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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. v.8 n.2 Porto Alegre ago. 2009

 

ARTIGOS

 

Adaptação e validação da Escala de Bem-estar Espiritual (EBE)

 

Adaptation and validation of Spiritual Well-Being Scale (SWS)

 

 

Luciana Fernandes Marques *; Jorge Castellá Sarriera **; Débora Dalbosco Dell'Aglio ***

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo visou adaptar e validar a Escala de Bem-estar Espiritual (EBE). Os participantes deste estudo foram adultos (N=506) de 16 a 78 anos (M=38,03 anos; DP=15,07), sendo 237 homens (46,8%) e 269 mulheres (53,2%), residentes em Porto Alegre (RS, Brasil). Foram realizadas análises fatoriais e a solução de dois fatores foi a mais adequada, explicando 47,97 % da variância total. Os 20 itens da escala apresentaram cargas fatoriais superiores a 0,38, nos dois fatores. A consistência interna (calculada pelo alfa de Cronbach) dos fatores foi de 0,92 para o Bem-estar religioso e 0,85 para bem-estar espiritual e de 0,92 para a escala geral. Os resultados encontrados reforçam as qualidades psicométricas da escala indicando sua aplicabilidade em estudos sobre religiosidade e espiritualidade no contexto local.

Palavras-chave: Validade, Bem-estar espiritual, Adultos.


ABSTRACT

The aim of the present study was adapt and assess the validity of Spiritual Well-Being Scale (SWBS). The participants of this study were adults (N=506), from 16 to 78 years old (M=38,03 years; SD=15,07), and 237 (46,8%) were male and 269 (53,2%) were female, residents in Porto Alegre (Brazil). Factor analyses were conducted to determine the dimensions and a two factor solution was found to be more adequate, explaining 47,97% of total variance. The scale included 20 items with factor loadings larger than 0,38 in both factors. Internal consistency (Cronbach's alphas) for the factors was 0,92 for religious well-being and e 0,85 for existencial well-being and 0,92 for general scale. The results strengthen the psychometric qualities of the scale indicating their applicability in the study of religiosity and spirituality in the local context.

Keywords: Validity, Spiritual well-being, Adults.


 

 

Introdução

Os estudos sobre o desenvolvimento da espiritualidade e o papel da religiosidade no enfrentamento de situações difíceis têm aumentado nas últimas décadas. As crenças religiosas podem ser uma das influências mais potentes na vida, sendo que seus efeitos podem incluir uma profunda mudança na experiência subjetiva e no comportamento social (Frankl, 1975). Conforme Ellison (1991), há registros na literatura de que a religiosidade influencia o bem-estar subjetivo e pode favorecer a integração e o suporte social, o estabelecimento de relações com algo considerado divino, a promoção de sistemas de significado e de coerência na existência. A religiosidade e a espiritualidade também podem contribuir na adoção de estilos de vida que influenciam nos processos de saúde-adoecimento. Por exemplo, a religiosidade pode estimular visões negativas do uso do álcool (Johnson, Sheets & Kristeller, 2008) e afetar a qualidade de vida quando as necessidades espirituais não são atendidas (Hampton, Hollis, Lloyd, Taylor & McMillan, 2007).

A Escala de Bem-Estar Espiritual - EBE - (Spiritual Well-Being Scale), de Paloutzian e Ellison (1982) é uma das pioneiras no tema da espiritualidade e da religiosidade e é tida como um padrão de referência para os autores que delineiam instrumentos de mensuração da espiritualidade. Existem outras escalas, como a Spiritual Involvement and Beliefs Scale (Hatch, Burg, Naberhaus, & Hellmich, 1998), a Mental, Physical and Spiritual Well-Being Scale (Vella-Brodrick & White, 1997), a Spiritual Issues Assessment (Lawson, Drebing, Berg, Vincellette & Penk, 1998), a Spiritual Assessment Inventory (Hall & Edwards, 1996 e 2002) e a Escala de Coping Religioso-Espiritual (Panzini & Bandeira, 2005), entre outras.

Apesar de já existirem inúmeras escalas, inventários e medidas relativas à espiritualidade e religiosidade, a medida de uma variável única também pode ser de grande expressão no processo investigativo, como, por exemplo, a variável envolvimento religioso. Mccullong, Hoyt, Larson, Koenig e Thoresen (2000), a partir de vários estudos que correlacionaram envolvimento religioso e mortalidade, com aproximadamente 126.000 participantes, indicaram que as pessoas que possuíam maior envolvimento religioso eram 29% mais propensas a sobreviver, num estudo longitudinal, do que as que possuíam baixo envolvimento religioso. No entanto, outras investigações são necessárias para melhor capturar as qualidades dinâmicas da religião e da espiritualidade - como a possibilidade de mudança, crescimento, deterioração ou estabilidade da vida religiosa e espiritual através do tempo e das situações (Hill & Pargament, 2003).

O bem-estar espiritual é entendido como uma sensação de bem-estar que é experimentada quando encontramos um propósito que justifique nosso comprometimento com algo na vida, e esse propósito envolve um significado último para a vida (Ellison, 1983). Essa sensação é uma síntese de saúde, um sentimento de completude e de satisfação com a vida, de paz consigo mesmo e com o mundo, de unidade com o cosmos, de proximidade com algo que se considere como absoluto ou com a natureza (Blomfield, 1980).

O bem-estar religioso (BER) é considerado como o bem-estar advindo da comunhão e da relação pessoal íntima com Deus ou com algo que se considere como uma força superior, que vai além do indivíduo, algo sagrado. É considerado como uma dimensão vertical da espiritualidade e contém uma referência a Deus (Paloutzian & Ellison, 1982). O BER tem sido associado positivamente com força interna (que inclui desafio, compromisso e controle) e esperança; e negativamente com depressão e solidão, tanto em adultos doentes como sadios (Mickley, Carson & Soeken, 1985).

A EBE é uma escala sucinta, de fácil compreensão e aplicável em diversos países, na sua maioria católicos (ou cristãos) como é o Brasil. Conforme Bufford e colaboradores (1991), a escala se correlaciona positivamente com vários indicadores padrões de bem-estar, incluindo autoconceito positivo, sentido e propósito de vida, alta assertividade, baixa agressividade, boa saúde física e bom ajustamento emocional; e é negativamente correlacionada com indicadores de má saúde, desajuste emocional, descontentamento com a vida (Brinkman, 1989; Brinkman & Bufford, 1990; Moody, 1989) e suicídio (Nad, Marcinko, Vuksan-AEusa, Jakovljevic, & Jakovljevic, 2008). Segundo Paloutzian e Ellison (1982), as pessoas com altos escores na EBE tendem a ser menos solitárias, mais habilidosas socialmente, têm maior auto-estima e um intrínseco compromisso religioso. Por outro lado, valores individualistas foram associados a menores níveis de EBE (Paloutzian & Ellison, 1982).

Histórico do instrumento

A Escala de Bem-Estar Espiritual foi elaborada com a intenção de complementar os indicadores objetivos nas avaliações de qualidade de vida nos Estados Unidos, principalmente sentimentos e percepções dos respondentes. Havia no governo desse país um movimento de mensurar a qualidade de vida através de indicadores sociais objetivos, e aos poucos começou a crescer o reconhecimento de que apenas medidas objetivas não davam conta da complexidade do construto (Bufford, Paloutzian & Ellison, 1991).

Para a criação da escala, Paloutzian e Ellison (1982) tomaram por base o estudo de Moberg e Brusek (1978) que apontava uma dimensão vertical e outra horizontal para o bem-estar espiritual. Essas dimensões se tornaram os dois fatores medidos pela escala: o bem-estar religioso (BER), dimensão vertical, satisfação na conexão pessoal com Deus ou com algo que se considere como absoluto; e o bem-estar existencial (BEE), dimensão horizontal que se refere à percepção da pessoa em relação ao propósito da vida independente de uma referência religiosa.

A escala foi testada por Paloutzian e Ellison (1982) e a análise fatorial revelou que os itens se agrupavam como o esperado, utilizando a rotação varimax. Os itens religiosos carregaram no fator religioso, e os itens existenciais em dois fatores, um de direção de vida e outro de satisfação de vida. Nesse estudo, a correlação entre as duas sub-escalas, a de bem-estar religioso e a de bem-estar existencial, foi 0,32 (p<0,001); os coeficientes de fidedignidade foram 0,93 para bem-estar existencial, 0,96 para bem-estar religioso e 0,86 para o Fator geral, bem-estar espiritual. Os escores revelaram alta fidedignidade e consistência interna. Outros autores (Ellison, 1983; Ledbetter, Smith, Fisher, Vosler-Hunter & Crew, 1991) concordaram que a escala é válida e também nas suas análises encontraram dois fatores sendo o primeiro o BER, e o segundo o BEE. Em estudos posteriores (Ellison, 1983), a confiabilidade da escala no teste/re-teste foi 0,85 em três amostras (após uma, quatro e dez semanas), e o coeficiente alfa para consistência interna foi de 0,84 em sete amostras.

Já existem diversos estudos sobre a aplicação da EBE a várias amostras, entre elas: grupos religiosos incluindo pastores e seminaristas, estudantes universitários, pacientes em aconselhamento, presidiários sociopatas, cuidadores de pacientes terminais e pacientes clínicos de ambulatório (Bufford & cols., 1991), entre outros. Na revisão desses estudos, os autores apresentaram alguns resultados como: a escala é sensível às diferenças entre populações; seu poder discriminante é menor em escores baixos; e, a ordem dos escores apareceu como esperado. Entre suas conclusões: a) Aqueles que estavam em treinamento ou que já eram líderes religiosos obtiveram os mais altos escores; b) grupos religiosos pontuam mais alto do que os grupos não religiosos; c) pessoas em tratamento mental ou com problemas médicos pontuam menos do que aquelas encontradas na igreja ou comunidades religiosas (Bufford & cols., 1991).

Tendo em vista a necessidade de instrumentos validados e adaptados a populações no Brasil, especialmente para avaliação da espiritualidade, o objetivo deste estudo foi o de adaptar e validar a EBE para a realidade brasileira. Esta escala poderá ser um instrumento útil para pesquisas e também para aplicações clínicas, organizacionais e comunitárias.

 

Método

Este estudo foi dividido em duas fases, a primeira com o objetivo de tradução e adaptação da escala e a segunda fase dedicada à análise das propriedades psicométricas da EBE.

Primeira fase: procedimentos de adaptação da escala

A EBE foi traduzida do inglês para o português por um tradutor juramentado e submetida à apreciação de três doutores (juízes) em psicologia (com fluência na língua inglesa) para confirmar se o sentido original das sentenças estava presente e para avaliar a validade de conteúdo. Considerando os pareceres dos doutores, alguns itens foram alterados da versão traduzida pelo juiz, aproximando o sentido do original em inglês. Foi confeccionada, então, uma versão da EBE em português e conduzido um estudo piloto.

Estudo piloto

A aplicação inicial da escala foi feita com uma amostra de 30 pessoas escolhidas ao acaso na cidade de Porto Alegre. Foram 18 mulheres e 13 homens, entre 19 e 72 anos (M=40 anos; DP=9,71). As pessoas foram contatadas em praças, parques e ruas do centro da cidade. Os participantes foram instruídos a ler o instrumento e a responder aos itens. Também foi solicitado que, caso não compreendessem alguma questão ou se a linguagem não parecesse adequada, anotassem suas observações, justificando e dando sugestões. No entanto, não foi necessário reestruturar a escala ou eliminar itens já que todos foram claramente compreendidos. Nesse estudo piloto, quanto à consistência interna do instrumento, o alfa de cronbach foi de 0,58. Esse índice pode ser considerado baixo, porém a escala foi mantida com a mesma configuração que a original em inglês, esperando que uma amostra maior pudesse corrigir o erro da variabilidade intra-sujeitos (que é maior com um grupo pequeno como este de 30 sujeitos).

Na correlação item-fator, foi investigada a contribuição de cada item na explicação do fator bem-estar espiritual. Embora alguns itens contribuam menos, eles não foram retirados da escala, pois de certa forma contribuem no total. É o que demonstra o alpha factoring revelando que os itens têm uma elevada correlação entre si. Também não foram realizadas mudanças na escala original em função dela já estar validada no país de origem e pareceu seguro mantê-la nos moldes originais.

Segunda fase: análise das propriedades psicométricas da EBE

Participantes

Participaram da pesquisa 506 pessoas com idades entre 16 e 78 anos (M=38,03 anos; DP=15,07), sendo 237 homens (46,8%) e 269 mulheres (53,2%). A distribuição por faixas etárias atendeu ao objetivo inicial de aplicar os questionários a todas as faixas que vão do final da adolescência até a velhice, sem necessidade de controle prévio, visto que, pelo tamanho da amostra, esperava-se que espelhasse aproximadamente a distribuição populacional. O tamanho da amostra se justifica em função da confiabilidade, na qual o erro amostral máximo de +/- 4% tem sido estimado para um nível de confiança de 95%.

Foram encontrados níveis educacionais variados na amostra, sendo que 60% dos participantes tinham até o ensino médio completo (antigo segundo grau) e os restantes 40% se distribuíram entre ensino superior incompleto até pós-graduação completo. O maior percentual, de 24,7%, se localizou nas pessoas que tinham ensino médio completo.

Em relação ao estado civil, 38,3% (194 pessoas) eram casadas e 35,8% (181 pessoas) solteiras. Os percentuais restantes se distribuíram em: 10,1% vivendo como casadas, 6,9% separadas, 4,5% viúvas e 4,3% divorciadas.

O número de filhos dos participantes variou de zero a nove filhos, sendo que grande parte da amostra não tinha filhos (38,1%); 14,2% tinham um filho; 22,1% tinham dois filhos; 16,4%, três filhos; e o percentual restante de 9,1%, tinham quatro ou mais filhos. Sobre a ocupação, 79,4% das pessoas trabalhavam e 20,6% não trabalhavam. Outras características de interesse podem ser vistas na Tabela 1, organizadas em ordem decrescente de percentagem válida.

 

 

Instrumentos

Foi aplicada a EBE junto a um questionário de dados sócio-demográficos. A EBE é um instrumento subdividido em duas sub-escalas (de 10 itens cada), uma de Bem-estar religioso (BER) e outra de bem-estar existencial (BEE). Os itens referentes ao BER contêm uma referência a Deus, e os de BEE não contêm tal referência. Metade das questões da escala é escrita na direção positiva e metade na negativa. A escala possui 20 questões que devem ser respondidas através de uma escala Likert de seis opções: Concordo Totalmente (CT), Concordo mais que discordo (Cd), Concordo Parcialmente (CP), Discordo Parcialmente (DP), Discordo mais que concordo (Dc), e Discordo Totalmente (DT). As questões com conotação positiva (3, 4, 7, 8, 10, 11, 14, 15, 17, 19 e 20) têm sua pontuação somada da seguinte maneira, CT=6, Cd=5, CP=4, DP=3, Dc=2 e DT=1. As demais questões são negativas e devem ser somadas de forma invertida (CT=1, Cd=2, CP=3 e assim por diante). O total da escala é a soma das pontuações destas 20 questões e os escores podem variar de 20 a 120.

Procedimentos de coleta de dados

A amostra foi escolhida a partir do procedimento amostral polietápico (baseado nos trabalhos de Sarriera, 1993 e Sarriera, Câmara & Schwarczs, 1996), que combina diversos métodos, seqüenciados por uma série de etapas.

O tamanho da amostra é proporcional ao número de seções de cada distrito eleitoral do município de Porto Alegre, sendo que as seções eleitorais (5% de cada uma das 10 zonas eleitorais) foram sorteadas e foram localizados seus endereços; o número total de questionários foi dividido pelas sessões; as sessões foram sorteadas entre os voluntários de pesquisa. Foram em torno de 10 endereços de cada uma das 10 zonas eleitorais, ou seja, por volta de 100 logradouros (diversos locais da cidade) para onde os voluntários de pesquisa se dirigiram.

Os instrumentos foram apresentados com um pequeno rapport. Os entrevistadores (onze pesquisadores voluntários, estudantes de psicologia) foram previamente treinados para a aplicação do questionário. No dia da aplicação eles se deslocaram para os endereços sorteados, procurando uma praça ou entrando num prédio (aguardando as pessoas na entrada ou na saída de casa), um ponto mais tranqüilo da rua, e se apresentavam convidando as pessoas a participarem. Os participantes foram informados sobre o objetivo da aplicação do instrumento e o sigilo em relação aos dados, concordando em participar do estudo. O tempo de aplicação não ultrapassava 15 minutos, desde a abordagem inicial até o agradecimento final pela participação.

 

Resultados

Os dados foram inseridos no pacote estatístico SPSS 11.0 para análises. O primeiro procedimento para levantar os resultados foi a Análise de Componentes Principais, que é uma técnica estatística que explora a estrutura fatorial latente, antes de levantar seus fatores e consistência. Nesta primeira análise, apareceram quatro fatores.

A seguir foi realizada a Análise Fatorial na técnica dos Eixos-Principais, (a qual é recomendada para o desenvolvimento de análises com caráter confirmatório), para a verificação da dimensionalidade da escala, foram extraídas soluções fatoriais com dois, três e quatro fatores. O Scree Plot apresentado na Figura 1 sugere que a solução dois fatores é preferível, assim como aqueles indicados pelos autores (Paloutzian & Ellison, 1982), usando-se o método de máxima verossimilhança e rotação Oblimin, e tendo como referência auto-valores superiores a 1,5. Ambos fatores são responsáveis por 47,97% da variância explicada. E foi encontrado um nível de 0,54 de correlação entre os dois fatores. As soluções com 3 e 4 fatores parece menos robusta e com piores características psicométricas.

 

 

Foi determinada a carga fatorial de no mínimo 0,30 como regra para inclusão dos itens nos fatores. Na Tabela 2 são apresentadas as cargas fatoriais e comunalidades (h2) de cada item do fator 1, Bem Estar Religioso, que apresenta 8,16 de eigelvalue que explicou 38,41 % da variância total. Este fator agrupa os itens referentes à relação pessoal com Deus, descrevendo se a experiência de proximidade e de fé ajudam a proporcionar bem-estar, satisfação, ausência de solidão.

 

 

Na Tabela 3, o fator 2 de Bem Estar Existencial apresenta 2,40 de eigenvalue, que explicou 9,56 % da variância total. Seu conteúdo se refere ao bem-estar existencial, expectativa positiva em relação ao futuro, otimismo e sentimento de propósito na vida.

 

 

A consistência interna da escala foi medida pelo coeficiente alfa de cronbach que acusou 0,92 para a EBE; 0,92 também para o fator 1, bem-estar religioso; e 0,85 para o fator 2, bem-estar existencial. Esses números revelam uma alta fidedignidade da escala na amostra.

 

Discussão

A EBE se mostrou um instrumento coeso, enxuto e de fácil compreensão nas variadas idades e condições sociais. A despeito de seus 20 itens, que podem ser respondidos em cinco minutos, mensura o construto a que se propõe. As análises realizadas neste estudo indicaram que a escala possui ótimas qualidades psicométricas, confirmando os dois fatores que também foram encontrados na literatura: bem-estar religioso e bem-estar existencial. Igualmente apresentou alta consistência interna e fidedignidade considerável.

Embora a amostra tenha sido ampla, heterogênea e representativa da cidade de Porto Alegre, os dados desta pesquisa não nos permitem universalizar os resultados e conclusões para a população brasileira. Dessa forma, sugere-se que a EBE seja aplicada em amostras de outros estados Brasileiros, para se obter parâmetros comparativos e se chegar a uma padronização para a população brasileira. Além disso, podem ser realizados estudos que considerem outras variáveis sociodemográficas, tais como escolaridade, sexo, faixa etária, entre outras, de forma que se possa identificar de forma mais clara como se manifesta a religiosidade e a espiritualidade em diferentes grupos.

Neste estudo encontramos uma maioria de sujeitos católicos (em torno de 65%). No entanto, foi observado que a escala pode ser aplicada para não católicos, desde que no rapport seja elucidado que ao invés de "Deus" a pessoa considere algo da sua crença que tenha como uma força superior.

A Escala de Bem-estar Espiritual atendeu os objetivos deste estudo, mas em outros que visem mensurar apenas a espiritualidade, sem as questões religiosas (ou de menção a Deus), entendemos que outras escalas deveriam ser procuradas. Conforme Sherman e Simonton (2001), ainda existe um número maior de escalas de religiosidade do que de espiritualidade, o que pode dificultar a busca. Isso também justifica a importância da criação, validação e adaptação de escalas de espiritualidade, especificamente.

Mais investigações e medidas são necessárias para melhor capturar as qualidades dinâmicas da religião e da espiritualidade, os processos de transformação da fé, de crescimento do envolvimento religioso e também das dúvidas e angústias espirituais, já que os construtos se mostram válidos. Da mesma forma, instrumentos específicos a determinadas culturas e grupos podem ser uma opção para escapar ao reducionismo ou generalismo presentes em certas escalas (Moberg, 2002).

No contexto da América Latina há um enorme potencial cristão e religioso que pode ser usado como recurso de transformação de si e da comunidade, fortalecendo e melhorando a qualidade de vida das pessoas (Sarriera, 2003). Assim, novos estudos que investiguem as questões religiosas e espirituais podem contribuir nessa direção.

 

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Endereço para correspondência
E-mail: lucianafm@terra.com.br

Recebido em abril de 2008
Reformulado em junho de 2009
Aceito em julho de 2009

 

 

Sobre os autores:

* Luciana Fernandes Marques: Doutora em Psicologia, professora adjunta da Faculdade de Educação da Unviersidade Federal do Rio Grande do Sul.
** Jorge Castellá Sarriera: Doutor em Psicologia, professor adjunto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
*** Débora Dalbosco Dell'Aglio: Doutora em Psicologia, professora adjunto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

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