para a constituição de uma memória comum, que se tornou hegemônica e legitimada com a publicação de livros de referência, como os de Gorender (1998), Patarra (1993) e Sirkis (1980). Uma memória comum que tem como função estabelecer uma ligação, uma continuidade, com tais momentos de lutas e traumas e também recalcar, encobrir, apagar, certas passagens que trazem sofrimentos aos atores sociais do coletivo (Kaës, 2006). Pode-se inferir que nessa reunião de construção desta memória comum, em que foram depositadas as culpas pelas quedas sobre Lungaretti e Juarez, houve um pacto denegativo de obrigatoriedade (Kaës, 2003). Para que o grupo de ex-guerrilheiros exilados pudesse lidar e suportar a derrota da guerrilha, teve que construir outras versões do que ocorreu, deixando de fora, denegando, as experiências traumáticas, que pudessem trazer algum sofrimento, ou arrependimento. Dessa forma, a memória coletiva restitui o que o grupo deseja lembrar, como também encobre o que quer esquecer (Kaës, 2006).

Na literatura sobre a guerrilha no Brasil encontra-se que a maioria dos guerrilheiros deu informações aos órgãos de repressão em situação de tortura. Portanto, tendemos a convergir com a afirmação de Lungaretti, de que as delações que resultaram nas quedas da VPR estavam pulverizadas, não poderiam estar localizadas em apenas poucos guerrilheiros, como no seu caso, acusado por mais de trinta quedas. Então, atribuir a culpa das quedas de militantes e do campo de treinamento do Vale do Ribeira ao "queimado" Lungaretti, ou ao falecido Juarez, tem como função desresponsabilizar alguns, que sobreviveram e que provavelmente abriram algumas informações em situação extrema de tortura. Cria-se assim, de um lado, a figura do bode-expiatório, depositário da culpa do fracasso do grupo (Pichon-Rivière, 1986), e do outro, um mito fundador heroico (Kaës, 2005), de ex-guerrilheiros que adotaram uma postura sobre-humana de resistir às sevícias da tortura, não abrindo nenhuma informação. Instaura-se uma relação dicotomizada, o pólo negativo, o segmento a ser extirpado e negado, e o pólo positivo, o segmento a ser admirado e respeitado.

A constituição do mito fundador, de guerrilheiros heroicizados que lutaram contra a ditadura, é uma forma de elaboração da violência e sofrimento vividos. Houve um processo de construção discursiva que levou a elaboração das feridas e cicatrizes desse período, como também a um apagamento e rechaço daquilo que não poderia ser suportado e tolerado pelo coletivo. Compreendemos que, complementar ao processo de apagamento, há o mecanismo de criação de bodes-expiatórios. Sua produção tem uma função de regulação da economia psíquica grupal, depositando a eles aquilo que não pode ser aceito pelo grupo e que causa sofrimento, numa excisão dos próprios aspectos negativos no outro. "As sociedades que saem de uma catástrofe social, trabalham, de início, com o recalque de sua história. Os acontecimentos criminais não podem ser rememorados e restituídos, numa comunidade de representação que foi rompida" (Kaës, 2005:180). Deste modo, aspectos intoleráveis para o coletivo são objeto de recalque e esquecimento, em que o laço social se dá a partir dessas alianças inconscientes. Portanto, a memória construída pelo coletivo não restitui fielmente como os fatos se deram, mas constitui uma versão do passado que possa "sustentar o recalque e o apagamento" (Kaës, 2005:180). Há a produção de uma memória coletiva de forma semelhante ao fenômeno das lembranças encobridoras comuns. A lembrança encobridora oculta, recalca, a representação traumática, mas o afeto desprazeroso continua (Freud, 1899). Há uma troca, em que a lembrança mais traumática possa ser esquecida em prol de outra menos conflitiva. Contudo, as vivências traumáticas recalcadas coexistem no psiquismo como corpos estranhos à consciência. "A intensidade psíquica é deslocada da representação abandonada para outra, que assume a função da primeira" (Goldfarb, 2004:76), em que o desejo e a evitação do desprazer acabam por modular as lembranças rememoradas.

Compreende-se que estas narrativas fundam uma versão da história que se institucionaliza. A memória coletiva construída sustenta o pacto denegativo, pois deixa de fora o que está no registro do insuportável para o coletivo. "Por razões que dizem respeito à sua lógica e à necessidade de ligação, o grupo estabelece essas referências memoriais comuns e partilhadas: elas sustentam o contrato narcísico e o pacto denegativo, inerentes à vida comum e à formação da identidade de cada sujeito" (Kaës, 2005:179). Os conjuntos sociais fundam-se sobre pactos denegativos, em que se deixa de fora, encobre-se, aquilo que não é tolerável e que poderia trazer o fim ao grupo. A memória sustenta o contrato narcísico, pois estabelece lugares imaginários para cada componente do coletivo. O indivíduo ocupa um lugar no conjunto social, sendo investido narcisicamente pelo grupo. "Esse contrato designa a cada um certo lugar que lhe é oferecido pelo grupo e que lhe é significado pelo conjunto de vozes que, antes de cada sujeito, manteve um certo discurso conforme ao mito fundador do grupo" (Kaës, 1997:263). Portanto, as memórias consolidadas da guerrilha produzem esse contrato, em que aos ex-guerrilheiros é investida carga transferencial positiva, ocupando o lugar mítico de heróis. Deve-se suprimir as lembranças que trazem sofrimento e vergonha, as quais são atribuídas aos bodes-expiatórios. Celso faz parte do contrato narcísico, erigido na suposta reunião de Lisboa, sendo depositado a ele as características negativas, não apenas políticas, como até as estéticas. Colocar o outro no lugar do bode-expiatório, sendo culpado ou não, é fonte de produção de sofrimento ao elemento culpabilizado. Principalmente se há o fenômeno das colagens imaginárias (Kaës, 1997), que se dá quando o elemento aceita, cola, nas atribuições imaginárias depositadas pelo grupo, assumindo como seu o que é adjudicado pelo coletivo (Berstein, 1986). Cria-se então uma situação paradoxal, em que o sujeito do grupo já não sabe se é regido por sua verdade ou pela verdade do coletivo. Nesse fenômeno:

A prova da realidade psíquica passa por essa experiência de ilusão, com o risco da confusão do ilusório. Não podemos estar nessa relação ambígua, por uma quantidade de aspectos inextricáveis, com o grupo. Outra coisa é a revolta, aqui também narcísica, contra esse submetimento ao rochedo da realidade grupal, na qual vem bater outra forma de ilusão: a da autonomia do indivíduo, limpo de todo tributo à tribo. (Kaës, 1997:199)

Portanto, há duas saídas no processo de colagem imaginária; o primeiro, que é submeterse ao lugar ilusório e o segundo, romper. No primeiro, pode resultar um processo de alienação, confusão e adoecimento, em que implica ao sujeito "um empobrecimento da psique individual e na assunção de um encargo que não é seu, capturando-o às cobranças que se referem a outras instâncias" (Hur, 2010:40), ao assumir os percalços do grupo guerrilheiro como se fossem apenas seus. No segundo, num autoinvestimento narcísico, pode-se romper com as atribuições do grupo, ao afirmar um funcionamento independente do coletivo em que se está. Ambos geram sofrimento psíquico. Hipotetiza-se que Massafumi operou pela primeira saída, em que assumiu como suas as culpas atribuídas pelo grupo, entrando em situação confusional e suicidando-se. Celso operou pela segunda, negando o que lhe foi atribuído, criticando ex-companheiros e afirmando seu discurso frente ao que está legitimado.

 

Considerações Finais

O terreno das memórias da ditadura ainda está em construção e movimento. No artigo debateu-se uma memória legitimada da guerrilha frente outra, duas versões sobre a construção da figura de traidor sobre o ex-guerrilheiro Lungaretti, gerando-se um conflito de memórias. Foram apresentadas falas presentes nos livros que denunciavam a sua conduta nos momentos em que foi torturado, que supõe que teve uma alta colaboração com os órgãos de repressão. Também foi apresentada sua justificativa, que tratou de dirimir as acusações atribuídas a si próprio, afirmando que foi colocado no lugar de bode expiatório. Denuncia que houve uma reunião de ex-guerrilheiros exilados que tratou de consensuar uma versão sobre as memórias da guerrilha, constituindo-se um consenso e uma versão sobre o passado.

Através da perspectiva da memória coletiva de Kaës hipotetizou-se a função psíquica da constituição de uma memória consensuada pelo conjunto de ex-guerrilheiros exilados. Esta memória sustenta um pacto denegativo e um contrato narcísico, ao rechaçar e encobrir as lembranças traumáticas e constituir um mito fundador comum, num investimento imaginário positivo dos guerrilheiros como heróis. No mito foi depositada a responsabilidade do fracasso do projeto guerrilheiro sobre os elementos que publicamente contribuíram para seu insucesso, principalmente àqueles que se expuseram na mídia "arrependidos", ao criticar a guerrilha. Produziu-se assim a figura de bode-expiatório, por exemplo, sobre Lungaretti, que apareceu na mídia criticando a guerrilha. Na consolidação dessa memória, em que há um mito fundador heróico e a materialização dos culpados, pode haver uma redução da complexidade do que foi a luta guerrilheira contra a ditadura para uma dicotomia entre "mocinhos" e "bandidos", ou "heróis" e "traidores", o que seguramente obnubila uma análise mais acurada do processo.

Não é nossa intenção defender, julgar, criticar, as condutas de Celso, ou de outros ex-guerrilheiros. Buscamos através do conflito das memórias, do dissenso, instaurar outras possibilidades de discussão, relacionando a memória coletiva instituída da guerrilha aos fundamentos narcísicos coletivos dos atores sociais. Uma memória que nunca é expressão fidedigna ou neutra do que passou, mas sempre interessada e socialmente posicionada. A perpetuação dessa memória legitimada pode ter incorrido em casos de injustiça e fatalidades, como a estratificação de alguns nos lugares de vilões e de traidores (e consequentemente outros no lugar de heróis). Não é que não tenham em determinados momentos agido de forma equivocada e deletéria para as organizações de guerrilha. Mas o que se sustenta é que o excesso de atribuições negativas, inclusive de ações que não cometeram, não tem como finalidade apenas reconstituir a história, mas sim produzir uma versão com bodes-expiatórios, em que aspectos denegados do coletivo lhes são atribuídos. Ao mesmo tempo em que se produz um discurso sobre os fatos passados, omite-se partes desse passado, em que a memória é produção de recordações, como também de esquecimentos. A memória de Lungaretti, que surge três décadas depois, pode romper o contrato narcísico sustentado pela memória comum legitimada pelo coletivo de ex-guerrilheiros. Pode haver assim mobilidade dos papéis e dos estereótipos assumidos e atribuídos. Com sua memória expressa, deixa de ser parte submetida do coletivo, apenas constituída, assumindo também um papel constituinte nessa história tão marcada por tensões, feridas que não se fecharam e cicatrizes. O conflito das memórias não é resolvido, não se estratifica em apenas uma versão, mas multiplica-se e tensiona-se para uma polifonia de vozes e discursos já ditos e que ainda deverão ser elaborados e enunciados.

 

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Recebido em 02/11/2013.
Aceito em 19/05/2014.

 

 

1 Um codinome que Sirkis (1980) utiliza para citar Celso Lungaretti.
2 Os números entre parênteses referem-se às linhas em que está localizada a citação na transcrição da entrevista integral que nos foi cedida.

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