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Revista Psicologia Política

versión On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.21 no.51 São Paulo mayo/ago. 2021

 

ARTIGO

 

"Trabalhar é preciso, viver não é preciso": ideologia e necropolítica na pandemia covid-19

 

"Working is necessary, living is not necessary": ideology and necropolitics in the covid-19 pandemic

 

"Trabajar es necesario, vivir no es necesario": ideología y necropolítica en la pandemia covid-19

 

 

Rosemeire Aparecida ScopinhoI; João Marcos Leão RoldãoII; Rafael Paulino JulianiIII; Gabriela Perissinotto de AlmeidaIV; Gabriela da Rocha SouzaV

IDocente do Departamento de Psicologia e Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de São Carlos / scopinho@ufscar.br
IIGraduando em Psicologia UFSCar / jm.roldao00@gmail.com
IIIDoutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSCar / rpjuliani@gmail.com
IVDoutoranda - Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSCar / gabriela.perissinotto.almeida@gmail.com
VMestranda - Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSCar / gabeee.rocha@gmail.com

 

 


RESUMO

A chegada da pandemia Covid-19 ao Brasil, em março de 2020, contribuiu para tornar aguda e revelar com nitidez as mais perversas facetas de uma crônica crise sistêmica, acentuada pela falta de consenso entre as diferentes esferas de governo sobre as medidas de isolamento social necessárias para proteger a saúde da população e preservar a economia. Este artigo tem como objetivo analisar a produção discursiva anti-isolamento social do governo brasileiro, entre 26 de março e 02 de junho, início da escalada de mortes no país. Sob a luz do conceito de ideologia proposto por John B. Thompson, analisamos o contexto de produção das formas simbólicas, os mecanismos de operação e as estratégias utilizadas. A articulação dos conceitos de neoliberalismo e necropolítica forneceu elementos para interpretar os sentidos da produção discursiva analisada.

Palavras-chave: Ideologia; Necropolítica; Neoliberalismo; Pandemia Covid-19; Brasil


ABSTRACT

The Covid-19 pandemic's arrival in Brazil in March, 2020, contributed to intensify and clearly reveal the most perverse aspects of a chronic systemic crisis. This was accentuated by the lack of consensus between different government spheres about the measures of social isolation, which are necessary to protect the population health and preserve the economy. This article aims to analyze the Brazilian government's anti-isolation discourse, between March 26th and June 2nd, when the escalation of deaths began in the country. In the light of the ideology concept proposed by John B. Thompson, we analyzed the context of symbolic forms productions, the mechanisms of operation and the strategies used. The articulation of neoliberalism and necropolitics concepts provided elements to interpret the meanings of the analyzed discursive production.

Keywords: Ideology; Necropolitics; Neoliberalism; Covid-19 Pandemic; Brazil.


RESUMEN

La llegada de la pandemia de Covid-19 a Brasil en marzo de 2020 contribuyó para hacer aguda y revelar las facetas más perversas de una crisis sistémica crónica, acentuada por la ausencia de consenso entre las diferentes esferas del gobierno sobre las medidas de aislamiento social necesarias para proteger la salud de la población y preservar la economía. Este artículo tiene como objetivo analizar la producción discursiva anti aislamiento social del gobierno brasileño, entre el 26 de marzo y el 2 de junio, el inicio de la escalada de muertes en el país. A la luz del concepto de ideología propuesto por John B. Thompson, analizamos el contexto de producción de las formas simbólicas, los mecanismos de operación y las estrategias utilizadas. La articulación de los conceptos de neoliberalismo y necropolítica proporcionó elementos para interpretar los significados de la producción discursiva analizada.

Palabras clave: Ideología; Necropolítica; Neoliberalismo; Pandemia de covid19; Brasil.


 

 

Introdução

Pandemia à brasileira: entre a saúde e a economia

No dia 11 de março de 2020, a OMS - Organização Mundial da Saúde (2020) declarou o início de uma pandemia causada por uma nova doença: a Covid-191, acontecimento que causou sofrimento para milhões de pessoas e constrangeu o mundo a repensar a sua forma de organização social. No Brasil, até a finalização deste artigo em 18 de julho de 2020 - apesar da subnotificação - haviam sido, oficialmente, registrados 2.075.246 casos de Covid-19 e 78.817 vidas foram perdidas, números esses que seguiam aumentando diuturnamente (O Globo, 2020).

Apesar de ser causada por um agente biológico, a pandemia estava longe de se restringir a ele e revelava, com nitidez, o caráter social do processo saúde-doença. Assim como a Covid-19 pode se agravar dependendo do histórico de saúde de um paciente, o quadro de instabilidade socioeconômica vivenciado pelo Brasil, durante a pandemia, também agravou as condições históricas pré-existentes da desigualdade social, da crescente precarização do trabalho e do aumento do desemprego estrutural. Os efeitos da crise do coronavírus associavam-se ao fenômeno da globalização e ao modo de produção flexível (Carlos Eduardo Martins, 2020), bem como à emergência de narrativas que buscavam inscrever esse evento em uma ordem simbólica (Javier Alejandro Lifschitz, 2020), o que reiterava o seu caráter político, econômico e cultural.

No contexto da administração pública da crise em território brasileiro, no início da pandemia, foi possível observar um movimento dos governos estaduais e municipais, alinhado com as orientações do Ministério da Saúde, porém, contrário ao posicionamento do gabinete da Presidência da República, para instaurar medidas protetivas para conter o aumento de casos de contaminação e mortes por Covid-19. Na medida em que se acentuavam os conflitos entre o Ministro e o Presidente na condução da política de combate ao vírus e tardavam as medidas do governo federal para proteger a economia e garantir a sobrevivência da população, grande parte dos que dependiam do trabalho formal e ou informal para sobreviver não puderam observar o isolamento social, considerada a forma mais adequada e eficaz de proteção até o surgimento da vacina contra o vírus. Aos poucos, a pressão dos discursos do governo federal e dos empresários para restabelecer a ordem econômica, bem como a preocupação dos prefeitos e governadores com os resultados das eleições municipais previstas para o final de 2020, contribuíram para flexibilizar as medidas que impunham o isolamento social. O governo federal, por sua vez, longe de contribuir com a contenção da crise, retardava a aprovação de programas sociais que poderiam minimizar os problemas econômico-sociais da população e mantinha a posição contrária ao isolamento social, o que provocou grandes polêmicas e polarizações na sociedade civil e agravou ainda mais a realidade sanitária e social vivida no país.

Diante da ausência de uniformidade entre as diferentes esferas do governo nas decisões sobre o combate à pandemia, o discurso do governo federal ganhou destaque e esteve presente, diariamente, nos veículos de comunicação nacionais e internacionais. Não pelo esperado esforço para garantir a saúde e a vida dos cidadãos, mas pela tônica negacionista (e até mesmo conspiratória) ao questionar a existência do vírus, mitigar a gravidade da pandemia e se opor às práticas de distanciamento social, bem como pela convocação obsessiva para a retomada das atividades econômicas, ao custo de muitas vidas, ou melhor, de determinadas vidas.

Este artigo tem como objetivo analisar a produção discursiva anti-isolamento social do governo brasileiro, em especial, do Presidente da República, em meio à pandemia Covid-19, sob a luz do conceito de 'ideologia' proposto por John Brookshire Thompson (2011). A articulação dos conceitos de 'necropolítica' de Achille Mbembe (2018) e de 'neoliberalismo' de Pierre Bourdieu (1998a, 1998b) forneceu elementos para interpretar os sentidos da produção discursiva analisada.

 

Sobre o referencial teórico-metodológico

Para atingir o objetivo proposto, selecionamos uma amostra intencional de fragmentos discursivos do Presidente da República que, expressando a contradição saúde versus economia, advogavam contra a quarentena, ou a favor da sua flexibilização, e de outras medidas de proteção à vida da população. Emitidos entre 09 de março a 02 de junho de 2020 - início da escalada do número de mortes por Covid-19 no Brasil - os discursos foram, amplamente, divulgados pelos meios de comunicação e redes sociais. Em domínio público, a sua utilização para fins científicos é respaldada pela Resolução nº 510/2016, do Conselho Nacional de Saúde.

A análise foi orientada pela categoria analítica ideologia proposta por Thompson (2011), pois a produção discursiva selecionada evidencia a sua utilidade empírica para compreender os impasses vividos pela sociedade brasileira nos meses iniciais da pandemia. Pedrinho Guareschi, Adriane Roso e Denise Amon (2016) apontam que a psicologia social, como campo científico interdisciplinar atento às particularidades dos sujeitos sociais, articula referenciais teórico-metodológicos capazes de nortear a compreensão de novos fenômenos e elege instrumentos analíticos que possam dar conta do teor histórico, político e econômico que transpassa e media a manifestação dos processos psicossociais. Essa categoria tem potência para revitalizar os estudos críticos em psicologia social, porque "a partir dela se potencializam incisões ou rachaduras nos discursos sobre sistemas de poder" (Guareschi et al., 2016, p. 553).

De fato, Thompson (2011) resgata o sentido negativo do conceito ao reconhecer a assimetria das relações sociais, ou seja, que os discursos e as práticas sociais podem estar atrelados aos interesses de grupos hegemônicos. Considera as transformações e demandas do mundo moderno ao levar em conta as diferentes formas de dominação presentes no tecido social, que vão além da luta de classes e se manifestam também por meio de preconceitos raciais, culturais, de gênero, entre outras formas, diferentemente do que propunha o marxismo clássico. Opta pelo sentido dinâmico do conceito como forma de resgatar um paradigma que entende que os sujeitos têm participação ativa nas relações sociais e defende que é por meio da apropriação de construtos sociais por eles elaborados e, adaptando-se às suas identidades, às suas formas de entender o mundo e de se comunicar com os outros, que uma ideologia se estabelece como expressão das relações de poder. As ideologias podem ser tão maleáveis quanto o metabolismo social em que elas se inserem sem que, por isso, percam a sua capacidade de produzir assimetrias. Em resumo, nas palavras do autor:

proponho conceitualizar Ideologia em termos das maneiras como o sentido, mobilizado pelas formas simbólicas, serve para estabelecer e sustentar relações de dominação: estabelecer, querendo significar que o sentido pode criar ativamente e instituir relações de dominação; sustentar, querendo significar que o sentido pode servir para manter e reproduzir relações de dominação através de um contínuo processo de produção e recepção de formas simbólicas. (Thompson, 2011, p. 79, grifos do autor)

De acordo com o autor, do ponto de vista metodológico, trabalhar com este conceito significa analisar o contexto de produção das formas simbólicas, os modos de operação - legitimação, dissimulação, fragmentação, unificação e reificação - e as estratégias típicas utilizadas por cada um deles assim como os sentidos que elas possuem, tanto para quem as produz quanto para quem as recebe. Isto quer dizer que, nem todo conjunto de construtos sociais seria, necessariamente, ideológico, apenas aquele que, sob um determinado recorte socio-histórico e cultural dos grupos sociais envolvidos, está à serviço da criação, reprodução e manutenção de relações de dominação. E quer dizer também que é fundamental verificar o "modus operandi" das construções simbólicas, ou seja, o seu viés estratégico e performático na construção do "sentido a serviço do poder" (Thompson, 2011, p.16).

Para compreender tais sentidos, valemo-nos do conceito de necropolítica formulado por Mbembe (2018), o qual diz respeito ao poder e a capacidade que possui o Estado de exceção para determinar quem pode viver e quem deve morrer, por meio de ações e/ou omissões políticas. Neste tipo de Estado, o trabalho da política, ao invés de garantir a reprodução e a proteção da vida, é realizado no sentido impor medidas dirigidas ao extermínio ou para deixar morrer determinados grupos sociais; a soberania, é tida como o direito de matar ou deixar morrer (de diversas formas) os que, supostamente, não mais importam para servir ao regime político-econômico neoliberal que pretende se fazer hegemônico.

Para Bourdieu (1998a), o neoliberalismo sustenta a utopia da existência de um mercado que funciona em ordem pura e perfeita, cujo discurso acrescenta força simbólica aos que dominam as relações econômicas, o que favorece a ruptura entre a economia e realidade social. Como "um programa de destruição metódica do coletivo" (1998a, para.4, tradução nossa), de "todas as estruturas coletivas capazes de interpor obstáculo à lógica do mercado puro" (1998a para. 5, tradução nossa), especialmente as instituições que defendem os direitos dos cidadãos, esse regime político-econômico impõe a precariedade da vida como a sua marca social típica (Bourdieu, 1998b). Trata-se de deixar os sujeitos em estado geral e permanente de submissão e aceitação da ordem social excludente, de modo que eles não conseguem elaborar projetos de vida de longo prazo e ficam privados das estruturas temporais que organizam a vida social, o que degrada as relações estabelecidas com os outros e com o mundo e afeta, direta ou indiretamente, a convivência social.

Na perspectiva deste quadro referencial, admitimos como pressuposto que os discursos proferidos por representantes do governo federal ao propagarem, reverencialmente, a ideologia econômica do neoliberalismo, tornaram-se mecanismos de uma política de produção de vários tipos de morte - simbólica, subjetiva, social e biológica, como classifica Gabriel Miranda em entrevista concedida a Ricardo Machado (2020) - em detrimento das possibilidades de contribuir para preservar a saúde e a vida dos cidadãos.

 

O contexto de produção dos discursos

Ao contrário do que apregoava o governo brasileiro, a pandemia da Covid-19 não encontrou o país em boa situação política e econômica. Do ponto de vista político, mais de um ano depois da posse, o governo seguia seu curso ainda sem apresentar projetos significativos ou colocar em prática as promessas da campanha eleitoral. Em desarmonia com os outros poderes e com inúmeros segmentos da sociedade organizada, demonstrava grande capacidade de criar polêmicas e destruir os feitos anteriores, especialmente nas áreas sociais.

Gabriel Feltran (2020) mostra que Jair Bolsonaro foi eleito com a promessa de não reproduzir a "velha política" e com um projeto de governo que incluía recriar o Estado, considerado corrupto, ineficiente e ineficaz. Esse projeto pretendia liberar o mercado das travas impostas pelos dispositivos de regulação econômica e outros (os relativos ao meio ambiente, por exemplo), da divisão de poderes existente no interior do Estado e as suas correspondentes práticas institucionais burocráticas que retardam o movimento das forças econômicas. Prometia também banir a criminalidade, eliminar os "diferentes" (aversivas personagens criadas pelos governos de "esquerda") e retomar os valores e costumes tradicionais. O autor ressalta que esse "projeto" teve o apoio de um amplo movimento reacionário e moral de base religiosa nascido nas periferias urbanas na década passada, que incluiu setores da igreja pentecostal e agentes de segurança pública frustrados pela ausência do Estado no controle da violência e pela falta de perspectivas de integração social. Pouco antes das eleições, a eles juntaram-se as elites econômicas, parte dos profissionais liberais e das famílias brasileiras, o que culminou na eleição da figura conservadora de Bolsonaro, sem o apoio da imprensa e de alianças partidárias. Para Feltran (2020, para. 3): "As mudanças em curso no sistema político não me parecem ser a causa [da ascensão de Bolsonaro], mas a consequência da erosão da promessa dupla (integração social e democracia) que chegaria ao nosso tecido social e nunca chegou muito, sabemos."

Este "projeto" político fez sentido para os eleitores de Bolsonaro na medida em que, do ponto de vista econômico, desde meados da década passada, o Brasil vinha registrando quedas na produção, ilustradas pelo sucessivo decrescimento que levou à negativação do PIB - Produto Interno Bruto, entre 2014 e 2016, e a sua lenta recuperação entre os anos 2017 e 2019, que mal elevou o índice em pouco mais de 1%. Entretanto, nem mesmo a nomeação do ultraliberal Paulo Guedes para ocupar o cargo de Ministro da Economia, que divulgou uma ampla agenda de reformas e de privatizações, logrou a melhoria da performance do país rumo ao tão esperado crescimento econômico. Pelo contrário, segundo dados do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2020a, 2020b, 2020c), no primeiro trimestre de 2020, 50% da população brasileira vivia com renda igual ou inferior a oitocentos e cinquenta reais mensais, o que correspondia a 81% do salário mínimo vigente no país, e 12,9 milhões de pessoas encontravam-se desempregadas. Além disso, o mercado de trabalho informal que, em 2017, era constituído por 37,3 milhões de pessoas, passou para 38,4 milhões no ano de 2020 - número superior ao de trabalhadores formais. O IBGE (2020c, 2020d) estimava que mais de 31,1 milhões de brasileiros não possuíam acesso à rede de água tratada; aproximadamente, 12,2 milhões moravam em residências superlotadas, com mais de três moradores por dormitório; e a oferta de leitos hospitalares e melhores condições sanitárias estavam desigualmente distribuídas no território nacional.

A chegada da pandemia contribuiu, crescente e rapidamente, para tornar ainda mais aguda e revelar com nitidez as mais perversas facetas de uma crônica crise sistêmica instalada e, de certa forma, naturalizada há décadas por diferentes governos e diversos segmentos sociais, que atingiu principalmente as áreas da saúde, economia, relações de trabalho e emprego, assistência social, segurança pública, sistema habitacional, educação, entre outras. Ameaçou a sobrevivência dos mais empobrecidos porque potencializou os efeitos da crise e colocou em xeque as estratégias e ações cotidianas, até então, instituídas para lidar com eles. Os problemas estruturais da sociedade brasileira, por si só, denunciavam a incompatibilidade estarrecedora entre as realidades sociais de tantos cidadãos marginalizados e as condições mínimas de salubridade para conter o avanço do vírus, o que inviabilizou a adoção de ações preventivas contra a Covid-19 (Santos, 2020). Essa afirmação materializava-se nos obituários das periferias de grandes centros urbanos e das regiões sociodemográficas mais pobres do país. Segundo Samuel Vida e Felipe Milanez (2020), negros morriam cinco vezes mais de Covid-19 em relação aos brancos e indígenas tinham o índice de infecção 744% maior.

Enquanto grande parte da classe média e alta refugiava-se em suas casas, para trabalhar em home office, o precariado estava desamparado pelo Estado e arriscava a vida em busca de sustento. Expondo-se aos riscos de contágio, muitas vezes sem as condições laborais necessárias para a proteção, durante a pandemia esses trabalhadores sustentaram, não somente a si e as suas famílias, mas também a chamada "cadeia produtiva essencial". De modo a garantir a saúde desses trabalhadores, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, alertou sobre a necessidade de os Estados nacionais abrirem mão do pragmatismo ideológico neoliberal e comprometerem-se com a garantia de renda e de segurança social, bem como com a definição de políticas de isolamento social pautadas na ciência.

Pessoas sem fonte de renda regular ou sem qualquer reserva financeira merecem políticas sociais que garantam a dignidade e permitam que elas cumpram as medidas de saúde pública para a Covid-19 recomendadas pelas autoridades nacionais de saúde e pela OMS. Eu cresci pobre e entendo essa realidade. Convoco os países a desenvolverem políticas que forneçam proteção econômica às pessoas que não possam receber ou trabalhar devido à pandemia da Covid-19. Solidariedade. (Ghebreyesus, 2020, on line, tradução nossa)

Entretanto, estas sugestões não foram observadas pelo governo federal brasileiro (Fernanda Cimini et al., 2020). Entre as falhas atribuídas ao governo no combate ao coronavírus destacaram-se: a ausência de uma política nacional de enfrentamento da pandemia coordenada com as demais instâncias administrativas para a testagem em massa da população e para a aquisição de equipamentos médicos essenciais, assim como a adoção de ações mais restritivas quanto à circulação de pessoas e programas sociais que sustentassem a permanência delas em isolamento social. Somou-se a isso o empenho do Presidente da República, de representantes e apoiadores do governo em fazer declarações negacionistas e contrárias às recomendações dos organismos internacionais de saúde, por exemplo, ao advogar, insistentemente, pelo não fechamento ou reabertura dos comércios e incentivar os trabalhadores a reassumirem seus postos de trabalho, ao invés de cumprir as regras do isolamento social.

 

Os discursos e os seus propósitos

Sob o pano de fundo político e econômico, sumariamente apresentado no tópico anterior, e diante do avanço da pandemia foram produzidos inúmeros discursos anti-isolamento social como forma de enfrentar os seus impactos na economia e no mundo do trabalho.

A legitimação é um modo de operação da ideologia muito presente nos discursos que procuravam justificar e angariar apoio popular para o fim e/ou flexibilização do isolamento social. Neste modus operandi, inserem-se as estratégias de construção simbólica racionalização, universalização e narrativização.

A racionalização respalda-se na elaboração de uma argumentação a respeito da natureza e das intervenções possíveis sobre um determinado problema sem que haja, necessariamente, respaldo factual ou científico. Trata-se da disseminação de ideias questionáveis sob um frágil verniz de racionalidade, na tentativa de construir raciocínios tidos como coerentes para se referir a fatos controversos.

Podemos elencar várias alternativas defendidas pelo governo, que supostamente freariam ou minimizariam o avanço do problema epidemiológico, como a aposta no uso do medicamento antimalárico cloroquina (e seu derivado, a hidroxicloroquina), a despeito da falta de comprovação científica sobre a sua eficácia para o tratamento da Covid-19 (Geleris et al., 2020; Rosenberg et al.2020), de modo a evitar a necessidade de isolamento social horizontal. São exemplos desta estratégia as seguintes frases do Presidente da República: "Aquele remédio lá, hidroxicloroquina, está dando certo em tudo o que é lugar" (Mariana Sanches & Matheus Magenta, 2020) e "O meu entendimento, ouvindo médicos, é que ela [cloroquina] deve ser usada desde o início para quem está no grupo de risco, pessoas com comorbidades, com idade, deve ser usada a hidroxicloroquina." (Band Jornalismo, 2020, 4:10 min.). Outra tentativa de Bolsonaro para legitimar a aversão de parte do seu governo à quarentena foi a defesa do isolamento vertical, isto é, o isolamento social restrito aos grupos de risco. Quando o país atingia mais de 13 mil mortes (13 de maio de 2020) o Presidente disse: "No meu entendimento, desde o início, deveria ser o [isolamento] vertical, cuidar das pessoas do grupo de risco, e botar o povo pra (sic) trabalhar." (Band Jornalismo, 2020, 0:36m) e "o grupo de risco é o das pessoas acima de 60 anos. Então, por que fechar escolas?" (TV BrasilGov, 2020, 2:30 min.). Esta tese ignorou o comportamento de transmissão do vírus e a atestada ineficácia do isolamento vertical para contê-lo, demonstrada em projeções cientificamente rigorosas (Ferguson et al., 2020).

O Presidente também buscou estabelecer a sua própria teoria sintomatológica em relação ao novo coronavírus. A estratégia da narrativização foi encontrada nos discursos que anunciavam que pessoas saudáveis (ou com "histórico de atleta") e empregadas estariam menos suscetíveis à doença. "No meu caso particular, pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar, nada sentiria." (TV BrasilGov, 2020, 3:05 min.). Ao atingir 1.933 mortes (16 de abril de 2020): "Uma pessoa desempregada estará mais propensa a sofrer problemas de saúde do que uma outra empregada." (Planalto, 2020a, 2:13 min.). E também pode ser reconhecida nos discursos em que o Presidente tentava convencer o país de que, antes da pandemia, a economia estava muito bem: "Estávamos praticamente voando no final do último trimestre [de 2019]. Tudo estava indo muito bem e o Brasil tinha tudo para dar certo no curto espaço de tempo"(Planalto, 2020a, 11:33 min.).

A estratégia de universalização, descrita como a apresentação de um padrão valorativo e ações que interessam para alguns como sendo, igualmente, válidas para diferentes problemas e distintos grupos sociais, foi encontrada nos discursos que procuravam distorcer a natureza e as condições de manifestação da enfermidade e da pandemia para legitimar o pensamento contrário ao isolamento social. Com 159 mortes (30 de março de 2020), as consequências dos problemas epidemiológicos foram equiparadas às dos problemas econômicos, em complexidade, perdas e importância: "Vai morrer gente? Vai, como tem morrido algumas pessoas. Mas temos outro problema: o desemprego. Não é apenas questão de vida, é questão de economia, de desemprego. Se a economia continuar desandando, vai haver morte também" (Gazeta do Povo, 2020); e "Morre muito mais gente de pavor do que do ato em si. Então, o pavor também mata, leva ao estresse, ao cansaço, a pessoa não dorme direito, fica sempre preocupada" (Jair Bolsonaro, 2020a, 3:09 min.).

A economia e a saúde coletiva seriam os polos opostos de uma realidade inevitavelmente trágica, na qual haveria remédio apenas para uma em detrimento da outra. Essas narrativas só faziam incitar o medo do caos econômico, como se ele já não fosse realidade para uma significativa parcela da população. Para as pessoas de baixa renda que viviam nas periferias urbanas, em residências superlotadas, sem acesso às condições mínimas de saneamento básico (IBGE, 2020a, 2020b, 2020, 2020d) e sob a ameaça constante do terror das milícias, a condição de vulnerabilidade já era observada e demandava atenção do Estado e das políticas públicas, mesmo antes da chegada da crise biológica de fator global. Era de conhecimento do governo e de seus representantes as condições inumanas vivenciadas por grande parte dos brasileiros, principalmente os pretos e pobres.

Ao eximir-se da proteção à vida, principalmente a dos mais prejudicados pelas desigualdades sociais e, ativamente, incentivar os trabalhadores para retornar ao trabalho, geralmente precário e sem garantia de proteção contra o vírus, o governo optou pela estratégia de imunização de rebanho como forma de enfrentar a pandemia (Campos, 2020). Ao tentar impor a exposição dos corpos ao vírus colocou em prática um tipo de gestão governamental que tinha plena ciência de quais sujeitos poderiam (ou até mesmo deveriam) morrer em decorrência disso. Sob a ótica do conceito de necropolítica (Mbembe, 2018) pode-se dizer que, opostamente à ideia do mártir que morre levando o inimigo consigo, o governo federal brasileiro procurou agir de modo a deixar matar os mais vulneráveis para preservar o seu projeto de poder.

A dissimulação, modo de operação das formas simbólicas caracterizada pelo desvio de atenção e confusão proposital da realidade concreta com a intenção de ocultá-la ou suavizá-la, também pode ser identificada nas produções discursivas a respeito do patógeno e das alternativas existentes para contornar o problema econômico. Entre as estratégias, inserem-se a eufemização, o tropo e o deslocamento.

A eufemização, ou seja, a utilização de termos que buscam ocultar ou minimizar a gravidade ou negatividade de uma situação, foi identificada nos discursos que descreviam as consequências fisiológicas do contágio da Covid-19, ignorando a gama sintomática da doença, as sequelas e os sofrimentos daqueles que foram por ela acometidos: "ou seria, quando muito acometido, de uma gripezinha ou resfriadinho" (TV Brasil Gov, 2020, 3:18 min.). O tropo - estratégia que consiste na utilização de recursos semânticos (como a metáfora, no caso) na tentativa de equiparar aspectos distintos de determinada realidade, sem considerar as suas devidas particularidades e proporções - pode ser identificada nos discursos que reafirmavam a alegada dicotomia entre saúde e economia ao comparar a propagação do vírus ao irrefreável avanço de uma chuva breve: "O vírus é igual a uma chuva, vem e você vai se molhar. Você não vai morrer afogado. Em alguns casos, lamentavelmente, haverá afogamento" (Brasil Urgente, 2020). Quando as mortes atingiram 9.146 (07 de maio de 2020), as dinâmicas financeiras nacionais foram comparadas ao metabolismo de um ser biológico: "A economia não pode parar por que economia também é vida ... a indústria, a atividade comercial está na UTI" (Bolsonaro, 2020b, 0:18 min.). Ainda, a evocação de um comandante em batalha, que estaria diante da ingrata e difícil tarefa de escolher entre dois eventos para que o menor número de vidas fosse perdido, foi utilizada como exemplo de conduta a ser seguido durante uma crise epidemiológica: "É igual um comandante em batalha: ele tem que decidir. Vai morrer gente? Infelizmente, vai morrer gente ... agora a quantidade de vidas que vai se perder lá na frente pelo caos na economia, por esse lockdown na economia, vai ser muito, mas muito maior" (Jornal do Brasil, 2020). Em ambos os casos, houve tentativa de equiparar a fragilidade e a dor da morte biológica a uma inevitável e irreversível morte comercial. E quando o Presidente foi questionado sobre o número de mortes, disse: "E daí? Eu sou Messias mas não faço milagres" (Poder 360, 2020a, 17:13 min.); "não sou coveiro" (Poder 360, 2020b, 5:16 min.), como se isto não tivesse importância ou não fosse responsabilidade de quem governa o país. Mais importante era chamar a atenção para o potencial que teria o vírus para destruir a economia "máquina de moer empregos ..." (Planalto, 2020a, 6:19 min.).

O deslocamento, mais uma das estratégias da dissimulação, que transfere características positivas ou negativas de uma pessoa ou coisa para outra para disfarçar as reais intenções de um indivíduo ou grupo social, pode ser observado, por exemplo, quando Bolsonaro afirmou, ainda antes de haver mortes, que "outras gripes mataram mais" (Emilly Behnke, 2020).

A fragmentação é um modo de operação da ideologia muito prevalente no discurso político de Jair Bolsonaro, a qual caracteriza-se pela produção de alteridade, isto é, o apontamento de pessoas e/ou grupos sociais considerados "adversários", "marginais" ou "retardatários" em relação a dinâmica social desejada pelo conjunto dominante, o que requer combatê-los ou, pelo menos, negligenciá-los. Com isso, os grupos dominantes podem elaborar uma versão paralela dos fatos, que preconize um compromisso com os seus interesses em detrimento da verossimilhança com a conjuntura do país. São estratégias mobilizadas por esta categoria a diferenciação, o expurgo do outro e a estigmatização.

A diferenciação, fundamentada na ênfase das diferenças e divisões entre grupos sociais destoantes, pode ser identificada nos discursos que procuravam delimitar as possibilidades de contágio aos cidadãos mais vulneráveis (doentes, idosos e pobres). Essa linha de raciocínio foi utilizada para apontar tais pessoas como "impedimentos" ao retorno da ordem econômica e argumentar em favor da flexibilização das medidas de proteção de caráter geral. Esta estratégia pode ser identificada no discurso feito no dia em que o número de mortes foi de 17.971 (19 de maio de 2020), para designar aqueles que discordavam das políticas governamentais, generalizando-os como "os de esquerda" e incentivando a polarização política em discussões que deveriam ser mediadas pela ciência como, por exemplo, o uso do medicamento cloroquina: "Quem for de direita toma cloroquina. Quem é de esquerda toma tubaína" (Julia Lindner, 2020).

O expurgo do outro pode ser identificado nas formas simbólicas analisadas. Trata-se de eleger um ou mais inimigos da sociedade e atribuir a culpa dos transtornos sociais e das ameaças à ordem para grupos específicos. As falas evidenciam que o governo federal procurava transmitir a ideia de que não era responsável pelos problemas sanitários e socioeconômicos do momento. Pelo contrário, os principais culpados seriam as instituições e os agentes políticos mais ativos no combate à Pandemia, que implantavam medidas de proteção mal-intencionadas, irresponsáveis e desconectadas dos anseios e dos planos do povo.

São exemplos de expurgo do outro: "Brevemente o povo saberá que foram enganados por esses governadores e por grande parte da mídia nessa questão do coronavírus" (Domingo Espetacular, 2020, 7:02 min.); "Os senhores [empresários], com todo o respeito, têm que chamar o governador [de São Paulo] e jogar pesado, jogar pesado, porque a questão é séria, é guerra" (Huffpost Brasil, 2020); "Então, o que parece que está acontecendo é uma questão política, tentando quebrar a economia, para atingir o governo. É isso que parece que está acontecendo" (Huffpost Brasil, 2020); "O desemprego, a fome e a miséria será (sic) o futuro daqueles que apoiam a tirania do isolamento total" (Bolsonaro, 2020c).

Essa é a Organização Mundial da Saúde que muitos dizem que eu devo seguir no caso do coronavírus. Deveríamos então seguir também diretrizes para políticas educacionais: satisfação e prazer ao tocar o próprio corpo (masturbação); expressar suas necessidades e desejos por exemplo, no contexto de 'brincar de médico'; as crianças têm sentimento sexuais mesmo na primeira infância. (UOL Notícias, 2020a)

Outras figuras públicas corroboravam essas ideias. Destaca-se uma fala do médico e deputado federal Osmar Terra, governista que o Presidente considerava uma importante referência científica na área da saúde: "a quarentena só trouxe sofrimento, desemprego e sofrimento pros (sic) mais pobres, quem tem dinheiro no banco e geladeira cheia tá (sic) curtindo a Netflix, a grande maioria não tá (sic) curtindo nada e tá (sic) sofrendo muito" (CNN Brasil, 2020a, 59:42 min.).

As falas transcritas que exemplificam o modo de operação fragmentação, seja por meio da estratégia de diferenciação ou pelo expurgo do outro, remetem a uma técnica típica dos formuladores de necropolíticas que é criar um inimigo ficcional. Isso porque é a partir da diferenciação do outro, mecanismo que opera por meio do racismo, que é possível decidir quais vidas são úteis e quais são descartáveis (Mbembe, 2018). No contexto brasileiro, outros marcadores sociais somam-se à raça, como classe e gênero.

No discurso, ao mesmo tempo em que atuavam a fragmentação e a diferenciação, também foi possível reconhecer o modo de operação unificação e a estratégia da padronização. Ao equiparar a pandemia da Covid-19 a da gripe H1N1 ocorrida em 2009: "No passado - 2009, 2010 -, tivemos uma crise semelhante, outro problema [de saúde] aqui no mundo. ... E a reação não foi nem sequer perto dessa que está acontecendo hoje em dia aqui no mundo todo" (CNN Brasil, 2020b, 3:38 min.).

Constata-se ainda a indiferença do sistema ideológico em análise ao caráter socio-histórico, cultural, político e até mesmo científico do fenômeno pandêmico da Covid-19, típico do modo de operação denominado reificação. Os defensores do fim da quarentena idealizavam a naturalização do espalhamento do vírus, rechaçavam a necessidade de intervenção do poder público na contenção da Pandemia, insistiam que o ritmo e a dimensão do contágio na população eram inexoráveis e defendiam uma postura passiva frente ao "inevitável" número de óbitos.

Até mesmo o sistema imunológico dos brasileiros estaria naturalmente "blindado" ao novo patógeno devido a sua exposição às precárias condições de saneamento básico. A falta de rigor científico e factual típica da naturalização associava-se, argumentativamente, com a racionalização nos discursos. Este modo de operação está explicitado nos seguintes fragmentos de discurso do Presidente: "Até por que o brasileiro tem que ser estudado. Ele não pega nada. Você vê o cara pulando em esgoto ali, sai, mergulha, tá (sic) certo? E não acontece nada com ele." (UOL Notícias, 2020b), com 77 mortes (26 de março de 2020); "vamos enfrentar o vírus com a realidade. É a vida. Todos nós iremos morrer um dia" (Jornal do Brasil, 2020); "Não precisa dessa gana toda para conter o vírus, o vírus vai atingir no mínimo 70% da população... esse lockdown agressivo não dá certo, e não deu certo em nenhum lugar no mundo" (Bolsonaro, 2020d, 7:45 min.). E com 31.199 (02 de junho de 2020): "A gente lamenta todos os mortos, mas é o destino de todo mundo" (Ingrid Soares, 2020). Para o médico e deputado federal Osmar Terra: "esta epidemia tem começo, meio e fim, ela está seguindo uma trajetória que independeu da quarentena" (CNN Brasil, 2020a, 59:34 min.).

Por fim, destaca-se também um conjunto de frases que negavam a existência do vírus e da própria pandemia. A negação, apesar de não ser descrita por Thompson (2011) como sendo um modus operandi ou estratégia de construção ideológica, perpassou todos os discursos, principalmente no início da pandemia, o que tornou o governo de Jair Bolsonaro internacionalmente conhecido pela sua postura negacionista de um processo que atingia a população mundial. Nas redes sociais, várias pessoas disseminaram teorias da conspiração e fake news na tentativa de negar os fatos, entre elas o próprio Presidente, que preferiu atribuir a escalada de casos e de mortes por Covid-19 aos agentes econômicos e políticos adversários que, ardilosamente, pretendiam atrapalhar ou derrubar o seu governo.

Como exemplos, foram selecionados os seguintes excertos das falas: "Tem a questão do coronavírus também que no meu entender está superdimensionado o poder destruidor desse vírus, então talvez esteja sendo potencializado até por questão econômica" (Beatriz Bulla, 2020a); "Muito do que tem ali é muito mais fantasia, a questão do coronavírus, que não é isso tudo que a grande mídia propaga" (Bulla, 2020b); "Parece que há interesse por parte de alguns governadores de inflar o número de vitimados do vírus" (Pedro Caramuru, Gregory Prudenciano, & Gustavo Porto, 2020); "Se for (sic) todo mundo com coronavírus, é sinal de que tem estado que está fraudando a causa mortis daquelas pessoas, querendo fazer um uso político de números. ... em São Paulo não estou acreditando nesses números" (Brasil Urgente, 2020, 21:26 min. ); e "a maioria das mortes não tem nada a ver [com a COVID-19, na Itália]" (Brasil Urgente, 2020, 6:32 min.).

O período analisado neste artigo foi muito rico no que se refere à produção e veiculação de formas simbólicas para sustentar o projeto neoliberal e necropolítico do governo Bolsonaro, a partir da ideia de que a pandemia veio para inviabilizá-lo e destruí-lo. Além dos trechos destacados, muitos outros poderiam ilustrar essa construção. Para finalizar, destacamos uma frase do Presidente que é emblemática da campanha governamental, criada no final de março de 2020, cujo slogan "O Brasil não pode parar", evidencia a intenção de sobrepor a preservação da economia em detrimento da saúde. Embora a campanha tenha sido embargada pela justiça como propaganda oficial do governo, ela seguiu sendo propagada pelo Presidente e pelos seus apoiadores:

O Brasil tem que trabalhar. O maior remédio para qualquer doença é o trabalho. Temos que trabalhar ... Estamos tomando providências para que quem tem emprego vá trabalhar. Porque depois que perder, vai levar anos para conseguir de volta, e as consequências são enormes. (Brasil Urgente, 2020, 26:57 min.)

No escopo deste artigo, não cabe desenvolver a discussão sobre a relação saúde-trabalho. Apenas é importante frisar que, de fato, é amplamente sabido que o trabalho pode ser um "remédio", um importante fator de desenvolvimento biopsicossocial e cultural. Porém, não é qualquer trabalho e, nem tampouco, trabalhar pode ser indicado como terapêutica para qualquer doença, principalmente as infectocontagiosas. É também amplamente sabido que o trabalho, realizado sob condições precárias e de risco iminente para os trabalhadores, pode levar ao desgaste, à doença e à morte.

 

"Trabalhar é preciso, viver não é preciso"

Parafraseamos a antiga frase "Navegar é preciso, viver não é preciso", utilizada em verso por Fernando Pessoa e objeto de variadas interpretações na literatura e usos nas artes, que inspirou o título deste artigo e a questão proposta para discutir neste tópico: por que o Brasil não pode parar ou por que trabalhar é preciso, viver não é preciso?

Para Thompson (2011), os discursos ideológicos são consubstanciados na esfera político-econômica e não sobrevivem no vácuo, pelo contrário, eles fazem eco no tecido social. Os sentimentos de angústia e de preocupação dos trabalhadores brasileiros, pré-existentes à Pandemia, acentuaram-se com o advento dela e as pesquisas de opinião pública tentavam dimensionar a atmosfera de medo do endividamento, do desemprego e da falência que pairava sobre o Brasil desde março de 2020. Cresceu a pressão sobre o governo por medidas emergenciais de contenção das crises sanitária e econômica. O que está em questão não é a legitimidade dos medos e angústias que recaíram sobre centenas de milhares de famílias, do trabalhador informal ao microempreendedor, mas o uso político delas na disseminação de uma narrativa para sustentar o governo e os grupos dominantes.

As aparentes preocupações governamentais para criar as condições para a população enfrentar a Pandemia, por meio da geração e manutenção de renda, nem sempre tornaram-se medidas concretas. As que se efetivaram foram marcadas pela ineficiência e ineficácia do governo no seu gerenciamento. Por exemplo, a Renda Básica Emergencial de seiscentos reais - medida proposta pelo congresso nacional após grande pressão popular - embora insuficiente, possibilitou um breve respiro aos milhões de brasileiros que foram afetados pela calamidade. No entanto, a burocracia para o acesso aos recursos, as inúmeras fraudes denunciadas e as incertezas sobre a sua continuidade reafirmaram-na como mais um fator de marginalização dos trabalhadores vulneráveis. O boletim da Rede de Pesquisa Solidária (2020) mostra que, nas principais capitais do país, o auxílio emergencial mal conseguiu cumprir, adequadamente, a sua função de manter os trabalhadores em isolamento social.

Quando as unidades federativas pediram ajuda financeira à União para atenuar os efeitos da paralisação das atividades produtivas, os conflitos entre o Presidente e os governadores impediram que os decretos fossem assinados com rapidez. Quando os trabalhadores precisaram de segurança para manterem-se empregados ou, ao menos, os seus direitos em relação à rescisão dos contratos de trabalho, as medidas provisórias 927/2020 e 936/2020 estipularam condições que aprofundaram o quadro de flexibilização do trabalho (Alberto Emiliano Oliveira, 2020). Ainda, quando os proprietários de micro e pequenos negócios necessitaram de ajuda para custear as operações e manterem as portas abertas, a maioria teve o acesso negado às linhas de crédito prometidas (Fundação Getúlio Vargas e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, 2020), fato evidenciado pela fala do Ministro da Economia Paulo Guedes na reunião ministerial de 22 de abril de 2020: "Nós vamos ganhar dinheiro usando recursos públicos para salvar grandes companhias. Agora, nós vamos perder dinheiro salvando empresas pequeninhas" (UOL Notícias, 2020c).

Segundo a economista Mônica de Bolle, o Brasil foi na contramão do que fez a maioria das nações para controlar os efeitos da Pandemia, até mesmo daquelas governadas por neoliberais e conservadores. De Bolle aponta a ineficácia e a ineficiência do governo federal para formular medidas de contenção das crises econômica e epidemiológica, bem como a insistência obsessiva pela retomada plena das atividades econômicas durante o avanço da Pandemia.

Esse comportamento muito irresponsável do Presidente da República, ele desvia o foco das atenções, [do] que precisa ser feito neste momento, tanto do ponto de vista da assistência e dar capacidade ao sistema de saúde quanto do ponto de vista econômico. A gente está vendo no Brasil respostas lentas a uma crise muito rápida e que bate na economia de forma muito rápida. Se a gente olhar, por exemplo, para o que está acontecendo em outros países, em termos de como a epidemia chegou e como as respostas de política econômica foram dadas com celeridade, o Brasil está extremamente letárgico e isso vai ter consequências. Porque, independentemente desse debate, o que acho completamente absurdo, sobre a necessidade ou não de uma quarentena, o impacto sobre a economia, de uma letargia na resposta econômica, vai ser tão brutal quanto o impacto da epidemia em si. (TV Cultura, 2020, 5:41 min.)

A aposta na intensificação do processo de precarização do trabalho, na contenção dos gastos na área da saúde e na negação de responsabilidades para garantir a segurança sanitária e a contenção do vírus, simboliza que o governo "lavou as mãos" e delegou para as "mãos invisíveis" do mercado (e da Pandemia) a definição dos rumos da vida de milhões de brasileiros. Seja criando as suas próprias interpretações para as dinâmicas da Pandemia e da economia, seja postergando as respostas governamentais para as crises econômica e sanitária, em pronunciamento oficial de 08 de abril de 2020, Bolsonaro insistiu em afirmar que "As consequências do tratamento [isolamento social] não podem ser mais danosas do que a própria doença [pandemia]" (Planalto, 2020b, 1:44 min.). Com isso, mais uma vez, menosprezou, intencionalmente, a gravidade da crise sanitária e o valor das vidas, além de adotar uma postura política omissa como representante de Estado que, na prática, sustentou a morte de milhares de brasileiros.

A produção discursiva analisada denuncia um governo que, em plena Pandemia, submeteu-se à cartilha de austeridade, depositou as esperanças de retomada do crescimento econômico no aprofundamento da precarização do trabalho e propagou um ideário necrocapitalista, como sinaliza João Ricardo Dornelles (2020), porque é predatório das condições de vida dos sujeitos.

as formas clássicas do capitalismo liberal - ou mesmo do capitalismo de bem-estar social das experiências social-democráticas - fundamentavam a sua existência na ideia de direitos, de democracia liberal representativa e de uma razão emancipatória, presente nos fundamentos do pensamento liberal clássico. O hipercapitalismo neoliberal afasta-se desses fundamentos, escancarando a essência do capital e sua lógica de acumulação. Neste sentido é que, mesmo considerando que todas as formas de capitalismo são predatórias das condições de vida, o capitalismo contemporâneo despe-se de todos os véus que poderiam esconder a sua verdadeira natureza. Portanto, mais do que nunca, é um capitalismo de barbárie, um capitalismo de morte, o necrocapitalismo. (Dornelles, 2020, pp. 94-95, grifos do autor)

Como aponta Mbembe (2018), tal forma de exploração humana é possibilitada pela interação com uma expressão de soberania extrema por parte do Estado e dos grupos dominantes que, instituindo regimes autoritários em países colonizados utiliza a força bruta, monopoliza o poder de decisão sobre a vida, gera extermínio de povos, acentua a opressão sofrida pelas minorias, legitima a morte dos considerados inúteis ao status quo. Para os regimes necropolíticos "exercitar a soberania é exercer controle sobre a mortalidade e definir a vida como a implantação e manifestação de poder" (Mbembe, 2017, p. 123).

Porém, o caráter necropolítico que orientou Bolsonaro na gestão da pandemia é anterior à ela e manifestava-se nos ataques sucessivos aos programas sociais criados em governos anteriores, ao Sistema Único de Saúde (a extinção do Programa Mais Médicos, por exemplo), bem como na aprovação de reformas (trabalhista e previdenciária) com potencial para aprofundar as desigualdades sociais. Assumindo um patamar incompatível com a democracia, os maiores beneficiados com essas medidas governamentais foram o mercado financeiro e a elite nacional, ou seja, os agentes que mais se dedicavam a fortalecer a mentalidade de indiferença e o desamparo estatal aos sujeitos vulneráveis, para possibilitar que as narrativas do medo, expressas no discurso que levavam à escolha entre trabalhar ou viver, fossem reproduzidas na sociedade.

O discurso bolsonarista, emergente na sociedade brasileira desde meados de 2014, penetrou no governo e no seu grupo de apoio. Reservadas algumas particularidades, a figura de Jair Bolsonaro representava o movimento e as pautas do populismo conservador, de caráter demagógico e elitista (Feltran, 2020; Mayra Goulart, Paula Frias, & Luan Guedes, 2020). No entanto, a truculência desse discurso político foi além da "falta de modos" dos representantes do governo. Trata-se de uma estratégia política que foi sendo, cada vez mais, utilizada radicalmente pelos apoiadores do presidente. Como afirma Tânia Maria Oliveira (2020), governos populistas, autoritários e de inspiração fascista como esse necessitam do enfraquecimento das instituições do Estado Democrático de Direito, justamente, porque elas possuem as condições para limitar os seus projetos autoritários e deter a assunção repressiva em direção a uma ditadura de novo tipo, que não necessita de ruptura formal. De igual modo, agem para calar qualquer divergência e crítica de adversários políticos, sejam partidos, pessoas, sindicatos ou coletivos. Flertando há muito tempo com uma escalada autoritária foi, sobretudo, na pandemia de Covid-19 que o Presidente encontrou uma oportunidade para concretizar, rapidamente, tais objetivos. Uma aposta na morte de tudo aquilo que é considerado descartável e na consolidação de um regime necropolítico brasileiro.

Examinando a produção discursiva deste período, pode-se dizer que, a cada racionalização de concepções científicas distorcidas; naturalização das tragédias e transtornos causados por fenômenos biossociais complexos; universalização de leis, cenários e perdas completamente distintas entre si; e a cada negação de fatos que estavam escancarados na realidade brasileira foi crescendo, exponencialmente como a curva dos dados de contágio pelo vírus, a aposta na morte como forma de legitimar a narrativa desse regime. Morte da ciência e da razão como norteadora de políticas públicas; da capacidade de ação do Estado em defesa da vida; da honestidade intelectual; da responsabilidade coletiva. A cada diferenciação entre os riscos de vida que atingiam diferentes sujeitos pertencentes a diferentes grupos sociais; eufemização de uma doença que leva aos limites da dor e do pânico, parte da fraternidade humana foi morta. O valor da existência de pessoas marginalizadas foi relativizado, deixado ao descaso das estatísticas subnotificadas, em nome da manutenção do status quo. A cada expurgo do outro, incitação à perseguição, construção de inimigos a serem destruídos, Bolsonaro e seus apoiadores almejavam a morte das instituições, dos ideais republicanos, do diálogo, do tecido social democrático. Partindo para o tudo ou nada, o Presidente cultivou o caos social para colher ditadura, como apontaram Juliana Neuenschwander e Marcus Giraldes (2020), ao estimular o aumento de mortes por Covid-19 e boicotar as medidas de socorro social e econômico que seriam necessárias para preservar empregos e combater a fome.

Finalizamos este artigo em julho de 2020, momento em que, com quatro meses de pandemia e 78.817 mortes contabilizadas, mantinha-se constante a marca diária de mais de mil óbitos pela Covid-19 e ainda não havia perspectivas de diminuição. A maioria de gente invisível: idosos, negros, moradores da periferia, moradores de rua, habitantes de estados distantes das rotas de circulação de pessoas e mercadorias. A comoção e o choque atenuavam-se. As filas voltavam a crescer. O trânsito voltou a se congestionar. As vitrines do comércio foram preenchidas e ornamentadas. As estatísticas adequaram-se às páginas dos jornais. A vida, mais trágica do que nunca, ansiava por voltar. Trabalhar, como sempre, é necessário, viver é para quem pode. Em silêncio, a catástrofe repousava sob a trágica normalidade brasileira. Em silêncio, e sem direito a velório, quem estava à margem dos planos dessa normalidade, padecia.

Outros acontecimentos na cena política ameaçavam o governo Bolsonaro, mas, ainda era possível identificar inúmeras ideias e práticas negacionistas da Pandemia. Desde a falta de nomeação de ministro para ocupar a pasta da saúde, que tem funcionado sob o comando de militares sem formação na área que economizavam gastos com equipamentos indispensáveis, até os vetos de inúmeros dispositivos que procuravam dispor sobre o uso obrigatório de máscaras de proteção contra o vírus no país, garantir auxílio emergencial e outras condições para os indígenas enfrentarem a Pandemia, facilitar o acesso dos pequenos negociantes ao sistema de crédito, prorrogar a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia, entre outras manifestações governamentais necropolíticas. Quem e como sobreviverá?

 

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Recebido em: 20/07/2020
Aprovado em: 01/12/2020

 

 

1 Doença infectocontagiosa de alta transmissibilidade decorrente de um novo coronavírus (SARS-Cov-2), de maior risco para idosos e pessoas que apresentam comorbidades (The Novel Pneumonia Emergency Response Epidemiology Team, 2020). Ocupando leitos de terapia intensiva e milhares de profissionais de saúde, a Pandemia desafiou governos e instituições de saúde na implantação de medidas de contenção ao espalhamento do vírus, entre elas: a higienização adequada dos corpos e do ambiente, o uso obrigatório de máscaras faciais, a proibição de aglomerações e a imposição de restrições para a circulação de pessoas e para o funcionamento do comércio não-essencial durante períodos de quarentena ou lockdown. (Iamarino, 2020; Ferguson et al., 2020)

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