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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.11 no.1 Itatiba abr. 2012

 

 

Acessório para aplicação do teste Wisconsin de classificação de cartas

 

José Humberto da Silva-Filho1

Universidade Federal do Amazonas

 

O Teste Wisconsin de Classificação de Cartas (WCST) é um instrumento internacionalmente reconhecido para avaliação das funções executivas e frequentemente adotado em avaliações neuropsicológicas. O WCST foi considerado o mais proeminente do pequeno grupo dos chamados testes dos lobos frontais (Damásio, 2000) e internacionalmente reconhecido como padrão ouro na avaliação das funções executivas (Reppold, Pedrom & Trentini, 2010). É um teste com quatro cartas-estímulo expostas sobre a mesa diante da pessoa que será avaliada e 128 cartas- resposta que ficam de posse deste respondente e que serão manejadas por ele, colocando-as logo abaixo das cartas-estímulo, fazendo um pareamento que busca uma correta classificação mediante feedback recebido do avaliador de "certo" ou "errado". A padronização do teste exige do avaliador três tarefas simultâneas: 1) manter o testando no enquadramento da tarefa e controlar o ritmo de suas respostas conforme o ritmo do aplicador para o registro dos dados; 2) oferecer um feedback verbal ao respondente de "certo-errado", uma por uma, após cada carta classificada; 3) fazer o registro adequadamente no protocolo, de cada uma das cartas classificadas pelo respondente, identificando o critério por ele adotado para classificação (Cor, Forma, Número). Os autores do manual original desse instrumento e das versões brasileiras adaptadas, validadas e padronizadas para crianças e idosos trazem instruções e recomendações cuidadosas para um adequado treinamento dos avaliadores (Heaton, Chelune, Talley, & Curtiss, 1993; 2005; Trentini, Argimon, Oliveira, & Werlang, 2010).

Este instrumento tem sido considerado um dos mais relevantes na avaliação neuropsicológica de idosos (Silva-Filho, Pasian, & Vale, 2007) e um dos instrumentos cujas produções cientificas têm gerado grande impacto na comunidade (Silva-Filho, Pasian & Humberto, 2011). Vários estudos com essa técnica têm sido desenvolvidos recentemente no Laboratório de Avaliação Psicológica do Amazonas (FAPSI/ UFAM), em trabalhos de pesquisa de iniciação científica, de conclusão da graduação em psicologia e em trabalhos de mestrado em psicologia, com idosos saudáveis e com queixas clínicas, tendo já alcançado um número significativo de observações. Nesses estudos, nos quais em aproximadamente metade dos casos foram feitos com auxílio experimental do acessório de aplicação, observou-se significativo conforto na tarefa tanto para o aplicador quanto para o respondente.

A prática no manejo dessa técnica demonstra que, por um lado, mesmo com treinamento do avaliador – e, sobretudo, na ausência de treinamento – é muito provável a ocorrência de imprecisões importantes na administração do teste em alguma das três tarefas do avaliador acima descritas. Dentre essas imprecisões, as mais comuns são: dar feedback verbal incorreto ou de forma hesitante (fazendo retificações), fazer o registro de forma inadequada no protocolo e deixar de retomar o enquadramento do respondente na tarefa, quando necessário. Esses erros comprometem imediatamente o protocolo do teste, inutilizando-o tanto para fazer interpretações clínicas do resultado como para o uso em pesquisas. A reaplicação do WCST pode ser inviável devido à influência da aprendizagem sobre o desempenho do respondente, sobretudo quando ele se recorda de que se trata de um teste em que as soluções são mutantes. Por essa razão, para evitar a inutilização dos dados obtidos com esse instrumento, o treinamento e o cuidado do avaliador são fundamentais.

Por outro lado, da parte do respondente, os incidentes mais comuns durante a aplicação do teste, que eventualmente podem oportunizar confusões na produção das respostas, são: esbarrar involuntariamente nas cartas-estímulos expostas sobre a mesa, tirando-as da posição; esbarrar nas cartas-respostas que vão se acumulando frente às primeiras; confundir cartas-estímulo com cartas-resposta na hora de fazer o pareamento entre elas, exigindo que o aplicador intervenha, retomando o enquadramento na tarefa. Alguns autores relatam, ainda, que o WCST pode ser uma tarefa muito exigente e por isto pode comprometer a motivação de idosos quando eles não conseguem encontrar o critério correto de classificação e também gerar frustração e fadiga (Zubicaray, Smith, Chalk & Semple, 1998; Chan, Lam, Wong, & Chiu, 2003). Em função disso, tem-se observado relatos da adoção da versão modificada do teste Modified Card Sorting Test - MCST (Avila, 2007) que flexibiliza a ordem dos critérios de classificação das cartas e diminui a sequência de acerto para mudança de categorias de classificação. Mesmo que esses estudos com a versão modificada do teste demonstrem que, ainda assim, o instrumento continua sensível para mensuração das funções executivas, um dos problemas que se coloca atualmente é a dificuldade de estudos comparativos com as versões diferentes do teste e a inexistência de normas técnicas adequadas da versão alternativa. Parece ainda fazer menos sentido usar uma versão alternativa do teste quando se observa, por meio da literatura, o significativo impacto científico internacional desse instrumento, após a sua padronização nos EUA por Heaton e colaboradores em 1993 (Silva-Filho, Pasian & Humberto, 2011).

Portanto, em função das eventuais imprecisões acidentais na administração desse instrumento, conforme citado anteriormente e observadas com significativa frequência na prática da aplicação do WCST e também visando preservar e não interferir na padronização considerada mais bem sucedida desta técnica (Heanton e cols., 1993), o presente trabalho propõe a utilização de um acessório simples, com o objetivo de auxiliar a tarefa do aplicador e do respondente, para estabilizar as cartas estímulo e facilitar o pareamento das cartas-resposta pelo respondente do WCST (Silva-Filho & Menezes, 2007).

 

 

Trata-se de um dispositivo de acrílico transparente, na forma de uma caixa de 38cm de largura, 10cm de cumprimento e 3cm de altura (Figura 1). Na parte interna da tampa da caixa, quando aberta, encontram-se expostas as quatro cartas-estímulo e logo abaixo delas, quatro cômodos correspondentes onde serão depositadas as cartas-resposta. O dispositivo se mantém com a tampa aberta durante a aplicação do teste, enquanto o respondente executa a tarefa. O uso experimental desse acessório tem demonstrado não ser necessária qualquer modificação na instrução ou na padronização da aplicação do teste. Os principais benefícios são: a facilidade em manter o testando no enquadramento da tarefa, reduzindo a necessidade de intervenção junto a ele enquanto a tarefa está sendo executada; eliminação da possibilidade de o respondente involuntariamente esbarrar e desordenar as cartas (de estímulo e de resposta) durante o teste; diminuição de eventuais confusões do respondente entre cartas-estímulo e cartas-resposta já depositadas; e, sobretudo, um maior conforto do aplicador e do respondente durante a administração do teste. Esse recurso também facilita significativamente o processo de revisão do protocolo quando se faz necessário inspecionar, posteriormente, cada carta depositada. Esse simples dispositivo tem se mostrado muito útil na aplicação da versão impressa do WCST, principalmente com crianças e com idosos e também na aplicação da versão assistida por computador.

 

Referências

Avila, K. N. (2007). Modified Wisconsin Card Sorting Test (MCST): desempenho de idosos com diferentes níveis de escolaridade. Psicologia Hospitalar, 5(2).         [ Links ]

Damásio, A. R. (2000). O Erro de Descartes. Emoção, Razão e Cérebro Humano. São Paulo: Companhia das Letras.         [ Links ]

Chan, C. W. Y., Lam, L. C. W., Wong, T. C. M., & Chiu, H. F. K. (2003). Modified Card Sorting Test Performance among community dwelling elderly chinese people. Hong Kong Journal of Psychiatry, 13(2), 2-7.         [ Links ]

Heaton, K. R., Chelune, G. J., Talley, J. L., Kay, G. G., & Curtiss, G. (1993). Wisconsin Card Sorting Test Manual. Odessa: Psychological Assessment Resources.         [ Links ]

Heaton, K. R., Chelune, G. J., Talley, J. L., Kay, G. G. & Curtiss, G. (2005). Manual do teste Wisconsin de Classificação de Cartas. Adaptação e padronização brasileira, Jurema Alcides Cunha e colaboradores. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Reppold, C. T., Pedrom, A. C., & Tentini, C. M. (2010). Avaliação das funções executivas por meio do Teste Wisconsin de Classificação de Cartas – versão computadorizada. Em: M. C. R. A. Joly, & C. T. Reppold, (Orgs.). Estudos de testes informatizados para avaliação psicológica (p. 45-62). São Paulo. Capsi Livraria e Editora Ltda.

Silva-Filho, J. H. & Menezes, I. G. (2007). Acessório para aplicação do Teste Wisconsin de Classificação de Cartas. Em Instituto Brasileiro de Avaliação Psicológica (Org.), Anais, III Congresso Brasileiro de Avaliação Psicológica / XII Conferência Internacional de Avaliação Psicológica: Formas e Contextos. (Livro de Resumos – Painéis, p. 24). João Pessoa, PB: IBAP.

Silva-Filho, J. H., Pasian, S. R., Vale, F. A. C. (2007). Typical performance of ederly patients with Alzheimer Disease on the Wisconsin Card Sorting Test (WCST). Dementia & Neuropsychologia, 1(2), 181-189.         [ Links ]

Silva-Filho, J. H., Pasian, S. R. P. & Humberto, J. S. M. (2011). Teste Wisconsin de Classificação de Cartas: uma revisão sistemática de 1952 a 2009. Psico-USF, 16(1), 107-116.         [ Links ]

Trentini, C. M., Argimon, I. I. L., Oliveira, M. S. & Werlang, B. G. (Org). (2010). Teste Wisconsin de Classificação de Cartas: versão para idosos. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Zubicaray, G. I, Smith, G. A., Chalk, J. B., & Semple, J. (1998). The modified card sorting test: test-retest stability and relationships with demographic variables. British Journal of Clinical Psychology, 37, 457-466.         [ Links ]

 

 

Recebido em junho de 2011
Reformulado em outubro de 2011
Aceito em janeiro de 2012

 

 

Sobre os autores:

José Humberto da Silva Filho:Psicólogo. Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo. Professor da Universidade Federal do Amazonas.


1Endereço para correspondência:
Laboratório de Avaliação Psicológica – FAPSI / Universidade Federal do Amazonas
Av. General Rodrigo Octávio Jordão Ramos, 3000
Campus Universitário, Coroado I - Manaus/Amazonas CEP: 69.000-000. Manaus/AM
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