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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. v.5 n.2 Porto Alegre dez. 2006

 

ARTIGOS

 

A auto-estima no CAT-A e HTP: estudo de evidência de validade

 

Self-esteem in CAT-A and HTP: study of evidence of validity

 

 

Maria de Fátima Xavier da Silva 1; Anna Elisa de Villemor-Amaral 2

Universidade São Francisco

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Constatando a necessidade de revisão dos instrumentos psicológicos e com intuito de contribuir para o aprimoramento dos mesmos, essa pesquisa teve por objetivo fazer um estudo de evidência de validade concorrente entre as categorias de indicadores de auto-estima das técnicas projetivas CAT- A e H.T.P, correlacionando-os com o instrumento de auto-relato, EMAE - Forma A. Ao lado disso, buscou ainda fazer um estudo de precisão entre avaliadores com o propósito de dar maior confiabilidade aos resultados obtidos no CAT-A. Participaram desse estudo 32 crianças, entre 7 e 10 anos, de ambos os sexos, freqüentando de 2ª. a 4ª. série do ensino fundamental de uma escola da rede pública da cidade do interior do Estado de São Paulo. Os dados demonstraram que as categorias de indicadores destacadas para verificar o nível da auto-estima no CAT-A apresentaram boa precisão pelo sistema de avaliadores. Do mesmo modo os índices de correlação entre os instrumentos permitiram encontrar evidência de validade para o CAT-A e o HTP.

Palavras-chave: Avaliação psicológica, Técnicas projetivas, Auto-estima, CAT, HTP.


ABSTRACT

The necessity of revision of psychological instruments and the intention of contributing to their improvement are in the origin of this research which has the aim of making an evidence study of validity between the categories of self-esteem pointers of the projective techniques Children's Apperception Test (CAT-A) and The House-Tree-Person Technique (H.T.P) correlating then with the instrument Multidimensional Self-Esteem Scale (EMAE-A). In addition, it has also tried to make an accuracy study between the evaluators with the purpose of giving a greater reliability to the results obtained in the CAT-A. The sample was composed by 32 children, between the ages of 7 and 10, of both sexes and attending a public elementary school of the countryside of the State of São Paulo. The data demonstrate that the categories of pointers used to verify the self-esteem level, in the CAT - A, presented good accuracy by the evaluators system. In a similar way, the indices correlations between instruments allowed the finding of evidence validity for the CAT-A and the HTP.

Keywords: Psychological assessment, Projective techniques, Self-esteem, CAT, HTP.


 

 

Introdução

As técnicas projetivas são amplamente utilizadas nos mais variados contextos, com o objetivo de compreender aspectos da personalidade encobertos, latentes ou inconscientes. Isto é possível a partir da análise da maneira como o indivíduo percebe e interpreta o material do teste, ou produz uma determinada tarefa, pois esta reflete aspectos fundamentais de seu funcionamento psicológico.

Anastasi e Urbina (2000) pontuam que embora essas técnicas quando avaliadas na perspectiva psicométrica apresentem um resultado fraco, sua aplicação clínica é bastante ampla e a maioria delas é considerada fundamentalmente como instrumento clínico, sendo seu valor proporcional à habilidade do profissional.

A validade de um teste diz respeito à verificação do quanto ele mede realmente aquilo que se propõe medir e quão bem ele o faz. Um teste nunca é totalmente válido, mas deve apresentar inúmeras evidências de validade para determinada população, de determinados indicadores. De acordo com Anastasi e Urbina (2000), os instrumentos psicológicos podem ter sua validade evidenciada com base em três procedimentos de validação: descrição do conteúdo, predição do critério e identificação do construto.

Por outro lado, com referência às normas e validade das técnicas projetivas, Bellak e Bellak (1949 / 1991) afirmam que "desde que se aceite a hipótese básica do fenômeno da projeção, ou apercepção, o caso individual pode se auto-sustentar" (p.25) mas acreditam que normas são essenciais para essas técnicas, pois possibilitam estabelecer padrões de avaliação que orientem a interpretação dos resultados. Retomando-se o construto projeção, verifica-se que Freud (1969) usou primeiramente o termo como uma ação psíquica defensiva. Entretanto, quando a expressão "métodos projetivos para o estudo da personalidade" foi introduzida por Frank em 1939 (citado por Anzieu, 1981), em artigo publicado no Journal of Psychology, o conceito de projeção já vinha associado a uma concepção inovadora e bastante ampliada. Esse autor usou o termo "métodos projetivos" para explicar as semelhanças entre três técnicas de avaliação da personalidade, o teste de associação de palavras de Jung (1904), teste de manchas de tinta de Rorschach (1920) e o Teste de Apercepção Temática - TAT de Murray (1935) ), demonstrando que a semelhança entre elas residia no fato de que aí estava em jogo uma projeção - exteriorização de aspectos da personalidade não perceptíveis de outro modo, retirando-se do termo o caráter meramente defensivo desse fenômeno. Ocorre que essas técnicas não seguiam a metodologia psicométrica utilizada pela maioria dos testes da época, baseando-se na abordagem clínica e estando sua credibilidade vinculada exclusivamente à teoria que lhes deu origem (Kolck, 1975).

Outro conceito importante para a compreensão das técnicas projetivas é o de apercepção. Foi adotado por Bellak em 1950 (citado por Anzieu, 1981), indicando o "processo pelo qual a experiência nova é assimilada e transformada pelo traço da experiência passada de cada um, de modo a formar um todo novo" (p.265). Portanto a apercepção é uma interpretação e como tal dá sentido à experiência. Kagan (1966) esclarece que esse termo se refere à integração de uma percepção nova com a experiência passada e com o estado psicológico atual do indivíduo. Para esse autor, técnica de apercepção temática compreende uma noção ampliada de apercepção que pode ser entendida como qualquer tarefa que exija interpretação de pranchas ou cenas por meio de um relato.

Enquadram-se nessas características as figuras do CAT, fazendo parte do grupo das técnicas temáticas que tem por objetivo eliciar processos projetivos sob a forma de histórias. Trata-se de um descendente direto do Teste de Apercepção Temática -TAT, de Henry Murray, criado por Leopold Bellak e Sonya Sorel Bellak em 1949, ao constatarem que é mais fácil para crianças pequenas identificarem-se com animais do que com pessoas (Bellak & Bellak, 1991). Enquanto estímulo, as figuras de animais apresentam uma natureza mais ambígua em relação à idade, sexo e a cultura, o que representa uma vantagem em comparação a outras técnicas similares, partindo do pressuposto que as imagens de animais evocam a fantasia com mais facilidade, fato que pode ser observado nas fábulas, nos contos de fadas e no papel que têm os animais nos jogos infantis, nos desenhos animados da televisão e histórias em quadrinhos, ou seja, os animais têm um importante papel nas fantasias e nas angústias infantis (Bellak & Hurvich, 1965).

Na revisão bibliográfica de estudos brasileiros com o CAT-A, encontrou-se apenas dois estudos que buscaram evidência de validade e normatização para este instrumento. Tardivo (1992) buscou, além de elaborar categorias de interpretação normatizadas, verificar a evidência de validade das mesmas, comparando-as com os resultados de outros testes projetivos. Fonseca (2005) elaborou um referencial de análise para o CAT e o DFH (Desenho da Figura Humana) que pudesse discriminar um grupo de crianças com histórico de abuso sexual do grupo sem esse histórico e verificou a evidência de validade correlacionando os resultados do CAT-A com os de DFH.

Herzberg e Mattar (2005) fizeram um levantamento dos procedimentos clínicos utilizados pelos psicólogos do Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo com o objetivo de comparar os resultados com os obtidos numa investigação anterior (Herzberg, Erdman e Becker, 1995). Verificaram que a freqüência do uso do CAT caiu de 83% para 58% nesses dez anos e relacionaram tal fato com o parecer desfavorável do CFP ao considerar que não há estudos recentes que comprovem a sua validade. Constataram ainda que, apesar do parecer desfavorável, o CAT-A é uma técnica valorizada pelos participantes, pois em seus relatos demonstraram preferência por técnicas que permitem a livre expressão do sujeito. Tal levantamento reforça ainda mais a necessidade de mais pesquisas de evidência de validade para o CAT-A Devido às inúmeras possibilidades de análise e a grande quantidade de informações sobre a dinâmica psíquica infantil que as técnicas projetivas possibilitam, optou-se por destacar nesse estudo um aspecto específico da personalidade, a auto-estima, relacionando-se os resultados obtidos no CAT-A, no H.T.P e numa Escala de Auto-Relato (EMAE-A).

A técnica projetiva HTP, de acordo com Kolck (1975), tem por finalidade avaliar aspectos projetivos e expressivos da personalidade, refletindo a maneira como o sujeito percebe o mundo, expressando vivências emocionais e ideacionais associadas ao desenvolvimento da personalidade. Portanto, o desenho representa a maneira que o indivíduo percebe o seu meio, as pessoas e de como sente e se posiciona diante delas, isto é, indica a maneira peculiar de ser e sentir de uma pessoa.

A auto-estima está relacionada, para James (1890), com o que o indivíduo pretende e o que alcança. Assim, se os sucessos percebidos pelo indivíduo forem iguais ou maiores que suas pretensões ou aspirações, a auto-estima será elevada. Contrariamente, se as pretensões excedem os sucessos, isto é, se a pessoa não for bem sucedida, nas suas aspirações, a auto-estima será baixa.

Confirmando e acrescentando a teoria de James, os interacionistas simbólicos enfatizam que as interações sociais contribuem para a formação e desenvolvimento da auto-estima. Dentre eles Cooley (1902) e Mead (1934) consideram o self como sendo uma construção social, formado por meio da interação com os outros. Para explicar esse conceito, Cooley (1902) adotou a metáfora do "espelho social" para descrever a auto-estima. Para ele, as pessoas que são significativas para o indivíduo, constituem um espelho social no qual o mesmo olharia para detectar opiniões a respeito do próprio eu, as quais são incorporadas, formando o self.

Os trabalhos encontrados que abordam temas relacionados ao self utilizam uma variedade de termos entre os quais se destacam os construtos autoconceito e auto-estima. Alguns autores consideram que são dois aspectos psicológicos distintos e diferentes formas de avaliação do self. Assim, consideram o autoconceito como um componente fundamentalmente cognitivo e contextualizado da auto-avaliação, ou seja, o conhecimento que o indivíduo tem de si. Nesse sentido, difere-se da auto-estima que se refere a uma auto-avaliação mais descontextualizada, tendo um componente predominantemente afetivo (Hattie, 1992; Campbell & Lavallee, 1993 citados por Peixoto & Almeida, 1999).

Um outro construto importante e que deve ser distinguido é a auto-imagem. De acordo com Weiner (1998) a auto-imagem tem vários traços em comum com a auto-estima e isso leva, muitas vezes, a utilização desses termos como sinônimos. A partir disso, esse autor e também Sendín (1999) definem a auto-imagem como a visão que o individuo tem de si mesmo e a descreve a partir das percepções positivas ou negativas de suas características baseadas em dados reais ou imaginários. A auto-estima, ao contrário, está relacionado com o valor que indivíduo atribui a essa percepção, vinculada à valorização externa. Confirmando essa definição, Weiner (1998) considera que a auto-estima se refere às atitudes que os indivíduos têm em relação às suas qualidades e capacidades e, quando essa é adequada, promove auto-aceitação, auto-respeito e autoconfiança baseados numa avaliação realista.

Nesse modelo de definição de auto-estima encontra-se o trabalho de Coopersmith, (1967) que define o construto como a avaliação que o indivíduo efetua e que normalmente mantém em relação a si mesmo e que por meio das suas atitudes de aprovação ou desaprovação indica o grau em que se considera capaz, importante e valioso. De acordo com esse autor, a formação da auto-estima está estreitamente ligada ao tratamento que a criança recebe no núcleo familiar.

Vale ressaltar as considerações de Epstein e Morling (1995) que, baseados na teoria experiencial-cognitiva do self, citam dois sistemas de auto-avaliação, a avaliação explícita - a pessoa responde com um sistema racional e a implícita - o indivíduo responde com o sistema experiencial, que é primariamente não-verbal, emocional e imaginário.

Com base nessas considerações, e tendo em vista a necessidade de desenvolver estudos sobre a precisão e validade do CAT-A e do HTP, esse estudo foi proposto com o objetivo de buscar evidência de validade de critério concorrente entre as categorias de indicadores de auto-estima das técnicas CAT- A e HTP, correlacionando-os com a EMAE - Forma A de Gobitta e Guzzo (2004).

 

Método

Participantes

Participaram desse estudo 32 crianças de ambos os sexos, com idades entre 7 e 10 anos, sendo (3,1%; N=1) de sete anos, (43,8%; N=14) de oito anos, (31,3%; N = 10) de nove anos e (21,9%; N=7) de dez anos de idade (M=8,72; DP=0,85), freqüentando a segunda série (31,3%; N=10), a terceira (43,8%; N=14) e a quarta série (25%; N=8) do ensino fundamental de uma escola da rede pública do interior do Estado de São Paulo. Considerando o total da amostra, 15 (46,9%) crianças eram do sexo masculino e 17 (53,1%) do feminino. As crianças que participaram desta pesquisa foram voluntárias e sem patologias graves que pudessem comprometer a realização dos testes.

Instrumentos

O Teste de Apercepção Infantil com Figuras de Animais - Children's Apperception Test - CAT-A. (Bellak & Bellak, 1991) - é composto por uma série de 10 pranchas com figuras de animais em várias situações humanas, destinando-se a crianças de 3 a 10 anos de ambos os sexos e foi analisado de acordo coma as categorias de indicadores de auto-estima elaborados para esta pesquisa.

Desenho da Casa-Árvore-Pessoa (H-T-P House-Tree-Person) Buck, (2003) - Esse teste foi realizado somente na forma acromática e sem o inquérito por ser mais adequada ao tempo dessa pesquisa.

Escala Multidimensional de Auto-Estima (EMAE Forma-A), (Gobitta e Guzzo,2004) -destina-se a crianças de 1ª. à 4ª. séries do ensino fundamental. É composta por 56 itens, com alternativas ilustradas por cinco "faces" que expressam a graduação ou intensidade da resposta - Não tem nada a ver comigo; Tem um pouco a ver comigo; Tem mais ou menos a ver comigo; Tem a ver comigo; Tem muitíssimo a ver comigo.

Procedimento

Após autorização da escola onde a pesquisa foi realizada e aprovação do projeto pelo Comitê de Ética da Universidade, os responsáveis pelas crianças selecionadas assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Em seguida os instrumentos foram aplicados na própria instituição de ensino, no período de aula da criança. O CAT foi aplicado individualmente em uma sessão com duração de 60 minutos na maioria dos casos. O HTP e EMAE foram aplicados em duplas ou individualmente, com duração média de 30 minutos, por uma psicóloga que auxiliou na coleta de dados.

Para atender o objetivo dessa pesquisa foram criadas categorias de indicadores de auto-estima no CAT-A a partir da proposta de interpretação dos aspectos gerais da personalidade de Bellak e Bellak (1949 / 1991) e Tardivo (1992) e os pressupostos de auto-estima de diversos autores trazidos na introdução. Do mesmo modo, foram elaborados para o HTP categorias de indicadores de auto-estima baseados nos itens interpretativos de Buck (1964 / 2003).

Para o CAT-A elaborou-se quatorze indicadores que pudessem analisar o nível da auto-estima, sendo sete relacionados à elevada e sete à rebaixada:

Identificação com heróis e personagens - verifica-se o quanto o sujeito se identifica com o herói ou personagem com características positivas, como por exemplo: bonito, corajoso, capaz, adequado. De que forma o indivíduo se percebe e se suas atitudes em relação às suas qualidades e capacidades promovem auto-aceitação, auto-respeito e autoconfiança baseados numa avaliação realista. Nesse caso é possível inferir que há uma auto-aprovação e que a pessoa se sente bem consigo mesmo e com os valores adotados, ou seja, não há conflitos graves e sim harmonia entre o comportamento, os sentimentos e os padrões sociais. Em contrapartida quando a Identificação é com heróis e personagens com características negativas, como por exemplo: inferiores, incapazes, auto-imagem negativa, indicando sentimentos de desaprovação, observa-se conflitos entre o comportamento, os sentimentos e os padrões sociais.

Introdução de objetos, figuras e circunstâncias positivas - registra-se que tipo de objetos, figuras ou circunstâncias a criança introduz nas histórias, já que são muito significativas, uma vez que estas não estão representadas na gravura. São consideradas positivas certas circunstâncias externas, como por exemplo aceitação, compreensão, afeto, controles adequados e boas expectativas associados aos personagens e objetos introduzidos. Entretanto quando a Introdução de objetos e figuras é negativa como no caso de sentimentos de insegurança, rejeição, desvalorização, inutilidade relacionados aos personagens e objetos introduzidos, indicam o tipo de mundo em que a criança acredita estar vivendo.

Concepção do ambiente e figuras - verifica-se como a criança percebe o seu ambiente, as figuras ao seu redor e como reage a elas, ou seja, a qualidade das relações objetais. Quando a percepção é positiva, sente-se valorizado, acolhido, seguro, compensado. Contrariamente se a Concepção do ambiente e figuras são negativas, ou seja, as relações geram inseguranças, são inadequadas, não oferecem apoio e tanto as pessoas como o ambiente são desvalorizados, falam de suas necessidades e carências nesse sentindo.

Natureza das ansiedades - é importante identificar as principais ansiedades, pois apontam para o tipo de defesas que as crianças utilizam para lidar com as mesmas. Quando positivas são advindas de expectativas e exigências adequadas, proporcionando crescimento, aprovação e busca de solução adequada. Contrariamente se a Natureza das ansiedades advem do medo da perda do amor, desaprovação, abandono, falta de apoio, a criança sente-se incompetente para realizar coisas, arriscar apresentando conseqüentemente a auto-estima rebaixada.

Defesas positivas - são aquelas utilizadas para lidar de forma adequada com os estímulos internos e externos. Por meio dos mecanismos de defesa o indivíduo evita as ameaças ao equilíbrio do ego, representadas pela ansiedade. Quando o indivíduo usa Defesas negativas demonstra que não consegue lidar de maneira adequada com as ansiedades, indicando sentimentos de inadequação e insegurança para lidar com os estímulos internos e externos.

Integração do Ego, autopercepção positiva na trama da história - verifica-se quando a criança é capaz de conciliar os impulsos e exigências da realidade, de um lado, com as ordens do superego, de outro, conseguindo uma solução adequada dos problemas. Entretanto se demonstra uma Autopercepção negativa na trama da história sente-se incapaz para solucionar os problemas e muitas vezes adota padrões alheios às circunstâncias e aos seus interesses com o propósito de ser aceito e aprovado pelo outro.

Desfecho da história positivo - é importante verificar se a criança consegue concluir a história encontrando solução dos conflitos de forma adequada, completa e realista, ou se o Desfecho da história é negativo - no qual o indivíduo não consegue uma saída adequada para os problemas.

Quanto aos indicadores de auto-estima elevada ou rebaixada para o HTP, destacou-se vinte e dois itens: tamanho das figuras; localização dos desenhos; detalhes essenciais e irrelevantes; qualidade da linha; proporção adequada da porta no desenho da casa, cabeça, braços, pernas, pés e posição do corpo no desenho da figura humana; raízes esboçadas ou omitidas (tronco sem finalização, cortado) e tronco regular ou longo no desenho da árvore .

Para assegurar maior confiabilidade nos resultados e também para verificar a precisão nas análises do CAT, os protocolos dos sujeitos foram submetidos à análise de dois juizes independentes e cegos quanto aos resultados do HTP e do EMAE. Cada sujeito recebeu um ponto positivo em cada categoria toda vez que em mais da metade das histórias houve um predomínio de indicadores de auto-estima elevada. Contrariamente, sempre que na maioria das histórias predominavam os indicadores para baixa auto-estima, atribuía-se um ponto negativo. Para caracterizar o nível da auto-estima de cada criança foi criado outra medida, produto da soma dos itens relacionados a auto-estima elevada e rebaixada, a saber: atribuiu-se zero quando a soma dos indicadores relacionados a auto-estima rebaixada era maior comparada ao escore total dos indicadores relacionados a auto-estima elevada. Inversamente, atribui-se o valor um quando a soma dos itens relacionados a auto-estima elevada era mais alta. Quanto ao HTP utilizou-se o mesmo procedimento do CAT-A e o EMAE foi corrigido conforme a orientação das autoras.

 

Resultados

Inicialmente serão apresentados os resultados de auto-estima do grupo nos três instrumentos, em seguida os índices de precisão entre avaliadores dos indicadores da auto-estima no CAT-A e finalmente as correlações encontradas entre os três instrumentos: CAT-A, HTP e EMAE-A.

No que diz respeito aos resultados encontrados nos indicadores de auto-estima do CAT-A pelos avaliadores, optou-se por padronizar um escore único entre os mesmos para que as análises com os outros testes pudessem ser feitas utilizando a pontuação dos dois juízes. Para tanto, atribuiu-se zero quando havia concordância quanto a auto-estima rebaixada, um ponto para discordância e dois para concordância quanto a auto-estima elevada, conforme pode ser observado na Tabela 1.

Os resultados mostram que entre os avaliadores houve concordância na pontuação dos indicadores de auto-estima elevada (78,1%, N = 25), revelando uma predominância desse nível de auto-estima nessa amostra, enquanto que o índice dos indicadores relacionados a auto-estima rebaixada foi pequeno (15,6%, N= 5) e a discordância entre os juízes foi menor (6,3%, N= 2). É importante destacar que esse resultado padronizado encontrado entre os juizes na pontuação dos indicadores de auto-estima elevada e rebaixada, mencionado acima, será utilizado nas correlações do CAT-A com os outros instrumentos.

Quanto ao teste HTP, nota-se que a maioria do sujeitos dessa pesquisa apresentou auto-estima elevada (87,5%, N=28), enquanto (12,5%, N=4) demonstrou auto-estima rebaixada. Esses dados são coerentes com os resultados observados no CAT-A, descritos acima.

 

 

Com relação ao EMAE-A, buscou-se por meio dos resultados obtidos pelas crianças dessa pesquisa, verificar o nível de auto-estima do grupo avaliado por essa escala. Os escores dos sujeitos, indicam uma média de 237,31 e desvio padrão de 18,89, com pontuação mínima de 180 e máxima de 274. Observou-se que há uma concentração de indivíduos entre a pontuação 220 e 260 que abrange 93,8% da amostra. Considerando que a pontuação máxima dessa escala seria de 280 pontos e a mínima de 56 pontos e observando que a média do grupo foi de 237,31, pode-se constatar que 53,1% dos sujeitos apresentaram resultados acima da média do grupo e 46,9% abaixo.

A análise referente a precisão entre os avaliadores no CAT-A consistiu na verificação do quanto eles concordaram na pontuação dos indicadores relacionados ao nível da auto-estima elevada e rebaixada em cada protocolo, conforme pode ser observado na Tabela 2 e 3.

Os resultados apresentados na Tabela 2 indicam que houve correlação positiva entre os avaliadores em todos os indicadores relacionados a auto-estima elevada. As correlações mais altas foram encontradas em quatro indicadores: integração do Ego - autopercepção positiva na trama da história, solução adequada dos problemas (IEP); desfecho da história positivo (DHP) (r = 0,851) respectivamente; defesas que mostram habilidades para lidar com estímulos internos e externos (DP) (r = 0,756); concepção do ambiente e figuras - percepção positiva, sente-se valorizado, acolhido, seguro, compensado (CAFP) (r = 0,618), e três indicadores apresentaram correlação positiva moderada: natureza das ansiedades que mobilizam crescimento, busca de solução adequada (NAMC) (r = 0, 471); introdução de objetos, figuras e circunstâncias positivas (IOFP) (r = 0,438) e identificação com heróis e personagens - bonito, corajoso, capaz, adequado, auto-imagem positiva (IHP) (r = 0,475). Esses dados revelam que os indicadores para verificar auto-estima elevada no teste CAT-A apresentam boa precisão pelo sistema de avaliadores. Finalmente na Tabela 3 pode-se observar a correlação dos indicadores de auto-estima rebaixada entre os juízes.

Quanto aos indicadores para verificar auto-estima rebaixada, conforme Tabela 3, os resultados demonstram que houve correlação positiva entre os avaliadores em cinco itens. As correlações mais altas foram encontradas em dois indicadores: autopercepção negativa na trama da história, incapaz para solucionar os problemas (ANTH) e desfecho da história negativo (DHN) (r = 0,696) respectivamente. Verificou-se correlação positiva moderada nos indicadores: defesas que demonstram inadequação, insegurança para lidar com estímulos internos e externos (DN) (r = 0,444); concepção do ambiente e figuras - relações inseguras inadequadas, sem apoio, figuras desvalorizadas (CAFN) (r = 0,527) e introdução de objetos e figuras que sugerem insegurança, rejeição (IOFN) (r = 0,569). De acordo com os resultados os indicadores: identificação com heróis e personagens inferiores, incapazes, auto-imagem negativa (IHN) e natureza das ansiedades - medo da perda do amor, desaprovação, abandono, falta de apoio (NAN), não apresentaram concordância positiva entre os juízes.

 

 

No que se refere ao grau de precisão entre os juízes constatou-se que há uma concordância positiva e alta no total dos indicadores de auto-estima elevada (r = 0,834) e nos indicadores de auto-estima rebaixada positiva e moderada (r = 0,616), indicando concordância significativa no total da pontuação dos itens referentes à auto-estima.

Por meio do escore total da medida padronizada dos avaliadores no CAT-A e o resultado de auto-estima no HTP, constatou-se que há uma correlação positiva e moderada (r = 0,575) entre o CAT-A e HTP, o que indica que os indicadores de auto-estima destacados para os dois instrumentos permitem com boa margem de confiança verificar esse aspecto da personalidade infantil. Quanto ao resultado da correlação do CAT com o EMAE, verificou-se que há uma associação positiva e baixa (r = 0,381), enquanto que entre o HTP e os dados do EMAE não houve correlação significativa.

 

 

Discussão e conclusão

Com base nos resultados encontrados é possível afirmar que os indicadores relacionados a auto-estima elevada convergem com a teoria que fundamenta o CAT, pois revelam o nível geral de funcionamento do ego do indivíduo, possibilitando verificar em que medida a criança é capaz de conciliar os impulsos e exigências da realidade, solucionar de forma adequada e realista os conflitos internos e externos, a qualidade das suas relações objetais e como percebe e interage com o ambiente (Bellak & Bellak, 1949 / 1991).

Esses conceitos interpretativos são coerentes com a teoria de auto-estima abordada nessa pesquisa. De acordo com James (1890), Cooley (1902), Mead (1934), Coopersmith (1967), Weiner (1998) e Sendin (1999), a auto-estima pode ser definida como um processo de auto-aprovação subjetiva - avaliação interna do próprio indivíduo baseada na realidade externa. Nesse caso o indivíduo se aprova e sente-se bem consigo mesmo e com os valores que adotou, ou seja, não há conflitos graves e sim harmonia entre o comportamento, os sentimentos e os padrões sociais. Esses autores pontuam que os altos ou baixos níveis de auto-estima, geralmente, são o resultado e o reflexo de um determinado tipo de avaliação interna que o indivíduo efetivamente experimenta. De acordo com essa definição, uma auto-estima rebaixada seria caracterizada por emoções negativas associadas com vários papéis vividos por uma pessoa e por qualquer rebaixamento do valor pessoal ou autopercepções inadequadas, imprecisas. Tais considerações são coerentes com os indicadores relacionados a auto-estima rebaixada no CAT-A, que em sua maioria coincidiram nas análises dos dois avaliadores.

Buscando analisar os aspectos que podem ter contribuído para que os resultados entre os juízes nos indicadores de auto-estima rebaixada se configurassem dessa maneira, chegou-se a conclusão de que isso ocorreu provavelmente pela menor freqüência desses indicadores na amostra. Como pode ser observado nos resultados, as crianças dessa pesquisa tiveram na sua maioria pontuações altas no EMAE e foram avaliadas com boa auto-estima em sua maioria, tanto no CAT quanto no HTP. Tal fato constitui um dado não previsto decorrente da própria estratégia para compor a amostra, ou seja, a de trabalhar com indivíduos voluntários e sem patologias graves. Supõe-se que as crianças que se interessaram e aceitaram participar tenham características relacionadas a auto-estima elevada, como por exemplo de auto-aprovação, sentimento de capacidade e de adequação. Não se previu que o grupo pudesse ser tão homogêneo quanto a auto-estima elevada.

No que se refere ao resultado encontrado entre os juízes quanto ao nível de auto-estima, indicam que as categorias de indicadores destacadas para verificar o nível da auto-estima, ou seja elevada e rebaixada no teste CAT-A, apresentam confiabilidade pelo sistema de avaliadores, convergindo com o conceito de precisão que se refere ao grau de confiabilidade do instrumento (Anastasi & Urbina, 2000).

Quanto ao estudo de correlação entre os escores da EMAE-A e os dados de auto-estima no CAT-A, constatou-se que houve correlação positiva e baixa. Enquanto que entre os dados de auto-estima no HTP e a escala EMAE-A não foram encontradas correlações significativas. Tais resultados corroboram os achados de Epstein e Morling (1995) ao confirmarem que os testes projetivos avaliam a auto-estima implícita e os testes de auto-relatos avaliam a auto-estima explícita.

Com base nessas considerações, pode-se levantar a hipótese que os indicadores de auto-estima no CAT-A possibilitam avaliar os aspectos implícitos e explícitos da auto-estima, considerando que esse teste correlacionou positivamente com o HTP e EMAE-A. Em contrapartida, é possível inferir que os indicadores de auto-estima no HTP avaliam aspectos diferentes, o que pode justificar a não associação positiva entre este teste e o EMAE-A. Uma outra hipótese diz respeito às diferenças entre os instrumentos, a saber: o CAT-A e o EMAE-A exigem uma tarefa mais cognitiva, enquanto o HTP é um teste projetivo gráfico e que sofre influência sobretudo do desenvolvimento intelectual, principalmente a figura humana.

Esses dados encontrados no CAT-A confirmam os achados por Tardivo (1992) ao verificar os aspectos da dinâmica da personalidade da sua amostra por meio do CAT-A, constatando que esse instrumento capta mais material latente e menos conteúdos manifestos. Esse estudo fornece, ainda, indicações de que é possível esperar correlações positivas entre o instrumento projetivo e de auto-relato, apesar dos níveis de alcance dos mesmos serem diferentes. Nesses termos, encontrou-se correlação positiva entre o CAT e EMAE.

A partir dos resultados dessa pesquisa é possível inferir que os indicadores de auto-estima no CAT-A possibilitam verificar mais aspectos da auto-estima relacionados aos conteúdos inconscientes do que aos relacionadas as atividades mais conscientes que envolvem significados e valores advindos desta.

Em suma, considerando-se a necessidade de estudos de evidência de validade para o CAT-A e ainda a constatação da lacuna existente na literatura científica brasileira de estudos envolvendo o construto auto-estima e o CAT, essa pesquisa traz uma dupla contribuição, já que os resultados encontrados possibilitam afirmar que as categorias de indicadores destacadas para verificar a auto-estima no CAT-A podem ser consideradas um referencial válido de análise desse aspecto da personalidade. Acredita-se assim ter-se contribuído com um referencial de análise para o CAT-A e HTP que permita a avaliação da auto-estima em crianças de sete a dez anos, de ambos os sexos.

 

Referências

Anastasi, A. & Urbina, S. (2000). Testagem Psicológica. Porto Alegre: Artmed.        [ Links ]

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Endereço para correspondência
R: Floriano Peixoto, 558, Centro
Piracicaba/SP, CEP: 13400-520
Tel.: (19) 3434 0479
E-mail: fatxavier@ig.com.br

O presente estudo é parte da dissertação de mestrado em Psicologia (USF) da primeira autora, realizada sob a orientação da segunda autora

Recebido em Outubro de 2006
Reformulado em Novembro de 2006
Aceito em Dexembro de 2006

 

 

Sobre os autores:

1 Maria de Fátima Xavier da Silva: mestre em psicologia e doutoranda do Programa de Estudos Pós Graduados em Psicologia da Universidade São Francisco.
2 Anna Elisa de Villemor-Amaral: doutora em Psicologia pela Universidade Federal de São Paulo e docente do curso de psicologia e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia, da Universidade São Francisco, campus Itatiba-SP.

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