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Stylus (Rio de Janeiro)

versão impressa ISSN 1676-157X

Stylus (Rio J.)  no.28 Rio de Janeiro jun. 2014

 

DIREÇÃO DO TRATAMENTO

 

As exigências do manejo transferencial e o desejo de analista

 

The demands of the transferring maneuvering and the desire of analyst

 

 

Luciana Guarreschi*

Fórum São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Baseado em fragmentos de um caso clínico, o presente artigo pretende discorrer sobre a instauração do sujeito suposto saber, bem como delimitar o que Lacan (1964) designou como fechamento do inconsciente. Efeito do amor de transferência e da função de obturadora do objeto a, o fechamento do inconsciente é o lugar onde o analista é suposto saber operar, via desejo de analista, a reabertura do inconsciente, a cada vez, sustentando o ato constituinte do sujeito, sua causa hiante.

Palavras-chave: Transferência, Sujeito suposto saber, Desejo de analista.


ABSTRACT

From fragments of clinical case, the present article intends to discuss the settlement of the subject supposed to know, therefore limit what Lacan (1964) designated as closing of the unconscious. Effects of the transference of love and the function of object-obstructing, the closing of the unconscious it's where the analyst is supposed to operate, by the analyst's desire, the reopening of the unconscious every time, sustaining the constituent act of the subject, your gaping cause.

Keywords: Transference, Subject supposed to know, Analyst's desire.


 

 

"A arte de escutar equivale quase à de bem dizer" (LACAN, 1964, p. 119).

Interessa-me neste texto tentar colher, com base em um caso clínico, o que Lacan (1964/1988) chamou de fechamento do inconsciente como efeito do amor de transferência e da função obturadora do objeto a, bem como apontar para a instalação do sujeito suposto saber. Para tal, utilizarei citações diversas de Lacan, entrecortadas, coladas e mescladas aos fragmentos de um caso clínico.

Lacan (1964/1988) dizia que o uso natural de expressões de linguagem implica a topologia envolvente em que o sujeito se reconhece quando fala espontaneamente. Opto então, não por narrar a história de M., mas por mapear seus significantes tentando localizar aí onde ela se faz reconhecer e onde delimita seu lugar na família e no mundo: herpes, pai quebrado e doente, comida aos montes, mãe como irmã, pai como filho, irmão como companheiro, irmã malcriada, relacionamentos que terminam sempre ao completar três meses, sem emprego, playboy, difícil acordar, ansiedade, pânico, psiquiatras...

Significantes agrupados pela fantasia do sujeito, montando seu romance familiar. O conteúdo importa pouco, fato é que o tempo passou, algo caiu e não cola mais. Chega-se à análise com um pedido: cola pra mim? Dizia ela, em sua primeira entrevista: "Tinha um sonho de casar, ter seis filhos, não tenho mais". Atenção ao verbo no imperfeito – "tinha" e à negação "não tenho mais".

Verbo imperfeito, em sua definição, expressa o passado inacabado, um processo anterior ao momento em que se fala, mas que durou um tempo no passado, ou ainda, um fato habitual, diário. Portanto, ele não indica a certeza de um fato acontecido, sendo assim chamado este tempo verbal de pretérito imperfeito, pois não se refere a um conceito situado perfeitamente num contexto de passado. Ou seja, algo que não passou.

Quanto à negação, sirvo-me de Lacan: "Mas o que pode significar não desejar? Toda a experiência analítica nos testemunha que não querer desejar, e desejar, são a mesma coisa" (Ibid., p. 222). E assim, com um vácuo de significação, entre um verbo imperfeito e uma negação, pode-se começar uma análise. Para tal, o outro sentado à frente do paciente, não pode recusar-se à significação, afinal é a isso que ele é suposto saber. (Ibid., p. 239).

 

Primeiro tempo

Uma abertura do inconsciente, por que não dizê-lo, freudiano. Os mecanismos da estrutura da linguagem, substituições, condensações e deslocamentos, rebatizados metáfora e metonímia por Lacan, já se apresentam na primeira sessão. Entre abundantes atos falhos, o nome da analista se transfere para o de três Fabianas. Aliás, esse é o primeiro uso que Freud dá à transferência, um deslocamento de palavra. Palavra transferida de um lugar da fala a outro, de um lugar onde ela é esperada a outro, inesperado. Sigo a pista deixada por essa enunciação e temos: a primeira Fabiana, uma dentista "superlegal", a segunda uma grande amiga da irmã e a terceira uma amiga de infância.

Vemos aqui a vertente imaginária da transferência – aquela onde o analista é rapidamente incluído na série de experiências afetivas passadas do paciente. É desta primeira vinculação que poderá se produzir o amor de transferência. Tal vinculação se faz pelos significantes que envolvem o analista e ilustra a máxima lacaniana de que não se pode separar o analista da manifestação do inconsciente, posto que ele é seu destinatário (Ibid., p. 121).

O que fazer então com o que é dado, destinado, assim tão gratuitamente, pelo paciente? Lacan aponta o valor inestimável da confiança que é depositada no analista. O que o analista faz a partir desta confiança, a partir desse amor? Ele deve apontar, dirigir, indicar, encaminhar esse amor para o saber. O paciente, via de regra, chega com a suspeita de que há algo que lhe escapa, que ele não sabe e que há um Outro que saberia. Mas, no entanto, no momento do encontro, o amor se interpõe, tapeando a busca inicial do sujeito, ficando a cargo do analista a recuperação dessa busca. Colocá-lo de volta no caminho, utilizar-se desse amor para a produção de um saber.

Mas que saber é esse que M. imputa ao Outro? Saber que só pode ser de uma ordem, a mesma que Lacan aponta no Banquete:

O momento essencial, inicial, da ação do analista, é aquele em que é dito que Sócrates jamais pretendeu nada saber, senão o que diz respeito a Eros, quer dizer, ao desejo (Ibid., p. 219).

Pois, se há um caminho que se deixa entrever, ou ainda entredizer, no mapeamento significante do qual a análise se ocupa, esse caminho é o do desejo. É assim que o sujeito poderá localizar-se implicado nas mazelas de sua vida, nas escolhas que fez atravessado por um desejo cuja causa se desconhece, mas que pode engendrar uma busca pelo saber.

Onde mais pode se ler isso nas sessões de M.? No enredo do encaminhamento e por meio do que diz Lacan "tudo que anima, o de que fala toda enunciação, é o desejo." (Ibid., p. 134). M. é encaminhada por um conhecido, diz ela: "encontrei-o em uma festa, ficamos amigos" e avisa: "mas ele não me pegou!". Que frase é essa? Ela arremata: "por que ele é todo pegador".

Muitas sessões depois, acrescentará: "sou pegadora". Lacan nos adverte quanto a isto: "ele, o paciente, retém certos elementos para que o analista não vá muito depressa. Pois aquele que pode ser enganado também pode enganar-se" (Ibid., p. 221). Sem problemas, é perfeitamente possível encontrar algo da dimensão da verdade ao se enganar, e isto serve para ambos.

 

Segundo tempo

Segunda sessão: "pensei em não vir", diz. Logo depois, emendando uma frase a outra: "a Fabiana não tem nada a ver". Dá suas explicações sobre os atos falhos cometidos na primeira sessão: "é tipo dislexia, leio errado, minha mãe também é assim". Ponto. Não quer brincar de associar. Nas formações do inconsciente algo de uma significação se insinua, na qual o sujeito hesita em se reconhecer. Resistência? Sim, por um lado, aquele que Freud apontava sob o nome de "resistência do recalcamento", que nada mais é do que uma dificuldade de entrar em contato com o material significante. Por outro lado, não, pois ao vir falar que não quer falar, não escapa à fala.

Mas, poderíamos ver aí já o efeito de transferência? O amor? E amar, como indicou Freud é, essencialmente, querer ser amado. Esse efeito afasta a revelação da verdade do desejo inconsciente, freudianamente falando. Mas, paradoxalmente, é por meio do mesmo que se poderá tocar algo dessa verdade. O amor leva o enigma para longe, mas também manda buscar, trazendo-o pela mão. As relações amorosas da família de M. se dão pelas "doenças/crises", e é assim que se fazem amar e é assim que ela começa a se apresentar à análise, sempre em vias de "ficar pior".

Diz Lacan: "estamos presos em esperar esse efeito de transferência para poder interpretar e, ao mesmo tempo, sabemos que ele fecha o sujeito ao efeito de nossa interpretação." (Ibid., p. 239). O analista segue tentando, por meio dos cortes, trazer à tona o que está soterrado pela fala cotidiana, tal qual indicou Augusto Massi (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1709201115.htm) sobre o trabalho do poeta: a poesia, discretamente indica que o ouvido do poeta pode desocupar outras falas.

Não sei muito bem como fazem os poetas, mas os analistas, supostos saber partir ao encontro do tal desejo inconsciente, deveriam contar com o que Lacan (Op. cit., p. 222) chamou de desejo de analista. Sabemos de cor e salteado a definição de desejo de analista, não é puro, é desejo de obter a diferença absoluta etc. Mas, como funciona? Quando funciona, é claro. Encontrei-me com algo que me possibilitou entrever algo desse funcionamento. É assim, diz Lacan:

Será que não há, reproduzido aqui (na análise), o elemento de alienação que lhes designei no fundamento do sujeito como tal? E o que não é nem levantado nem a ser levantado, pois a experiência analítica nos mostra que é de ver funcionar toda uma cadeia no nível do desejo do Outro que o desejo do sujeito se constitui (Ibid., p. 223).

É preciso essa primeira alienação, pois ao ver funcionar toda uma cadeia no nível do desejo do Outro, o desejo do sujeito se constitui. Isso me possibilitou uma aproximação acerca do desejo de analista em sua função dita "operador". Ou seja, contra a inércia da transferência – a ferramenta é o desejo de analista.

Uma tentativa, diz ela: "termino meus relacionamentos sempre em três meses". Ensaiando uma articulação simbólica, aponto o início, indicando uma localização outra do sujeito, onde ele não se vê, dizendo: "será que eles começam?". Corte. Quinze dias depois um "ficante" vira namorado. Neste momento, a libido se desloca um pouco impondo novas circunstâncias ao trabalho analítico, que, no entanto, segue.

Ao mesmo tempo, sua vida começa a fazer outros, pequenos, movimentos. Arruma algum trabalho, deixa a arrumação da casa um pouco de lado... E não é assim o amor? Assujeitado ao desejo do outro, tentando enganá-lo dessa sujeição, fazemonos amar por ele, propondo essa falsidade essencial que é o amor. (Ibid., p. 240).

As entrevistas seguem, com demandas diversas. Atrasos, esquecimento do pagamento, bocejos, surdez: "o que você disse? Não escutei.". Numa sessão, esquece o dinheiro e reclama, "custava me organizar?". E, questionada sobre o esquecimento, explica-se: "Acho que essas coisas é falta de desorganização!". Como? Ela escuta, diz: "Não! É organização...". No movimento de trazê-la ao que escapou, ela: "hum... me saboto...? Não, não". Tampando rapidamente e brigando "comigo" se eu insinuasse algo. Isso aconteceu muitas, muitas e muitas vezes. Penso que há alguns para os quais a experiência da clivagem é sentida com mais horror. O sujeito paralisa perante o que escuta de si e diz não! Isso não! Impossível! A possibilidade de escutar o ato falho é interrompida por um julgamento antecipado acerca do que se desconhece e que, de imediato, é tido como negativo. Mas, não nos esqueçamos do amor, parece que este também impedia que ela se mostrasse assim... Tão dividida, digamos.

Cabe aqui um apontamento sobre o título do texto – exigências de manejo transferencial – pois não foram poucas as sessões que M. vinha para brigar, onde o "amódio" da transferência imaginária ficava patente. Neste momento, segui uma pista errada, entendendo esse movimento como fechamento do inconsciente = a resistência, o que me levou a tentar precisar melhor esses conceitos e, consequentemente, a escrita deste texto.

Bom, o inconsciente fala. Mas essa fala não é homogênea, contínua. Diz Lacan: "O que é ôntico, na função do inconsciente, é a fenda por onde esse algo é por um instante trazido à luz – por um instante, pois o segundo tempo, que é de fechamento, dá a essa apreensão um caráter evanescente" (Ibid., p. 35).

Freud disse que o inconsciente não conhece contradição, nem a função do tempo, porém o tempo que ele desconhece é o das horas, do passado, do presente. Lacan introduz a noção de tempo lógico, um batimento, um pulsar, uma hiância. Nessas descontinuidades insinua-se a posição fantasmática do sujeito. Diz ele: "Podemos conceber o fechamento do inconsciente pela incidência de algo que desempenha o papel obturador – o objeto a, chupado, aspirado, ao orifício da nassa" (Ibid., p. 138). Esse "meio-tempo", essa pulsação, essa alternância de sucção, acima de tudo temporal, é dada pela função encobridora do objeto. Ao analista cabe tentar reabri-lo, num acordar às avessas com o discurso do paciente, mantendo o ritmo, zelando pela "presentificação dessa esquize do sujeito realizada aqui, efetivamente, na presença (do analista)" (Ibid., p. 126).

Quanto à resistência, "é sempre resistência do analista". Gosto da dica de Colette Soler, quando diz que não há contratransferência, antes, o problema consiste em ir contra a transferência. Trata-se então de manejá-la, tarefa do analista, nem sempre muito fácil de cumprir.

Outros tempos

A antiga surdez cede lugar a um princípio de escuta, M. me diz: "a frase 'será que eles começam' que você disse não sai da minha cabeça". A pulsação do inconsciente brinca de par ou ímpar com as intervenções do analista no discurso do paciente. Abre-se uma nova série de associações, nestas tentarei demonstrar a particularização da transferência, ou ainda o endereçamento de uma questão ao Sujeito Suposto Saber.

SSS, eis o denominador comum que Lacan extrai das três formulações freudianas sobre a transferência. Sendo como sugestão, repetição ou resistência, a transferência é sempre consequência de uma fala, como tal dirigida a alguém, alguém no lugar de Outro, lugar do saber.

Pouco tempo depois de relatar a frase infiltrada na sua cabeça, M. vem com um anel simples na mão direita, e como nunca usava adereços, tal objeto reluzia em seu dedo. Questionada sobre do que se tratava, sua resposta incluiu uma lembrança envolvendo alguns novos significantes, dentre eles "solitário" e "aliança". Na sessão seguinte, um sonho. Nele, pedia à mãe para não se mudar de cidade, falava para ela não ir. Conta o sonho e pergunta: "por que você me perguntou sobre a aliança?". Pergunta prontamente devolvida, ela responde: "achei que você falou que eu queria casar e eu não queria não. Era uma aliança comigo mesma". Retomo então o "solitário", ela diz: "um solitário é um anel com diamantes, mas é também de ser uma pessoa só". A intervenção foi sublinhar o só, numa tentativa de fazer aparecer a conjunção-disjunção entre o enunciado e o ato de enunciar, entre o que se diz e o que se pode ouvir do que de fato se disse.

Após esses desdobramentos, uma queixa se impõe: "não consigo mais ficar sozinha! – em casa não dá". Baseada em fatos circunstanciais de sua vida, esse é o sentido que dá a essa queixa: muitas pessoas à minha volta, logo, não posso ficar sozinha. Bom, sabemos que o laço que une o significante ao significado é arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem nenhum laço natural na realidade. Assim, interrogo sua frase, repetindo-a, acentuando o sozinha e o "casá não dá!". Ela responde questionando-me: "como vou ficar sozinha morando com alguém? É isso que eu vim te perguntar". E ainda: "eu preciso ficar sozinha com alguém perto, é isso que eu preciso fazer aqui". Resposta de analista: divã.

Poderíamos dizer que houve aí uma entrada em análise? Sua fala parecia indicar que sim, a partir do significante da transferência, solitário, abriu-se um ponto de interrogação, um lugar vazio, deixando entrever um impasse: ou sou sozinha ou sou colada a alguém. O significante da transferência, um significante qualquer, não é tão qualquer assim, trata-se de um traço que se encontra o mais próximo possível do vazio onde reina o objeto da fantasia fundamental. Seria preciso uma análise, e tempo, para ultrapassar esse impasse. M. vem mais duas sessões, não vem a mais duas e volta para dizer que não viria mais.

Tentarei rever agora estas duas últimas sessões antes das "faltas". Seguem-se crises de angústia, tonturas e os efeitos de amor e ódio da transferência imaginária – "só queria uma mãe e você não me dá carinho!", e ainda: "já falei que te odeio?". A abstinência por parte do analista faz que o sujeito tente evocar seu amor. Diz ainda "não consigo viver sozinha, quero ter alguém para contar, que não vai te abandonar". Deslizamento do me para te, não ouvido à época, mas onde se anuncia sua repetição, todos seus ex-namorados, e foram muitos, foram "abandonados" por ela. Precisão lacaniana: para o lado do recalcado não há resistência alguma, há apenas tendência a repetir-se (LACAN, 1954/1985).

Quanto às tonturas e vertigens, a imagem que o sujeito tem de si vacila, "a pegadora" só quer ser pega no colo. Lacan diz: "o sujeito experimenta, por exemplo, reações de decepção, mal-estar, vertigem, em seu próprio corpo, em relação à imagem ideal que tem dele" (LACAN, 1957-58/1999, p. 473).

São sessões em que a cada acontecimento narrado se poderia ouvir um apelo desesperado "não faz um, não faz um, não faz um" ou ainda "só há um, um, um". Dentre outras falas, queixa-se do namorado, "desligado como o irmão", e diante da marcação do par ligado/desligado, diz: "Não quero ser desligada. Vou continuar casada com meu irmão. Vou ficar sozinha!". Digo: já se está, encerrando a sessão. O desvelamento abrupto do buraco que há, e que de fato sempre houve, na relação com o Outro, foi demais. Ah... O bem dizer...

Tentando cernir o que poderia ter ocorrido, encontro com Lacan:

Vemos que se trata de atingir, nessa linha, um esclarecimento das relações do sujeito com a demanda, que revela que toda relação com essa demanda é fundamentalmente inadequada para permitir que o sujeito tenha acesso à realidade efetiva do efeito que o significante tem nele, isto é, que se coloque no nível do complexo de castração (LACAN, 1957-58/1999, p. 434, grifo nosso).

Para quem ainda demandava o fazer Um amoroso, o "já se está" talvez tenha sido opaco e angustiante demais.

Quando volta, duas semanas depois, está decidida a parar o tratamento. Afinal, a sua questão sobre como se ligar ao Outro, a partir da não relação e do desamparo radical, a qual estamos sujeitos, continuava sem resposta e o "já se está" não foi lá muito encorajador para a construção de um saber sobre parcerias possíveis, as que incluíssem a solitária.

Bom, acabei encontrando, ao final, o que tentava abordar no início. Abertura e fechamento. Pulsação temporal que acompanha todo o tratamento, e onde o momento de fechar não "poderia" ser o momento de parada, mas impulso para outro pulso, relançamento de dados na aposta analítica, não infinitamente, mas até que a busca de sentido se esvazie e a construção de um singular sobre a falta de si possa amarrar de maneira menos sofrível o caminhar da vida. Mas, a despeito do cuidado do analista, que se encontra a favor do sujeito, ainda que contra seus caprichos, há aqueles que saem antes do fim do filme. E assim ela deixa a sessão: "bom, acho que não preciso ficar até o fim".

 

Referências

LACAN, J. (1964). O Seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988.         [ Links ]

__________. (1957-58). O Seminário, livro 5: as formações do inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999.         [ Links ]

__________. (1954-55). O Seminário, livro 2: o eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985.         [ Links ]

MASSI, A. Estilo tardio exibe radicalidade de Francisco Alvim. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1709201115.htm. Acesso em: 21 de março de 2014.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Luciana Guarreschi
Rua Arthur de Azevedo 255, Pinheiros, São Paulo.
E-mail: guareschi.lu@gmail.com

Recebido: 18/01/2014
Aprovado: 23/02/2014

 

 

* Psicóloga. Membro do Fórum São Paulo.