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Revista Psicologia Política

versión On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.21 no.51 São Paulo mayo/ago. 2021

 

ARTIGO

 

Pandemia de Covid-19 e sofrimento psíquico: alguns elementos para uma problematização do Brasil contemporâneo

 

Covid-19 pandemic and psychic suffering: some elements for a problematization of contemporary Brazil

 

Covid-19 pandemia y sufrimiento psicológico: algunos elementos para problematizar el Brasil contemporáneo

 

 

Cristiane Moreira SilvaI; Rafael Coelho RodriguesII

IMestrado em Psicologia. Centro de Ciências da Saúde. Programa de Pós Graduação em Psicologia. Universidade Católica de Petrópolis. Petrópolis-RJ / cristianemoreirapsi@hotmail.com
IICentro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Cruz das Almas - BA / rafaelcoelho@ufrb.edu.br

 

 


RESUMO

Este artigo analisa a gestão biopolítica da pandemia de Covid-19 no Brasil, situando a mesma à racionalidade neoliberal, ao Estado pós-democrático e a democracia securitária que nos atravessam. Uma espécie de governo possível somente através da guerra à própria população. Neste sentido, argumenta-se que o acontecimento junho de 2013 e o movimento conservador que o seguiu foram cruciais para o modo de governamentalidade de nossa contemporaneidade. Escrito em momento agudo dos efeitos da pandemia no Brasil, o texto relaciona os fatores que compõem a gestão biopolítica da pandemia no país ao sofrimento psíquico na população, e como este processo se dá de modo a exasperar as condicionantes sociais, raciais e de gênero na sociedade. Problematizamos os modos de atuação da psicologia neste cenário e convocamos sua dimensão política e social indissociáveis dos cuidados em saúde mental.

Palavras chave: Pandemia; Neoliberalismo; Biopolítica; Psicologia; Sofrimento Mental.


ABSTRACT

This article analyses the biopolitical management of the Covid-19 pandemic in Brazil, placing it within the neoliberal rationality, the post-democratic State and the security democracy that cross us. A kind of government possible only through war against its own population. In this sense, it is argued that the June 2013 event and the following conservative movement were crucial for the way of governmentality in our contemporaneity. Written at an acute moment of the effects of the pandemic in Brazil, the text relates the factors that make up the biopolitical management of the pandemic in the country to the psychological suffering of the population, and how this process takes place in order to exasperate the social, racial and gender conditions in society. We problematize the modes of action of Psychology in this scenario and call its political and social dimension inseparable from mental health care.

Keywords: Pandemic; Neoliberalism; Biopolitics; Psychology; Psychic suffering.


RESUMEN

Este artículo analiza el manejo biopolítico de la pandemia de Covid- 19 en Brasil, situándola en la racionalidad neoliberal, el estado posdemocrático y la democracia securitaria que nos atraviesan. Un tipo de gobierno posible solo a través de la guerra contra la población misma. En este sentido, se argumenta que el evento de junio de 2013 y el movimiento conservador que lo siguió fueron cruciales para el modo de gobierno de nuestra contemporaneidad. Escrito en el apogeo de los efectos de la pandemia en Brasil, el texto vincula los factores que conforman el manejo biopolítico de la pandemia en el país con el sufrimiento psicológico de la población, y cómo este proceso tiene lugar para exasperar las condiciones sociales, raciales y de género en sociedad. Problematizamos las formas en que opera la psicología en este escenario y recurrimos a su dimensión política y social inseparable de la atención de la salud mental.

Palabras clave: Neoliberalismo; Biopolitica; Psicología; Sufrimiento psicológico.


 

 

Introdução

Segundo Caffarena (2020), a pandemia de Covid-19 é constituída por uma crise na saúde pública, com milhões de mortos ao redor do mundo; por uma crise econômica sem precedentes, em decorrência da paralisação da produção e restrição ao consumo imposto pelo período de isolamento social; e por uma crise da saúde mental, com os efeitos produzidos nas subjetividades contemporâneas com a vivência de algo tão aterrador e singular na história desta geração.

Este texto busca traçar alguns elementos que compõem o Brasil no momento em que vivemos esta pandemia. Entendemos que estes elementos são algumas das forças que formam um diagrama do presente e contribuem consideravelmente para potencializar os danos à saúde pública, com mortes que poderiam ter sido evitadas, assim como e, especificamente, os efeitos deste cenário no quadro de sofrimento psíquico da população no período da pandemia e, provavelmente, posteriormente.

Inicialmente, discutiremos alguns conceitos da filosofia política que nos possibilitam pensar suas nuances no Brasil e, depois, brevemente, traçar alguns dos elementos de nosso quadro político contemporâneo que acreditamos contribuir com o aumento do quadro de sofrimento psíquico vivenciado neste período. Por fim, colocaremos em análise as práticas psi em relação a este cenário que buscamos evidenciar, no qual se potencializou os danos à saúde pública e o sofrimento psíquico da população.

 

Racionalidade neoliberal e a guerra permanente

O Brasil tem sido descrito como uma espécie de laboratório desta nova etapa do neoliberalismo, assim como, podemos creditar ao Chile, anteriormente, durante sua ditadura militar. Talvez uma das marcas mais elegíveis desta caracterização seja a Emenda Constitucional 95, conhecida como emenda do teto dos gastos públicos, que estabelece um novo regime fiscal, tornando constitucional a política econômica de austeridade. Essa medida é avaliada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como a medida econômica mais drástica do mundo contra direitos sociais.

Foucault (2008), em curso no qual realizou uma genealogia do neoliberalismo, demonstrou que este é mais do que um sistema econômico, sendo toda uma maneira de reger a vida, os pensamentos, o imaginário social, se constituindo como uma racionalidade.

Temos presenciado mundo a fora, principalmente, a partir da crise do sistema financeiro em 2008, que a crise do capitalismo é, na verdade, uma estratégia na qual o capital consegue produzir mais capital. A crise se torna permanente e, assim, se torna uma estratégia de governo (Laval & Dardot, 2016). O governo pela crise, assim como o Capitalismo de Desastre (Klein, 2008), possibilitam que todas as reformas do Estado até então impensadas, sejam implementadas em tempo recorde. Direitos trabalhistas, direitos à educação e saúde públicas, direitos à cidade, direito ao comum, vão se tornando aos poucos, mercadoria. É a privatização dos meios de vida. A crise de saúde mental anunciada como a quarta onda na pandemia pela Associação Brasileira de Psiquiatria (2020) produziu um discurso que prontamente foi abarcado por profissionais psis (psiquiatras, psicólogos e pessoas sem formação na área mas que adotam em suas práticas, teorias e técnicas suportadas pelos saberes psis) que não foge à está lógica individualizante: mais diagnósticos, mais prescrições psicotrópicas, mais ofertas de psicoterapias diversas.

Segundo Wendy Brown (2019), temos dificuldade em encontrar até mesmo uma nomenclatura que defina o que estamos vivenciando. Pergunta ela: Trata-se de um autoritarismo, fascismo, populismo, democracia não liberal, liberalismo democrático, plutocracia de extrema direita? Ou outra coisa?

Para Casara (2017), a figura do Estado Democrático de Direito, se caracterizava pela existência de limites rígidos ao exercício do poder, e o principal desses limites era constituído pelos direitos e garantias fundamentais. Segundo ele, o que temos configurado não dá mais conta de explicar e nomear o Estado que se apresenta. Hoje, este autor defende que poder-se-ia falar em Estado Pós-democrático (Casara, 2017), pois do ponto de vista econômico, essa configuração do Estado retoma com força as propostas do neoliberalismo, ao passo que, do "ponto de vista político, se apresenta como um mero instrumento de manutenção da ordem, controle das populações indesejadas e ampliação das condições de acumulação do capital e geração dos lucros" (Casara, p. 17, 2017).

Para ele, atualmente, não se trata de ocasionalmente, o Estado recorrer a um instrumento autoritário em plena democracia, mas de reconhecer que esse Estado não pode mais ser tido como democrático, em especial, diante da forma como trata os direitos e as garantias fundamentais. Enfatiza, concordando com Laval e Dardot (2016), que a crise é uma constante do modo de funcionamento do capitalismo e, assim, se transforma em modo de governo.

 

Democracia securitária. Estado penal. Estado de exceção

Para Augusto e Wilke (2019), em seu estudo sobre a caracterização dos governos na era da racionalidade neoliberal, as formas como questões como sociedade, o meio ambiente, o humano, etc., passam a ser legitimadas como objetos de securitização, podendo as decisões políticas a respeito destas passar por cima de uma legitimidade já constituída ou produzindo uma legitimidade ad hoc por questão de necessidade de sobrevivência, atropelam os meios de mediação democrática estabelecidos pelo Estado ao longo do século XX.

Essa ampliação e centralidade da segurança nos levam a concluir que hoje a questão que se coloca para as resistências não é tanto superar o déficit democrático, como colocam Dardot e Laval, e nem que estaríamos vivendo um retorno às formas autoritárias que se acreditavam superadas pela onda neoliberal dos anos 1970 e 1980, como os governos fascistas da Europa no pré-Segunda Guerra Mundial e as ditaduras latino-americanas produzidas como efeito da Guerra Fria. O que propomos é compreender a atual ascensão de discursos e governos autoritários dentro da moldura institucional democrática desde 2016, com Donald Trump (EUA), Matteo Salvini (Itália), Viktor Orban (Hungria), Sebastian Kurz (Áustria), Rodrigo Duterte (Filipinas), Abdelaziz Buteflika (Argélia), Jair Bolsonaro (Brasil), como traço constitutivo de democracias securitárias. Não há uma ruptura institucional, mas precisamente o resultado do processo de ampliação e centralidade da segurança como valor político e social dominante. (Augusto & Wilke, p.204, 2019)

Essa capacidade de tencionar os governos formalmente democráticos para uma guinada autoritária que responde aos clamores populares é possível precisamente porque a racionalidade neoliberal se espraiou como constituição de subjetividades por meio da teoria do capital humano, do empreendedorismo de si e da demanda por uma conduta resiliente.

A mudança de compreensão da relação capital-trabalho para uma relação capital-capital humano coloca a economia como uma ciência do comportamento entendida como a capacidade de adequar meios escassos a fins individuais, produzindo, não apenas uma competitividade entre sujeitos que se veem como unidades empresas, mas também o desejo de eliminação de seus concorrentes, pois disputam meios raros. (Augusto & Wilke, p. 227, 2019)

Deste modo, segundo a análise aguda desses autores, as crises não provocam mais momentos de ruptura, tornando-se o modo mesmo de governar a população. E justamente por isso, deseja-se mais e mais segurança. De modo que, hoje, ao invés de grandes golpes que mudam os rumos da configuração do Estado e da democracia, o que há é o acionamento constante, em nome de uma suposta segurança, de dispositivos de exceção que se tornam regulares e próprios das democracias modernas. Assim, estes autores nomeiam esse modo de governo como democracia securitária, para qual a justiça criminal e as Forças Armadas cumprem papel central. Isso explica, de um lado, a extrema militarização das polícias e, de outro, a policialização dos exércitos (Augusto & Wilke, 2019).

Estas leituras do atual momento do capitalismo e da racionalidade neoliberal que o implementa, embora divergentes em vários aspectos, parecem se aproximar no que tange a violência necessária com a qual o Estado precisa efetivar as políticas econômicas que vem aumentando consideravelmente a desigualdade social. Tudo leva a crer que esta política seja uma continuação da guerra por outros meios, sendo que a paz que ela parece proporcionar "libera tecnicamente o processo material ilimitado da guerra total" (Alliez & Lazzarato, 2018; Pelbart, 2019).

Estamos em guerra. Guerra contra os pobres, contra os negros, contra as mulheres, contra os indígenas, contra os craqueiros, contra a esquerda, contra a cultura, contra a informação, contra o Brasil. A guerra é econômica, política, jurídica, militar, midiática. É uma guerra aberta, embora denegada; é uma guerra total, embora camuflada; é uma guerra sem trégua e sem regra, ilimitada, embora queiram nos fazer acreditar que tudo está sob a mais estrita e pacífica normalidade institucional, social, jurídica, econômica. Ou seja, ao lado da escalada generalizada da guerra total, uma operação que a abafa em escala nacional. Essa suposta normalização em curso, essa denegação, essa pacificação pela violência - eis o modo pelo qual um novo regime esquizofrênico parece querer instaurar sua lógica, em que guerra e paz se tornam sinônimos, assim como exceção e normalidade, golpe e governabilidade, neoliberalismo e guerra civil. Nada disso é possível sem uma corrosão da linguagem, sem uma perversão da enunciação, sem uma sistemática inversão do valor das palavras e do sentido do próprio discurso, cujo descrédito é gritante. (Pelbart, 2018, p. 02)

Alliez e Lazzarato (2016) contestam a separação que Foucault realiza no final de sua obra em relação ao conceito de poder e o de guerra, e sinalizam que o "Capitalismo e o liberalismo carregam as guerras em seu seio como as nuvens carregam a tempestade" (Alliez & Lazzarato, 2016, p. 28). Trata-se, para esses autores, de uma guerra contra a própria população, uma guerra de classes, de raças, de sexos, de subjetividades. Esta guerra mantém e aprofunda as clivagens que atravessam nossas sociedades. Modelo do colonialismo que se dá hoje na metrópole, no que Pelbart denomina uma "espécie de endocolonialismo" (Pelbart, 2019, p. 73).

Essa guerra permanente contra insurrecional não visa, logicamente, a segurança ou a paz, mas a manutenção de um estado de insegurança generalizado, de medo difuso, que justifique precisamente a mobilização incessante, securitária ou salvacionista, desde que ela produza ao mesmo tempo uma espécie de pacificação. Não seria mais uma guerra visando objetivos políticos do Estado, mas do capital. Para Mbembe (2017a), o Estado securitário realiza uma guerra civil silenciosa. Esse Estado securitário necessita fomentar constantemente um estado de insegurança que lhe possibilite existir.

Deleuze e Guattari (2008) também perceberam que a administração de uma grande segurança molar organizada tem por correlato toda uma microgestão de pequenos medos, "toda uma insegurança molecular permanente, a tal ponto que a fórmula dos ministérios do interior poderia ser: uma Macropolítica da sociedade para e por uma micropolítica da insegurança" (Deleuze & Guattari, 2008, p. 94).

As múltiplas guerras em curso hoje contra as populações atestam que o que se governa são as divisões no seio da população, a distribuição diferencial da precariedade - é isso a biopolítica contra insurrecional. Sua matriz continua sendo a guerra colonial, que nunca foi entre Estados, mas sim "dentro e contra a população, onde as distinções entre paz e guerra, entre combatentes e não combatentes, entre o econômico, o político e o militar nunca tiveram lugar" (Mbembe, 2017a). Como mostrou Mbembe (2017b), a escravidão colonial foi o protótipo dessa necropolítica. "A colônia representa o lugar em que a soberania consiste fundamentalmente no exercício de um poder à margem da lei e onde a paz costuma ter o rosto de uma 'guerra sem fim'" (Mbembe, 2017b, p. 32).

Para Alliez e Lazzarato (2018), o estado de exceção descrito por Agamben, é um dispositivo da máquina de guerra do capital. Não à toa, quando a epidemia de Covid-19 chegou ao Brasil a alusão que se fazia era a de uma guerra ao vírus, e os profissionais de saúde aderiram ao discurso de profissionais "na linha de frente do combate", sendo reconhecidos como heróis nessa guerra, recebendo congratulações performáticas em aplausos coletivos previamente agendados enquanto atuavam sem EPIs necessários, em condições precárias, sem direitos trabalhistas garantidos e, consequentemente, fazendo com que o Brasil lidere o número de profissionais de saúde contaminados e, também, os mortos por Covid-19, em sua maioria atuantes na enfermagem em serviços públicos (Conselho Federal de Enfermagem, 2020). Não à toa, essas profissionais são em sua maioria mulheres e negras.

Nesta democracia securitária há a necessidade permanente da construção de inimigos para que o Estado utilize seu poder de matar, a face mais autoritária de um Estado que ao diminuir as políticas no âmbito da assistência a população, precisa se fortalecer para combater esta própria população, nesta espécie de guerra permanente que se tornou a política das democracias securitárias.

A conjuntura política descrita acima, neste momento, torna-se ainda mais violenta, pois a pandemia na qual estamos, como demonstraremos a seguir, faz com que as mazelas desta sociedade se tornem ainda maiores. Augusto (2020) definiu o momento da crise ocasionada pela pandemia, como toda as outras crises, como uma espécie de encruzilhada.

 

O Brasil e a pandemia: Como chegamos nisso que nos tornamos hoje?

Para contextualizar o modo como o governo brasileiro fez a gestão da crise decorrente da pandemia de Covid 19, se faz necessário realizar uma breve análise de como nosso presente se constituiu. Para esta análise, o acontecimento junho de 2013 é essencial. Como todo acontecimento possui inúmeras linhas de forças, uma disputa pelas narrativas e interpretações e alguns dos efeitos produzidos. Um acontecimento que delineou um projeto que chegava ao seu fim, pois algo ali sinalizava seu esgotamento (Multinômade, 2020).

A crise do capital em 2008 marcou um momento no qual as grandes economias do mundo utilizaram recursos do Estado para socorrer o mercado e o sistema financeiro. Uma espécie de solidariedade no prejuízo, enquanto os lucros antes, durante e depois, sempre foram individualizados e legitimam a narrativa liberal do mérito. "Agravante foi o fato deste mercado e sistema financeiro ser socorrido pelo Estado é que foram esses setores que produziram a crise, principalmente, a partir da bolha imobiliária estadunidense" (Multinômade, 2020, p. 13).

Neste período, o Brasil vivia um momento de crescimento econômico, diminuição da pobreza e incremento de políticas sociais e educacionais que permitiam acesso à universidade pública a setores da população que nunca tiveram esse acesso possibilitado, o incremento de políticas de transferência de renda e um fortalecimento do cuidado territorial na atenção básica em saúde que produziu alterações nas curvas das doenças crônicas nas cidades mais pobres e longínquas através do programa Mais Médico (Pinto et al., 2019). Ao mesmo tempo, em meio a várias manobras político-partidárias para a manutenção de uma governabilidade institucional, o partido dos trabalhadores, contraditoriamente, possibilitou através de fartos financiamentos públicos, a educação privada (cada vez mais visando o lucro), o fortalecimento dos planos de saúde e uma política de endividamento de parte vultosa da população que se convencionou denominar "a nova classe média".

Uma política de investimentos públicos com mega obras foi implementada buscando fortalecer o crescimento econômico tendo o Estado como indutor. Este processo contribuiu para esquemas de corrupção e para obras em áreas de preservação ambiental e demarcadas como terras indígenas ou quilombolas. Obras como a barragem de Bela Monte, demonstrou como o crescimento econômico detinha os matizes do projeto civilizacional que tentava se construir. O meio ambiente, os povos originários, como sempre, estavam colocados como inimigos do Estado e do crescimento do capital (Multinômade, 2020).

Segundo o Coletivo Multinômade (2020), enquanto o país "ensaiava um salto que, na verdade, apontava para o atual abismo", as condições de vida passavam por uma mudança silenciosa:

o aumento de tarifas do transporte chegando a 60% acima da inflação; o percentual de famílias endividadas atingindo 45% em 2014 (chegando a 61,2% em 2018); uma triplicação do número de trabalhadores terceirizados (12 milhões), uma quintuplicação do número de pessoas encarceradas (715 mil presos); os gastos das famílias representando 60% dos gastos totais em saúde do país, a rede hospitalar tornando-se 70% privada e apenas 50% das verbas para saneamento básico sendo aplicadas, com um índice inaceitável de apenas 48% de casas com coleta de esgoto. (Multinômade, 2020, p. 12)

Junho de 2013 foi o movimento que, de forma inesperada e avassaladora, suspendeu o moto-contínuo desta falsa preparação e colocou problemas concretos a todos os governos: "menos estádios e mais hospitais", "escolas e hospitais padrão FIFA", "saneamento sim, teleférico não", "todos contra o aumento", "mais livros, menos lacrimogêneo", "fim da corrupção e mais saúde", "democracia real já" etc. (Multinômade, 2020). Um acontecimento! Acontecimento que sacudiu o país e teve uma profunda repressão policial. Após quando o movimento se mostrava inquestionável e ingovernável, uma série de capturas foram produzidas. Assim, a sociedade brasileira não conseguiu produzir um plano de consistência do que ali, naquele breve intervalo de tempo, de tanta intensidade e invenção, vivemos. Um movimento de contrarrevolução parece ter ocorrido de lá pra cá, algo como dizia Florestan Fernandes em relação ao movimento de contrarrevolução permanente que identificou no Brasil. Assim, chegamos em 2020 com olhos assustados pela pandemia de Covid-19, sendo necessário para análise deste período, uma breve história sobre o ano anterior.

O ano de 2019 iniciou e, com ele, o mandato como presidente de Jair Bolsonaro. Nas primeiras semanas de seu governo, em viagem aos Estados Unidos, o presidente declarou, em reunião com empresários, que seu governo teria como objetivo destruir o que havia sido construído no Brasil. E assim, vem cumprindo com o objetivo declarado. Seus ministros são descritos como os ministros que lutam contra as pautas dos seus ministérios, ou seja: o ministro do meio ambiente, ficou conhecido mundialmente por travar uma luta contra o discurso das mudanças climáticas e pelo desprezo com as queimadas e com o aumento do desmatamento na Amazônia. A ministra da família, mulheres e direitos humanos, tem o discurso de luta contra as pautas das minorias, em defesa da família tradicional e contra o feminismo; o ministro da educação (demitido em junho de 2020) fornecia provas diárias de sua luta contra as universidades públicas e o conhecimento produzidos nestas instituições; o ministro da ciência e tecnologia é cúmplice do sucateamento da ciência no governo, com os sucessivos cortes de verbas para a área e com a lógica de valorização das ciências tecnológicas em detrimento das ciências humanas e sociais; Um dos secretários de cultura fez vídeo parafraseando o ministro da cultura do Estado nazista, em uma das etapas de uma guerra cultural que vem se delineando.

Antes mesmo da disputa eleitoral em 2018, já tínhamos no país um cenário no qual a narrativa construída era de que temos uma Constituição Federal que não cabe mais no orçamento público e, por isso, precisa ser alterada, se adequando a atual realidade brasileira. A justificativa para esse quadro seria o cenário de déficit fiscal em que se encontra o Estado desde meados de 2015. Segunda esta narrativa, o aumento dos gastos públicos foi responsável pela construção deste cenário (Carvalho, 2018) e, não, as sucessivas renúncias fiscais iniciadas no governo Dilma Rousseff e continuadas no governo posterior, de Michel Temer, após impeachment da primeira. O plano de governo enunciado pelo partido deste, ainda durante o processo de impeachment, denominava-se "Ponte para o Futuro" e tinha como meta, justamente, promover alterações constitucionais que possibilitariam ao Estado a revisão dos gastos públicos obrigatórios, principalmente, nas áreas sociais. Para tanto, uma série de reformas constitucionais eram prometidas, como as trabalhistas, previdenciárias, administrativa e tributária. Tais reformas, há muito, defendidas pelo mercado e pela mídia de massa, foram encampadas pelo discurso de campanha do então candidato Jair Bolsonaro. No entanto, ele acrescentou alguns elementos cruciais. Um discurso de ódio ao que denomina como "esquerda", chegando a enunciar possibilidades de extermínio destes, e um discurso que envolve uma disputa cultural, no que denomina uma luta contra o marxismo cultural.

O Brasil contemporâneo, se torna, assim, uma espécie de laboratório para outra fase do neoliberalismo, no qual a racionalidade neoliberal está entranhada no modo de vida social e de governo de um Estado cada vez mais autoritário. Talvez não seja mais conveniente aos detentores do capital transnacional utilizar militares para manter uma ordem social do tipo que é necessária para tamanha concentração de renda e produção de riqueza para uma minoria cada vez menor. Hoje a democracia securitária, contrária aos direitos fundamentais e, a partir da guerra como política, implementa a lógica de capitalização e rentabilização de todos os aspectos da vida.

 

"E daí? O que eu tenho a ver com isso?"

No início da pandemia de Covid-19 na Europa, vários pensadores descreviam, tendo Foucault como principal referência, como as sociedades ao longo da história lidaram com as epidemias constituindo, a partir delas, mecanismos e tecnologias de poder para gestão da população. Agamben (2020) buscou sinalizar como a necessidade de isolamento poderia efetivar e atualizar mecanismos de segurança que balizam o que denomina Estado de Exceção (Agamben, 2004).

Augusto e Wilke (2019) referem-se a um Estado Sanitário-securitário implementado em vários países, a partir de técnicas e mecanismos de controle computo-informacionais. Este autor interpelava como tais estratégias de governo e gestão da pandemia poderiam ser implementadas no Brasil, considerando o lugar no qual o país ocupa hoje, como uma espécie de laboratório de um modo de governo no qual vetores hiper-securitários se aliam a destruição de políticas sociais.

No seu livro "Vigiar e Punir" (1994) e no Curso "Segurança, território, população" (1977-1978), (2008), Foucault estabelecendo o que denominou como dispositivos de segurança (mecanismos e técnicas que visam o governo dos acontecimentos, dos fatos aleatórios da existência da população, dos riscos, das séries abertas), complementares aos mecanismos disciplinares, implementam, por sua vez, estratégias de normalização distintas. Estratégias biopolíticas para o governo da população que passam a ser possíveis no momento de uma epidemia. Assim, a epidemia se transforma em estratégia política.

Nesse sentido, Foucault vai destrinchar a transformação dos mecanismos de controle e gestão da lepra na Europa à gestão da peste como processo a partir do qual foi possível a implementação da tecnologia disciplinar de espacialização do poder e suas técnicas de inclusão excludente (Foucault, 1994).

A lepra suscitou na Europa, segundo ele, políticas de exclusão, através das quais, o leproso é visto dentro de uma prática de rejeição e de exílio.

Já na peste, inaugura-se, a partir do final do século XVII, estratégias de controle nas quais o espaço se fecha, é recortado, vigiado em todos os seus pontos. Os indivíduos inseridos em lugares fixos, onde os menores movimentos podem ser controlados, "onde o poder é exercido sem divisão, segundo uma figura hierárquica contínua, na qual cada indivíduo é constantemente localizado, examinado e distribuído entre os vivos, os doentes e os mortos - isso tudo constitui um modelo compacto do dispositivo disciplinar" (Foucault, 1994, pp. 174-175).

A peste como espécie de sonho político a partir do qual, para Foucault, era vista como forma real e, ao mesmo tempo, imaginária da desordem que tem a disciplina como correlato médico e político. A cidade pestilenta, atravessada inteira pela hierarquia, pela vigilância, pelo olhar, pela documentação, a cidade imobilizada no funcionamento de um poder extensivo que age de maneira diversa sobre todos os corpos individuais - é a utopia da cidade perfeitamente governada (Foucault, 1994).

A epidemia, deste modo, possibilita todo o funcionamento de mecanismos de poder disciplinar nos quais um conjunto de instituições e de técnicas assumem como tarefa medir, controlar e corrigir os tidos como anormais, pestilentos, doentes. O funcionamento de modo capilar do poder, nos mais ínfimos detalhes da existência.

Para Preciado (2020), o Estado de Exceção atual se dá como normalização do paradoxo insuportável da biopolítica, assim como constatada por Foucault (2005). Segundo este, é no período histórico em que mais se fala da vida, em defesa da vida, que mais se mata. A partir das estratégias políticas de controle e cuidado com a vida de uns que a vida de outros pode ser suprimida. Preciado (2020) enfatiza que são nos momentos de epidemias e graves crises que se torna possível radicalizar e deslocar as técnicas biopolíticas - anatomia política, inscrevendo-a no corpo individual. Nesse momento é que se torna possível a extensão de técnicas biopolíticas aplicadas apenas a alguns "estrangeiros" para toda a população.

Entendendo que pela imposição de medidas extremas e inflexíveis de um Estado de Exceção que as epidemias se tornam laboratórios de inovação social e oportunidade de reconfiguração das técnicas ao corpo e das tecnologias do poder em grande escala (Preciado, 2020), que Agamben (2020) escreveu textos, muito criticados em relação ao perigo das medidas sanitárias adotadas pela Europa, e mais especificamente, pela Itália, no combate a pandemia de Covid-19.

As estratégias de gestão da pandemia na Europa foram, em sua maioria, medidas disciplinares de isolamento social. Já em países asiáticos, como a Coréia do Sul, técnicas de biovigilância, computo-informacionais, vigilância digital extrema foram introduzidas. Porém, o que se constata no Brasil é uma modalidade de governo da pandemia com características distintas e, talvez, até então, impensáveis.

O Presidente da República construiu uma narrativa que, embora sem incidência nas políticas implementadas na maioria dos Estados, produziu efeitos difíceis de serem mensurados. A narrativa de que a pandemia era apenas uma "gripezinha" e que teria impacto significativo somente nos "grupos de risco", balizou uma ideia de isolamento vertical. Na prática, esse discurso demonstra tacitamente sua veia higienista e pautada pelo darwinismo social. A denominada "imunização de rebanho" provocaria, provavelmente, a morte de milhões de pessoas (El País, 2020).

Porém, essa narrativa construída pelo governo federal evidencia que o "preço a se pagar" por esta estratégia, a saber, milhares de mortes evitáveis, seria melhor do que impactar uma economia já combalida e alterar as chances de uma reeleição. Uma dicotomia foi construída a partir da qual se colocava o problema da salvaguarda da vida da população ou a manutenção da economia e da "vida das empresas". Representantes do setor industrial brasileiro, apoiados na afirmativa de Jair Bolsonaro de que o setor estaria "na UTI", o acompanharam ao STF, em marcha para salvar o "CNPJ da morte", uma alusão à dicotomia espúria CPF X CNPJ, que ficou conhecida pela insensatez e por memes em redes sociais1.

Assim, foi se delineando o modo como o Brasil lidou com a pandemia. Estados e municípios decretaram quarentena, fechando o comércio e serviços não essenciais. Com aproximadamente, 45% de trabalhadores na informalidade, a pressão da sociedade civil e setores do Congresso Nacional contribuiu para a aprovação de uma renda emergencial para os trabalhadores impedidos de trabalhar ou desempregados, durante a crise. Contudo, a demora do governo federal em implementar a distribuição do recurso fez com que milhões precisassem ir às ruas e buscar continuar a ter fontes de renda mesmo durante a pandemia.

Considera-se que a demora pela efetivação do recurso emergencial (mesmo depois, milhões ficaram sem receber) associado ao discurso presidencial de minimização da pandemia e a disseminação de fake news, prática já amplamente adotada no período eleitoral, contribuíram para a dificuldade do isolamento social nas cidades e para uma maior incidência de sofrimento psíquico, uma vez que as autoridades divergiam em relação as medidas necessárias durante a pandemia.

No dia 28 de abril de 2020, o país teve o registro da marca de cinco mil mortes até aquele momento. Perguntado por repórteres sobre o fato, o presidente respondeu: "E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre" 2. Muito criticado por alguns, outros, no entanto, principalmente da grande mídia, demonstraram surpresa.

Por isso, quando o Presidente da República expressa sua pergunta: E daí? O que quer que eu faça? Entendemos que a expressão diz de uma lógica de governo, que governa através da destruição das políticas erigidas nos últimos anos, de crises que se tornam permanente, em um modo de governo que tem sido denominado como desgoverno, a partir do qual uma série de crises são geradas e parecem alimentar esta governamentalidade. Discursos de ódio, uma guerra a cultura, a ciência, e a busca por implementar uma ótica extremamente conservadora à cultura e educação parecem ser estratégias da guerra permanente. Guerra que extermina segmentos bem definidos da população, mas também culturas e modos de vida. Tudo aquilo que numa cultura democrática precisamos estar atentos, ou seja, aos modos de vida que pedem passagem, que estão germinando. Hoje, no Brasil contemporâneo, tais modos de vida são abolidos, em proveito dos valores tradicionais, da heteronormatividade branca, masculina e cristã. Um governo que se faz pela guerra.

E nós, psis, o que temos a ver com isso? Práticas psis e o chamado "novo normal": as determinantes sociais na saúde, sua relação com a pandemia e a psicologia.

As relações sociais de produção dos países determinam condições de vida - necessidades sociais básicas da população - cuja síntese expressa o bem-estar social de suas populações em cada momento histórico (Castro, 2020).

Dimenstein e Siqueira (2020) apontam que o ponto de partida dessa discussão está na compreensão do processo saúde doença como uma construção social. Para isso, o paradigma da "Determinação Social da Saúde" (Garbois, Sodré, & Dalbello-Araujo, 2017), é tomado como base para tal, articulando o conjunto de fatores econômicos, psicossociais, culturais, biológicos e ambientais que incidem sobre a realidade concreta e nas condições de vida, e consequentemente, sobre a situação de saúde de uma população. Nesse sentido, se faz necessário a compreensão das especificidades dos modos de vida nos variados contextos e como as desigualdades sociais são produzidas, articuladas e sentidas no cotidiano. Contudo, segundo Dimenstein e Siqueira (2020), há a necessidade de um cuidado em não estabelecer uma correlação causal entre fator social e saúde/doença. Assim,

A noção de causalidade é substituída, do ponto de vista analítico, pela noção de 'determinação', com base na qual a hierarquia das condições ligadas à estrutura social é considerada na explicação da saúde e doença. Está vinculada à compreensão dos 'modos e estilos de vida', derivados não só das escolhas pessoais, como de fatores culturais, práticas sociais e constituição do espaço. (Batistella, 2007, p. 47)

Essa noção de determinação traz como pressuposto a compreensão da saúde enquanto fenômeno complexo que não se restringe à ausência de doenças. Abarca, desta forma, dimensões individuais, sociais e estruturais, com grande variação entre pessoas e contextos. A noção de determinação porta múltiplos sentidos e expressões, aproximando-se da complexidade e multidimensionalidade da saúde, e requerendo análise "multidisciplinar das formas de organização das sociedades, de sua estrutura social, econômica e cultural, entendendo que esta subordina a dimensão biológica no processo saúde-doença" (Dimenstein & Siqueira, 2020).

Para Butler (2020), a precariedade da vida em escala planetária se tornou evidente, mas nem todas as vidas são dignas de serem lamentadas. A precariedade contínua e intensificada destas vidas, com sua desigualdade social e econômica, racial e de gênero garante a discriminação do vírus.

A partir da noção de determinação social em saúde, verificamos que a pandemia demonstra que a doença não é democrática como tanto se propagou. O risco de contágio e o suporte material do sistema de saúde são amplamente desiguais. Fatos como a primeira morte no Rio de Janeiro ter sido de uma mulher que trabalhava como empregada doméstica, continuou trabalhando, e se contaminou através do contato com a sua "patroa" que voltara recentemente de uma viagem à Europa; e do decreto da cidade de Belém que instituiu o serviço de empregada doméstica como essencial durante a pandemia (Lima, 2020), enquanto que as pessoas mais abastadas daquela cidade estarem se locomovendo de helicópteros para outras cidades quando adoeciam, devido ao esgotamento dos serviços de saúde locais, são exemplos dramáticos e amplamente divulgados dos efeitos da pandemia no Brasil e a influência dos marcadores sociais, de raça e gênero.

Desta forma, percebe-se que a insensibilidade a essas mortes não é a insensibilidade a morte como fenômeno, mas sim, a profunda insensibilidade às mulheres, aos negros, pobres, indígenas, quilombolas, pessoas em situação de rua, moradoras de favelas, detentos e demais minorias que estão mais expostas aos riscos de contágio e ao cuidado precário (Butler, 2020). Não é coincidência, o fato de serem as pessoas pobres e negras as que mais apresentam doenças preexistentes e crônicas e terem dificuldades de manutenção da estabilidade das mesmas.

Tavares (2020) demonstra que a saúde da população negra brasileira, com especial atenção para o aumento do número de mortes e o recrudescimento da violência do Estado no contexto da pandemia de Covid-19 como agravantes do sofrimento gerado pelo racismo. Segundo ela, a exposição continuada e os quadros clínicos prévios elevam o risco de contaminação e morte por Covid-19 (54,8% dos que morreram nos hospitais) ou síndrome respiratória aguda (risco 2,5 vezes maior que entre brancos).

Em uma análise interseccional, evidencia-se que, no Brasil, recortes de classe também estão ligados à raça, uma vez que 75% das pessoas que vivem na extrema pobreza são autodeclarados como negros ou pardos (IBGE, 2018). As iniquidades sociais brasileiras tornam essa camada da população ainda mais vulnerável. Dessa forma, os desfavorecidos socioeconomicamente são representados por minorias raciais e étnicas que trabalham em empregos casuais e carecem de recursos financeiros necessários para o autoisolamento e para os autocuidados com sua saúde mental. "Quando se trata de mulheres negras e pobres, essa situação se torna ainda mais drástica" (Estrela et al., 2020).

A pandemia de Covid-19 torna mais visível uma realidade social que tem sido invisibilizada, que têm a marca do racismo estrutural (Almeida, 2019), a desigualdade social colossal e o machismo (Garrido & Rodrigues, 2020). É nesse cenário em que a psicologia é convocada a atuar.

As medidas de distanciamento e os sentimentos oriundos da situação de pandemia com as diferentes percepções de risco acarretam o agravo da saúde mental. Estudo realizado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro aponta os efeitos da pandemia na saúde mental constatando aumento de 80% dos casos de estresse e ansiedade e a incidência de 90% nos casos de depressão. O estudo indica que as mulheres estão mais propensas a esses efeitos. Diferentes fatores devem ser considerados para além das medidas de restrição de contato. O trabalho doméstico, aumento da demanda de cuidado com os filhos e o crescimento de casos de violência doméstica que chegam em 50% no Rio de Janeiro e em São Paulo. O caso é ainda mais alarmante se considerarmos a maior subnotificação no período (Folha de São Paulo, 2020). Crepaldi et al. (2020) sinalizam, ainda, o sofrimento acarretado por complicações no luto que não tem o sofrimento expresso nos tradicionais rituais de apoio.

Na sequência das medidas de distanciamento social necessárias neste período, a expressão "novo normal" foi integrada aos discursos de profissionais de saúde mental, reproduzida incessantemente pelas mídias e adotada com certa naturalidade. Para além do questionamento do que seria a normalidade, e porque estaríamos desejosos de tal coisa, o novo também não traz nenhum caráter de novidade, de fato. O que vemos no momento é escancarar-se diferenças sócio-econômicas, que repercutem no acesso à saúde, educação, informação e consequentemente agravo de situações de violência e exclusão social. Esse novo normal refere-se às incontáveis possibilidades de atividades mediadas por Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e medidas de proteção somente possíveis aos que tem recursos para estarem em casa, atendidos por delivery, munidos de álcool em gel e internet para manter as atividades anteriores mediadas por tecnologias. Afinal, quem está incluído nessa "normalidade"?

O mercado é ágil, multiplicaram-se serviços de delivery, as aulas de instituições de ensino privadas foram transferidas para o que foi nomeado como ensino remoto emergencial, o mesmo acontecendo com parte considerável dos profissionais que passaram a atuar em home office. Reuniões de amigos, academias, terapias, cultos religiosos, shows, cursos, palestras, compras de todos os tipos, enfim, tudo disponível "na segurança da sua casa" dizem os slogans publicitários.

Psicólogas e psicólogos também não tardaram a oferecerem seus serviços mediados por tecnologias. Atendimentos individuais, em grupos, cartilhas, palestras, lives, frases motivacionais e "dicas". Dicas de cuidados com a saúde mental foram o carro chefe dos discursos psis no período: reserve um espaço específico para o estudo ou trabalho, faça exercícios, medite, tenha lazer, mantenha contato com os amigos, acompanhe seus filhos nas atividades escolares, aprenda algo novo, aproveite o tempo em família, diminua o consumo de informações sobre a pandemia entre outras. Por trás dessas orientações a oferta de serviços. O atendimento on-line é autorizado desde 2012 (CFP, 11/12) com restrições e regulamentado a partir de 2018 (CFP, 11/18) por resoluções do Conselho Federal de Psicologia. Silva, Junior, Andrade e Botelho (2019) já destacavam a atuação desses profissionais em redes sociais que evidenciam discursos acerca de psicopatologias, relacionamentos interpessoais e orientações para uma vida mais feliz. Práticas que podem cooperar para uma produção de subjetividades individualizadas e carentes de orientações de especialistas.

Não podemos desconsiderar os psis militantes na saúde mental pública que desempenham função primordial neste momento fazendo monitoramento dos usuários de seus serviços, oferecendo suporte aos profissionais de saúde, atuando diretamente na assistência social, fazendo a mediação do contato entre famílias e pacientes em hospitais. Entretanto, neste texto problematizamos as práticas psis patologizantes e negligentes com o contexto social, que perpetuam ações individualistas voltadas para adaptação dos corpos e subjetividades. Práticas que encontraram no mercado das subjetividades consumidores para os produtos que disponibilizam.

A Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP) em atenção ao momento inédito de pandemia criou um Grupo de Trabalho de enfrentamento a pandemia que resultou no diretório "Orientações técnicas para o trabalho de psicólogas e psicólogos no contexto da crise Covid-19". Em seu documento inaugural, destaca como a instabilidade e insegurança acarretadas por incertezas nas dinâmicas econômicas, políticas e sociais dominam a população mostrando como "esse cenário deflagra uma crise psicológica sem precedentes, demandando dos profissionais de saúde mental acolhida e manejo terapêutico adequado em situações de crise"(SBP, 2020).

Preocupa-nos as ações da psicologia que negam parte considerável da população que não serão beneficiadas por seus serviços e que sequer tem condições de seguirem as orientações prestadas por estarem ocupadas em sobreviver. Não se trata de ignorar o sofrimento psíquico oriundo das incertezas, lutos e distanciamento social, ou da potencialidade de agravo de problemas de saúde mental no período. Trata-se de convocar a psicologia para a discussão das questões sociais, raciais e de gênero implicadas, para um discurso que abarque as diferenças, para a problematização da gravidade do momento vivido e dos seus efeitos como algo esperado e não como patologias.

Tais práticas psis amplamente divulgadas em diferentes redes sociais com suas dicas para manter a saúde mental na quarentena ou informações para identificar psicopatologia e buscar auxílio profissional reconhecem determinada existência e negligencia as demais.

Afinal, o que desencadeia bournout em home office? O esgotamento ou condições precárias de trabalho, aumento da carga horária, conciliação com serviços domésticos, cuidados com filhos e, ainda, a ameaça de perder o emprego? É esperado que tal situação não acarrete em reações de sofrimento psíquico? Este deve ser medicado ou problematizado? Centrar no sujeito a responsabilidade por seu mal-estar e ensinar formas para amenizá-lo mais cooperam que enfrentam os fatores desencadeantes.

 

Acontecimento e possibilidades de vida

"Um pouco de possível, senão eu sufoco!" (Gilles Deleuze, 1992, p.131)

Neste momento, julho de 2020, temos setenta mil mortos (sem contabilizar os inúmeros casos de subnotificação e aqueles que foram diagnosticados apenas como vítimas de doenças respiratórias agudas). São semanas em que todos os dias temos aproximadamente mil mortes, o denominado platô da curva.

A epígrafe com a frase comunal de Deleuze, na qual suplica por novos possíveis para não sufocar, é aterradora em nosso presente. É justamente devido a falta de ar que se morre de Covid-19. Mbembe (2020) alerta que durante a longa duração do capitalismo foi reservado a segmentos da população ou a raças inteiras a submissão a uma respiração difícil e ofegante, uma vida penosa. Defender e lutar pelo direito universal a respiração, como faz Mbembe, serve de alerta para que aqueles que julgaram que a pandemia era algo democrático, percebam que há uma distribuição profundamente desigual das vulnerabilidades (Mbembe, 2020). A histórica desigualdade de raça, renda e gênero se torna indiscutível no modo como a pandemia afeta essas parcelas da população.

Ao considerar a criação do possível, Deleuze (1992) aponta para a emergência do acontecimento como fato político necessário para o surgimento de novas possibilidades de vida. Segundo ele, o possível não preexiste. Só existem novas possibilidade a partir de um campo aberto com o acontecimento.

Neste sentido, indaga-se se poderia ser a pandemia de Covid-19 um acontecimento na história do país, visto se tratar da maior epidemia em mais de um século. Poderia estar a partir dela, se abrindo um novo campo de possibilidades?

Embora seja difícil mesmo pensar sobre essa questão durante a pandemia, período no qual não conseguimos nem enterrar nossos mortos e vislumbra-se, cada vez mais, uma maior insensibilidade com a morte, diríamos que este processo está em disputa. Podemos disputar o processo e conseguir produzi-lo como acontecimento, a partir do qual, um novo campo de possibilidades pode se abrir. Mas podemos também, buscar restaurar um "normal" que se construiu ao longo da nossa história sobre massacres invisibilizados, violências institucionalizadas e naturalizadas.

No caminho da produção do acontecimento, segundo Deleuze (2016), é necessário certa vidência. Para esta é necessária uma nova sensibilidade, um novo regime de afetos. Nesta vidência coletiva, uma sociedade passa a perceber como intolerável o que, até então, julgava tolerável e normal.

Considera-se que fatores não faltam para que a pandemia se torne um acontecimento. Salienta-se que a gestão política da pandemia é uma forma de organização da vida e da morte. Momento de desenho de estratégias biopolíticas de cuidado com a vida e de modos de implementar a necropolítica do Estado brasileiro. Evidenciou-se, durante este período, a desigualdade social, de raça e gênero e como determinantes sociais no processo de saúde-doença, no processo de vida e morte.

À guisa de conclusão, buscamos problematizar como os modos de gestão no Brasil produzem maior sofrimento psíquico da população. Essa discussão já está posta quando pensamos a saúde e o adoecimento enquanto formas pelas quais a vida se manifesta, experiências únicas, subjetivas (Czeresnia, 1999), que não podem ser discutidas por marcadores biomédicos, estatísticas isoladas do contexto social e analisadores individualizantes. Condições de segurança, alimentação, habitação, renda, cultura, trabalho, lazer, educação, liberdade, acesso à serviços de saúde e garantias de direitos compõem saúde como "o conjunto de condições integrais e coletivas de existência, influenciado pelo contexto político, socioeconômico, cultural e ambiental" (Lopes, 2005, p. 1595). Enquanto práticas psis tratarem os efeitos da pandemia como similares em todas as pessoas e tratáveis por autocuidado, negligenciando o contexto, pouco temos a contribuir enquanto ciência e profissão que se ocupa da saúde mental da população, ao contrário, seremos atuantes na produção dos empresários se si, vendendo serviços e reconhecendo no momento o mercado ideal para essa ciência.

Acompanhamos Despret (2011) quando defende que há versões da Psicologia que marcam um campo de saber e atuação da psicologia, e não uma representação. Há versões da Psicologia que se estabilizaram na pandemia em diferentes campos de exercício profissional: são psicólogas e psicólogos hospitalares que integram a mediação tecnológica em suas práticas, profissionais da atenção básica que buscam recursos tecnológicos para monitoramento e suporte aos estão impedidos de comparecerem aos serviços, grupos que se associaram para ofertar psicoterapia on-line gratuitamente ou pelo chamado "valor social" (expressão que comporta outra discussão) mas a versão que desejamos destacar ganhou força no período, embora já vinha se constituindo anteriormente apoiada em teorias e técnicas comportamentais, ditas positivas ou que recorrem à práticas de meditação, relaxamento entre outras que prometem a manutenção do equilíbrio pessoal. Práticas essas que podemos associar ao empresariado de si e a produção de si mesmo como capital humano.

Foucault (2008) percebeu como no neoliberalismo há uma centralidade do homo economicus, porém, não é uma figura do parceiro da troca como no liberalismo, mas sim, um empresário de si mesmo, no qual se torna ele "próprio seu capital, sendo seu próprio produtor, sendo para si mesmo a fonte de sua renda" (Foucault, 2008, p. 311).

Ao se tornar produtor do seu próprio capital, o sujeito neoliberal busca aumentar competências que são valorizadas pela chave de inteligibilidade conferida pelo mercado. Assim, todas as relações e ações desse sujeito passam pela valoração mercantil, pela análise em termos de ganho de capital que pode suscitar. Não é diferente com a demanda produzida e, tantas vezes reforçada, para e pelas práticas psi.

Mol (2002) afirma que nas práticas, os objetos são feitos (enacted), algo existe por meio das práticas e não antes delas. E para entender essa fabricação, devemos seguir os rastros que as práticas produzem. Psicólogos dão dicas e estas dicas servem a uma determinada classe social. Acompanhem as aulas dos filhos, criem atividades de lazer, façam exercícios físicos, meditem, preservem a privacidade, aproveite o tempo livre para renovar a casa, limitem o acesso às notícias sobre a pandemia. A quem ou ao que servem essas "dicas"? Tais orientações prometem a manutenção do bem-estar e a prevenção do agravo de quadros de saúde mental. Entendemos que estas versões da Psicologia estão comprometidos numa lógica individualizante que patologiza o que é esperado como efeito da vivência deste acontecimento. Quem diante de uma crise socioeconômica e de saúde sem proporções deveria manter a dita sanidade? O mal-estar neste caso não seria sinal de saúde?

A ABP projeta que haverá uma "4ª Onda" de consequências psíquicas da pandemia que deverá se sobrepor às anteriores e superar o número de casos já enfrentados pelo sistema de saúde no mundo. Segundo esta Associação, um número alarmante de transtornos mentais, como os transtornos de ansiedade, a depressão e o transtorno de estresse pós-traumático desafiarão os sistemas de saúde do mundo nos próximos meses a anos (ABP, 2020).

Não se trata de negligenciar os casos de depressão, estresse pós-traumático, ansiedade, consumo abusivo de álcool e ideações suicidas, amplamente alarmados por profissionais de saúde mental que esperam a pandemia da doença mental. Trata-se primordialmente de colocar em análise o que é efeito do distanciamento social ou de questões individuais e o que é efeito da potencialização de fatores como pobreza, dificuldade de acesso à internet, acesso precário aos serviços de saúde, orientações de autoridades conflitantes, entre tantos outros. A esperada pandemia de transtorno mental se daria pelo distanciamento físico ou pelo atravessamento de questões sociais e pela intensificação das mazelas históricas da sociedade brasileira?

 

Considerações finais

Neste texto, buscou-se evidenciar como a racionalidade neoliberal em um Estado cada vez mais autoritário, sustentado por uma democracia securitária, como o que vivemos no Brasil contemporâneo, faz a gestão biopolítica da pandemia de Covid-19.

Argumentamos que as divergências entre o governo federal, os estados e municípios e, principalmente, as estratégias promovidas pela Presidência da República contribuem para aumento do sofrimento psíquico da população, agravando o cenário de mal-estar já esperado devido às próprias exigências de isolamento social, dificuldades oriundas com a renda e o medo da morte.

Somados a este cenário, o Brasil já vivia um quadro de dissolução das políticas sociais conquistadas ao longo das últimas décadas, o que já contribuía para um aumento da desigualdade social, racial e de gênero no país. Estes marcadores são cruciais na compreensão da pandemia vitimar percentualmente mais a população negra e pobre, além da população indígena.

É neste momento triste de nossa história que pesquisas são realizadas e divulgam que as doenças mentais serão um fato que teremos que lidar após a pandemia, uma espécie de 4ª onda. Legitima-se um discurso no qual o sofrimento psíquico vai sendo entendido como doença, passando a ser, neste sentido, patologizado e medicalizado.

Em diferentes momentos históricos uma determinada versão da psicologia vem atuando na supervalorização do ego, com recortes meritocráticos e uma volta do sujeito para si mesmo, que produz o esvaziamento da esfera política. Sujeitos sócio-históricos produzidos por discursos, subjetividades produzidas por propagandas de pessoas vitoriosas, lives de especialistas, entrevistas em mídias diversas que se apropriam desse discurso psi para vender a necessidade de auto superação e, consequentemente, terapias diversas que se propõem ao assujeitamento.

Com este texto espera-se fortalecer uma versão da psicologia apostando na dimensão indissociável da clínica, política e sociedade, que coloque em análise os modelos de vidas neoliberais e que, ao invés de adaptar pessoas à esses modelos, ou tratar os sintomas dos que buscam incansavelmente e não se adaptam, convoquem para outros modos de existir. Espera-se, ainda, contribuir na produção do processo de vidência coletiva para a construção de novos possíveis a partir deste trágico acontecimento que vivemos. Do direito universal à respiração à possibilidade de disputa do acontecimento e abertura de novos possíveis. Respirar senão sufocamos, pois viver é mais do que sobreviver.

 

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Recebido em: 21/07/2020
Aprovado em: 27/11/2020

 

 

1 https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/05/fim-do-isolamento-nao-estava-na-pauta-da-visita-de-industriais-a-bolsonaro-e-guedes.shtml
2 https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/04/28/e-dai-lamento-quer-que-eu-faca-o-que-diz-bolsonaro-sobre-mortes-por-coronavirus-no-brasil.ghtml

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