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Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.5 no.1 Porto Alegre June 2006

 

ARTIGOS

 

Estudo normativo do Sistema Compreensivo do Rorschach para São Paulo: resultados dos índices PTI, SCZI, DEPI, CDI, HVI, OBS e S-CON

 

Normative study of the comprehensive system for the Rorschach in São Paulo: results for the PTI, SCZI, DEPI, CDI, HVI, OBS and S-CON indices

 

 

Regina Sonia Gattas Fernandes do Nascimento1

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Associação Brasileira de Rorschach e Métodos Projetivos

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo do presente artigo é apresentar, a partir de estudo normativo realizado com adultos não-pacientes no estado de São Paulo, os resultados dos índices especiais e das constelações do Sistema Compreensivo do Rorschach. Estes índices podem indicar a presença de patologias ou desajustes e traços ou estilos dominantes de uma pessoa. Este trabalho apresenta: estatística descritiva dos resultados dos índices da capital, do interior e da amostra completa; t de student para comparar as médias da capital e do interior; e qui-quadrado para comparar resultados positivos e negativos dos índices, da capital e do interior. Entre os resultados encontramos o PTI dentro de limites esperados, um aumento do DEPI, freqüência muito alta de CDI positivo. HVI e S-CON apresentam baixa freqüência. Foram encontradas várias diferenças entre capital e interior e foram realizadas algumas considerações a partir dos resultados.

Palavras-chave: Método de Rorschach, Sistema compreensivo, Indices especiais, Estudo normativo.


ABSTRACT

The purpose of the this article is to present, based on a normative study with non-patient adults in the State of São Paulo, the results of the special indices and constellations of the Comprehensive System for the Rorschach, which can reveal the presence of pathologies or disorders and traits or dominant styles of a person. This study presents: descriptive statistics for indices from the participants of the capital, interior and the results of the complete study; Student-t test to compare means in the capital and the interior; and chi-square to compare positive and negative results of the indices in the capital and in the interior. The results revealed the PTI within expected limits, an increase in the DEPI and very high frequency of positive CDI. There was a low frequency of HVI and S-CON. Various differences were found between the capital and the interior and considerations were carried out based on the results.

Palavras-chave: Rorschach method, Comprehensive system, Special indices, Normative study.


 

 

Introdução

Finalizamos recentemente um estudo normativo para o sistema compreensivo do Rorschach, no estado de São Paulo. Na primeira etapa desta pesquisa, aplicamos o Rorschach individualmente em 200 adultos não-pacientes, com idade variando entre 17 e 65 anos, de todos os graus de escolaridade e níveis sócio-econômicos, residentes na cidade de São Paulo, cujos resultados já se encontram publicados (Nascimento, 2002). Posteriormente aplicamos em outros 209 sujeitos, em cidades do interior do estado . Nossos resultados têm apresentado grandes diferenças quando comparados às normas americanas (Exner, 1999, 2003) e algumas semelhanças às de outros países, especialmente os de origem latina, o que sugere existir influência cultural nos resultados do exame de Rorschach. O conjunto dos resultados de toda a amostra deverá ser publicado brevemente (Nascimento, 2006).

Para o presente trabalho, decidimos focalizar os resultados das constelações e índices encontrados com estas pesquisas. As constelações são conjuntos de variáveis que podem indicar a presença de patologias ou desajustes, mas que também podem ajudar na compreensão da estrutura da personalidade, de estilos e traços dominantes das pessoas. No sistema compreensivo, até o momento temos as seguintes constelações e índices: SCZI (índice de esquizofrenia), DEPI (índice de depressão), CDI (índice de déficit relacional), HVI (índice de hipervigilância), S-CON (constelação de suicídio), OBS (índice de estilo obsessivo) e PTI (perceptual-thinking index - índice de transtornos de percepção e pensamento, que é decorrente de uma revisão do SCZI). Os índices são calculados pelas presenças de um conjunto de localizações, determinantes, conteúdos, respostas populares, atividade organizativa, qualidade evolutiva, qualidade formal e códigos especiais, determinados para cada quadro específico.

De acordo com Exner (1986), os índices devem ser checados antes de se dar início à interpretação de um protocolo. Eles foram incluídos para alertar quanto à possibilidade de se tratar de um caso com problemas sérios e quando considerados dentro de seus respectivos pontos de corte o avaliador deve buscar uma análise minuciosa para compreender a fonte das referidas alterações e a possibilidade de distúrbios psicológicos graves, com a possibilidade inclusive de um potencial suicida.

Todos estes índices foram organizados a partir de pesquisas, onde foram considerados os aspectos conceituais de cada quadro e a experiência empírica. Encontramos o histórico deles nas edições anteriores dos livros de Exner (1986, 1994) e na mais recente (2003). O único que se encontra apenas na última revisão do livro, ou seja, 2003 é o PTI.

Vamos nos deter um pouco nesse índice (PTI), uma vez que não se encontram referências a ele em bibliografia facilmente encontrada no Brasil. Esse índice foi criado em decorrência de problemas encontrados no SCZI, que hoje é considerado um índice que deve ser utilizado com certa cautela. O SCZI foi proposto por Exner na década de 70 para detectar casos de esquizofrenia, mas o refinamento dos estudos para diagnóstico de desordens afetivas e de personalidade evidenciou muitos casos de falsos positivos em SCZI. No final da década de 80 o índice foi revisado (publicado em 1991 nos Estados Unidos) e ainda assim sua aplicabilidade é duvidosa, com incidência de falsos positivos com resultados acima de 4, especialmente em casos nos quais existam condições semelhantes às psicoses. As conclusões errôneas da aplicabilidade deste índice, somada à complexidade do diagnóstico da esquizofrenia trouxeram problemas para sua utilização. Resultados de SCZI relativos aos critérios de [(X+% < 0.61) e (S-% < 0.41) ou (X+%< 0.50)] são freqüentes em inúmeros casos de não-esquizofrênicos, especialmente no Brasil, onde a porcentagem média de X+% é bem inferior à encontrada nos USA. Outra condição freqüente é o aparecimento de FQ-, bem como, na nossa experiência (não relatado por Exner) Sum6>6 ou Wsum6>17. A partir destas constatações, verificou-se a dificuldade de se trabalhar com as variáveis X+% e FQ-, o que levou Exner a substituí-las no índice. Paralelamente aos questionamentos relativos ao conjunto de variáveis deste índice foram evoluindo os estudos relativos às variáveis XA% e WDA%. Estas foram criadas para resolver as dificuldades do X+%. O XA% refere-se à soma das respostas de qualidade formal Xo+Xu+X+, onde todas são consideradas respostas adequadas aos contornos, independentemente de serem ou não comuns. O WDA% refere-se à adequação da qualidade formal das respostas com localização em W e D, excluindo-se Dd. Com estas novas variáveis e alguns ajustes nos códigos especiais críticos (Sum6 e Wsum6) foi criado o PTI, com a mudança de nomenclatura, por se ajustar melhor às finalidades do índice, que não inclui uma hipótese diagnóstica de algum quadro específico.

 

 

Quanto aos pontos de corte e suas respectivas interpretações temos as seguintes informações de Exner e Sendín (1999) e Exner (1986, 1994, 2000, 2003):

SCZI<4 - não tem valor interpretativo.

SCZI = 4 - não podemos concluir que se trata com certeza de um caso de esquizofrenia.

SCZI = 5 - é muito provável que se trata de um caso de esquizofrenia.

SCZI = 6 - é praticamente certa a hipótese de esquizofrenia.

O PTI, diferentemente dos demais índices, não apresenta ponto de corte para determinar se é positivo. Contudo, sabemos que valores mais altos são indicativos de distúrbios mais sérios da percepção e do pensamento. Seus resultados variam de 0 a 5 e Exner sugere que o ponto que diferencia a presença de distúrbios seja PTI>3, valores mais encontrados em amostra de esquizofrênicos, enquanto que população de não pacientes apresenta com grande freqüência resultados 0 e 1.

Os demais índices, de acordo com Exner & Sendín (1999) e Exner (2003) têm os seguintes pontos de corte e respectivas interpretações:

DEPI < 5 sem valor interpretativo.

DEPI = 5 - indica que a pessoa apresenta muitas características comuns aos deprimidos, ou se trata de uma pessoa com maior predisposição a uma séria perturbação do estado de humor.

DEPI > 5 - geralmente se refere a uma grave depressão.

CDI = 3 - sem valor interpretativo.

CDI > 3 a pessoa tem dificuldades para enfrentar as demandas do meio social, acarretando um déficit relacional.

S-CON = 8 - indica um risco iminente de suicídio.

S-CON = 7 - pode-se pensar também que a constelação seja positiva se aparecerem 7 variáveis, entre as quais MOR>3 esteja presente.

S-CON = 6 - também pode ser considerado positivo, se as 4 primeiras variáveis estiverem presentes, ou seja, FV+VF+V+FD > 2; Col-Shd Blends > 0; Ego < .31 ou > .44; MOR > 3.

Quanto aos índices de hipervigilância (HVI) e de estilo obsessivo (OBS), neste trabalho apenas indicaremos os casos positivos ou negativos, pois ambos apresentam uma forma mais complexa de cálculos. Quando positivo, o HVI indica que a pessoa apresenta uma atitude negativa e desconfiada em relação ao meio, podendo sentir-se vulnerável nos contatos e sua participação cautelosa no ambiente. O OBS, quando positivo, indica que se trata de uma pessoa com marcada tendência ao perfeccionismo, preocupada em não falhar, muito convencional e que tende a ser menos criativa, pela preocupação de agir corretamente. É um indicador pouco freqüente que aparece em apenas 2% da população americana de não-pacientes.

 

Método

Participantes

Para o presente trabalho a amostra será composta por 409 sujeitos, com as características descritas a seguir, que compõem a amostra da pesquisa de normatização, sendo 200 da cidade de São Paulo e 209 que vivem no interior do estado, distribuídos de acordo com as distribuídos conforme as Tabelas 1, 2, 3 e 4.

 

 

 

 

 

Como podemos observar, a distribuição dos participantes na capital e no interior evidencia uma grande semelhança das duas amostras, excetuando-se o nível de escolaridade dos participantes da capital, que inclui um número maior de pessoas com estudos além do curso universitário (escolaridade >16 anos).

Procedimento

Pela dificuldade de se encontrar uma amostra aleatória, tentamos ser criteriosos na escolha dos sujeitos, procurando escolher sujeitos com características bem variadas, no que se refere a sexo, idade, escolaridade, estado civil, profissão, e nível sócio econômico.

Na capital, os sujeitos foram procurados em seus ambientes de trabalho que cuidamos para que fossem variados (escritório, empresa de saúde, instituição pública, instituição de ensino, etc.) ou ambientes de estudo também variados (público, privado e de diferentes áreas). Como na amostra de Exner, também seriam procurados alguns sujeitos voluntários, de diferentes ambientes, fora do local de estudo ou de trabalho. Nas cidades do interior, nossa experiência mostrou ser mais fácil estabelecer os contatos a partir de alguns conhecimentos pessoais, ou buscando pessoas com certa influência na cidade que foram fazendo indicações e assim pudemos ir constituindo a nossa amostra, pois, ficou difícil encontrar empresas muito grandes e por isto não poderíamos selecionar muitos sujeitos em cada uma delas, bem como a amostra de cada cidade era relativamente pequena e procuramos não ultrapassar o limite de 5 sujeitos em uma mesma instituição, sendo estes com cargos e profissões variados. Desta forma conseguimos também uma amostra bastante variada.

A condição para a inclusão do sujeito na pesquisa, tanto na capital como nas demais cidades, era: sujeitos sem histórico de comprometimento psicológico ou psiquiátrico e que estivessem trabalhando ou estudando, com exceção de algumas donas de casa.

Inicialmente foi apresentada uma carta explicando resumidamente os objetivos da pesquisa. Quando o trabalho foi realizado por permissão de instituições, esta carta foi também entregue para um responsável. Nesta carta esclarecemos que não seriam oferecidos resultados específicos nem aos participantes, nem à instituição, pois nosso interesse era o grupo como um todo e não os casos individuais. Ademais, seria impossível neste período relativamente curto da pesquisa realizar um estudo individual de cada participante e agendar horários com todos, o que demandaria no mínimo triplicar o tempo previsto da pesquisa.

Codificação

A codificação foi realizada por duas pessoas separadamente, seguindo em primeiro lugar o livro de Exner (1999) e no caso de dúvida, na avaliação dos protocolos do interior também foi utilizado o livro de Viglione (2002). No caso de discordância, nas reuniões da equipe de pesquisadoras com a coordenadora da pesquisa decidimos qual a melhor codificação.

O cômputo dos resultados dos índices foi realizado pelo RIAP 5, o que diminui a probabilidade de erro de codificação.

Concordância entre codificadores

Foi realizado o estudo de concordância entre codificadores. Para esta atividade, no total foram selecionados 20% dos protocolos da amostra para ser codificado por um especialista que não participa da pesquisa. Os testes foram escolhidos seguindo um critério randômico, pelo número do participante na pesquisa, escolhendo-se um a cada 5 protocolos. Os resultados do índice Kappa, relativos às concordâncias entre diferentes codificadores mostraram-se bastante adequados, entre os quais, 28 variáveis apresentaram resultados iguais ou maiores do que 0.80. Destacam-se como valores abaixo de 0.40, os obtidos com as seguintes variáveis: DQv/+, DV, DR, ALOG e PSV que foram categorias muito pouco freqüentes, mas ainda mostram uma tendência à concordância,. Como absolutamente não confiáveis encontramos o índice relativo a CONTAM, mas este foi praticamente ausente em nossa amostra. Os resultados na íntegra encontram-se com a autora e devem ser publicados em breve.

Estudos Estatísticos

Foram efetuados os seguintes cálculos estatísticos, utilizando-se o programa SPSS 10:

• Média, desvio padrão, moda, mediana, valores mínimos e valores máximos dos índices PTI, SCZI, DEPI, CDI e S-CON da capital, das demais cidades do estado (que aqui chamaremos de interior) e da amostra total.

Qui-quadrado para comparar os resultados da capital e do interior de alguns índices categorizados : PTI >3; SCZI > 4; DEPI = 5; CDI = 4; HVI presente ou ausente.

T de Student para comparar as médias de PTI, SCZI, DEPI, CDI e S-CON da capital e do interior.

 

Resultados

Os resultados encontram-se nas tabelas a seguir.

 

 

Como podemos observar na tabela 5, a maioria dos índices e constelações apresentam a média dentro dos valores abaixo da indicação de presença de desajustes ou patologias. Salienta-se neste conjunto a média, mediana e moda do CDI, tanto em São Paulo, como no interior do estado, com valores mais acentuados do que o esperado.

 

 

 

 

A distribuição dos resultados do PTI (Tabelas 6, 7 e 8) encontra-se dentro das expectativas para uma amostra de não-pacientes, ou seja, a maioria apresenta resultados abaixo de 3. No entanto, podemos notar que na capital a proporção de participantes com indicação de distúrbios de percepção e pensamento é maior do que no interior, com uma indicação de diferença estatística a partir dos cálculos de qui-quadrado e do t de student, significantes ao nível .001.

 

 

 

 

Apesar de encontrarmos alguns valores muito elevados no SCZI (só na capital, 9 casos com SCZI = 5 e um com SCZI = 6 e grande freqüência de participantes com SCZI = 4), ainda podemos afirmar que a distribuição apresenta resultados na direção esperada (88% dos casos com SCZI negativo, contra 12% de positivos). No entanto, as médias das duas amostras apresentam diferença estatisticamente significante, ao nível de 0,001, indicando freqüência mais alta para a capital (21% dos casos), o que em princípio é um valor acentuado. No entanto, é importante salientar que a presença de alguns sinais deste índice são conseqüência da diferença das porcentagens esperadas principalmente nos indicadores da qualidade formal, muito diferentes dos resultados da amostra americana, com a qual os pontos de corte das diferentes variáveis do índice foram estabelecidos. Como exemplo podemos citar os indicadores X+%< .61 ou X+%< 0,50, quando a média de X+% da nossa amostra é 0,48, a mediana 0,48 e a moda 0,50, o que contribuiu em diversos casos para que a constelação se tornasse positiva. Portanto, é muito provável que encontremos esta variável positiva na constelação de um protocolo de Rorschach, e a própria constelação positiva, sem valor interpretativo (Tabelas 9, 10 e 11).

 

 

 

 

Os resultados de DEPI (Tabelas 12, 13 e 14), para a maioria da nossa população também não apontam problemas nesta esfera, contudo, consideramos que a parte da amostra que apresenta resultados positivos é muito alta, com freqüência de 20%. Os resultados estatísticos apontam uma tendência a resultados mais acentuados na população da capital, com freqüência de 23,5%, versus 11,7% no interior, embora a diferença não seja estatísticamente significante. Se considerarmos os valores de DEPI = 6 ou 7, excluindo os casos com o valor de DEPI = 5, a proporção diminui bastante, o que oferece maior valor interpretativo de depressão com valores 6 ou 7, como propõem Exner & Sendín (1999) e Exner (2003) embora este autor afirme que não se trata de um valor de pouca importância, quando DEPI é igual a 5, ao examinar os dados de suas pesquisas.

 

 

 

 

Quanto ao CDI, não podemos afirmar que apresenta uma distribuição esperada. Não encontramos diferença estatisticamente significante, entre as duas amostras, sendo positivo (>3) em aproximadamente 54% na capital e 56% no interior (Tabelas 15, 16 e 17).

Foram poucos os participantes que apresentaram resultados alterados, no entanto, os poucos nos chamam a atenção. As duas amostras apresentam diferença estatisticamente significante (p= 0,10), quando as médias são comparadas com o t de student, com tendência a resultados mais elevados na capital. No entanto, com os resultados categorizados em positivos ou negativos não encontramos diferença estatisticamente significante. Como no SCZI, diversas variáveis do S-CON tem o ponto de corte acima do que encontramos na maioria dos casos de nossa amostra, por exemplo, X+% < .70, ou R < 17. Portanto, provavelmente alguns de nossos casos podem ter apresentado valores acentuados em S-CON, por se tratar de um modo habitual de nossa população responder, o que, por um lado, nos recomenda que devemos ter muita cautela ao interpretar os casos individuais para não considerarmos falsos positivos, mas, por outro lado, é importante levar em consideração que a grande maioria de nossa população não apresentou resultados positivos no índice, o que indica que ser positivo não é irrelevante. A consideração de Exner & Sendín para estar atentos para resultados positivo nas 4 primeiras variáveis, ou seja, FV+VF+V+FD > 2; Col-Shd Blends > 0; Ego < .31 ou > .44; MOR > 3 pode ser uma boa sugestão para a interpretação desta constelação em nosso país (Tabelas 18, 19 e 20).

 

 

 

 

Quanto ao HVI (Tabela 21), observamos o índice positivo em apenas 6% da amostra Estes casos são predominantemente encontrados na capital, sendo que os resultados indicam diferença significativa, ao nível de .008 quando comparadas ambas as amostras. Não foram realizados estudos estatísticos com o OBS, uma vez que não encontramos nenhum caso onde esta constelação fosse positiva.

 

 

Considerações finais

No geral podemos dizer que os índices parecem refletir a expectativa de uma amostra de não pacientes e podemos pensar que sejam capazes de identificar na nossa população a indicação das patologias e desajustes, apesar das variações dos resultados normativos de São Paulo, quando comparados aos da amostra americana de Exner (2003).

Chamam-nos a atenção algumas variáveis do SCZI e S-CON quase sempre presentes, bem com indicadores de alguns traços depressivos na nossa população e muitas das variáveis do CDI. Podemos pensar que alguns destes resultados aconteçam em função dos pontos de corte que deveriam ser diferentes, levando-se em consideração nossos resultados normativos, tais como os referentes a R ou X+%, como já vimos, que não foram incorporados aos índices e constelações. Andronikof-Sanglade (2000 ) também se refere a alteração do SCZI na Europa, em função dos resultados da qualidade formal. Ressalta-se ainda a freqüência dos códigos especiais críticos, muito mais acentuados na nossa população, que merecem uma atenção especial. Com relação a estes códigos, Ephraim (2000) também comenta sua alta freqüência na Venezuela. Este autor justifica esta freqüência, por serem consistentes com a tradição cultural de seu país, onde o realismo mágico encontrado na literatura de seu país expressa o sincretismo encontrado nas combinações inusuais do Rorschach. Estes códigos apresentaram-se mais aumentados na capital, e como 2 dos aplicadores da pesquisa haviam apresentado resultados muito mais elevados que os demais, foi realizada uma revisão cuidadosa de cerca de 80 protocolos (referentes aos 2 aplicadores). Houve de fato uma diminuição do WSum6, embora ainda os resultados da capital sejam mais acentuados do que os da amostra americana de Exner (2003) e ao refazer as freqüências dos índices encontramos poucas alterações com os que já havíamos obtido antes da revisão. Esta presença sugere que as pessoas da capital demonstraram menos cuidados e críticas ao apresentar respostas bizarras, o que pode indicar pessoas menos convencionais. O resultado destes códigos também é responsável pela elevação de PTI ou SCZI, e diminui a possibilidade de interpretação de distúrbios graves em muitos casos. Ou seja, podemos ter em nossa amostra falsos positivos em diversas constelações.

A mesma linha de raciocínio utilizada para compreender o aumento de SCZI pode ser utilizada para compreender o OBS, no sentido inverso, ou seja, poucos participantes obtiveram resultados muito elevados nas variáveis relativas à qualidade formal. No entanto, notamos também por uma análise qualitativa que muito poucos participantes tenham evidenciado traços de estilo obsessivo.

A alta freqüência de DEPI positivo também nos chamou a atenção. Estes resultados são semelhantes a outros países de origem latina, como Portugal, Espanha e Venezuela. É importante levar estes dados em consideração para se fazer um diagnóstico clínico com este índice. Weiner (1986, apud Ephraim, 2000) também afirma que as variáveis deste índice podem não ser uma indicação suficiente da perspectiva conceptual e devemos ser cuidadosos quando a avaliação for realizada em grupos culturais diversos. Uma outra questão a ser levada em consideração para a análise do DEPI é que, como afirma Exner (2003), quando uma elevação deste índice acontece juntamente com CDI com valores 4 ou 5, é muito provável que o problema afetivo seja secundário ao déficit relacional. Como em nossa amostra o CDI foi muito presente, causando certa dificuldade para se fazer uma discriminação segura, é possível pensarmos que alguns dos DEPI possam ser interpretados levando-se em consideração o CDI, mas é necessário ter muita cautela.

São dignas de nota as diferenças encontradas entre a capital e o interior. Algumas delas nos parecem muito justificadas, em função de uma vida mais tensa, mais difícil e com nível de estresse muito diferente das pequenas cidades onde foram realizadas as aplicações. Na capital encontramos um maior número de pessoas com indicação de depressão, hipervigilância e com possíveis desajustes no pensamento (SCZI e PTI).

Podemos concluir afirmando que estes resultados nos encorajam a continuar utilizando o sistema compreensivo do Rorschach, tanto do ponto de vista conceitual, quanto com os dados empíricos encontrados e considero que esta nossa pesquisa para elaboração de normas incrementou o poder deste instrumento para nossa população. Entretanto, cada vez mais colocamos o desafio de continuar investigando, pois muitas peculiaridades são encontradas em nossa população que são importantes para aprimorar sua utilização na nossa prática clínica e profissional em geral.

 

Referências

Andronikof-sanglade, A. (2000). Use of the Rorschach Comprehensive System in Europe: State of the Art. Em R.H. Dana, Handbook of Cross-Cultural and Multicultural Personality Assessment. Mahvah: Lawrence Erlbaum Associates, Inc.        [ Links ]

Ephraim, D. (2000). Culturally Relevant Research and Practice with the Rorschach Comprehensive System. Em R.H. Dana, Handbook of Cross-Cultural and Multicultural Personality Assessment. Mahvah: Lawrence Erlbaum Associates, Inc.        [ Links ]

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Endereço para correspondência
Rua Cristiano Viana, 1089 - apto 182
05411-002 São Paulo-SP
E-mail: rrecnascimento@uol.com.br

Esta pesquisa teve o apoio financeiro da FAPESP.

 

 

Sobre a autora:

1 Regina Sonia Gattas Fernandes do Nascimento: Doutora em Psicologia Clínica. Professora adjunta da Faculdade de Psicologia da PUC-SP. Vice-diretora e supervisora em Psicodiagnóstico e em Orientação Vocacional, no Aprimoramento Clínico Institucional da Clínica Psicológica "Ana Maria Poppovic" da Faculdade de Psicologia da PUC-SP. Membro da Comissão Consultiva em Avaliação Psicológica do Conselho Federal de Psicologia. Secretária da ASBRo (Associação Brasileira de Rorschach). Professora de Rorschach da ASBRo.

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