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Stylus (Rio de Janeiro)

versão impressa ISSN 1676-157X

Stylus (Rio J.)  no.27 Rio de Janeiro out. 2013

 

ENSAIOS

 

O forçamento por onde o psicanalista pode fazer ressoar outra coisa1

 

The forcing where the psychoanalyst can echo another thing

 

 

Ana Laura Prates Pacheco*

Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano - EPFCL - Brasil
Fóruns do Campo Lacaniano - FCL - SP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A proposta deste trabalho é a de articular as consequências dos avanços elaborados por Lacan em seu último ensino, para a experiência psicanalítica. Se a correspondência entre a linguagem e o real é da ordem do impossível, se a transmissão integral é impossível, a pergunta que não se cala é qual a resposta ética do psicanalista quando o destino da mensagem passa a ser o ab-sens da relação sexual humana, relação essa que não é natural, mas "tomada pelas palavras"? Essa é a questão clínica e ética essencial: a psicanálise não visa tanto à verdade por trás do que isso quer dizer, mas antes, o fato de "que se diga". Para além do sentido, o psicanalista faz ressoar outra coisa – afirma Lacan em 1977. Para tanto, é preciso o que ele chama de "forçamento", que remete ao ato analítico como resposta, sem o qual a psicanálise pode vir a capengar irredutivelmente a um "autismo a dois" (LACAN, 1977). É preciso, assim borrar a diferença entre a verdade e a ficção já que "o que o analisante diz, esperando verificar-se, não é a verdade, é a vari(e) dade do sinthoma". Mas atenção: essa despretensão da verdade não justifica em absoluto um relativismo da desconstrução, já que as "verdades mentirosas" apontam todas para o real de que o gozo é a castração. Eis a ousadia clínica e ética que a psicanálise oferece: a aposta no bem dizer como resposta do psicanalista diante do impossível de dizer tudo é o que se espera de uma clínica que inclua passe. Lá, onde não há Outro que responda, nem sujeito que corresponda. Lá, onde não há carteiro da verdade há, entretanto algo que a letra/carta carrega: o valor sonoro da função poética, que toca o real, para além do valor semântico da verdade – e que faz ressoar no corpo (encore). Eis as questões que pretendo abordar neste trabalho.

Palavras-chave: Psicanálise, Interpretação, Escrita, Poética.


ABSTRACT

The proposal of this paper is to articulate the consequences of the advances elaborated by Lacan in his later teaching, for the psychoanalytic experience. If the correspondence between language and the real is from the order of the impossible, if the integral transmission seems impossible, the crucial question is: What is the psychoanalyst's ethical response when the destiny of the message becomes the ab-sens of the human sexual intercourse, which is not natural, but "taken by the words"? This is the clinical question and essential ethics: psychoanalysis does not seek so much the truth behind what it means, but the fact should "reveal itself" beforehand. For beyond the sense, the psychoanalyst echoes something else – claims Lacan in 1977. For this, it is necessary what he calls "forcing", which refers to the analytical act as response, without which psychoanalysis can limp irreducibly to an "autism of two" (Lacan, 1977). Thus, it is necessary to blur the difference between truth and fiction since "what the patient says, expecting confirmation, is not the truth, but the variety of the symptom". But, attention: this lack of pretension of the truth does not at all justify a relativism of deconstruction, since the all the "lying truths" point to the real that jouissance is the castration. Here is the clinic and ethical boldness Psychoanalysis offers: the bet on the well saying as the psychoanalyst's response facing the impossible of saying everything that is expected from a clinic that includes pass. There where there is not the Other to answer, neither a subject that corresponds. There where there is not a postman of the truth there is, however, something that the letter carries: the sound value of the poetic function, which touches the real far beyond the semantic value of the truth – and that it makes it echo in the body (encore). Those are the questions I intend to deal with in this paper.

Keywords: Psychoanalysis, Interpretation, Writing, Poetic narrative.


 

 

O título deste trabalho foi extraído de uma frase de Lacan (1976-77/inédito) na aula de 18 de abril de 1977, do Seminário 24 L'insu que sait de l'une bévue s'aile à mourre:

A interpretação é o forçamento por onde um psicanalista pode fazer ressoar outra coisa, outra coisa que o sentido, porque o sentido é o que ressoa com a ajuda do significante, mas o que ressoa, isso não vai longe, é antes de tudo fraco. O sentido, isto tampona, mas com a ajuda daquilo que se chama escrita poética vocês podem ter a dimensão do que poderá ser a interpretação analítica.

Com essa mesma frase eu havia concluído minha apresentação no Encontro Nacional de Salvador (Brasil, 2011), denominado Por uma prática sem valor: a suficiência e a conveniência poética do psicanalista (PACHECO, 2012).2 Naquele texto, eu havia partido da questão colocada por Lacan no próprio Seminário L'insu: "seria o psicanalista, poeta o suficiente?"; e em meu desenvolvimento, destaquei que a articulação entre interpretação e poesia e, portanto, as leis da linguagem, estão presentes no ensino de Lacan pelo menos desde os anos cinquenta. A pergunta que então me colocava era se a interpretação seria homóloga à estrutura do inconsciente, e encaminhei minhas respostas a partir de três recortes: 1) Um significante irredutível; 2) Um dizer; 3) Um significante novo.

Mas, o que haveria em comum entre o cálculo do poeta e o do psicanalista? Eis a questão a partir da qual pretendo avançar hoje com este trabalho. A frase de L'insu, na qual Lacan menciona o forçamento que faz ressoar outra coisa, precede uma observação sobre a relação entre a poesia e a escrita, que absolutamente não é óbvia, já que ele afirma não ser por meio da escrita que a ressonância do corpo se exprime. Lacan estava se referindo especificamente à poesia chinesa, afirmando que há aí uma particularidade da relação entre escrita e som que poderia ensinar algo ao psicanalista.

Ora, essa particularidade também havia sido destacada por Jakobson (1960/1969) no texto Linguística e Poética, ao qual Lacan retorna longamente nessa aula. Essa retomada é bastante instigante, já que no Seminário 20 (LACAN, 1972-73/1992), entretanto, ele havia advertido que seu dizer: o inconsciente é estruturado como uma linguagem não é do campo da Linguística, mas da Linguisteria. Isso porque, se o significante é causa do gozo, é no nível da substância gozante que ele deve ser situado. Em L'insu, contudo, Lacan (op. cit.) não hesita em citar Jakobson, e precisamos entender suas razões.

Resgatemos brevemente as ideias defendidas por Jakobson nesse texto. Ele advoga ser a Poética um assunto da Linguística, e não apenas da Crítica literária.

O pendor para a MENSAGEM como tal, o enfoque da mensagem por ela própria, eis a função poética da linguagem. Essa função não pode ser estudada de maneira proveitosa, desvinculada dos problemas gerais da linguagem e, por outro lado, o escrutínio da linguagem exige consideração minuciosa da sua função poética. Qualquer tentativa de reduzir a esfera da função poética à poesia ou de confinar a poesia à função poética seria uma simplificação excessiva e enganadora (JAKOBSON, op. cit., p. 128).

E ele acrescenta: "A função poética projeta o princípio de equivalência do eixo de seleção sobre o eixo de combinação. As sílabas se convertem em unidades de medida, e o mesmo acontece com as moras e acentos" (Ibid, p. 130).

Retomo esse ponto porque um dos argumentos daqueles que opõem Poética à Linguística é o de que a primeira se ocuparia de julgamentos de valor. Eis um aspecto crucial abordado por Lacan (1959-60/1988) desde o Seminário 7 – A Ética, quando aponta para a relação paradoxal do desejo com o belo, assim como para a função do belo no "domínio cifrado do valor da obra de arte" (p. 289).

Ora, em L'insu, Lacan (op. cit.) é bastante explícito:

Nós não temos nada a dizer de belo. É uma outra ressonância que se trata de fundar sobre o chiste. Um chiste não é belo. Ele não consiste senão de um equívoco, de uma economia. A economia funda o valor. Uma prática sem valor, eis o que se trata para nós de instituir.

Primeiro ponto a ser destacado, portanto: a função poética não é tomada nem por Jakobson nem por Lacan por seu valor estético. Poderíamos afirmar que o primeiro a eleva a uma dimensão estrutural da linguagem, enquanto o segundo desloca o plano estético para o ético. Mas, lembremos mais uma vez que Lacan também aproximara, no início de seu ensino, a estrutura do inconsciente e a da interpretação à poesia. Como não posso me alongar nos limites deste trabalho, mencionarei apenas duas referências paradigmáticas:

A primeira em Função e Campo da fala e da linguagem (LACAN, 1953/1998), cujo subtítulo da parte 3 é exatamente: As ressonâncias da interpretação e o tempo do sujeito na técnica psicanalítica. Ali, Lacan já vincula a interpretação à resposta própria do analista, contanto que se faça um retorno ao uso de seus efeitos simbólicos, "evocando-os deliberadamente nas ressonâncias semânticas de suas colocações" (Ibid., p. 295). Para tanto, seria preciso por parte do analista "uma profunda assimilação dos recursos de uma língua e, especificamente, dos que se realizam concretamente em seus textos poéticos" (Ibid., p. 296). A segunda em A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud (LACAN, 1956/1998), quando apresenta a estrutura metafórica "que indica que é na substituição do significante pelo significante que se produz um efeito de significação que é de poesia ou criação" (Ibid., p. 510).

Aqui, entretanto, Lacan parece estar apontando para a própria estrutura da linguagem, com sua dupla função: a referencial e a poética; demonstrando com Jakobson (op. cit.) que:

Qualquer mensagem poética é, virtualmente, como que um discurso citado, com todos os problemas peculiares e intrincados que o 'discurso dentro do discurso' oferece ao linguista. A supremacia da função poética sobre a função referencial não oblitera a referência, mas torna-a ambígua. A mensagem de duplo sentido encontra correspondência num remetente cindido, num destinatário cindido e, além disso, numa referência cindida. (p. 150)

A função poética, portanto, por sua própria estrutura, permite apontar o intervalo e a divisão subjetiva pela via do duplo sentido. Mas em L'insu podemos constatar que há um giro do plano das ressonâncias semânticas e do efeito de significação para o plano do sentido: "a metáfora e a metonímia não têm peso para a interpretação, ele diz, senão enquanto capazes de exercer a função de outra coisa. E essa outra coisa da qual ela faz função é bem aquilo pelo que se unem estritamente o som e o sentido" (LACAN, 1976-77/inédito). O próprio Jakobson (op. cit.) adverte que seria uma simplificação abusiva tratar a rima meramente do ponto de vista do som, e cita Valéry que descreve a poesia como a hesitação entre o som e o sentido.

Ora, não é exatamente o mesmo articular a poesia à significação – ou referência, como às vezes é traduzido (Bedeutung) ou ao sentido (Sinn). Aqui, é preciso tomar certos cuidados, já que em vários textos, sobretudo dos anos cinquenta, Lacan utiliza os termos sentido, significação e significado de modo pouco rigoroso. Em pelo menos duas ocasiões, entretanto, antes dos anos setenta, ele parece utilizar o termo Bedeutung de modo forte: a primeira é no texto A significação (Bedeutung) do falo (LACAN, 1958/1998), que dá nome ao texto. A segunda é quando define a fantasia, no texto Subversão do sujeito e dialética do desejo (LACAN, 1960/1998) como o "índice de uma significação absoluta". Aliás, a indicação de Frege de que a referência de uma proposição é seu valor de verdade é bastante coerente com a posição sustentada por Lacan quanto à lógica do fantasma. A partir de O Aturdito, entretanto, Lacan (1973/2003) está bastante advertido do fato de que a significação é a margem da linguagem que diz respeito à função referencial. Podemos afirmar que o que está em jogo na noção de referente – enquanto significação – é, nada mais nada menos, que o debate sobre a relação com a realidade, em Frege, e com o Real, em Lacan.

Não estou, evidentemente, sugerindo que a interpretação deveria visar ao sentido, mas, ao contrário, apontando que a função poética, por privilegiar uma relação muito específica entre o som e o sentido, é o que possibilita fazer ressoar outra coisa. Digamos que o analista, quando força a dimensão da função poética pela via da interpretação, está usando o sentido antes como meio, do que como fim.

Para esclarecer esse ponto, crucial em meu argumento, retomemos a já mencionada interpretação pelo equívoco, que privilegia a homofonia e os jogos com a língua, servindo-se deles quando convém, como adverte Lacan. E se acrescentarmos a essa lista a homonímia e o jogo interlínguas, o texto de Joyce torna-se paradigmático. Cito novamente meu texto Por uma prática sem valor, a respeito do cálculo poético:

Frequentemente ouvimos que o texto de Joyce não tem sentido. Talvez pudéssemos corrigir essa afirmação, dizendo que, se nos ativermos apenas à semântica, talvez ele fracasse na significação (Bedeutung). Mas quanto ao sentido, o que encontramos é uma proliferação tão grande que ele perde o valor (lembrem-se do valor de verdade da fantasia), apontando então para o ab-sens. Cada frase de Joyce foi construída como uma escultura, de modo totalmente artificial e calculado. Não se trata de uma escrita automática. Considero esse ponto importante, porque me parece que Lacan faz disso uma espécie de paradigma metodológico, apresentado no próprio título do Seminário L´insu. (PACHECO, op. cit., p. 47)

É preciso, portanto, passar pelo sentido, usá-lo até gastar, desgastá-lo, para que ele perca o valor e seu peso se desloque para o peso do real. Vimos que, desde A Instância da letra, Lacan (op. cit.), com Jakobson (op. cit.), havia definido a função poética como promotora da divisão subjetiva, ao apontar para o duplo sentido. Ocorre que em Joyce não há apenas duplo sentido, mas uma fuga de sentido. E é aqui que reencontramos a particularidade da escrita poética chinesa: uma multiplicidade de sentidos, nesse caso propiciado pela própria estrutura da escrita chinesa.

Segundo Ryuko (2007), no texto A arte da escrita chinesa e suas implicações pictóricas e poéticas:

[...] a escrita poética chinesa contém em si inúmeras leituras possíveis ao oferecerem um significado multiforme. Essa multiplicidade é inevitável na arte da escrita e na poesia chinesas. A maior parte dos caracteres chineses são construídos a partir de outros caracteres, o que produz uma gravidez de sentidos e evocações em cada um. Essa compressão de sentidos numa única palavra, porém, conduz a uma economia vantajosa na expressão poética. O leitor é implicado de modo intenso no poema ao ser-lhe permitida a escolha entre diversas interpretações. (demandadodragao.blogspot.com.br/2007_05_01_archive.html)

Além disso, como lembra Lacan (1976-77/inédito), citando François Cheng, há um contraponto tônico, uma modulação que faz com que isso cantarole, criando ainda novos sentidos.

Assim, parece-nos que Joyce faz artificialmente uma escrita que se aproxima da escrita chinesa na medida em que cria neologismos "grávidos de sentidos", articulando de modo íntimo e indissociável a escrita e o som. Como afirma o especialista em Joyce, Declan Kiberd (1922/2012): "era o fato de as palavras terem sido escritas que incomodava Joyce, que se inquietava por tudo que se perdia na transição do éter ao papel (...) suas obras ganham muito ao serem lidas em voz alta" (p. 38). Em outra passagem, ele afirma que em Joyce "as palavras não são apenas moldadas por sentimentos, mas acabam, num estranho tipo de dialética, por moldá-los também". Joyce está convencido do "caráter estrangeiro de toda língua e da universalidade da frase inacabada" (p. 45).

Ora, Joyce, com sua obra, explicita que é da leitura que nasce a escrita. Lacan (1961-62/inédito) foi extremamente sensível a esse ponto, o qual destacara desde o Seminário 9: A Identificação: "é pela inversão dessa relação, e dessa relação de leitura do signo, que pode nascer em seguida a escrita, uma vez que ela pode servir para conotar a fonematização" (10/01/1962). Sim, é apenas quando se pode ler com o privilégio do som e fixá-lo de modo a inscrevê-lo, que um traço qualquer se torna letra.

Com efeito, a passagem do signo mnemônico à letra, segundo os estudiosos da escrita, ocorre pelo chamado princípio rebus valendo-se justamente da homofonia. Como afirma Fischer (2009): "símbolos gráficos se tornam sinais de escrita só quando o valor fonético (o som) de um símbolo começou a superar seu valor semântico" (p.32) ou seja, quando é cortada a ligação com o referente externo. Ora, lembremos que a função poética caracteriza-se exatamente pela prevalência das ressonâncias em detrimento da função referencial. Podemos concluir, dessa forma, que é a função poética da linguagem que torna possível uma leitura que crie a escrita. Lacan afirma em O Aturdito: "começo pela homofonia, da qual depende a ortografia" (op. cit., p. 493). Passagem de lalíngua à letra, que infelizmente não poderei desenvolver neste texto.

A leitura do som operada pelo psicanalista em sua interpretação poética, portanto, é um forçamento, um ato que Lacan nomeia com o neologismo nada inocente pouâte, que une, surpreendentemente, praxis e poiéis. Esse ponto exige um pequeno comentário, o qual retomo de meu texto Por uma prática sem valor:

Lacan, que vinha havia um bom tempo definindo a psicanálise como práxis – ou seja, a modalidade de ato na qual, segundo Aristóteles, o agente, a finalidade e a produção são indissociáveis –, nos últimos seminários cria esse neoligismo (pouâte) que articula o ato com o poeta, remetendo então a poiesis (Arte) – cuja característica, para Aristóteles, é justamente a de uma produção (obra) que apresenta um caráter externo em relação ao agente. Esse é um terreno fértil para ser explorado, sobretudo no que diz respeito à relação entre o papel do saber, o tipo de formação e experiências implicadas em cada uma dessas ações, bem como o lugar da intenção e da deliberação em cada uma delas, e ainda como as modalidades lógicas (necessário, possível e contingente) aí comparecem. (PACHECO, op. cit., p. 48)

Parece-me, entretanto, que mais uma vez Lacan está aqui operando uma subversão nessa separação aristotélica, a qual, inclusive, é questionada por alguns comentadores.3 É evidente, também, que a poiesis aristotélica não se restringe à poesia e que, por outro lado, Lacan está nesse momento, como já destacamos, lendo Aristóteles com Jakobson. Eis uma questão para ser desenvolvida em outro momento.

Retomemos então, o ponto central: o analista, como já destacamos, se serve, portanto, da função poética estrutural como lhe convém, deslocando-a do plano estético para o ético para fazer ressoar outra coisa: a poesia tem efeito de sentido, mas também de furo. Com a práxis da tagarelice, algo da substância gozante pode ressoar. Para concluir, citarei Lacan, sem referência.4 Isso para que tomemos cuidado antes de dividi-lo em dois:

A voz responde ao que é dito, mas não pode responder por isso. Em outras palavras, para que ela responda, devemos incorporar a voz como a alteridade do que é dito. É por isso mesmo que, separada de nós, nossa voz nos soa com um som estranho. É próprio da estrutura do Outro constituir um certo vazio, o vazio de sua falta de garantia. A verdade entra no mundo com o significante. Ela se experimenta, reflete-se unicamente por seus ecos no real.

 

Referências

BESNIER, B. A distinção entre práxis e poiésis em Aristóteles. Analytica. Vol. 1, n. 3, 1996.         [ Links ]

FISCHER, S. História da escrita. São Paulo: Unesp, 2009.         [ Links ]

JAKOBSON, R. (1960). Linguística e poética. In: Linguística e comunicação. São Paulo: Editora Cultrix, 1969, 118p.         [ Links ]

KIBERD, D. Introdução (1922). In: Ulysses. São Paulo: Penguin Companhia, 2012.         [ Links ]

LACAN, J. (1953). Função e campo da fala e da linguagem. In: LACAN, J. Escritos. Trad. de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998, pp. 238-324.         [ Links ]

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PACHECO, A. L. P. A lógica da interpretação. Stylus. Rio de Janeiro: Associação Fóruns do Campo Lacaniano, n. 25, pp. 43-51, 2012.         [ Links ]

RYUKO, O A arte da escrita chinesa e suas implicações pictóricas e poéticas. In: Blog Dragon's Quest, maio de 2007. Disponível em: <http://demandadodragao.blogspot.com.br/2007_05_01_archive.html>, acesso em 22 de julho de 2013.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
E-mail: analauraprates@terra.com.br

Recebido: 18/02/13
Aprovado: 15/03/13

 

 

* Psicóloga. Doutora em Psicologia Clínica pela USP. Pós-Doutorado em Psicanálise na UERJ. Psicanalista. Membro da EPFCL – Brasil e do FCL – SP. AME da EPFCL Coordenadora da rede de pesquisa de psicanálise e Infância. Autora de "Feminilidade e experiência psicanalítica" ( 2001) e de "Da fantasia de infância ao infantil na fantasia" (2012).
1 Uma versão bastante condensada deste trabalho foi apresentada no VII Encontro Internacional da IF-EPFCL "O que responde o analista?", realizado em julho de 2012, no Rio de Janeiro.
2 Texto apresentado no XII Encontro Nacional da EPFCL-Brasil (Salvador, 2011), A lógica da interpretação e foi publicado na Revista Stylus n. 25 (nov. 2012).
3 A esse respeito, consultar o texto de Bernard Besnier (1996).
4 Na apresentação oral do trabalho, a referência não foi mencionada. Trata-se de O Seminário 10 A Angústia (LACAN, 1962-63/2005).