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Psic: revista da Vetor Editora

versão impressa ISSN 1676-7314

Psic v.9 n.2 São Paulo dez. 2008

 

RESENHA

 

A criança sobre um enfoque psicossocial

 

 

Adriana Munhoz Carneiro *

Universidade São Francisco

 

 

Assumpção Jr., F. B. & Kuczynski, E. (2008). Situações psicossociais na infância e adolescência. São Paulo: Atheneu, 360 p.

Em meio aos fatos que permeiam a sociedade em que vivemos, existem crianças e adolescentes que são vítimas de toda a espécie de violência, que muitas vezes sofrem caladas. Tais fatos, na maioria das vezes, geram seqüelas para o resto de suas vidas, e muitas vezes os sistemas públicos são falhos, o que acaba por piorar a situação das vítimas. Em Situações psicossociais na infância e adolescência organizado por Francisco Baptista Assumpção Jr. e Evelyn Kuczynski, são abordadas esta e outras questões, discutindo como os fatores biopsicossociais influenciam no desenvolvimento da criança e adolescente.

O livro inicia com Assumpção e Kuczynski em Desenvolvimento infantil e agentes estressores, destacando como se dá a formação do pensamento da criança, relatando a influência de fatores predisponentes, precipitantes, perpetuadores e protetores nesse processo. Comentam ainda como o papel do estresse e a percepção que possuímos dos eventos pode interferir na maneira de lidar com os mesmos, e finalizam sugerindo a criação de programas de intervenção para controle dos fatores estressores e aumento da resiliência dos jovens e crianças.

Na seqüência Makilim N. Baptista, em Impacto do Estresse na Criança discute os principais agentes estressores para crianças e adolescentes, expondo a dualidade que estes podem causar, levando a criança tanto a vulnerabilidade quanto ao desenvolvimento da resiliência. Exemplos dos principais tipos de estressores e a importância da família nesse contexto também são abordados, sugerindo ao final o desenvolvimento de programas preventivos visando à promoção da saúde mental.

Edgard Belfort, no texto Estrés, homeostasis y adolescentes discute os fatores que geram na criança e no adolescente uma "adaptação" mais adequada a problemas ligados a enfermidades crônicas, problemas de saúde e abuso de substâncias. Abrange também qualidade de vida e estresse, seus fatores de risco, causas e sintomas, assim como o papel do estresse na vida do adolescente e jovem adulto. Ainda, fala sobre estresse pós-traumático, transtornos de adaptação e fatores ligados a resiliência e prevenção, trazendo considerações seu melhor manejo e prevenção.

Em seguida, em A criança resiliente - resistência e vulnerabilidade, Haim Grunspum relata a situação mundial atual deste tema, e como a resiliência é importante nesta questão. Retrata também a influência dos pais na vida das crianças questões como inatismo e plasticidade cerebral. Ainda, define o perfil de uma criança resiliente, suas principais fontes e como promovê-la. Por fim, aborda alguns tópicos sobre estratégias para promover fatores protetivos na época escolar inicial.

Já Kuczynski e Assumpção Jr., em Qualidade de vida e fatores de risco, discutem a necessidade de considerar a avaliação da saúde conforme dois conceitos: a má saúde e a anormalidade patológica, conceituando e expondo estudos sobre saúde e qualidade de vida. Nesta linha, os autores citam os instrumentos utilizados para mensuração da qualidade de vida em adolescentes e crianças, e suas respectivas propriedades psicométricas. O capítulo é concluído com os autores ressaltando a abrangência da utilização do termo qualidade de vida e as dificuldades em se universalizar o conceito.

Seqüencialmente, José Marcelino Bandin, no capítulo sobre A criança em situação de pobreza extrema, expõe dados estatísticos acerca da pobreza no Brasil e fatores que, quando ausentes ou inadequados, comprometem o desenvolvimento infantil. Outros fatores de risco, provenientes principalmente do ambiente psicológico e social são descritos, demonstrando a repercussão e impacto da pobreza na vida da criança. Aborda ainda psicopatologias e suas associações com a pobreza, indicando alguns fatores responsáveis e medidas que vêm sendo tomadas sobre essa situação.

O capítulo escrito por José Raimundo da Silva Lipp, A criança maltratada, apresenta uma contextualização sobre estudos na área de abusos contra as crianças, e os diferentes tipos de violência existentes, definições e classificações. Discute ainda a criação de leis e do Estatuto da Criança e Adolescente no Brasil, elucidando sua importância para a promoção do bem-estar. O capítulo também versa sobre a população jovem atual e uma de suas principais formas de morte, o suicídio, demonstrando estudos que denotam relações entre vítimas de abuso e suicídio na adolescência, e a influência dos fatores preditores neste contexto.

Seguindo a mesma linha, Âmbar Velasco Rizzo, em El Niño en situaciones de riesgo: violência, abuso y negligencia trata sobre o histórico de abusos contra as crianças e remete aos dias atuais. Nesse sentido, é demonstrada a possibilidade do sofrimento do abuso em crianças e adolescentes causar transtornos psicopatológicos, como depressão e transtorno de estresse pós-traumático, além de gerar vulnerabilidade. Por fim, apresenta brevemente como ocorrem as formas de intervenção, tratamento e recuperação do sujeito que sofre abuso.

O próximo capítulo, El niño y Adolescente con una enfermedad crónica o discapacitante, Maria de la Concepción Galiano Ramirez explica sobre os quadros crônicos de saúde, fatores de risco, estressantes, predisponentes, precipitantes e perpetuadores dos mesmos. Igualmente, relata sobre enfermidade, riscos de crianças e adolescentes serem acometidos por estas, e o papel da família nesse contexto, tanto como rede suportiva quanto aquela que predispõe o sujeito a vulnerabilidade, finalizando apontando estratégias e recursos para as crianças superarem as doenças.

Maria Júlia Kóvacs, em A criança em luto: separação e morte fala brevemente sobre o luto e o seu processo, expondo a necessidade de informar a criança sobre o luto e da importância desse processo. Descreve também sobre como a criança compreende esse conceito e as técnicas existentes para lidar com tal perda e externalizar seus sentimentos, trabalhando com o desapego.

O capítulo, A noção de estresse pós-traumático e a simplificação do conceito de risco, de Durval Mazzei Nogueira Filho, versa sobre a história do transtorno estresse pós-traumático (TEPT) até suas definições na Classificação Internacional de Doenças (CID) e Manual Estatístico e Diagnostico de Transtornos Mentais (DSM). Cita ainda os eventos que antecedem a definição de TEPT, algumas de suas causas, métodos de intervenção e tratamento, fármacos, psicoterapia e prevenção.

Roberto Chaskel e Marta Millán, em Factores de riesgo, psicopatologia e intervención en los hijos de padres com transtornos mentales relatam doenças influenciadas pela hereditariedade, fatores sociais e o papel dos pais na vida da criança, discutindo os efeitos que a pais com transtornos mentais podem causar na relação pais-filho. Ainda, diante da premissa de associações entre a enfermidade do pai com os transtornos emocionais do filho, comentam sobre como se dá a prevenção e apresentam algumas formas de intervenção possíveis.

Claudio Cohen e Gisele Joana Gobbetti, em Aspectos éticos da criança sob risco discutem sobre o abuso sexual intrafamiliar e o papel da família, instituições de saúde e do Estado perante tal tema, apontando para a falta de estrutura protetiva dos que sofreram abuso. Além disso, abordam sobre trabalhos realizados em um centro de estudos e atendimento relativos ao abuso sexual intrafamiliar e chamam a atenção para problemas de omissão e dados que demonstravam conhecimento da própria mãe acerca do abuso. Aspectos bioéticos também são descritos, focando a posição do médico em relação a vítima de abuso e sentimentos pessoais.

O penúltimo capítulo, Ética en psiquiatria infanto-juvenil redigido por Carlos Alberto Bernard fala sobre a importância da estrutura e suporte familiar, citando a influência que a maternagem possui no desenvolvimento da criança e em como o impacto da convivência e da transferência pode acarretar na criança uma necessidade de tratamento. Ainda, descreve como construir um tratamento ético para crianças e adolescentes, enfatizando o trabalho multidisciplinar e as condutas necessárias para uma boa prática ao atendê-las.

O último capítulo Um modelo teórico de atendimento para um país pobre, escrito pelos organizadores do livro, enfatiza a necessidade de uma rede estruturada de atendimento as crianças, trazendo um modelo de atendimento. São citadas formas de organização deste sistema, que vão desde a utilização de instrumentos de screening eficazes até a priorização de tratamento diferenciado, segundo a necessidade e os métodos de intervenção, que vão da brinquedoteca a hospital-dia. Finalizam evidenciando a necessidade de uma equipe multidisciplinar eficaz para proporcionar um bom atendimento a elas.

Em suma, os capítulos demonstram situações que possibilitam ao leitor estimar como o processo desenvolvimental pode ser negativamente afetado, causando conseqüências negativas à criança e ao adolescente, assim como a importância de se prezar a resiliência e programas que promovam seu desenvolvimento, que é apresentada ao final de cada capitulo pelos autores. Os capítulos, mesmo escritos por autores de diferentes países, encontram-se inter-relacionados e servem como um ótimo referencial teórico, pois proporcionam uma visão ímpar sobre o cenário atual e a lacuna existente entre sociedade, profissionais de saúde e modelos políticos de cada país.

 

Recebido em: outubro/2008
Aprovado em: novembro/2008

 

Sobre o autor:

* Adriana Munhoz Carneiro e discente do curso de Psicologia da Universidade São Francisco.