SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.7 issue1Public and private schools procedures toward domestic violence in São PauloMitos familiares e escolha profissional: uma visão sistêmica author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Psic: revista da Vetor Editora

Print version ISSN 1676-7314

Psic vol.7 no.1 São Paulo June 2006

 

RESENHA

 

POPI - Programa de Orientação Profissional Intensivo: outra forma de fazer orientação profissional

 

 

Rodolfo Augusto Matteo Ambiel1

Universidade São Francisco

Endereço para correspondência

 

 

Mahl, A. C., Soares, D. H. P., & Oliveira Neto, E. (orgs.) (2005). POPI - Programa de Orientação Profissional Intensivo: outra forma de fazer Orientação Profissional. 1ª ed. São Paulo: Vetor.

O livro apresentado nessa resenha trata das dificuldades inerentes à escolha profissional. Ao escolher uma profissão, o jovem se vê em meio a vários dilemas: "Devo fazer o que realmente gosto ou o que me dê mais dinheiro? Faço o que quero ou o que meus pais querem que eu faça? Afinal de contas, tenho mesmo que ir para a universidade?" E um agravante nessa situação é o fato de que essa escolha tem data para acontecer: assim que se encerrarem as inscrições para o vestibular, encerra-se também o prazo para a escolha. A urgência dessa decisão se caracteriza como algo, no mínimo, cruel para o adolescente, já perturbado por tantas dúvidas, típicas dessa fase do desenvolvimento psicossocial. Se não decidir no prazo, já está atrás na corrida por uma boa posição no mercado de trabalho. Como se vê, apesar de ser uma decisão tão íntima, o jovem tem que prestar contas de sua escolha à sociedade.

Procurando aliviar a angústia que essa situação complexa e dinâmica pode causar, o LIOP (Laboratório de Informação e Orientação Profissional, da Universidade Federal de Santa Catarina -UFSC), que há quase 20 anos desenvolve trabalhos na área de orientação profissional, manteve durante certo tempo um programa chamado "Plantão ao Vestibulando". Este programa, que funcionava durante o período de inscrições para o vestibular da referida Universidade, consistia em um atendimento único e pontual, visando diminuir a ansiedade e resolver pequenos conflitos que eclodiam frente ao preenchimento da opção de curso da ficha de inscrição. O livro POPI - Programa de Orientação Profissional Intensivo: outra forma de fazer Orientação Profissional, organizado por Álvaro Cielo Mahl, Dulce Helena Penna Soares e Eliseu de Oliveira Neto trata do método desenvolvido na elaboração do Projeto POPI e traz a experiência e resultados práticos desse programa.

O livro é dividido em duas partes, sendo a primeira composta por cinco capítulos e a segunda, por dois outros. No primeiro capítulo, Eliseu de Oliveira Neto conta a origem do projeto, abordando a dificuldade que o LIOP enfrentou quanto ao aumento da demanda de candidatos inscritos, principalmente às vésperas dos vestibulares, o que propiciou a criação e viabilização do projeto em um modelo intensivo, tomando a forma de um "retiro". O mesmo autor, juntamente com Álvaro Cielo Mahl, abordam e fundamentam a metodologia do programa no capítulo dois, fazendo um resgate de conceitos ligados a uma abordagem psicodinâmica do desenvolvimento adolescente, tais como a influência dos grupos nas decisões pessoais, a ânsia de separação dos pais, misturada com a necessidade de atenção por parte deles, a dificuldade de investimento de energia psíquica em um único objeto, a urgência de escolha imposta pela sociedade, que faz com que o adolescente desvie a energia, que seria investida em outros objetos para o problema da decisão profissional e as dificuldades que a ansiedade dos pais podem trazer para a já conturbada situação pela qual o jovem está passando.

Para tratar deste último assunto, Andréa Knabem e Dulce Helena reservam o capítulo três, abordando a problemática das relações familiares conflituosas que acabam por influenciar e dificultar as escolhas. Os autores afirmam que a presença dos pais nas reuniões que precedem os encontros e naquelas que os encerram se faz necessária para que possam ser ouvidos a respeito de suas angústias e expectativas a respeito do futuro profissional dos filhos e para poderem discutir com eles, num ambiente propício, os problemas inerentes ao processo de escolha. São apresentadas ainda dicas e esquemas para a preparação das reuniões dos pais e relatos de experiências ocorridas durante o POPI II.

Oliveira Neto, psicólogo habeatra, entre uma revisão teórica dos aspectos mais essenciais do desenvolvimento adolescente e um breve posicionamento do papel do orientador no processo de escolha profissional, compreendido como um facilitador, discute o narcisismo imperante e operante em nosso século e o papel da mídia na vida cotidiana do adolescente. O autor ainda levanta uma interessante discussão sobre o deixar de ser adolescente e os ganhos e as perdas inerentes a essa cisão, afirmando que o desejo de permanecer jovem se encontra bastante presente na sociedade contemporânea.

Os três organizadores trazem no capítulo 5, que encerra a parte de apresentação do programa, uma série de técnicas utilizadas em grupos de orientação profissional (OP), a maioria dando conta de que as atividades são para grupos de até 12 pessoas. Alertando para o fato de que cada edição do programa, por ser constituído por jovens diferentes, demanda certas mudanças para adequá-los aos freqüentadores, os autores afirmam que o coordenador de um grupo de OP bem preparado é aquele que se baseia em sua experiência regressa, mas mantém-se aberto e atento para as mudanças, que se processam rapidamente, para poder particularizar os métodos, contextualizando-os conforme a necessidade.

As técnicas apresentadas no capítulo são dividas em seis tipos, cada um com uma especificidade e uma finalidade dentro do processo de orientação. Os tipos de técnicas são apresentação, autoconhecimento, influências da família, para trabalhar a realidade social, informação profissional e para trabalhar a ansiedade no vestibular, totalizando 26 dinâmicas. Dentro de cada tipo, são descritos detalhadamente os procedimentos e objetivos de cada dinâmica, além de informações a respeito do tempo e materiais necessários, comentários, exemplos extraídos da experiência clínica dos autores e alguns referenciais teóricos.

Dentre as dinâmicas apresentadas, vale comentar duas que os autores abordam mais profundamente. Uma delas trata do uso do genoprofissiograma. A idéia dessa técnica é fazer com que o adolescente monte uma árvore genealógica de até três gerações, enfatizando as profissões e alguns traços de personalidade mais marcantes dos parentes, propiciando a explicitação de influências que a estrutura familiar pode ter na escolha profissional do jovem. A partir dessas informações, poderá refletir e compreender melhor a problemática que o envolve, fazendo-o sentir mais seguro.

A outra, chamada Coffe-break da realidade social, que se encaixa no caráter intensivo do POPI, por ser realizado durante uma das refeições, utiliza-se das técnicas de psicodrama e envolve os jovens num jogo no qual eles são divididos em classes sociais (5% de ricos, 30% de classe média e 65% de operários). Cada casta recebe uma refeição diferente em qualidade e quantidade, simbolizando a realidade social da sociedade capitalista em que eles irão se inserir profissionalmente. O jogo objetiva levar os jovens a tomar contato com sua posição na pirâmide social e com seus sentimentos ao ter essa posição modificada.

Na segunda parte do livro, Novas interfaces da orientação profissional, os autores relatam algumas experiências em trabalhos de OP, tanto no processo de escolha quanto na preparação emocional para o vestibular, realizadas no LIOP e POPI. No capítulo 6, André Hawerroth Wiggers, Andréa Knabem, Dulce Helena Penna Soares e Pablo Raimundo contam a experiência de realizar uma etapa do processo de orientação ao ar livre. Para atingir os objetivos da proposta, os idealizadores adaptaram o Inventário de Âncoras Profissionais de Edgar Schein para a utilização em trilhas ecológicas. As âncoras, a saber, competência técnica e funcional, competência administrativa geral, autonomia e independência, segurança e estabilidade, criatividade empresarial, dedicação a uma causa, desafio puro e estilo de vida, são definidas pelo autor do inventário como combinações de áreas percebidas de competências, motivos e valores que servem de guia para as decisões relativas a carreira e são apresentadas sumariamente com as características principais, tipos de trabalho, remuneração e benefícios, sistemas de promoção e tipos de reconhecimento que as âncoras propiciam.

A trilha consiste em quatro caminhos, representando as possibilidades de escolha durante o desenvolvimento da carreira, identificados com placas contendo valores e expectativas em relação à escolha profissional. Ao longo do caminho, as afirmações retiradas do inventário de Schein se encontram expostas em cartazes, que são instruídos a levar consigo aquelas com as quais se identificarem. Na adaptação do inventário para a situação da trilha, optou-se por caracterizar cada frase de determinada âncora com uma cor diferente, para facilitar a conferência posterior. Em pontos estratégicos da trilha, como bifurcações ou mirantes, outras reflexões são propostas, sempre buscando estabelecer relações dos conflitos e dilemas enfrentados durante o processo de escolha com o relevo e características do terreno. Ao final da atividade, a troca de experiências entre os participantes é encorajada e a eles é dada uma explicação sobre as características que as frases da cor predominantemente escolhida revelam sobre suas preferências e opções profissionais.

A avaliação de procedimentos de orientação presencial e via internet a vestibulandos, que visam reduzir a tensão e a angústia que tendem a preceder as provas foi o objetivo de um projeto de pesquisa realizado pelo LIOP, documentado no último capítulo do livro por Dulce Helena Penna Soares, Geruza Tavares D´Avila e Raquel Guedes Pimentel. Na orientação presencial, o projeto contou com a participação de 31 jovens, divididos em grupos menores, que já haviam passado por todo o processo de orientação vocacional, e portanto, já haviam se decidido pelo curso a seguir. Foram utilizadas três técnicas nesse processo, quais sejam, o Cartaz da Foto do Vestibular, o Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE) e um formulário, desenvolvido por Soares, que possibilita ao vestibulando fazer uma avaliação do trabalho de orientação.

A técnica do Cartaz da Foto do Vestibular, segundo os autores, propicia de forma descontraída e lúdica, por meio de pinturas e desenhos, o trabalho de elementos importantes no processo de OP, levando o jovem orientando "a associar e expressar conteúdos pré-conscientes e inconscientes a partir dos materiais oferecidos a ele" (p. 170). O objetivo desse procedimento é proporcionar aos participantes a possibilidade de levantar os motivos, manifestos ou latentes, que o levaram a procurar orientação e de representar seus sentimentos a respeito do processo seletivo que irão enfrentar, sendo a técnica aplicada no primeiro e no último encontro, a fim de que os orientandos pudessem comparar suas representações em dois momentos distintos do processo.

Destinada aprofissionais engajados em promover programas de OP com grupos de adolescentes, a obra traz à tona importantes discussões a partir de experiências clínicas e vivenciais, e propõe, em linguagem técnica e acessível, novas formas de se promover reflexões a respeito da escolha e desenvolvimento de carreiras. Ao lado disso, mostra a possibilidade de se fazer um trabalho abrangente, englobando a grande demanda que busca por informações e orientação, sem perder a qualidade do serviço. Em síntese, em uma área como a OP, que carece de pesquisas nacionais, é imprescindível que outras obras, que tragam idéias originais e inovadoras, sejam publicadas e divulgadas no meio científico brasileiro.

 

 

Endereço para correspondência
Caixa Postal 594 - Bragança Paulista, SP - 12914-970

Recebido em: fevereiro/2006
Aprovado em: maio/2006

 

 

Sobre o autor:

1Rodolfo Augusto Matteo Ambiel é acadêmico da psicologia pela Universidade São Francisco. Bolsista de Iniciação Científica PIBIC/CNPq.