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Psic: revista da Vetor Editora

versão impressa ISSN 1676-7314

Psic v.7 n.1 São Paulo jun. 2006

 

ARTIGOS

 

O professor em sala de aula: reflexão sobre os estilos de aprendizagem e a escuta sensível

 

The teacher at the classroom: a reflexion about learning styles and sensitive listening

 

El profesor en clase: reflexión sobre los estilos de aprendizaje y la escucha sensible

 

 

Teresa Cristina Siqueira Cerqueira1

Universidade de Brasília

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este trabalho envolve uma reflexão sobre os modos de aprender em contextos educacionais. Nesse sentido focaliza o aprendente e o ensinante em suas relações, considerando como ocorreria o processo ensino/aprendizagem se ambos praticassem na sala de aula o exercício da escuta sensível. Discute-se ainda as contribuições sobre os estilos de aprendizagem e o que esse conhecimento pode trazer para o processo educativo. Como conclusão discute-se que o aprender resulta do diálogo entre o saber e o conhecer, que passa por uma relação de empatia entre quem aprende e quem ensina. Lembra-se ainda que a relação referida é dialética entre os processos de ensinar e aprender, pois é o contexto que favorece que a verdadeira aprendizagem ocorra, resultante desse sentimento de identificação entre os pares, que é o ponto de apoio para a escuta sensível.

Palavras-chave: Processo educativo, Estilos de aprendizagem, Escuta sensível.


ABSTRACT

This article involves a reflection about the ways of learning in educational contexts. To attain this objective, it focuses on the relationships between the student and the teacher, considering how the process teaching/learning would occur if both partners developed a sensitive listening. Also the many contributions about the learning styles and how this knowledge could help the educative process are analyzed. As a conclusion, it is discussed that learning results from the dialogue between knowledge and curiosity, in a dialogue that goes through an emphatic relation between student and teacher. It is also explained that our subject is a dialectic relation between the teaching and learning processes, since this is the context that supports the occurrence of true learning, as a result of the feeling of identification between pairs, what is the basis of sensitive listening.

Keywords: Educative process, Learning styles, Sensitive listening.


RESUMEN

Este trabajo ha involucrado una reflexión sobre las formas de aprender en contextos educacionales. En ese sentido ha focalizado el aprendiz y el profesor en sus relaciones, considerando como acontecía el proceso enseñanza/aprendizaje si los dos practicasen en clase el ejercicio de la escucha sensible. Se han discutido todavía las contribuciones sobre los estilos de aprendizaje y lo que ese conocimiento puede contribuir para el proceso educativo. Como conclusión se ha discutido que el aprender es resultado del diálogo entre el saber y el conocer, que pasa por una buena relación entre quien aprende y quien enseña. Se ha resaltado todavía que esa relación es dialéctica entre los procesos de enseñar y aprender, pues es el contexto quien favorece que el aprendizaje verdadero suceda como resultado de ese sentimiento de identificación entre los pares, que es el punto de apoyo para la escucha sensible.

Palabras clave: Proceso educativo, Estilos de aprendizaje, Escucha sensible.


 

 

Introdução

O nosso estar no mundo é repleto de ações que nos levam a aprender. A aprendizagem, por sua vez, acontece num entrelaçamento entre informação, conhecimento e saber. As informações que recebemos presentes no outro, nos espaços externos, acionam nossas estruturas mentais movimentando nosso organismo, corpo, esferas dramáticas e cognitivas, transformando-se em conhecimento que se incorpora em nossos saberes. Dessa maneira, o saber se constitui a partir das experiências e vivências do nosso cotidiano, e nossas aprendizagens primeiras acontecem em nossas relações familiares, somente mais tarde ingressamos na escola ampliando nossas relações sociais.

É nessa dialógica entre informação, conhecimento e saber que nos constituímos sujeito epistêmico. Todavia, nem sempre nossas experiências com o aprender são bem sucedidas e geralmente, os insucessos são evidenciados no espaço escolar, pois é nele que o sujeito aprende novos saberes, ou seja, transformam os saberes cotidianos em saberes científicos. Resta-nos saber como tem sido essa transformação: será que tem sido com sabor ou dissabor?

Nesse sentido, se desempenhamos na sociedade um papel de professor faz-se necessário compreendermos que é essencial conhecermos como acontece a aprendizagem, ou seja, como se dá o desenvolvimento humano e como deveria ser o processo educativo. Dessa forma, é essencial refletirmos sobre os seguintes questionamentos: Como a criança aprende? Como acontece o processo de aprendizagem? Como ou quando pode ocorrer a intervenção do professor? Quais influências dos atravessamentos no processo de aprendizagem da criança? Será que os atravessamentos influenciam no processo? Como o professor age diante desses atravessamentos? Os vínculos estabelecidos entre professor/aluno influenciam nesse processo? E o papel do professor, como esse se define? E o aluno, quais suas expectativas diante da escola e do professor? Como seria a relação professor/aluno com o processo ensino/aprendizagem se ambos praticassem na sala de aula o exercício da escuta sensível? Quais contribuições os estilos de aprendizagem podem trazer para o processo educativo?

Os atravessamentos são variáveis externas ao espaço da sala de aula que em certo momento vêm à tona e, muitas vezes, influenciam no processo educativo como um todo.

Com o intuito de aprofundar os estudos relacionados às questões da subjetividade do sujeito ensinante/aprendente, podemos partir da suposição que o elo perdido da resistência com a aprendizagem poderia estar na conexão/articulação das estruturas dramáticas e cognitivas dos sujeitos (professor/aluno) que aprendem e ensinam, ou seja, nos vínculos estabelecidos entre ambos.

Nesse sentido, abordaremos alguns conceitos que poderiam estar envolvidos nesse processo tais como, o papel do professor em sala de aula; interação entre o saber e o conhecer, como também entre alunos e professoras; vínculos afetivos, cognitivos e sociais, os estilos de aprendizagem e a escuta sensível. Conceitos esses que servirão como norteadores para a construção do conhecimento, pois temos clareza que esse processo é individual e interno de cada um, nossa intenção é que ao final da leitura cada um possa construir seu próprio conceito. Acreditamos que algumas abordagens teóricas referentes à produção de sentido no espaço escolar, bem como às concepções interacionistas de aprendizagem e à escuta sensível poderão contribuir para essa construção a qual propomos.

Sendo assim, na primeira parte discorremos sobre a importância da produção de sentido no espaço escolar para que aconteça a aprendizagem, tendo como referencial a abordagem interacionista de aprendizagem e a escuta sensível, e na segunda parte levamos em consideração o papel do professor em sala de aula e o estilo de aprendizagem.

O espaço escolar como produção de sentido

A escola foi institucionalizada no auge da "Revolução Industrial" a fim de sistematizar o conhecimento construído pela humanidade ao longo de sua história, dentre outras coisas mais. Sabemos que desde sua criação as concepções de aprendizagem basearam-se nas correntes inatistas e empiristas. A primeira baseia-se na idéia de que o "indivíduo é pré-determinado biologicamente, tendo o ambiente pouca influência no seu desenvolvimento" (Brandão et al. 2002), ou seja, o sujeito já nasce inteligente, são os fatores maturacionais e herdados os constituintes do ser humano e determinante do processo de aprendizagem. Os autores ressaltam ainda que a abordagem empirista concebe o sujeito como tábula rasa em que a experiência é grande fonte de aprendizagem, e a mesma é confundida com memorização, repetição, fixação e cópia.

No entanto, diante de tantas transformações ocorridas na história da humanidade nos vemos em situações de mudanças. Existe uma consciência de que os paradigmas educacionais também têm sofrido mudanças significativas por vivermos numa era em que a informação se processa rapidamente e a comunicação se faz essencial para compreensão e participação no mundo globalizado. Não estamos reinventando a roda, pelo contrário, os avanços tecnológicos nos impulsionam para uma nova forma de ver o homem, que é aquele que participa das práticas sociais e é ativo nos processos de aquisição de conhecimentos.

Nesse sentido, vislumbramos uma escola que deixa de ser transmissora de conteúdos para voltar-se à formação do sujeito no seu sentido mais amplo. Não podemos perder de vista que a escola deveria ser o espaço comprometido com a humanização, concordamos com Vasconcellos (2003) quando comenta que a perspectiva da humanização não é algo que nos remete a meras elucubrações filosóficas ou valorativas; ela está presente a cada instante da vida do indivíduo, na produção concreta da existência, uma vez que o homem se constitui, se transforma, ao transformar. É nesse sentido que queremos uma escola viva, dinâmica, pulsante, democrática; uma escola que enxergue o sujeito como um todo, que valorize e respeite o ser humano em todas suas dimensões emocionais, racionais e espirituais. Uma escola que possa contribuir para a transformação da realidade.

Por isso, é preciso lembrar que as grandes experiências humanas - amor, liberdade, felicidade, tecnologia, etc.; são perpassadas pela simbolização e, em alguma medida, pelo conhecimento - senso comum, mito, religião, arte, ciência e filosofia (Vasconcellos, 2003). O autor comenta ainda que, na medida em que o professor estimula e ajuda o aluno a ter acesso à cultura, refletir, imaginar, criar, atribuir valor, desenvolver a consciência, ele trabalha com a produção de sentido num contexto histórico e coletivo.

As sociedades democráticas são capazes de desenvolver um tipo de educação que promova a continua reconstrução da experiência individual e social. A concepção de sociedade discutida aqui é, portanto, a sociedade que pressupõe a igualdade de oportunidades, de chances entre todos os indivíduos, na qual a educação exerce a importante tarefa de propiciar os instrumentos capazes de colocar os indivíduos em situação de competição pelos privilégios que a sociedade democrática permite alcançar. Imaginamos que praticar essa democracia no espaço escolar é contribuir para a formação de crianças, jovens e adultos para a ética e a cidadania dando-lhes oportunidades de se sentirem proprietários do trabalho que executam.

Assim, acreditamos nas possibilidades de termos escolas que desde cedo preparam os seus cidadãos para ter voz ativa, sendo dono de opiniões, pontos de vista; que participem de debates, discussões; que possam cumprir seus deveres e lutarem por seus direitos com autonomia; que possam conquistar sua liberdade de ir e vir agindo na participação das práticas sociais existentes, com dignidade. Importante ressaltar que trabalhar com a produção de sentido no espaço escolar aconteceria no momento em que o trabalho pedagógico da escola conquistasse sua autonomia, isso possibilitaria a toda a comunidade escolar uma participação efetiva, desde a construção do projeto político-pedagógico até uma simples decisão que venha ocorrer no espaço escolar.

Nesse aspecto, Villas Boas (2002) pode elucidar o que estamos pensando, quando comenta que o que dá direito de autonomia não é o professor ensinar o que quiser, da maneira como quiser e a quem quiser, mas o compromisso de garantir que cada aluno aprenda o que necessita aprender. Ter autonomia não significa desvincular-se do conjunto de normas educacionais básicas, mas criar os melhores meios de aplicá-las. A escola que a sociedade democrática requer é aquela capaz de implementar o seu próprio projeto pedagógico, elaborado coletivamente, devidamente atualizado, divulgado e avaliado por todos os interessados. Isso pressupõe competência, seriedade, comprometimento e rigor.

Nessa perspectiva de construção do projeto pedagógico coletivamente levamos em consideração que os temas abordados nas áreas do conhecimento possam ser relacionados com a realidade existente. Sabemos que no dia-a-dia de nossos alunos, eles têm contato com os números, os fenômenos naturais/físicos e biológicos, com a escrita e a leitura, com o meio, e é claro com o próprio corpo, no qual percebem sua saúde e seu movimento no mundo. Não importa se são jovens, crianças ou adultos.

Já ouviram a história "A águia e a galinha?" É uma história que Leonardo Boff (2001) a utiliza como uma metáfora da condição humana. Cada um hospeda dentro de si uma águia. Sente-se portador de um projeto infinito. Quer romper os limites apertados de seu arranjo existencial. Há movimentos na política, na educação e no processo de mundialização que pretendem reduzir-nos a simples galinhas, confinadas aos limites do terreiro. Ele indaga: Como vamos dar asas à águia, ganhar altura, integrar também a galinha e sermos heróis de nossa própria saga? Assim, perceber a águia dentro de cada um desafia-nos a romper com paradigmas enraizados em nossa sociedade, precisamos aprender a apreender essa condição humana. Sugere que conhecer o humano é, antes de, mais nada situá-lo no universo, e não separá-lo dele. "Quem somos?" é inseparável de "Onde estamos?", "De onde viemos?", "Para onde vamos?"

Um dos objetivos da educação não é simplesmente o de efetivar um saber na pessoa, mas seu desenvolvimento como sujeito capaz de atuar no processo em que aprende e de ser parte ativa dos processos de subjetivação associados à sua vida cotidiana (Gonzalez Rey, 2001). Essa afirmação nos leva a enxergar o aluno como aquele sujeito ativo na sua aprendizagem, uma vez que ele se apropria do conhecimento, o mesmo terá a ousadia de utilizá-lo na sua vida prática. É por isso que reafirmamos que devemos aprender e ensinar aquilo que tem sentido para o estar no mundo dos alunos. Não adianta dizer que a terra é redonda, se para aquele sujeito essa informação não faz o menor sentido, como também é inútil impor silêncio numa classe em que os pensamentos estão borbulhando e precisam ser compartilhados.

Entende-se que é importante valorizar as concepções dos alunos, tratando-as respeitosamente, pois é com base nelas que o conhecimento poderá ser construído. Fundamental, também, questionar os conhecimentos científicos e suas aplicações em relação às condições sociais, políticas e econômicas, na época em que ocorreram e no mundo atual, para melhor compreender o processo de construção de vida da humanidade e individual. Dessa forma, tornar a escola um ambiente propício para a produção de sentido é proporcionar aos sujeitos, partindo das representações simbólicas já construídas, o acesso a novas representações para que possam estabelecer as relações que há entre o que já conhece e o que foi construído historicamente, socialmente e culturalmente pela humanidade.

Ao lado disso, considera-se que todo conhecimento perpassa por um senso comum, isto é, por um saber cotidiano que precisa ser rompido para dar lugar a novos saberes. Entendemos que para tanto, o professor deve assumir um papel de organizador do ambiente escolar e da sala de aula, proporcionando aos alunos situações que os levem a pensar, a desenvolver o raciocínio lógico e a lidar com suas emoções, ou seja, os prazeres e desprazeres que a vida lhes oferece.

González Rey (2001) nos leva a uma reflexão que rompe com o sistema tradicional de ensino de que ensinar e aprender são relações de mão única (o professor ensina, ou seja, transmite o conteúdo e o aluno decora esse conteúdo sem questionar e discutir); o mesmo autor nos propõe a idéia de que a sala de aula não é simplesmente um cenário relacionado com os processos de ensinar e aprender. Nela aparecem, como constituintes de todas as atividades aí desenvolvidas, elementos de sentido e significação procedentes de outras zonas de experiência social, tanto de alunos quanto de professores. Sabemos que cada um constrói sua história, vivencia fatos, experiências coletivas e individuais.

Nesse sentido, acreditamos que a sala de aula é o lugar em que há uma reunião de seres pensantes que compartilham idéias, trocam experiências, contam histórias, enfrentam desafios, rompem com o velho, buscam o novo, enfim, há pessoas que trazem e carregam consigo saberes cotidianos que foram internalizados durante sua trajetória de vida, saberes esses que precisam ser rompidos para dar lugar a novos saberes. O aluno precisa se apropriar das informações que circulam nos meios sociais e culturais para transformá-las em conhecimento. Não podemos perder de vista que essas informações deveriam fazer sentido para a vida desse sujeito, para que ele possa ser articulado com suas ações, seus objetivos e seus sonhos e outras aspirações que tenha.

Com base na mesma lógica, Freire (1996) afirma que uma das tarefas da escola, como centro de produção sistemática de conhecimento, é trabalhar criticamente a inteligibilidade das coisas e dos fatos e a sua comunicabilidade. Ele revela ainda que o educando deve assumir seu papel de sujeito da produção de sua inteligência do mundo e não apenas o de recebedor da que lhe seja transferida pelo professor. É nesse sentido que a escuta sensível do professor é essencial para que o mesmo possa ajudar o aluno a reconhecer-se como construtor de seu conhecimento, acreditamos que é a partir desse (re)-conhecimento que aprendente e ensinante podem se conectar para um estabelecimento de relações que venham contribuir para um avanço no processo de desenvolvimento para a aprendizagem.

Ao falar de escuta, Freire (1996) comenta que escutar é obviamente algo que vai mais além da possibilidade auditiva de cada um. Escutar significa a disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do outro. Isto não quer dizer, evidentemente, que escutar exija de quem realmente escuta sua redução ao outro que fala. Isto não seria escuta, mas auto-anulação. A verdadeira escuta não diminui em nada, a capacidade de exercer o direito de discordar, de opor-se, de posicionar-se. Pelo contrário, é escutando bem que me preparo para melhor colocar-me, ou melhor, situar-me do ponto de vista das idéias.

Desse modo, ao escutar, o professor abriria espaço para compreender a dinâmica estabelecida em sala de aula, pelo aluno, como a construção de seu conhecimento e também de sua subjetividade. Se de um lado temos o aluno buscando novos saberes, do outro deveríamos ter o professor que investiga, observa, escuta, propõe situações problemas, intervem e organiza o espaço para que a aprendizagem se concretize. É por isso, que aprender/ensinar só faz sentido para cada um dos envolvidos nesse processo se houver uma conexão entre as partes, se na sala de aula, como propõe Barbier (2002), for possível sentir o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro para poder compreender de dentro suas atitudes, comportamentos e sistema de idéias, de valores, de símbolos e de mitos.

Consideramos esse um dos desafios para a construção de uma educação de qualidade, pois ao falarmos em sentir o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro. Com isso, estamos nos referindo à construção de um novo saber, de um saber singular que impulsiona o desejo tanto do aluno quanto do professor, pois sabemos que tanto um, quanto o outro, são sujeitos subjetivantes e objetivantes, ou seja, os dois se movimentam nas dimensões do corpo, do organismo, da inteligência e do desejo para desenvolverem-se nos seus processos de aprendizagem.

Cada um, com sua singularidade que participa de ambientes sociais diferentes, apresenta-se ao mundo de maneira distinta, acredita-se que cada pessoa tem seu mundo privado, ao lado dos demais. O mundo é o lugar do encontro, onde nós reencontramos os instrumentos que construíram nosso próprio mundo. Nesse sentido, Freire (1996) propõe que ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo. É quando somos capazes de sentir o outro tanto na sua dimensão cognitiva quanto dramática, quando somos capazes de participar das coisas que acontecem ao nosso redor sem estarmos alienados, pois poderíamos dizer que a objetividade do sujeito pode ser questionável, no entanto, não podemos dizer o mesmo em relação a sua subjetividade. Daí a importância em estarmos atentos ao "mundo" do sujeito aprendente. Um mundo, que vem recheado de mitos, crenças, valores, fantasias, ideais, com o qual é preciso entrar em contato utilizando o conhecimento, tanto dos profissionais envolvidos na educação, como daqueles que indiretamente influenciam o espaço escolar.

Dessa maneira, pensamos que é preciso que o profissional da educação esteja em constante formação, pois é ele e seu aluno que ocupam o espaço da sala de aula, são eles que lidam cotidianamente com a dinâmica do aprender/ensinar e com todos os atravessamentos. A afirmação de Vasconcelos (2003) enfatiza que o professor para se atuar verdadeiramente como tal deve considerar sempre a realidade da sala de aula, sabendo que é com os alunos que ali estão que ele terá que trabalhar e, além disso, que a escola e o país são aqueles elementos que terá que considerar.

Por isso, não podemos perder de vista que a cada ano letivo, cada classe, cada aluno, cada professor é único. Devemos ter a consciência que no universo escolar existe um imaginário social que se constrói e precisa ser reconhecido. Esse reconhecimento nos levaria a compreender como professores e alunos pensam e atuam no espaço escolar, pois esse espaço é temporalmente contextualizado. Nele, existem regras, combinados, histórias, fantasias, mistérios, formalidades, enfim, uma série de coisas que influenciam e contribuem para a produção de sentido na educação.

Perceba que ao citarmos educação, estamos falando num sentido de conduzir o sujeito para fora de si mesmo, mais livre, criativo e inventivo. Queremos romper com aquela forma de fornecer, trazer, dar, tendo como objetivo um ensino passivo e alunos imóveis. No entanto, temos consciência de que existem dentro do espaço escolar conflitos que ora se mostram visíveis e invisíveis entre estas concepções de escola. Nem sempre as mudanças educacionais que se anunciam se concretizam no cotidiano das escolas.

O desafio está lançado, o sentido da escola está inserido em muitas outras formas de construção e compreensão da realidade do que, propriamente, na rede curricular, nos trabalhos de sala de aula, nas provas e avaliações, nos resultados escolares. Entendemos que o sentido da escola está no olhar, na escuta, no sorriso, nos afetos e desafetos, nas intrigas, no redescobrir a alegria do conhecimento, a aventura da imaginação.

Nesse aspecto, acreditamos que fazer da escola um lugar que reconheça crenças, desejos, fantasias, valores e os saberes espontâneos trazidos pelos alunos proporcionariam aos profissionais da educação abertura de espaços para romper com a resistência ao desconhecido revolucionando assim as práticas pedagógicas.Desse modo, levaria os profissionais a refletiram sobre o papel que desempenham em sala de aula como também possibilitaria que os mesmos reconhecessem seu estilo de aprendizagem.

O papel do professor e o estilo de aprendizagem

O espaço da sala de aula é um lugar privilegiado, nela se encontram professores e alunos que participam de ambientes sociais diversificados que necessitam estabelecer uma convivência. Como lembra Vasconcellos (2003) o professor necessita colaborar com a formação do educando na sua totalidade - consciência, caráter, cidadania -, tendo como mediação fundamental o conhecimento, visando à emancipação humana.

Todavia, muitas características de cada um dos envolvidos estão presentes nesse processo, uma vez que estamos lidando com a complexidade do próprio homem que se constitui ser humano, capaz de transformar sua própria realidade, ao interagir com a cultura por ele produzida. Poderíamos dizer que algumas dessas características como consciência, ética, estética, vínculos, aprendizagem, diferenças, linguagem, projeto, desejo, sonho, cultura, alegria, esperança, compromisso, imaginação, criatividade e outros, articulam-se com o lado positivo do ser. No entanto, não esqueçamos que essas características só existem por que há os seus opostos como ódio, inveja, egoísmo, indiferença, exploração, mentira, crueldade, alienação, preconceito, entre outros. Não existiria o claro sem o escuro, o rico sem o pobre, o preconceito sem as diferenças, a verdade sem a mentira.

Sem dúvida é essa dualidade que nos constitui sujeito participante de um mundo repleto de informações que cada vez mais nos exige interação com o objeto de conhecimento, e para isso necessitamos do outro para nos desenvolvermos cognitivamente e afetivamente para nos diferenciarmos dos demais. Diante dessa complexidade que é o homem, e se acreditamos que o conhecimento é objeto de mediação que possibilita a emancipação do ser, então, como enfrentar tal desafio em sala de aula?

Convém lembrar que na sala de aula nos deparamos com todas essas questões, visto que é o lugar, instituído pela sociedade, para a concretização das aprendizagens, lugar de encontro de pessoas que carregam no seu íntimo quase todas essas características já citadas. Assim, para lidar com todas essas dimensões consideramos ser essencial despertar o desejo de quem aprende e também de quem ensina, pois é o desejo que impulsiona os seres humanos a se movimentarem no mundo. Dessa maneira, entendemos que sendo a educação intencional e sistemática, que interage com a realidade, com o social e o cultural, deveria encontrar meios de despertar o desejo para o processo de construção do conhecimento.Acreditamos que uma das formas seria investir no conhecimento, no estudo dos problemas-chave da realidade, da condição humana, a fim de capacitar os sujeitos para a intervenção.

Nessa perspectiva de construção do conhecimento alguns autores definem que o papel do professor é ajudar os alunos a entenderem a realidade em que se encontram, tendo como mediação para isto o conhecimento. Para isso, como destaca Vasconcellos (1993:31) "o professor lança mão da cultura acumulada pela humanidade; diante dos desafios da realidade e coloca o aluno em contato com este saber".

Vigotski (2003:77) ainda confirma que a "educação é realizada através da própria experiência do aluno, que é totalmente determinada pelo ambiente; a função do professor se reduz à organização e à regulação de tal ambiente". O que indica que o professor deve buscar o fazer pensar e propiciar a reflexão crítica e coletiva em sala de aula, ou seja, uma verdadeira atividade interativa que possibilite processos mentais superiores. No pensamento de Vigotski (1987) torna-se essencial sabermos que a intervenção do professor não pode estar muito abaixo do desenvolvimento real do aluno, nem muito acima do potencial, o que significa em esforço para poder atingir a zona de desenvolvimento proximal de cada um presente na sala de aula.

Assim, caberia ao professor ação consciente das funções que desempenha na sua sala de aula. Essa tomada de consciência os levaria a organizar seu trabalho pedagógico de forma a desenvolver no educando suas várias capacidades, como a de desafiar, de provocar, de contagiar, de despertar o desejo, fazendo com que ele realize, por meio da interação educativa, a construção do conhecimento (Vasconcellos, 1993). Assim, o professor agiria como facilitador das relações e problematizador das situações. Mas, como isso seria possível?

Acreditamos que o passo inicial seria por parte de nossos governantes investirem na formação dos professores. Pensamos que, à medida que as discussões inerentes à sala de aula se ampliem aos espaços acadêmicos e à comunidade escolar possibilitaria mais recursos à pesquisa e o próprio professor se sentiria um ser-pesquisador. O sentido que gostaríamos de empregar ao ser-pesquisador é aquele em que o professor possa reconhecer sua sala de aula como um ambiente diversificado de idéias, contextos, sentidos e histórias. Ao lado disso, ela seria utilizada como um lugar propício a novas descobertas, desafios e problemas que necessitam de soluções.

Na mesma linha, pensamos que, uma vez que o professor rompe com a idéia de que somente o aluno precisa se desenvolver cognitivamente e emocionalmente, o mesmo poderia dar mais significado ao processo de aprender/ensinar. Em termos práticos, entendemos que os professores precisam dominar o conteúdo que ensinam para poder transformá-los, para que se integrem com aquilo o que os estudantes já conhecem, promovendo uma compreensão mais significativa. Conhecer os recursos culturais dos alunos torna-se uma tarefa necessária para lidar com eles em sala de aula. Zeichner (2002) lembra inda que os professores precisam saber como tornar acessíveis os conceitos mais complexos, bem como conduzir discussões e especialmente como avaliar seus alunos.

Então, é essencial compreendermos que a tarefa do professor não é tão simples assim, pois além dele estar conectado com os estudantes é importante estar conectado a si mesmo, uma vez que estamos nos referindo a uma educação que se preocupa com as questões cognitivas, afetivas e sociais. Para isso, não podemos desconsiderar que o professor também passa por processos de desenvolvimento com relação à experiência pedagógica. Antes de ser professor ele é pessoa como qualquer outro que pensa, chora, entristece, alegra-se, e que também pode errar. São nos erros e acertos que sua experiência pedagógica amplia-se em conhecimentos, transformando sua sala de aula num lugar prazeroso e dinâmico.

Ignorar que os professores produzem conhecimentos seria medíocre, no entanto, percebemos que no espaço escolar isso é pouco ou quase nada reconhecido. Mesmo porque até então, as abordagens tradicionais educacionais ainda o enxergam como transmissores de conteúdos, como se os mesmos já os tivessem prontinhos para serem repetidos. Isso não é uma verdade absoluta, Freire (1996) ao dizer que o cotidiano escolar, esfera de formação repleta de sentido, vem nos formando em meio a situações que não se encontram no manual, o que pressupõe o fortalecimento de competências que venham constituir uma identidade que seja marcadamente reflexiva e emancipatória, chama-nos atenção que as mudanças mesmo que ocorram lentamente, estão presentes no espaço escolar.

Desse modo, entendemos que fortalecer competências significa acreditar que nós, professores, dispomos de um conhecimento prático adquirido no cotidiano escolar, conhecimento esse que perpassa uma pluralidade de dimensões. No entanto, nos tempos atuais somente esse conhecimento prático não basta, acreditamos que esses conhecimentos poderiam ser apropriados à medida que os professores reconhecessem os seus estilos de aprendizagem, os quais repercutem em suas maneiras de ensinar.

São vários os estudiosos que defendem a idéia de estilo de aprendizagem e estilos cognitivos, poderíamos estar citando alguns, mas nesse estudo optamos em citar apenas suas concordâncias, mesmo porque não há um consenso quanto às definições. Cerqueira (2000) em seus estudos confirma que eles concordam em um aspecto: o fato de que os conceitos de estilo não implicam habilidade, capacidade ou inteligência. A autora ainda comenta que quando se trabalha com o conceito de estilo de aprendizagem, não se opera uma delimitação de um conjunto de habilidades em si, e sim se trata de delimitar o modo preferencial de alguém usar habilidades práticas, não havendo estilos bons ou maus, mas apenas diferentes estilos de aprendizagem e estilos cognitivos.

O estilo de aprendizagem chama nossa atenção no sentido de compreender que cada um tem um jeito próprio de aprender e ensinar, no entanto, o professor ainda ensina segundo seu próprio estilo de aprendizagem sem levar em consideração que o aluno também tem um estilo de aprendizagem que é único. O que é uma ação natural do ser humano, pois às vezes queremos que as pessoas aprendam da forma como aprendemos, chegando até a mostrar passo a passo como se faz.

Romper com paradigmas cristalizados é uma ousadia, pois o professor além de ter consciência de seu papel de organizador e mediador; de ser um "passador" de conhecimentos, de finalidades, de significados, de sensações. Assim ele se depara com esse novo desafio de reconhecer que o estilo de aprender tem relação com o seu jeito de ensinar, proporcionando uma revisão de sua prática pedagógica. Por isso, Cerqueira (2000) propõe que o estudo e a análise dos estilos de aprendizagem oferecem aos indivíduos indicadores que os ajudam a guiar suas interações com as realidades existenciais vivenciadas, facilitando um caminho, por certo limitado, de auto e heteroconhecimento.

A mesma autora ainda sugere que conhecer os estilos de aprendizagem e elaborar propostas, deveria ser posta em prática desde o início da vida escolar, se incorporada às instituições de ensino como um dispositivo dinâmico de intervenção sobre as didáticas dos conteúdos escolares, não só disciplinarmente, mas na própria prática didático-pedagógica. Enfim, concluímos que o papel do professor se define como organizador, passador de conhecimento, à medida que ele reconheça que em sua sala de aula há distintos estilos de aprendizagem, inclusive o seu, e isso possa levá-lo a buscar construir novos saberes que o desafie a aprimorar sua prática pedagógica. Ao professor cabe a tarefa de articular, problematizar, desafiar, facilitar e mediar o saber com o conhecimento, então, é essencial que para existir os vínculos cognitivos, afetivos e sociais de uma relação estabelecida com o outro que aprende seja a partir de uma escuta sensível.

Escuta Sensível - uma possibilidade para novos vínculos.

Pedimos licença para transcrever o seguinte texto:

Se eu fosse professora eu...
Construiria uma escola cheia de jardins, parques, piscinas, quadras de esportes, laboratórios de informática, salas de inglês, de francês e espanhol, professores legais e simpáticos, aulas de arte, química, física, piano, violão, educação física, de dicionário, coisas desse tipo sabe. As minhas amigas claro com faculdade. Trataria meus alunos sempre bem, seria legal, ensinaria, organizaria mutirões para pintar a escola, ajeitar as mesas, as cadeiras, limpar a parede o quadro, essas coisas. Também poderia fazer uma vaquinha para ajudar as crianças carentes e os adultos. Construiria um asilo para que não ficassem mendigos porque eles são seres humanos. Organizaria gincanas entre as turmas, faria piqueniques nas sextas-feiras para dar uma quebrada na rotina. Decoraria os murais, faria campanhas pela paz, justiça, etc. Um mundo melhor se faz com amor, confiança, força de vontade, alegria, e, principalmente inteligência. Sabe, também poderia fazer caminhadas e sem falar de ensinar bem, dar banhos de piscina, brincar na hora do recreio, fazer um lanche delicioso para as turmas do colégio. Faria tudo para o bem das crianças, pois elas serão os adultos de amanhã. Por isso, quanto mais você ensinar, amar, educar e brincar deixar que as crianças se divirtam você estará fazendo um grande bem para a nação, pois o mundo, as crianças, os adolescentes, os adultos e os idosos precisam de amor, respeito, carinho, afeto e principalmente compreensão.
(Aluna de 4ªsérie - Escola Pública do DF - 10 anos)

Tudo na vida tem um propósito, desde os atos mais simples aos mais complexos, e o nosso, ao transcrever esse texto, foi de iniciar essa seção com uma escuta bem sensível, pois esse texto traduz quase tudo que necessita ser (des)velado nas escolas, na nossa sociedade, enfim, no mundo. Por isso, buscamos a escuta sensível como um dos referenciais deste artigo. Escutar no seu sentido mais simples é ouvir com atenção. Uma criança recém-nascida quando chora quer manifestar a sua mãe alguma mensagem que pode ser traduzida por fome, dor, manha, solidão, etc. e sua mãe com seu instinto materno, ou melhor, dizendo, com sua intuição, sempre irá desvendar o mistério dessas mensagens. De uma forma, ou de outra essa mãe será perceptiva aos sentimentos dessa criança e a acolherá para satisfazer seus desejos, pois na vida, cada um de nós, "necessita da interpelação do outro como espelho ativo para encaminhar-se a seus valores últimos e para deles fazer uma verdadeira força interior" (Barbier,1998:169).

Assim, inicia-se uma escuta sensível, que parte do senso comum, de um simples ato de amor de mãe para com o filho, que rompe barreiras e passa a existir em outros espaços como hospitais, escolas, empresas, em que há relações estabelecidas entre pessoas que em algum momento de sua vida necessitam de um acolhimento de ser escutado, ou para lidar com o sofrimento, ou para lidar com alegrias. A escuta que iremos abordar serve para qualquer um desses espaços, no entanto, iremos dar mais atenção ao espaço educacional, pois nele espera-se uma sistematização do conhecimento construído pela humanidade ao longo de sua história a fim de fazer do cidadão uma pessoa reflexiva, crítica e consciente de seus direitos e deveres para que possa participar desse mundo com dignidade e autonomia.

Quando se fala em conhecimento muitos aspectos estão envolvidos: relação de poder, currículo, projetos, política, ética, compromisso, qualidade, vínculos estabelecidos, cultura, emoções, enfim uma série de questões que de alguma forma influencia nesse processo de construção da aprendizagem. Dessa forma somos todos reféns de esquemas de representações e ações que nos atingem através de nossa família, de nossa classe social e que nos conduz a um conformismo social inconsciente (Barbier, 2002).

O aprender acaba sendo um diálogo entre o saber e o conhecer, assim esse diálogo passa por uma relação de empatia entre quem aprende e quem ensina, lembrando que estamos falando de uma relação dialética entre ensinar e aprender, pois nesse contexto acreditamos que todos são capazes de ensinar e aprender. Esse sentimento de identificação entre os pares é o ponto de apoio para a escuta sensível. Como já citado anteriormente Barbier (2002) diz que o profissional que se propõe a trabalhar com a escuta sensível deve saber sentir o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro para poder compreender de dentro suas atitudes, comportamentos e sistemas de idéias, de valores, de símbolos e de mitos. A escuta sensível e multirreferencial não é a projeção de nossas angústias ou de nossos desejos, ela propõe um trabalho sobre o eu-mesmo, em função de nossa relação com a realidade, com o auxílio eventual de um terceiro ouvinte, que no caso desse estudo poderia ser o professor e/ou o professor - pesquisador.

Outro aspecto considerado por Barbier (2002) é que a escuta sensível e multirreferencial não se fixa sobre interpretação de fatos, ela procura compreender, por "empatia", como já foi dito, o sentido que existe em uma prática ou situação. É como a arte de um escultor sobre a pedra, que para fazer aparecer a forma, deve antes passar pelo trabalho de vazio e retirar todo o excesso para que a forma surja. O autor ainda aborda que a escuta se apóia na totalidade complexa da pessoa (os cinco sentidos) a postura que se requer para uma escuta sensível é uma abertura holística. Trata-se na verdade de se entrar numa relação de totalidade com o outro, tomado sua existência dinâmica. Alguém só é pessoa através de um corpo, de uma imaginação, de uma razão e de uma afetividade, todos em interação permanente. A audição, o tato, a gustação, a visão e o olfato precisam ser desenvolvidos na escuta sensível.

Uma última característica citada por Barbier (1999/ 2000) é que a escuta sensível é, antes de tudo, uma presença meditativa. A pessoa que está neste processo meditativo está em um estado de hipervigilância, de suprema atenção, ou seja, o contrário de um estado de consciência dispersa. Por esta razão, a escuta, neste caso, é de uma sutileza inigualável. A escuta é sempre uma escuta-ação espontânea. Ela age sem mesmo pensar que o faz. A ação é completamente imediata e se adapta perfeitamente ao evento.

Enfim, Barbier (1998) conclui que a escuta sensível e multirreferencial é importante na educação. Ele afirma que o outro-que-escuta não tem de dizer "a verdade" nem de proclamar "é preciso". Deve simplesmente escutar e responder adequadamente à demanda, freqüentemente implícita, do aluno, do professor, etc. Ainda com a palavra o autor confirma ser uma decodificação difícil, pois o mesmo entende que, o conhecimento teórico e a experiência não bastam para sentir o que se deve fazer. Ele sugere que apenas a escuta sensível que integra e ultrapassa ao mesmo tempo a experiência anterior e o saber psicológico, permite chegar a uma atitude justa e a um comportamento pertinente. E finaliza com a seguinte indagação: por que insistir em tirar a venda daquela pessoa que ainda precisa da escuridão sobre o seu rosto?

Concluindo nossas reflexões é importante frisar que ficamos com a mesma indagação, mesmo porque o silêncio do outro, os seus movimentos e a sua falação podem estar querendo denunciar muitos sentimentos que se relacionam com a aprendizagem ou não. Na sala de aula isso é bem visível, muitas vezes deixa o professor sem ação ou com ações exageradas diante de certas situações. Não podemos culpá-los, ao buscar a escuta sensível nossa intenção é justamente tentar decodificar os sentimentos dos envolvidos no processo de ensino/aprendizagem. Todavia, uma coisa é certa, possibilitar o novo é ousado e desafiador, pois lacunas existem e fazem parte de qualquer processo, principalmente quando nos referimos ao processo de ensinar e aprender que envolvem questões sociais, culturais, políticas, econômicas, afetivas e cognitivas.

 

Referências

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Endereço para correspondência
SQN 315 Bloco H Apto 304
70774-080 Brasília-DF
teresacristina@unb.br

Recebido em: agosto/2005
Revisado em: março/2005
Aprovado em: abril/2006

 

 

Sobre a autora:

1 Teresa Cristina Siqueira Cerqueira é doutora em Psicologia da Educação pela UNICAMP e docente da Universidade de Brasília - UnB.