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Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.11 no.3 Itatiba July/Sept. 2012

 

 

Estudo normativo para o Sistema Compreensivo do Rorschach1

 

Normative study of Rorschach Comprehensive System

 

Estudio normativo para el Sistema Comprehensivo del Rorschach

 

 

Regina Sonia Gattas Fernandes do Nascimento2

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

 

 


RESUMO

Este artigo mostra resultados de uma pesquisa para realizar a estatística descritiva das variáveis que compõem o sistema de codificação do Sistema Compreensivo, de indivíduos adultos não-pacientes, de cidades do interior e do litoral do Estado de São Paulo. Apresenta também um estudo comparativo de algumas variáveis com os resultados da capital do estado. A amostra é composta por 209 protocolos de Rorschach, de participantes adultos, com características variadas. Foi realizado um estudo do índice de concordância entre os diferentes codificadores que indicaram resultados muito favoráveis. A estatística descritiva e os testes de comparação entre as médias de algumas variáveis mostraram semelhanças e diferenças com os da capital. Essas semelhanças e diferenças nem sempre aconteceram no sentido que esperávamos. Como exemplo, podemos citar o nível de estresse que é tão alto nas cidades do interior quanto os resultados encontrados na capital do estado.

Palavras-chave: método de Rorschach; sistema compreensivo; estudo normativo; adultos.


ABSTRACT

This article presents the results of research with nonpatient adults used to perform descriptive statistics of the variables that compose the coding system of the Comprehensive System of countryside and coastal cities of the State of São Paulo, in Brazil. It also presents a comparative study of some variables with the results of the capital of State. The sample is comprised of 209 adults Rorschach protocols with varied characteristics. A study of integrated reliability among examiners was performed and indicated very favorable results. The descriptive statistics and comparison tests between some variables showed similarities and differences with those from the capital although they did not always occur in the manner in which we had expected. As an illustration, we can mention the level of stress that is as high in the cities of the interior (coastal and countryside) as the results founded in the capital of the state.

Keywords: Rorschach test; comprehensive system; normative study; adults.


RESUMEN

Este artículo presenta resultados de una investigación para realizar estadísticas descriptivas de variables que componen el sistema de codificación del sistema integral de personas adultas no pacientes, en ciudades en el interior y de la costa del Estado de São Paulo, en Brasil. También presenta un estudio comparativo de algunas variables con los resultados de la capital del Estado. La muestra está compuesta por protocolos de Rorschach, 209 de adultos participantes con características variadas. Fue realizado un estudio de índice de correlación entre diferentes codificadores que indican resultados muy favorables. Los resultados de estadísticas descriptivas y análisis comparativos entre algunas variables mostraron similitudes y diferencias con los de la capital. Esas similitudes y diferencias no ocurrieran siempre en el sentido de que se esperaba. Como ejemplo, podemos mencionar que el nivel de estrés es tan alto en las ciudades del interior como los resultados encontrados en la capital del estado.

Palabras-clave: método de Rorschach; sistema comprehensivo; estudio normativo; adultos.


 

 

A partir do início da experiência com o Sistema Compreensivo do Rorschach no Brasil, notou-se uma diferença bastante constante entre os resultados encontrados com as pessoas de São Paulo e os da população de Exner (1999). No início, os mais evidentes referiam-se às porcentagens das variáveis relativas à qualidade formal das respostas, e posteriormente foram observadas outras peculiaridades relativas aos resultados das demais variáveis.

Em 1999, em virtude de nossas dúvidas, iniciamos uma pesquisa para a normatização dos resultados do Rorschach para a cidade de São Paulo. Com o apoio da FAPESP e com um grupo de colaboradores, foi realizado um estudo para investigar as características dos resultados da qualidade formal das respostas, uma das mais significativas diferenças em relação aos critérios do Sistema Compreensivo, e as tabelas foram publicadas em revista científica (Nascimento, 2002) e em complemento ao manual de Classificação de Exner (Villemor-Amaral, Pacheco e Silva & Nascimento, 2004). Foi também realizado um estudo para verificar as diferenças entre os vários níveis socioeconômicos dessa amostra, publicado na Rorschachiana (Nascimento, 2004).

Os resultados dessa pesquisa normativa, realizada na cidade de São Paulo, mostraram alguns valores muito diferentes dos apresentados por Exner (1994, 1999, 2003). Alguns deles revelaram algumas características que pareciam refletir particularidades de pessoas que vivem em uma grande metrópole, como a cidade de São Paulo. Entre esses resultados, podemos salientar uma média muito baixa de respostas de textura (T<1), sinais de estresse muito acentuados, especialmente como um indicador situacional (Nota D negativa e AdjD>D), marcada presença do índice de depressão (DEPI), índice de autoestima rebaixado (Ego Index ¯). Acrescentam-se a eles, os resultados dos Códigos Especiais (Sum6). Também foram encontradas diferenças significativas entre os resultados dos diversos grupos socioeconômicos (Nascimento, 2004).

 

Objetivos

Em função dos resultados encontrados, na etapa seguinte dedicou-se a realizar um estudo normativo do Rorschach para pessoas que moram no Estado de São Paulo, mas em cidades com características variadas (neste trabalho serão designadas como cidades do interior). A coleta de dados foi realizada em duas cidades grandes, e três cidades pequenas, incluindo uma cidade de montanha e uma de praia. A escolha dessas cidades se deu por suas características e também pela facilidade de acesso e contatos que facilitaram aos pesquisadores realizar suas aplicações.

O objetivo principal foi realizar a estatística descritiva (média, desvio padrão, mediana, moda, valores mínimos e máximos) das variáveis que compõem o sistema de codificação do sistema compreensivo de Exner (1994, 1999, 2003), de indivíduos adultos não-pacientes, das cidades acima mencionadas, para ampliar a amostra de referência do estudo normativo para o Brasil. Como segundo objetivo, nosso projeto incluiu a comparação dos resultados encontrados nessas cidades com os da cidade de São Paulo.

 

Método

Participantes

Este trabalho consta de protocolos de Rorschach de 209 participantes (cerca de 50 nas cidades maiores e 35 nas menores), adultos (a partir dos 17 anos), de ambos os sexos, de todos os níveis de escolaridade e estados civis, de diferentes níveis socioeconômicos e que não apresentassem nenhuma queixa e/ou não estivessem em tratamento psicológico ou psiquiátrico e que estivessem trabalhando ou estudando.

Não foi considerada a possibilidade de se fazer uma amostra comparativa aos dados do Censo, pois teríamos que trabalhar com uma grande porcentagem de pessoas de classes mais baixas da população, o que criaria uma amostra desproporcional. A primeira tentativa foi para compor uma amostra equitativa em todas as características (sexo, idade e nível socioeconômico), o que também se tornou muito difícil. Decidimos então compor a amostra com as características mais variadas possíveis, tendo participantes de todas as camadas socioeconômicas, graus de escolaridade, idade, sexo, atividades de trabalho, etnias e estado civil. As tabelas a seguir mostram as características dos participantes.

Procedimento3

Pela dificuldade de se encontrar uma amostra aleatória, tentamos ser criteriosos na seleção dos sujeitos. Os critérios para a procura dos participantes deveriam seguir procedimentos semelhantes ao da pesquisa realizada na capital, ou seja, os sujeitos seriam procurados em seus ambientes de trabalho, que deveriam ser variados (escritório, empresa de saúde, instituição pública, instituição de ensino etc.) ou ambientes de estudo também variados (público, privado e de diferentes áreas). Também seriam procurados alguns voluntários, de diferentes ambientes, fora do local de estudo ou de trabalho. Inicialmente, seria apresentada uma carta explicando resumidamente os objetivos da pesquisa (ver em Nascimento, 2010). Quando o trabalho fosse realizado por permissão de instituições, essa carta seria também entregue para um responsável na instituição. Nessa carta esclarecemos que não seriam oferecidos resultados específicos nem aos participantes, nem à instituição, pois nosso interesse era o grupo como um todo e não os casos individuais.

 

 

Tratando-se de cidades do interior, nossa experiência mostrou ser mais fácil estabelecer os contatos a partir de alguns conhecimentos pessoais, ou buscando pessoas com certa influência na cidade, que foram fazendo indicações e assim pudemos ir constituindo a nossa amostra, pois foi difícil encontrar empresas muito grandes e por isto não poderíamos selecionar muitos sujeitos em cada uma delas, bem como em função da amostra de cada cidade ser relativamente pequena, procuramos não ultrapassar o limite de 5 participantes em uma mesma instituição, sendo estes com cargos e profissões variados. Dessa forma, conseguimos também uma amostra bastante variada. A condição para a inclusão do sujeito na pesquisa era que fosse sem histórico de comprometimento psicológico ou psiquiátrico e que estivesse trabalhando ou estudando, com exceção de algumas donas de casa, como já citado.

A partir da aceitação voluntária do sujeito para participar da pesquisa, foi marcado um horário. Havendo condições adequadas no local de trabalho ou de estudo, o procedimento ocorreu nessas instituições; caso contrário, foi marcado um encontro em algum consultório, emprestado por profissionais da cidade, ou na própria residência do sujeito, em local adequado para a aplicação.

Nesse encontro, foi realizada uma pequena entrevista para coletar alguns dados informativos, e ao mesmo tempo estabelecer um rapport. Em seguida foi administrado o Rorschach. No final da aplicação, os sujeitos assinaram uma permissão para uso do material, de acordo com as atuais normas éticas para pesquisa com seres humanos. Os profissionais que fizeram as aplicações dos protocolos de Rorschach eram psicólogos, com curso de Rorschach, seguindo o sistema compreensivo, todos bolsistas de Capacitação Técnica da FAPESP4.

Codificação

A codificação foi realizada por dois pesquisadores separadamente, em combinações variadas, ou seja, cada examinador codificou os seus próprios testes e mais cerca de 40, sendo em torno de 10 de cada um dos outros examinadores. Os critérios de codificação eram: seguir em primeiro lugar o livro de Exner (1999) e para resolver dúvidas, foi utilizado o livro de Viglione (2002). No caso de discordância, uma equipe constituída pelos pesquisadores e pela coordenadora da pesquisa decidiu pela melhor codificação. Duas reuniões semanais aconteceram durante todo o período da pesquisa, cuja principal atividade era discutir as aplicações e principalmente as codificações, para garantir sua precisão e, consequentemente, dos resultados do estudo.

No final, foi realizado um estudo do índice de concordância entre os diferentes examinadores, com a participação de juízes externos da pesquisa. Do conjunto da amostra, foram selecionados randomicamente 8 protocolos de cada pesquisador para realizar a concordância entre codificadores. Desse conjunto de dados, foram comparadas 1.686 respostas.

Análise dos dados

• A estatística descritiva foi realizada pelo programa informatizado de assistência à interpretação do método de Rorschach RIAP 5 (Exner & Weiner, 2001).

• A concordância entre os codificadores foi realizada pela porcentagem simples e pelo índice Kappa, cujos resultados não serão apresentados neste artigo, mas podem ser encontrados em Nascimento (2010).

• Para a comparação das médias de algumas variáveis selecionadas entre resultados obtidos na capital e no interior foram utilizados os cálculos estatísticos Mann-Whitney (para as variáveis que não apresentavam distribuição normal) e t de Student (para as que apresentavam distribuição normal).

Os cálculos foram efetuados no SPSS 10. As tabelas do SPSS foram construídas diretamente pelo RIAP 5, o que dá maior segurança e diminui a presença de erros de digitação na construção das tabelas.

Condições éticas para pesquisas com seres humanos.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

 

Resultados

Os resultados da estatística descritiva para as variáveis do Sistema Compreensivo do Rorschach dos 209 sujeitos encontram-se na Tabela 2.

 

 

A estatística descritiva e os resultados de Mann-Whitney e t de Student, indicando as diferenças entre a capital e as cidades interior, encontram-se nas Tabelas 3 e 4.

 

Discussão

Estatística descritiva e semelhanças entre capital e interior

Lambda: A média da capital se mostrou bem diferente do interior, pela comparação realizada pelo teste estatístico Mann Whitney. A média da capital é mais acentuada do que a das cidades do interior. Embora essa diferença seja estatisticamente significante, não podemos dizer que ambas as médias sejam muito diferentes, a não ser pelo fato de que o resultado do interior fica abaixo do limite de corte estabelecido por Exner, ou seja, L = 0,99 (média de lambda capital = 1,05; interior = 0,92). Chama a atenção termos encontrado os mesmos resultados no interior e na capital relativos à moda e aos valores mínimo e máximo.

XA%, WDA%, X+%, X-% e P: Variáveis que apresentam distribuição normal tanto na capital quanto no interior, mostram resultados distintos, com diferença estatisticamente significante. Na capital, os valores são ligeiramente mais baixos em XA%, WDA%, X+% e P e mais alto em X-%. De qualquer modo, podemos verificar que todos eles estão próximos de padrões normativos de outros países, como da pesquisa realizada por Schaffer, Erdberg e Haroian (2007), e que apresenta valores semelhantes aos resultados apresentados por Meyer, Erdberg e Schaffer (2007), em seu estudo para constituir uma referência normativa internacional. O fato de encontrarmos diferença estatisticamente significante entre a capital e o interior em XA%, X+% e X-% pode indicar que as pessoas da capital sejam menos convencionais do que as do interior, resultado que pode ser confirmado pela comparação das respostas Populares (P), um pouco mais elevadas no interior. Quanto às diferenças de P, embora se possa considerá-las muito pequenas, devemos argumentar que outros fatores estatísticos, além das médias, provocaram a diferença. Em termos de médias, temos valores muito semelhantes na capital e no interior. No entanto, moda e mediana são um pouco diferentes (Cidade A = 5; Cidade B = 5; Cidade D = 5; Cidade C, com mediana = 4 (não tem moda especificada), Cidade E = 4; e na capital (moda e mediana) = 4, o que confirma a interpretação de que estes dados refletem maior convencionalismo em algumas cidades do interior.

WSum6: Este resultado mostra uma grande diferença entre capital e interior, o que indicaria em princípio que as pessoas da capital apresentam uma ideação mais danificada e confusa (Interior = 4.19; capital = 10,63). No entanto, pensamos que também pode se tratar de um modo menos convencional de responder. Constatamos que a maioria dos códigos que atribuímos não se devia a respostas que revelassem grande comprometimento ao nível da ideação, mas sim respostas mais comuns, indicando talvez uma imaturidade cognitiva ou um modo pouco cuidadoso de responder. Por exemplo, como citado em outras ocasiões (Nascimento, 2006), muitas das respostas às quais atribuímos ALOG, não evidenciavam falhas tão graves como as que são indicadas na literatura. Parecia apenas um modo de responder menos cauteloso. Em muitas das FABCOM, as pessoas não explicitavam que se tratava de uma fantasia, mas estava implícito nas respostas. As CONTAM (indicativas de falha grave de pensamento) que encontramos, além de serem muito poucas, eram as mais comuns, ou seja, na prancha I, “morcego”, em que os espaços em branco seriam seus olhos e boca. Portanto, mesmo com valores elevados, não podemos dizer que essa amostra evidencie graves problemas de pensamento.

Nota D e AdjD: Ao contrário do que esperávamos inicialmente, as pessoas do interior evidenciaram resultados médios muito semelhantes aos da capital, não apresentando diferença significativa, (Nota D: Interior = -1.04, Capital = -1,07) e (AdjD Interior = -0.55; Capital = -0,50). Esses resultados indicam não ser a vida em cidade grande a causadora de maior estresse, seja crônico, seja situacional, o que contraria nossa hipótese inicial. De qualquer modo, para quase todas as cidades o estresse situacional é maior.

Soma Sombreado: Outro dado interessante é que as médias da capital e do interior relativamente às respostas de sombreado não apresentam diferença significante. Esse dado reforça a interpretação da Nota D e AdjD, indicando situações de sobrecarga de afetos, que podem causar sofrimento e ocorrem independente do nível de estresse da cidade. A média de es é apenas ligeiramente mais elevada na cidade de São Paulo (Capital = 8,57; Interior = 8,44).

FT, TF e T: Esperávamos encontrar um número maior de respostas de textura no interior, mas encontramos resultados também bastante baixos, com moda e mediana iguais a zero (média interior = 0.50 e capital = 0,33). Com relação a essa variável, chama a atenção o resultado da Cidade A (montanha), mais acentuado do que os demais, embora a mediana e moda continuem a ser zero. Os resultados de Mann Whitney mostram diferenças significantes entre a capital e interior quanto à presença de respostas de textura. Esse dado nos indica que, em geral, as pessoas das cidades do interior apresentam maior tendência a se aproximar dos outros, o que faz um sentido teórico e prático. No entanto, ao examinarmos a estatística descritiva dos resultados, percebemos que apenas em uma das cidades (Cidade A – montanha), como apontado acima, este resultado é significativamente maior (média = 0,75), e que diversos itens da estatística descritiva são semelhantes, tais como a moda, a mediana, valores mínimos e valores máximos. E ainda, devemos salientar o fato de que a média ainda não atinge o valor 1, como Exner afirma ser a expectativa. É necessário aprimorar a compreensão desses resultados em nosso país. Por enquanto, temos uma hipótese de que o valor zero não significa unicamente que as pessoas não se aproximem. É possível que encontremos dois significados, ou seja, que pessoas que estejam satisfeitas em suas necessidades afetivas também apresentem T = 0, assim como aquelas que apresentam a tendência a não se aproximar.

GHR: PHR e [H+(H)+Hd+(Hd)]: Quanto ao interesse pelas relações humanas, tendo como referência a soma dos conteúdos humanos (Todos H), este parece maior na capital (capital = 5,38; Interior = 4,45), com diferença estatisticamente significante. Porém, nas cidades do interior em geral há maior predisposição para um bom relacionamento interpessoal, com menor frequência de respostas PHR (GHR: PHR - Capital = 2,72:2,73 e Interior = 2,89:1,89), com diferença estatisticamente significante entre os valores de PHR. Os resultados de cada cidade são interessantes. Na Cidade E (praia) a diferença foi mais marcada, com GHR mais alto do que nas demais (média = 3,29) cidades e PHR entre os mais baixos (média = 1,83). Um dado a ser destacado é que tanto na capital quanto no interior encontramos H<(H)+Hd+(Hd). Esse mesmo resultado foi encontrado na Argentina, Peru e Espanha, conforme simpósio do Congresso Internacional de Rorschach (Nascimento, 2005). Alguns resultados, entre os quais podemos incluir este, ainda são difíceis de encontrar uma explicação teórica. Estamos apresentando apenas como uma constatação.

Ma: Mp, a:p: Na capital, tanto a relação a:p (movimentos ativos e passivos) quanto Ma:Mp (movimentos humanos ativos e passivos) evidenciam maior quantidade de respostas ativas e nas cidades do interior encontramos a relação inversa, indicando maior passividade e maior tendência a usar a fantasia para o enfrentamento das demandas cotidianas. Na cidade E (praia), com diferença muito pequena, encontramos a>p, porém Mp>Ma. As diferenças estatisticamente significantes entre a capital e o interior são relativas a Ma e a:p, ou seja, só não encontramos diferença entre as cidades no que se refere a Mp.

EB ou tipo de vivência: apenas por curiosidade, selecionamos as cidades que apresentam as maiores diferenças quanto a características regionais e comparamos a frequência dos tipos de vivência, que segundo Hermann Rorschach (1921) apresenta diferenças nos resultados das pessoas que vivem nas montanhas. Em todas as cidades, encontramos o tipo ambigual como o mais frequente, mas o que nos pareceu surpreendente foi encontrarmos a mesma frequência de extratensivos nas duas cidades, e o maior número de participantes introversivos na Cidade E (praia), contrariando uma imagem popular de que as pessoas de cidades de praia são mais extrovertidas, expansivas etc. Uma questão que fica também para posteriores investigações é a presença de tantos ambiguais e introversivos, o que não nos parece ser um modo de ser apenas de brasileiros, mas também de pessoas de outras nacionalidades, como temos oportunidade de observar em diversos artigos da revista Journal of Personality Assessment, volume 89, supplement 1, dedicada à apresentação de pesquisas normativas em diversos países, editadas por Meyer e cols. (2007).

 

Conclusão

Esta pesquisa normativa com habitantes de outras cidades do estado de São Paulo, que não a capital do estado, trouxe resultados muito interessantes. O ponto de partida para a ampliação da amostra teve como pressuposto que a condição da grande metrópole poderia interferir na qualidade dos relacionamentos humanos e criaria uma carga muita elevada de estresse, que poderia causar maior nível de sofrimento às pessoas.

Esse pressuposto não foi constatado a partir do atual projeto, embora outras diferenças tenham sido encontradas. Nem sempre conseguimos encontrar a explicação para essas diferenças. Contudo, por se tratar de estudo normativo, nosso objetivo foi alcançado.

Gostaria de salientar que, pela enorme quantidade de resultados encontrados neste estudo, com ampla variância na distribuição dos resultados e com a presença de um grande número de “outliers” foi se evidenciando cada vez mais que resultados de estudos normativos não representam características da população que possamos generalizar. Trata-se apenas de um referencial, que deve ser utilizado junto com toda estatística descritiva (mediana, moda, valores mínimos e valores máximos), para a compreensão de um caso particular.

Gostaria ainda de salientar que nossos resultados apresentam algumas semelhanças com os de pesquisadores de outros países, mas também algumas diferenças. Acreditamos que, em parte, essas diferenças possam ser consequência das características de nossa amostra. No projeto inicial, fizemos questão de incluir pessoas com as mais variadas características. Entre elas, a amostra incluiu participantes sem nenhuma escolaridade, ou com escolaridade muito baixa. Esse fato pode ter levado a que alguns resultados sejam distintos dos apresentados por Exner (1994, 1999, 2003), pois foram utilizados diferentes modos de compor a amostra.

Gostaria de concluir afirmando que nossos resultados põem em evidência a necessidade de se estudar cada população, com seu modo peculiar de responder aos testes psicológicos. Esperamos com este estudo estimular outros pesquisadores a dar continuidade a trabalhos como este, em suas regiões.

 

Referências

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Recebido em abril de 2012
Reformulado em julho de 2012
Aceito em agosto de 2012

 

 

Sobre a autora:

Regina Sonia Gattas Fernandes do Nascimento: Professora Associada da FaCHS / PUC-SP. Diretora da Clínica Psicológica “Ana Maria Poppovic”/ PUC-SP. Líder de Grupo de Pesquisa do CNPq. Experiência profissional com ênfase em Psicologia Clínica e Métodos de Avaliação Psicológica.


1Pesquisa realizada com o apoio financeiro da FAPESP.


2Endereço para correspondência:
Rua Monte Alegre, 984 - Perdizes - São Paulo - SP CEP: 05014-901 Fone: (11) 3670-8320 Secretaria da FaCHS E-mail: rsnascimento@pucsp.br e rsnascimento@pucsp.br


3O procedimento encontra-se descrito detalhadamente em Nascimento (2010).