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Revista Psicologia Política

versão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.20 no.47 São Paulo jan./abr. 2020

 

ARTIGOS

 

Concepções e práticas de autonomia em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS):
desafios cotidianos

 

Conceptions and practices of autonomy in a Psychosocial Care Center (CAPS): everyday challenges

 

Concepciones y prácticas de autonomía en un Centro de Atención Psicosocial (CAPS): desafíos cotidianos

 

Conceptions et pratiques d'autonomie dans un Centre de SoutienP sychosocial (CAPS): defis quotidiens

 

 

Katharina Pereira KammerI; Larissa Moraes MoroII; Kátia Bones RochaIII

IPsicóloga, mestre em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), residente pelo Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental da Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos). Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos, São Leopoldo, RS, Brasil / katharina.kammer@hotmail.com
IIPsicóloga, mestre em Psicologia e doutoranda no Programa de Pós-graduação de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, Porto Alegre. RS, Brasil / larissamoraesmoro@gmail.com
IIIDocente do Programa de Pós-graduação e do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutora em Psicologia pela Universitat Autònoma de Barcelona (UAB). Mestre em Psicologia Social pela PUCRS. Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS, Porto Alegre. RS, Brasil / katiabonesrocha@gmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo objetiva analisar as concepções de autonomia no cotidiano de um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Trata-se de um estudo qualitativo transversal e exploratório, realizado em um CAPS do sul do Rio Grande do Sul/Brasil. Os participantes foram seis profissionais, seis usuários e três familiares. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas e diários de campo, analisados mediante Análise Temática. Foram encontradas diversas concepções sobre autonomia, referentes ao gerenciamento da vida, independência e autossuficiência, e enquanto processo construído a partir das relações. Destaca-se a importância das oficinas terapêuticas e atividades extramuros como práticas fortalecedoras de autonomia. É necessário pensar a autonomia enquanto potência para a expansão das relações, entendendo-a como um objetivo transversalizador de todas as práticas dos CAPS e fora dele.

Palavras-chave: Saúde mental; Atenção psicossocial; Autonomia; Centro de atenção psicossocial.


ABSTRACT

This article aims to analyze the conceptions of autonomy in the daily care of a Psychosocial Care Center (CAPS). This is a qualitative cross-sectional and exploratory study carried out at a CAPS in the south of Rio Grande do Sul/Brazil. The participants were six professionals, six users and three family members. Semi-structured interviews and field diary were conducted and analyzed through Thematic Analysis. Results show several conceptions about autonomy, referring to life management, independence and self-sufficiency, and as a process built from relationships. The importance of therapeutic workshops and outdoors activities is highlighted as such practices strengthen autonomy. It is necessary to perceive autonomy as something that can potentially expand and diversify relationships, understanding it as a transversal goal of all practices inside and outside the CAPS.

Keywords: Mental Health; Psychosocial Attention; Autonomy; Psychosocial Care Center.


RESUMEN

Este artículo objetiva analizar las concepciones de autonomía en el cotidiano de un Centro de Atención Psicosocial (CAPS). Se trata de un estudio cualitativo transversal y exploratorio, realizado en un CAPS del sur de Rio Grande do Sul / Brasil. Los participantes fueron seis profesionales, seis usuarios y tres familiares. Se realizaron entrevistas semiestructuradas y diarios de campo, analizados mediante Análisis Temático. Se encontraron diversas concepciones sobre autonomía, referentes al manejo de la vida, independencia y autosuficiencia, y en cuanto proceso construido a partir de las relaciones. Se destaca la importancia de los talleres terapéuticos y actividades extramuros como prácticas fortalecedoras de autonomía. Es necesario pensar la autonomía como potencia para la expansión de las relaciones, entendiéndola como un objetivo transversalizador de todas las prácticas de los CAPS y fuera de él.

Palabras-clave: Salud mental; Atención psicosocial; Autonomía; Centro de atención psicossocial.


RÉSUMÉ

Cet article vise à analyser les conceptions de l'autonomie dans la vie quotidienne d'un Centre de Soutien Psychosocial (CAPS). Il s'agit d'une étude qualitative transversale et exploratoire, réalisée dans un CAPS au sud de Rio Grande do Sul / Brésil. Les participants étaient six professionnels, six utilisateurs et trois membres d'une famille. Des entretiens semi-guidés et des journaux de terrain ont été réalisés, analysés moyennant une analyse thématique. Plusieurs conceptions de l'autonomie ont été trouvées, liées à la gestion de vie, à l'indépendance et à l'autosuffisance, construits à partir des relations établies pendant le processus. Il est fondamental de souligner l'importance des ateliers thérapeutiques et des activités hors-le-murs comme des pratiques qui renforcent l'autonomie. Il faut penser l'autonomie comme une puissance d'expansion des relations et la comprendre comme un objectif transversal de toutes les pratiques dedans et en dehors des CAPS.

Mots-clés: Santé mentale; Soutien psychosocial; Autonomie; Centre de soutien psychosocial.


 

 

Introdução

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) têm sido a base da constituição das políticas públicas em saúde mental no Brasil e se estabelecem como a ferramenta estratégica de mudança na atenção psicossocial (Ministério da Saúde, 2004). Contudo, o avanço na implementação desses serviços substitutivos não garante o rompimento com a lógica manicomial, percebida, principalmente, no tratamento tutelar e excessivamente medicamentoso dos usuários de saúde mental (Jorge et al., 2011).

Como propunha Basaglia no movimento de Reforma Psiquiátrica Italiana, a real ruptura com paradigmas manicomiais relaciona-se, sobretudo, com criação de novos sentidos para a loucura. Para tanto, é necessário propor outra forma de cuidar, que coincide com a possibilidade de perceber os sujeitos em sua subjetividade capazes de serem autônomos em suas vidas (Amarante, 2007). Nesse sentido, diferentes autores indicam o risco de os serviços substitutivos reproduzirem o modelo manicomial, ainda que sutilmente, tornando-se uma instituição cronificada e cronificadora (Barros, 2003; Costa & Paulon, 2012; Pande & Amarante, 2011). Como alguns autores referem, tornarem-se "Capscômios", remetendo ao perigo de os serviços mudarem apenas o lugar de tratamento (Emerich, Campos, & Passos, 2013; Heidrich, 2007). Usa-se também o termo "Encapsulados" para referir aos usuários denominados crônicos, que apresentam quadros psicóticos, perdas significativas nas habilidades e que frequentam o serviço de forma intensiva; e também os "novos crônicos", usuários que trocam recorrentemente de modalidade de atendimento ou apresentam estado regular, sem se desvincularem do serviço (Wetzel, 2005).

Com isso, essa "nova cronicidade" favorece a dependência do usuário em relação ao serviço, percebida, por exemplo, na permanência por anos nos CAPS. Esse funcionamento contraria o caráter do serviço de "casa de passagem", configurando-se como único espaço social de referência do usuário (Goulart, 2013). Nesta direção, na sutileza do trabalho no campo de saúde mental encontram-se diversas formas de não cuidar, como o controle disfarçado de organização, a negligência disfarçada de respeito, a institucionalização disfarçada de atenção (Mendes & Rocha, 2016).

A fragilidade da construção da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), em englobar o sujeito na sua multiplicidade, impede que se criem outras portas de entrada e de saída. A possibilidade de reconstrução do cotidiano dos usuários e outras perspectivas de sociabilidade aparecem vinculadas à conexão com outras redes de apoio social. Desse modo, na contramão do princípio de desinstitucionalização, podem estar se estabelecendo outros mecanismos de marginalização que dificultam a aproximação com a diversidade (Liberato, 2011).

As críticas relacionadas ao CAPS e os desafios da efetivação do modelo psicossocial não diminui sua potencialidade. Um estudo avaliativo sobre a efetividade dos CAPS apontou que mais de 50% dos usuários que frequentavam o serviço há mais de três anos apresentaram uma redução significativa de crises e menores índices de internações psiquiátricas. Além disso, entre os usuários"não intensivos",observou-se uma diminuição do uso de medicação associada à participação em atividades de grupos no CAPS (Tomasi et al., 2010).

Estudo avaliativo sobre os CAPS do sul do Brasil indicou que usuários e familiares consideram satisfatório o tratamento ofertado, destacando o estímulo e o fortalecimento da autonomia do usuário, a redução das crises, a participação no serviço, a perspectiva de reorganização de vida e inserção dos usuários em sociedade, construindo possibilidades que ultrapassam o transtorno mental (Kantorski et al., 2009). Além disso, as atividades terapêuticas, como as oficinas, foram identificadas como instrumentos importantes para a socialização, o fortalecimento de vínculos, além de ferramentas potentes na constituição de possibilidades de geração de renda (Kantorski et al., 2010).

A importância de pensar o conceito de autonomia relaciona-se aos avanços ocorridos com a implementação da Política Nacional de Saúde Mental (PNSM) no Brasil, que resultou na transição do modelo de atenção e cuidado em saúde. Enquanto principal ferramenta para a efetivação da política e como serviço estratégico e de referência, os CAPS assumem a promoção do cuidado, a busca pela reinserção social, pelo direito à cidadania, pela liberdade de transitar nos espaços sociais e pelo desenvolvimento e exercício da autonomia.

Os CAPS, estruturados de portas abertas, inseridos no território dos usuários, têm a possibilidade de romper com a lógica manicomial, à medida que potencializam o protagonismo dos usuários, o reencontro com seus laços sociais e familiares, estimulando a autonomia e a responsabilização do sujeito frente à vida (Ministério da Saúde, 2004). A promoção de autonomia é uma das diretrizes fundamentais da PNSM. Entretanto, a discussão sobre o tema é recente e permeada de sentidos que tornam complexa sua contextualização e entendimento. O conjunto de documentos que constitui a política aborda a autonomia como meta do processo de cuidado, ainda que de forma tênue e superficial, sem examinar a fundo seu conceito. A partir disso, é emergente a problematização da concepção de autonomia como desafio para a implementação de modos e práticas de cuidado, em especial na saúde mental enquanto política pública.

A análise do conceito de autonomia neste estudo se dá a partir das contribuições e intersecções da saúde mental, saúde coletiva e psicologia social (Ibañez, 2004; Merhy, 2007; Onocko-Campos & Campos, 2007). Segundo Ibañez, a psicologia social retoma a dimensão subjetiva da realidade social e destaca que é a partir da interação com os outros que construímos nossa forma de interpretar a realidade. A partir desta perspectiva, as pessoas exercem um papel ativo, selecionando e transformando significados adequados em função das ações que pretendem desenvolver em diferentes situações, sendo a realidade social aquilo que se constrói mediante as práticas sociais concretas que desenvolvem as pessoas e coletivos na vida cotidiana (Ibañez, 2004). A compreensão do conceito de autonomia nesse estudo vai nesta mesma direção. Não se trata de uma noção de autonomia de caráter individual, que responde às lógicas capitalistas de relação com si e com o mundo, mas autonomia enquanto potência construída a partir de encontros. Neste contexto, o objetivo deste artigo é analisar as concepções de autonomia no cotidiano de atenção de um Centro de Atenção psicossocial (CAPS), a partir das vivências de profissionais, familiares e usuários.

 

Método

Esta pesquisa possui delineamento qualitativo transversal, de caráter exploratório. Foi realizada em um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) II da região sul do Rio Grande do Sul/Brasil. O CAPS participante do estudo atende aproximadamente 300 usuários ativos, realizando uma média de 800 atendimentos mensais. No momento da pesquisa, a equipe estava composta por 20 profissionais, nas áreas de psicologia, assistência social, psiquiatria, técnico em enfermagem, educação física, artesanato, música, recepção e limpeza.

Participaram da pesquisa seis profissionais do CAPS, seis usuários do serviço e três familiares, totalizando 15 participantes. Os usuários foram sugeridos pela equipe e os profissionais foram escolhidos mediante o vínculo com os usuários participantes. Em relação aos familiares, a proposta inicial era, a partir de uma conversa com os usuários entrevistados, solicitar autorização para contatá-los. Em duas situações não se concretizou o contato no período previsto para a coleta, e na terceira situação, a usuária informou não ter ninguém que pudesse responder a entrevista. Algumas informações a respeito dos participantes estão descritas na tabela 1.

A coleta de dados foi realizada entre maio e julho de 2017. Entrevistas semiestruturadas foram utilizadas com roteiro que abordou questões referentes ao cotidiano do CAPS, ao entendimento de autonomia e articulação com a rede de saúde. As atividades do CAPS foram acompanhadas por 2 meses, apoiadas em um roteiro de observação que contemplou a dinâmica e relações do serviço, as atividades previstas no Plano Terapêutico Singular (PTS) dos usuários, oficinas, grupos de familiares, assembleias e eventos, que foram descritos em diários de campo. As entrevistas foram realizadas no serviço, com duração aproximada de 40 minutos, as quais foram gravadas e transcritas na íntegra.

Para a análise do material, adotou-se a técnica de Análise Temática, segundo Braun e Clarke (2006). Os passos seguidos no procedimento de análise foram: (a) familiarização dos dados (transcrição e leitura das entrevistas); (b) codificação inicial dos temas e padrões recorrentes; (c) escolha e definição dos temas (análise e relação entre códigos); (d) releitura e revisão dos temas; (e) definição e nomeação dos temas, (f) redação analítica, interligando extratos de falas mais significativos dos temas (Braun & Clarke, 2006).

Essa pesquisa foi aprovada pelos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), respeitando as diretrizes e normas reguladoras de pesquisas envolvendo seres humanos (Resolução n. 510/ 2016).

 

Resultados e Discussão

Os resultados e a discussão são apresentados a partir de dois eixos temáticos: (a) Concepções de Autonomia a partir das vivências de usuários, familiares e profissionais e (b) Práticas de construção de autonomia no cotidiano do CAPS. Os eixos temáticos buscam analisar as concepções atribuídas à autonomia pelos atores sociais envolvidos no cotidiano do CAPS, as intervenções do CAPS e seu potencial no processo de construção de autonomia.

Concepções de autonomia a partir das vivências de usuários, familiares e profissionais

Ao serem questionados sobre o que entendem como autonomia, os profissionais, usuários e familiares trouxeram diferentes compreensões e vivências, como pode ser observado a seguir.

Em termos de atenção psicossocial, acho que tem que considerar as especificidades de cada pessoa. Eu entendo que seja minimamente a capacidade de gerenciar coisas cotidianas, alimentação, vestuário, organização do lugar onde a pessoa vive." (Profissional 3)

Fico bem feliz quando eles (usuários) chegam aqui sem nenhuma autonomia, com uma pessoa cuidando, guiando, e aí passa um tempo e eles estão vindo sozinhos, morando sozinhos, fazendo a comida deles. Eu acho isso maravilhoso." (Profissional 1)

"Ela tem total autonomia com as coisas dela. Ela se organiza, faz higiene, se alimenta. Ela não cozinha, porque a gente não tem esse espaço. Mas ela ajuda, lava, limpa, organiza. Ela estuda, ajuda os outros." (Familiar 3)

As diferentes definições trazidas pelos profissionais e familiares se aproximam do proposto por Leal (2001) e Pitta (1997). Leal apresenta três diferentes formas de pensar os conceitos de autonomia no que se refere à saúde mental, a qual se relaciona com a ideia de independência, autossuficiência e autogoverno. De acordo com a autora, à medida em que o indivíduo consegue estabelecer normas para sua vida diária e estabelecer relações sociais, está exercendo sua autonomia de forma mais, ou menos, ampliada. Outra forma semelhante de compreenderdiz respeito à autonomia como possibilidade de realização de atividades da vida diária/prática de maneira independente, como aponta Pitta.

Neste sentido, é possível observar que as falas denotam a concepção de autonomia relacionada com a perspectiva de gerenciamento da vida, caracterizada pela realização de cuidados diários. Percebe-se que há uma relação intrínseca entre os conceitos 'capacidade' e 'autonomia'. É importante abordar a produção de autonomia em relação às pessoas em sofrimento psíquico que, historicamente, foram consideradas incapazes, e que, para muitos ainda são. Trata-se de compreender que a capacidade de cada sujeito é relativa e varia entre situações particulares, assim, a autonomia está inscrita dentro da realidade das pessoas. Desse modo,na perspectiva da atenção psicossocial,não se buscam padrões para medir o grau de autonomia, mas estímulos para pessoaslidarem com seus limites e, talvez, superá-los.

Neste sentido, para Onocko-Campos e Campos (2007), o processo de promoção de autonomia advém do movimento de construção de sujeitos e coletivos. Nesse entendimento, a autonomia não é estática, mas dinâmica, sendo o sujeito corresponsável pela sua constituição e pela constituição da sociedade, caracterizando a existência de uma dependência multifatorial.

Quando questionados, a maioria dos usuários não conseguiu ou não soube dizer o que entendia por autonomia, e quando o fez, corroborou com a ideia de liberdade de ir e vir e de gerenciamento de vida, o que também foi analisado durante nas observações no CAPS. Apesar de não saberem o significado de autonomia - o que poderia ser trabalhado pela equipe - muitos usuários referiram avanços a partir da atenção recebida no serviço, demonstrando autonomia em suas vivências. Por exemplo, sobre autonomia, a usuária 5 refere: "Eu acho que é ser uma pessoa automática, né? Uma pessoa que quer crescer na vida". Sua fala remete ao entendimento de que autonomia se realiza espontaneamente, ou seja, indica que a vivência não necessita consciência, mas que ocorre no cotidiano. Entende-se que a concepção de realizar as tarefas diárias já é um grande desafio para uma pessoa em sofrimento psíquico grave.

Outro exemplo é da usuária 1, que apresenta um déficit intelectual que dificulta a construção de relações sociais. Apesar disso, a participante comparece regularmente à oficina prevista no seu PTS. Isso representa uma condição de autonomia, à medida em que consegue ir sozinha ao CAPS realizar a atividade, a qual genuinamente tem interesse. Assim como a usuária 03, que conforme relato de seu familiar, antes de frequentar o CAPS não conseguia sair de casa, devido à depressão e ansiedade. Embora ela ainda relate essa dificuldade, comparece assiduamente ao CAPS para participar das atividades previstas em seu tratamento.

Tykanori (2010) aponta que o conceito de autonomia está relacionado à produção de normas e regras de vida do cotidiano. Para o autor, a questão central não é a autossuficiência ou independência, mas sim a interdependência de relações, o que aponta para o estabelecimento de outras normas, escolhas e relações. Tais concepções podem ser observadas na fala anterior do Familiar 3 e pela seguinte fala:

Eu penso que a autonomia tem a ver com as condições de vida também. Do quanto o sujeito é capaz de enfrentar as adversidades, mesmo precisando de outro. Autonomia não significa só fazer as coisas sozinho, a gente depende dos outros... ter com quem contar, ter ajuda para ter autonomia. Saber que pode, que tem direito de acessar os mais diversos setores e serviços. (Profissional 6)

O aspecto referido anteriormente pelo profissional corrobora com o conceito de autonomia proposto por Onocko-Campos e Campos (2007) e Tykanori (2010), de produção de autonomia pautada em vínculos constituídos a partir de trocas estabelecidas, que favoreçam a ampliação das relações interpessoais. Nesta mesma direção, Merhy (2007) refere que a partir do fortalecimento das relações sociais é possível construir novos arranjos de significados, vidas e produções entrelaçados com o outro. Nessa perspectiva, um usuário refere: "E a gente aprende assim, cada um tem um jeito de ser. Não pode querer que a pessoa seja igual a gente. Mas a gente está aqui para aprender, ensinar..." (Usuário 6).

Assim, aprender e ensinar são componentes interdependentes e fundamentais no processo de construção das relações, sendo possível, a partir deste compartilhamento, alcançar os objetivos de vida mais autônoma. Profissionais e usuários devem conectar os interesses de cada um e do grupo, em perspectivas coletivas e individuais, simultaneamente. Para que isso aconteça, é importante o desenvolvimento pleno da atual política de saúde mental, com ênfase no espaço - território, comunidade, família- o qual as dificuldades e potencialidades de interação ocorrem. O trecho de fala a seguir relata o caráter relacional de autonomia:

Autonomia eu entendo que é além de pensar, poder colocar em prática desejos. Poder desejar, né? Pensar, desejar, efetuar, ser escutado. Acho que autonomia fala de escuta, porque está ligada a poder. Empoderamento. Se tu ficas muito tempo sem voz - e a gente faz isso muitas vezes como serviço, não dá voz para o sujeito - tu passas a não ter poder. Tu passas a não ter desejo, porque não precisas, porque está tudo dado, porque tu não és escutado. (Profissional 4)

A articulação entre poder e desejo está relacionada à produção de autonomia. Na mesma direção do que o profissional menciona, Onocko-Campos e Campos, (2007) referem que a autonomianão está pronta e determinada. De acordo com Soares e Camargo (2007), autonomia constitui-se enquanto exercício ético e constante; caracteriza-se por processo de múltiplos encontros entre sujeitos e as relações estabelecidas em rede, com respeito às subjetividades, saberes e valores. Corroborando com essa ideia de autonomia enquanto processo saúde/doença, é preciso romper com a lógica da autonomia absoluta, mas, diversamente, fortalecer os vínculos entre usuários e profissionais da saúde, entre usuários e seus familiares, compreendendo essas redes de autonomia/cuidado constituídas como elementares para o cuidado e para a saúde (Soares & Camargo, 2007).

Práticas de construção de autonomia no cotidiano do CAPS

O conceito de autonomia no contexto da saúde precisa considerar como o sujeito se relaciona com sua rede de apoio. Desta forma, o entendimento do sujeito no serviço de saúde precisa estar de acordo com estratégias de cuidado que possibilite inseri-lo como protagonista. Considerar a autonomia neste sentido também diz respeito à gestão de cuidado, que tem uma implicação política, no sentido da valorização de direitos humanos arduamente conquistados. Portanto, a produção de saúde também deve estar atrelada à coconstrução de capacidade de reflexão e ação autônoma dos sujeitos (Onocko-Campos & Campos, 2007). O trecho a seguir representa o entendimento da importância do serviço enquanto prática de cuidado em saúde que aponta para a construção da autonomia:

Eu penso que todas as propostas as quais se permite ao usuário a expressão, a reflexão, o olhar sobre si, sobre seu cotidiano, as relações interpessoais, são fundamentais para a promoção da autonomia. Quando a pessoa chega no serviço e tem essas oportunidades, a gente já está contribuindo para que ela venha a exercer ou valorizar esse processo de autonomia. (Profissional 3)

A forma de organização do serviço de saúde mental, enquanto serviço de portas abertas, garante ao usuário livre acesso e o direito de escolha sobre o tratamento. Esses aspectos reconhecem a autonomia enquanto princípio e estimulam seu desenvolvimento, em um antagonismo evidente e direto ao modelo manicomial:

A gente reforça isso, se não for em liberdade já vai cerceando ele desta própria autonomia. Que ele possa entender do seu tratamento, desde o cuidado, do pode fazer para o tratamento dar certo, para ele superar a condição que está. (Profissional 5)

O CAPS mudou completamente o conceito de tratar as pessoas. Tratar com jeito de gente. Tratar com carinho. Olhar o ser humano de outra forma e não com aquela forma que usavam... Truculenta, fechada. (Usuário 6)

O acolhimento, sua relevância no estabelecimento do vínculo entre usuários-familiares, equipe técnica e suas funções na viabilização do cuidado assumem novo papel, constituindo-se como oferta de relação e troca, conforme o próprio significado do termo (Ayres, 2004). Observou-se que a equipe utiliza o acolhimento para estabelecer relações mais humanizadas, demonstrando aproximação com a atual Política Nacional de Humanização do SUS (Ministério da Saúde, 2013). Isto corrobora a noção da escuta qualificada como potência na geração de resultados terapêuticos e como elemento fundamental do cuidado. Neste sentido, o usuário ao usar a expressão "olhar o ser humano de uma outra forma", fala das possibilidades desta atenção psicossocial, sustentada pela perspectiva dos direitos humanos, considerando o usuário ativo no seu processo de cuidado.

Nesse seguimento, conforme documento orientador do Ministério da Saúde, o PTS é um conjunto de propostas de ações terapêuticas, decorrentes da discussão coletiva de equipe interdisciplinar, com o objetivo de atender as demandas dos usuários para além do critério diagnóstico (Ministério da Saúde, 2008). Além disso, o PTS é uma estratégia proposta como práxis da saúde mental, que estimula a participação do usuário, incluisua história e necessidades individuais, na perspectiva do seu protagonismo no tratamento (Lancetti, 2015). Ademais, é indispensável que o PTS supere o paradigma biomédico, a partir de ações coletivas desenhadas em conjunto e reavaliadas constantemente com a participação efetiva dos usuários (Barros, 2010). As falas a seguir articulam esta compreensão, ao expressar o entendimento dos profissionais sobre a importância da construção coletiva e do respeito às subjetividades, além de demonstrar sensibilidade em considerar o desejo, sem perder de vista a necessidade de atendimento:

Quando eu faço plano terapêutico, tento considerar os desejos da pessoa, pensar se ela teria algum benefício na atividade. Às vezes a pessoa gosta de uma coisa, mas a proposta não vai incentivar áreas que são importantes. Eu tento às vezes dirigir um pouquinho o plano terapêutico. Mas tento sempre considerar os desejos. Às vezes não é possível. (Profissional 6)

Este fragmento aponta alguns desafios da efetivação da atenção à saúde mental Por um lado, o desejo dos usuários é contemplado, por outro lado, o profissional precisa avaliar quais atividades beneficiariam mais no momento. Nessa sutileza acontece o cuidado em saúde mental, que exige a atenção constante dos profissionais.

Em relação aos usuários, observou-se que elesse consideram ativos na construção do PTS, embora também dependentes do saber técnico da equipe. O fato de eles relatarem não se sentir capazes de tomar decisões sozinhos não indica necessariamente um problema, mas pode denotar confiança na equipe:

A gente escolhe em conjunto com a equipe técnica, para saber o que é melhor para a gente. (Usuário 4)

Me considero meio fraca, meio frágil. Eu peço conselhos para elas. Se eu acho que a medicação que eu estou tomando não está me fazendo bem, eu venho consultar com elas. Ver se elas podem trocar, se podem me dar opinião sobre essa medicação. (Usuária 05)

Alguns usuários participam do processo de decisão do PTS, ainda que a percepção sobre isso não esteja clara. Da mesma forma, eles reafirmam os vínculos com o serviço e equipe e indicam possibilidades de avaliação e escolha que, ao longo do processo, favorecem a autonomia: "Eu não escolhi. Fui olhando, aí eles pediram para eu ir de sala em sala, onde tinha atividade... Aí eu consegui em todas as atividades me dar bem" (Usuário 6). Resgatar a autonomia como condição de saúde e de cidadania, como valor fundamental da vida e ao mesmo tempo, não absoluto, é fundamental. Isso deve ser compreendido como um processo contínuo em uma rede de interdependências, flexível e intrínseca à prática, sendo sujeito autônomo aquele que reconhece também a importância do outro (Soares & Camargo, 2007).

Dar resposta às demandas práticas e subjetivas dos usuários e auxiliar na produção da autonomia e assimilação de seu processo de cuidado representam o principal papel projeto terapêutico conforme Merhy (1999). Para além disso, e de acordo com autores como Mângia (2002), Mângiá e Muramoto (2007) e Boccardo et al. (2011), transformações significativas no cotidiano e o aumento da autonomia dos sujeitos em relação aos serviços de saúde por recursos externos podem ser estabelecidas neste processo.

Os trabalhadores referem que utilizam estratégias individuais e grupais, priorizando atividade de grupos e/ou oficinas. Tal decisão deve-se à compreensão de que essa modalidade favorece a socialização, permite a expressão das emoções e a troca de experiência, como forma de elaboração para lidar com questões comuns do cotidiano. Algumas oficinas possuem caráter profissionalizante, e também funcionam como espaços culturais (Guerra, 2008). Nesta direção os usuários referem:

Eu gosto muito de costurar. Então naquele momento que eu estou ali, com as amigas, às vezes conversando... vendo o talento que eu já consegui... às vezes em casa, eu começo a fazer as florzinhas que eu aprendi aqui no CAPS. Eu me sinto muito talentosa. (Usuário 2)

Eu comecei a ver a vida de outra maneira, a gente fazia várias oficinas, coisas que às vezes a gente tem, pela gente, mas a gente não sabe que pode... O potencial que a gente tem. (Usuário 6)

Em algumas oficinas são produzidos artefatos como bolsas, aventais, quadros, doces e salgados, entre outros, que são assinalados pelos entrevistados como elementos que auxiliam à produção de autonomia. Essas atividades parecem ter importância simbólica para os usuários, uma vez que enxergam sua capacidade para realizar tarefas que não eram possíveis até então e resgatam a noção de capacidade para o trabalho. Alguns usuários usam o que aprendem nas oficinas como forma de trabalho e geração de renda fora do CAPS. O trabalho, mesmo que simbólico, parece ser uma das ferramentas mais potentes de promoção de saúde, à medida que a ideia de estar produzindo algo lhe permite também a sensação de pertença e aceitação na sociedade. Em geral, o serviço apresenta vasta possibilidade de atividades, entretanto, por vezes, a procura torna-se maior que a oferta, implicando em rearranjos na definição do PTS e lista de espera para participação nas oficinas. Assim, compreende-se que isto pode constituir-se em obstáculo da atenção, quando a equipe não consegue proporcionar o tratamento de acordo com a necessidade e também do desejo do usuário.

As atividades realizadas extra CAPS também ganham destaque ao contribuírem para a integração dos usuários no território, promovendo parcerias com outras redes. Além disso, estimulam a convivência e circulação por diversos espaços, constituindo experiências transformadoras para os usuários. Algumas atividades são realizadas em outros espaços ou incluem parcerias com instituições, como atividades nos museus da cidade. Cabe destacar uma oficina desenvolvida semanalmente, a "agenda cultural", que tem como característica a descentralização do usuário do CAPS, promovendo sua inserção na cidade. Assim, possibilita aos usuários novas vivências em relação ao seu território, como expostoa seguir: "Eu conheci muito lugares. Isso eu adorei muito. Conhecer muitos lugares. Porque eu não conhecia, na minha vida" (Usuário 2).

As observações no serviço também salientam o relevante papel que a Assembleia desempenha. A assembleia é um espaço democrático com o intuito de promover a participação sociale o empoderamento dos usuários referente às questões de saúde mental e cidadania. As discussões abordam temas políticos e de direitos, esclarecimentos sobre as práticas do serviço, alémda construção participativa dos eventos do CAPS. Os usuários assumem a coordenação dessa atividade, no gerenciamento de pautas e discussões. Assim, as Assembleias reiteram a importância do CAPS como espaço profícuo de participação e construção do sujeito cidadão.

Todas as práticas destacadas são permeadas por um elemento essencial, o vínculo, observado na confiança depositada no serviço. Esse vínculo é estabelecido a partir de relações de afeto de trabalhadores e usuários, com base no atendimento qualificado, na escuta, favorecendo a comunicação e a confiança (Merhy, 2007).

Em uma das observações, uma usuária estava se sentindo mal e a pessoa que percebeu e iniciou o manejo da situação foi a funcionária de serviços gerais. Ficou evidente que, naquele momento, o vínculo pautado na confiança e no respeito mútuo foi fundamental na realização de um exitoso cuidado. Isso não diz apenas do saber técnico, mas também do ambiente acolhedor no qual todos os profissionais do CAPS constituem a equipe. O afeto pode ser uma ferramenta de transformação, como exemplificado a seguir, na fala de um profissional sobre os elementos que constituem a oficina que ministra: "Para mim, o afeto, no sentido de as pessoas se afetarem pelas relações, é muito importante no processo da reabilitação" (Profissional 3).

A corresponsabilização entre os sujeitos é favorecida pelo estabelecimento de vínculos, traduzidos pelo respeito e valorização mútua de saberes, pela confiança entre os atores, e que propicia a melhoria da qualidade de vida do sujeito em sofrimento psíquico (Jorge et al., 2012). Um trabalho vivo em ato é um encontro entre duas "pessoas", que atuam uma sobre a outra, gerando produtos e expectativas: é isto que ocorre a partir da abordagem assistencial de um trabalhador de saúde junto a um usuário. A confiança, o vínculo e a aceitação são imprescindíveis nos espaços que se pretende que sejam de troca (Merhy, 1998).

Para Jorge et al. (2011), o acolhimento e vínculo são decisivos para o estabelecimento da relação de cuidado entre o trabalhador de saúde mental e o usuário e favorecem a construção da autonomia a partir de pactos e responsabilidades compartilhadas entre os sujeitos envolvidos neste processo. A isto é dado o nome de cuidado integral democratizado e horizontalizado das práticas em saúde que se constrói na perspectiva da autonomia.

 

Considerações finais

Os resultados deste estudo apontam para diversas compreensões atreladas ao conceito de autonomia, que se referem ao gerenciamento da vida prática, à independência e autossuficiência, à capacidade de enfrentamento frente às adversidades da vida, e também como processo em movimento, construído a partir das relações com outros sujeitos, espaços e instituições. Os entendimentos não são dissociados, mas estão atravessados e constituem fundamentalmente a história dos sujeitos.

Assim, evidencia-se a autonomia enquanto potência para a expansão e diversificação das relações, de forma que seja estimulada e agregada ao cuidado oferecido aos usuários, considerando que estes sujeitos sofrem inúmeros limites em relação ao estabelecimento e conservação das relações sociais. Estes limites, muitas vezes os tornam dependentes de poucas relações, restringindo aos espaços pelos quais circulam e constituem suas redes.

A maneira como os CAPS são estruturados, como espaços abertos situados no território dos sujeitos, evidencia a autonomia como inerente ao cuidado. Além disso, aponta-se também a construção coletiva do PTS, as oficinas terapêuticas e atividades extramuros como práticas fortalecedoras de autonomia, à medida em que estimulam a construção de vínculos, de integração e a capacidade de expressão, potencializando a ideia de pertença e acolhimento. Outro aspecto destacado é a importância das Assembleias como práticas potentes de construção e ressignificação de cidadania. A partir de um espaço democrático, os usuários podem reconhecer a força de suas vozes e desejos, enquanto sujeitos políticos.

Para que estas práticas possam ser concretizadas, a constituição de um bom vínculo entre usuário, equipe e instituição faz-se essencial. A partir de relações permeadas pelo afeto, no qual o cuidado é tarefa de todos os atores envolvidos, tem-se a possibilidade de transformação da existência do sujeito e sua forma de se relacionar, dentro e fora do CAPS. Todavia, um empecilho para a construção da autonomia é a dificuldade de pensar e efetivar o processo de alta do CAPS. Este obstáculo relaciona-se aos aspectos de burocratização e fragmentação da rede, que impossibilita o cuidado dos usuários de forma integral. Sendo o CAPS um espaço símbolo de garantias e segurança, isto pode favorecer uma lógica de relação exclusiva de Centro de Convivência pelo usuário, afastando-se das orientações da Política de Saúde Mental, mas sobretudo, obstruindo as possibilidades de construir autonomia e possibilidades de interação com a sociedade.

Como alternativa, é válido apostar e investir no fortalecimento e na articulação com as Associações de Usuários e Familiares. Em geral, as associações, atividades e oficinas também representam a participação social e o engajamento na luta por uma sociedade que cuide com humanidade daqueles que apresentam sofrimento psíquico. Desta forma, também podem contribuir efetivamente para aliviar a excessiva demanda dos CAPS, visto que muitas vezes os usuários permanecem no serviço buscando um espaço que represente cuidado e acolhimento às suas demandas.

A efetivação de Centros de Convivência, enquanto ferramenta para a desinstitucionalização dos usuários de saúde mental também pode contribuir para a coprodução de projetos de autonomia, a partir de novos olhares sobre o território dos sujeitos. Além disto, é imprescindível que se efetive uma rede que atenda às necessidades em saúde dos sujeitos numa perspectiva integral. Para que seja possível o enfrentamento dos problemas relativos à articulação da RAPS, é necessário que o acolhimento, o vínculo e a responsabilização pautem a produção do cuidado (Figueiró & Dimenstein, 2010). Quando defende-se a Reforma Psiquiátrica, defende-se a doença posta em parênteses para que se construa uma nova perspectiva de olhar os sujeitos, que também exige atender de forma integral e humanizada as suas demandas, sempre que for necessário.

 

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Recebido em: 11/12/2018
Aprovado em: 16/07/2019

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