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Revista Psicologia Política

versão impressa ISSN 1519-549Xversão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.18 no.43 São Paulo set./dez. 2018

 

MENSAGEM DA ABPP

 

Mensagem da ABPP: conjuntura política e a importância de reflexões psicopolíticas

 

Message from ABPP: political conjuncture and the relevance of psycho-political reflections

 

Mensaje de la ABPP: conjuntura política y la importancia de reflexiones psicopolíticas

 

Message de la ABPP: conjoncture politique et importance des réflexions psycho-politiques

 

 

Jáder Ferreira LeiteI; Frederico Alves CostaII

IPresidente da ABPP (2017/2018)
IIPresidente da ABPP (2019/2020)

 

 

O golpe de 2016, que retirou a presidenta Dilma Rousseff da presidência da República, explicitou de maneira cadente a necessidade de problematizarmos a legitimidade das instituições brasileiras, mais especificamente, o poder legislativo e o poder judiciário. Neste contexto de fragilidades democráticas, acompanhadas do fortalecimento de pautas conservadoras e favoráveis a retirada de direitos já existentes dos trabalhadores e das trabalhadoras e de minorias sociais, que se construiu o Governo Temer e que ocorreu o processo eleitoral deste ano de 2018.

Dois acontecimentos ocorridos neste processo eleitoral foram importantes indicadores de nossa conjuntura política. O primeiro foi a prisão do ex-presidente da República Luís Inácio Lula da Silva no interior de um processo jurídico que, por vozes nacionais e internacionais, tem sido concebido como um processo político, que teve como efeito a proibição da candidatura de Lula em 2018. É relevante ressaltar que este episódio é apenas mais um, entre outros que ocorreram nos últimos anos, que tem servido ao fomento do ódio ao Partido dos Trabalhadores.

O segundo acontecimento a se destacar neste processo eleitoral diz respeito às candidaturas que foram para o segundo turno das eleições e a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro. Uma dessas candidaturas foi a de Fernando Haddad (PT). Candidato que, mesmo tendo realizado sua campanha em um pequeno espaço de tempo e sob os holofotes da prisão de Lula em Curitiba, conseguiu o apoio de grande parte do eleitorado brasileiro no primeiro e no segundo turno das eleições. Um fato interessante para reflexão é que o candidato obteve a maioria de votos em todos os estados do nordeste brasileiro. Região que se tornou um grande capital político para o Partido dos Trabalhadores desde os mandatos do presidente Lula em razão do impacto social e econômico da ampliação e construção de políticas de justiça social nessa região. Ainda que não tenha sido o candidato eleito para a presidência da República, é relevante demarcar que o PT conseguiu eleger a maior bancada de deputados federais no Congresso Nacional.

A outra candidatura foi a de Jair Bolsonaro (PSL). Candidato, que assim como Fernando Collor de Melo, nas eleições de 1989, é oriundo de um partido político até então pouco expressivo no cenário nacional, e que, apesar de estar há décadas no Congresso Nacional, não possuía nenhuma expressão relevante na cena política. Condições que implicariam em poucas chances de vitória numa eleição para Presidente da República. Entretanto, não foi o que aconteceu, na medida em que Bolsonaro foi eleito com uma votação surpreendente e com larga vantagem em relação à Fernando Haddad (PT). Aquelas condições, inclusive, o favoreceram no interior da conjuntura política marcada pela fragilidade das instituições democráticas e pelo ódio ao Partido dos Trabalhadores, uma vez que possibilitou a ele se apresentar como o "novo" na política.

Tratou-se de uma candidatura que se tornou vitoriosa na defesa de uma agenda política que compromete consideravelmente uma gama de conquistas democráticas da nossa sociedade: desde a perda de garantias trabalhistas, passando por um profundo ataque ao campo dos direitos humanos, chegando em propostas que não só afetam sobremaneira o meio ambiente, bem como os povos e comunidades tradicionais e seus territórios de vida, trabalho e moradia. Agenda que não tem como ser dissociada das agressões verbais e físicas sofridas por diversas parcelas da população (mulheres, população LGBT, população negra, pessoas vinculadas aos movimentos sociais, trabalhadores e trabalhadoras sem teto e sem terra) no período eleitoral.

Tratou-se também de uma vitória que colocou mais uma vez a necessidade de compreender os usos das redes sociais nos processos políticos (as jornadas de 2013 e as manifestações referentes ao Golpe de 2016 já nos indicavam isso), na medida em que a eleição foi marcada pelas chamadas falsas notícias (fake news), viralizadas em mensagens de WhatsApp e pelo Facebook. O fortalecimento de pautas conservadoras no país, inclusive de demandas fascistas, bem como estes usos das redes sociais são temas de pesquisa relevantes para a psicologia política brasileira.

Considerando esta importância da psicologia política produzir reflexões críticas sobre a conjuntura política do país e fomentar estratégias políticas orientadas para a radicalização da democracia, é fundamental também destacarmos neste ano de 2018 a realização do X Simpósio Brasileiro de Psicologia Política (xsbpp.com.br), o qual se iniciou um dia após o resultado das eleições e teve como tema central: Psicologia Política no Brasil e enfrentamentos a processos antidemocráticos.

O Simpósio aconteceu na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), na cidade de Maceió/AL, de 29 de outubro a 01 de novembro de 2018, tendo sido organizado pela Associação Brasileira de Psicologia Política (ABPP) e pelo Programa de Pós-graduação em Psicologia da UFAL. Ademais, contou com a parceria do Instituto de Psicologia da UFAL, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (CAPES), da Fundação de Amparo à Pesquisa de Alagoas (FAPEAL), da Secretaria de Direitos da Mulher e dos Direitos Humanos do Estado de Alagoas e do Conselho Regional de Psicologia - Alagoas (15ª Região).

O Simpósio teve aproximadamente 600 inscritos, participantes e convidados de todas as regiões do país e de países da América Latina. As atividades realizadas - Minicursos, Simpósios Temáticos, Grupos de Trabalho e Diálogos Rede Unida-ABPP - possibilitaram a construção de debates sobre o quadro de ataque às históricas conquistas democráticas de nossa sociedade e sobre as contribuições de perspectivas psicopolíticas para o enfrentamento a este quadro político.

Além disso, foi realizada durante o Simpósio uma Sessão de Homenagens a pessoas que têm contribuído para a luta democrática e para a construção da psicologia política no Brasil. Foram homenageados os professores Leôncio Camino (UFPB), Salvador Sandoval (PUC-SP), Marco Aurélio Máximo Prado (UFMG), a professora Lúcia Rabello de Castro (UFRJ) e Maria Enaura Alves do Nascimento (líder comunitária da Vila de Pescadores do Jaraguá/Maceió).

Na Assembleia da ABPP, realizada durante o Simpósio, debatemos o papel da associação na conjuntura política brasileira, tendo sido aprovada a Carta de Maceió em defesa do Estado Democrático de Direito (anexada ao final deste texto). Conversamos sobre a importância do trabalho da Diretoria Nacional e da Comissão Editorial atual da Revista Psicologia Política para a reorganização da periodicidade da revista. Deliberamos sobre as prestações de conta da Diretoria Nacional e do X Simpósio Brasileiro de Psicologia Política.

Nesta Assembleia, elegemos a nova Diretoria Nacional (Biênio 2019-2020), a qual tem como integrantes: Frederico Alves Costa (presidente), Josiele Bené Lahorgue (secretária-geral), Marcela de Andrade Gomes (vice-presidente regional sul), Mariana Luzia Aron (vice-presidente regional sudeste), Fernando Lacerda Júnior (vice-presidente regional centro-oeste), João Paulo Macedo (vice-presidente regional nordeste), Paulo Victor Telles de Almeida (vice-presidente regional norte). Também elegemos o Conselho Fiscal para o Biênio 2019-2020, composto por: Jáder Ferreira Leite (UFRN), Rafael Prosdocimi Bacelar (UNI-BH), Leandro Amorin Rosa (IMES Catanduva), Larissa Baima (IMES Catanduva), Maria Aparecida Veiga Malagrino (PUC-SP).

Desejamos à nova gestão excelente trabalho e disposição para fazer avançar a Psicologia política brasileira num cenário onde as liberdades políticas estão sendo postas à prova e agradecemos pelo apoio fundamental dado pelos associados à nossa gestão.

 

CARTA DE MACEIÓ DA ABPP

Jáder Ferreira Leite Presidente da ABPP (2017/2018)

Frederico Alves Costa Presidente da ABPP (2019/2020)

A Associação Brasileira de Psicologia Política, reunida no X Simpósio Brasileiro de Psicologia Política, em Maceió\AL, comemora os 30 anos da constituição do nosso Estado Democrático de Direito como uma conquista da sociedade civil organizada e das forças políticas progressistas.

Nessas três décadas construímos espaços públicos participativos e ampliamos a representação da pluralidade dos segmentos sociais no parlamento. Entretanto, estes avanços ainda são insuficientes para a democratização do Estado e da Sociedade Brasileira que preserva traços autoritários de sua herança colonial e do conservadorismo das elites reacionárias.

Diante do cenário atual, é fundamental que nos mobilizemos para evitar retrocessos em relação aos direitos já conquistados, visto o contexto de grande polarização social na sociedade civil e nas instituições sociais e políticas em torno das eleições recentemente realizadas no país. Nós psicólogos/as temos assumido o compromisso ético e político para construção de uma sociedade pautada na justiça social, garantida no respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos e coletivos sociais.

Esse é o momento de reafirmarmos esse compromisso, convocando todos/as psicólogos/as, independente de abordagem teórico-metodológica e campo de atuação, para apoiar, proteger e defender todos indivíduos e grupos que possam ser alvos da intolerância, ódio e cerceamento da liberdade humana, reafirmando o pluralismo identitário, étnico e cultural de todos e todas e a democracia como forma relacional micro e macro nos processos de tomada de decisão.

 

Maceió, 01 de novembro de 2018
Associação Brasileira de Psicologia Política

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