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Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.11 no.3 Itatiba July/Sept. 2012

 

 

O Teste de Pfister em idosos

 

The Pfister Test in the elderly

 

La Prueba de Pfister en ancianos

 

 

Mariana de Siqueira Bastos-Formighieri; Sonia Regina Pasian1;

Universidade de São Paulo

 

 


RESUMO

Diante da tendência mundial de maior longevidade humana e do grande contingente de idosos, emerge a necessidade de cuidados especialmente dirigidos a este grupo de indivíduos, nos mais diferentes aspectos e contextos socioculturais. Dentre os recursos técnicos disponíveis na Psicologia encontram-se os instrumentos de avaliação psicológica, com potencial para contribuir para o alcance de informações relevantes sobre características e vivências psíquicas dos indivíduos, inclusive idosos, embora ainda pouco pesquisados no Brasil. Nesse contexto, o presente trabalho objetivou elaborar padrões normativos do Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister para essa faixa etária. Procurou-se caracterizar particularidades do funcionamento afetivo da velhice a partir desse método projetivo, apresentando argumentos e evidências empíricas para aprimorar processos de avaliação psicológica com idosos no contexto sociocultural brasileiro contemporâneo. Esses novos referenciais normativos foram comparados às normas brasileiras disponíveis para adultos nesse método projetivo, explorando a questão da especificidade das vivências afetivas durante o envelhecer.

Palavras-chave: avaliação psicológica; métodos projetivos; idosos; teste de Pfister.


ABSTRACT

Given the global trend of increased human longevity and the large number of elderly, arises the necessity of care specifically aimed at this group of individuals, in many different aspects and sociocultural contexts. Among the technical resources available in Psychology are the psychological assessment instruments, with the potential to contribute to the achievement of relevant information on psychological characteristics and experiences of individuals, including elderly, although poorly studied in Brazil. In this context, this study aimed to establish normative standards of the Color Pyramid Test of Pfister for elderly. We sought to characterize features of the affective functioning of old age from this projective method, arguments and empirical evidence to improve processes for psychological assessment with the elderly in contemporary Brazilian sociocultural context. These new standards were compared to normative standards in Brazil are available to adults in this projective method, exploring the question of the specificity of affective experiences during aging.

Keywords: psychological assessment; projective methods; elderly; Pfister test.


RESUMEN

Dada la tendencia mundial de aumento de la longevidad humana y el gran número de ancianos, surge la necesidad de la atención dirigida específicamente a este grupo de individuos, en varios aspectos y contextos socioculturales. Entre los recursos técnicos disponibles en Psicología hay instrumentos de evaluación psicológica, con el potencial de contribuir a la consecución de informaciones pertinentes sobre las características psicológicas y experiencias de personas, incluidos ancianos, aunque poco estudiada en el Brasil. En ese contexto, este estudio tuvo como objetivo establecer estándares normativos de la prueba de color de la Pirámide de Pfister para ese grupo de edad. Hemos tratado de caracterizar a las características del funcionamiento afectivo de la vejez de este método proyectivo, los argumentos y la evidencia empírica para mejorar procesos de evaluación psicológica con los ancianos en el actual contexto sociocultural de Brasil. Esas nuevas normas se compararon con los estándares normativos en Brasil.

Palabras-clave: evaluación psicológica; métodos proyectivos; ancianos; prueba de Pfister.


 

 

A pesquisa com avaliação psicológica tem se destacado como um importante campo de investigação científica em Psicologia, visando a assegurar a disponibilidade de recursos adequados e de boa qualidade ao profissional da área, uma vez que, segundo Alchieri e Cruz (2003), as discussões acerca dos instrumentos de avaliação psicológica no Brasil têm enfocado as qualidades psicométricas dos mesmos, em decorrência da escassez de investigações científicas que as assegurem. De acordo com A. E. Villemor-Amaral (2005), apesar do recente fortalecimento dos laboratórios de pesquisa em avaliação psicológica, as técnicas projetivas, mesmo com o seu reconhecimento ou devido a este, ainda necessitam investimentos. Ainda no contexto brasileiro, argumentos semelhantes são apontados por Ferstenseifer e Werlang (2008), ao abordarem a questão da cientificidade dos métodos projetivos de avaliação psicológica.

Dentre os instrumentos de avaliação psicológica de natureza projetiva, pode-se citar o Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister. Para Baccari e cols. (1983), o Teste de Pfister consiste num instrumento de avaliação da personalidade em níveis latentes e manifestos, com destaque por propiciar informações acerca do afeto e do controle de impulsos. Foi criado por Max Pfister, na Suíça, em 1951, introduzido no Brasil por Fernando Villemor-Amaral em 1966 e vem sendo utilizado há 50 anos, com boa aceitabilidade nas áreas clínica e de seleção de pessoal (A. E. Villemor-Amaral, Primi, Farah, Cardoso & Franco, 2003). Anzieu (1984) ressalta ainda que se trata de um teste com boa receptividade, agradando aos sujeitos por seu caráter lúdico. Mais recentemente, A. E. Villemor-Amaral (2005) comenta como surpreendente o fato de não serem encontradas muitas publicações científicas sobre esse instrumento, embora frequentemente utilizado na prática clínica.

Destaque deve ser oferecido ao estudo de A. E. Villemor-Amaral e cols. (2003) que publicaram novas normas avaliativas para esse instrumento no contexto brasileiro. Nesse estudo foram avaliados 109 voluntários, variando entre 18 e 66 anos de idade. Foram confirmadas as boas características psicométricas do material nessa pesquisa, sendo que os novos referenciais normativos pouco se diferenciaram daquelas de F. Villemor-Amaral (1978). Embora esse dado normativo tenha contemplado indivíduos acima de 60 anos, contou com uma faixa etária muito ampla, em que a média de idade foi de 39 anos para os homens e 30 para as mulheres. Desse modo, as informações acerca do padrão de respostas a esse método projetivo ainda são limitadas para os idosos, o que sugere investimentos nessa direção.

Ainda nesse contexto de pesquisas nacionais com o Teste de Pfister, recentes estudos reafirmam a sua utilidade na avaliação psicológica, apontando para a sensibilidade do instrumento na detecção de determinados indicadores psicopatológicos (Rosseto & Luigi, 2000; A. E. Villemor-Amaral e cols., 2005; A. E. Villemor-Amaral e cols., 2004; A. E. Villemor- -Amaral, Silva & Primi, 2003). Também pode ser interessante recurso para investigações acerca das características de certos recortes populacionais, como surdos (Cardoso, 2006) ou a idosos institucionalizados (Oliveira, Pasian & Jacquemin, 2001).

Tais evidências empíricas reafirmam a riqueza técnica do Teste das Pirâmides de Pfister, que obteve parecer favorável para uso pelos psicólogos no Brasil, conforme avaliação realizada pelo Conselho Federal de Psicologia, de acordo com a Resolução CFP No. 002/2003 (BRASIL, 2003). Apesar de muito utilizado nas áreas clínica, acadêmica e de pesquisa, segundo A. E. Villemor-Amaral e cols. (2005), ainda são escassos os estudos normativos e de validade para o Pfister no Brasil, justificando maiores investimentos nesta direção.

Nesse sentido, a faixa etária focalizada num estudo normativo constitui um importante critério (Alchieri & Cruz, 2003), devendo-se considerar as particularidades de cada segmento da população, como, por exemplo, eventuais diferenças existentes entre etapas do desenvolvimento, evitando-se, deste modo generalizações equivocadas nas normatizações. E nesse contexto, faz-se importante enfocar um determinado grupo populacional que vem ganhando notoriedade em todo o mundo: os idosos.

As pesquisas envolvendo idosos no Brasil vêm sendo justificadas por numerosas publicações atentas para a rápida mudança do perfil populacional brasileiro e os possíveis impactos destas mudanças em um futuro próximo. De acordo com previsões da Organização Mundial da Saúde, em 2025 a população idosa mundial estará por volta de 1,2 bilhão, sendo 75% deste número em países em desenvolvimento (Kalache, 1998). Assim, no início deste novo século, nove das 11 maiores populações idosas do mundo se localizarão em países em desenvolvimento: China, Índia, Brasil, Indonésia, Paquistão, México, Bangladesh e Nigéria (Kalache, 1998). No caso específico do Brasil, estima-se que o crescimento da população com 60 anos ou mais, entre os anos de 1950 e 1991, dobrou (de 3,5% para 7,3%) e aqueles acima de 65 anos triplicaram (1,7% para 4,5%) (IBGE, 2000).

Se o perfil populacional está mudando, há uma previsão de que o perfil das necessidades públicas de atendimento em saúde à população se alterará ainda mais. Os países desenvolvidos, que sofreram uma mudança mais lenta, ainda encontram sérias dificuldades para lidar com a questão, o que pode ser exemplificado pelas crises nos diferentes sistemas de Previdência Social existentes nestes países (Kalache, 1998). Segundo esse autor, diante dos aspectos acima levantados, a dificuldade do Brasil tenderá a ser ainda maior.

Essas preocupações certamente também se refletem nas investigações promovidas pelas Ciências da Saúde, como colocou Neri (2004), dentre elas a Psicologia. A autora apresenta um levantamento bibliográfico sobre velhice na base de dados PsyInfo e relata ter encontrado 160 registros em 1966, 9.609 em 2001 e 3.651 no primeiro semestre de 2002, observando ainda uma produção de aproximadamente 150.000 títulos em psicologia do envelhecimento. Neri (2004) afirma que atualmente as pesquisas se interessam pelas causas e pelos determinantes do envelhecimento bem sucedido, bem como pelas razões e padrões da velhice disfuncional.

No entanto, a mesma autora coloca que: “A Psicologia brasileira não apresenta produção volumosa, de longo prazo, contínua, sistemática e característica sobre a velhice.” (Neri, 2004, p. 15) Essa pesquisadora argumenta que parte dos profissionais brasileiros acompanha a produtividade internacional acerca do envelhecimento. Outra parte atua profissionalmente buscando solucionar problemas emergentes, o que tem sido cada vez mais frequente, tendo em vista o descompasso entre os investimentos científicos e as demandas da área na prática clínica cotidiana.

Dentro desse contexto atual de investigação acerca de instrumentos para avaliação dos idosos, há evidências na literatura científica internacional de uma recente preocupação dos pesquisadores da área de avaliação psicológica em considerar a população idosa em seus estudos, sobretudo investigando evidências de caráter psicométrico sobre seus instrumentais. Encontra-se diversidade e amplitude temática nas investigações, de âmbito internacional, voltadas à busca da compreensão do processo do envelhecimento, recorrendo aos instrumentos de avaliação psicológica como ricos auxiliares técnicos

Desse modo, as evidências até aqui apresentadas apontam que o envelhecimento vem se configurando como um importante foco de investimentos não só por parte da sociedade, mas também da Ciência, em âmbito internacional e também no Brasil, onde pouco se investiu no conhecimento e na atenção a esta população até o momento, incluindo aí a Psicologia. Ela, por sua vez, tem buscado enfrentar desafios internos da área a fim de garantir a ética e a qualidade da prática profissional do psicólogo, o que tem se evidenciado a partir da preocupação acerca da qualidade dos instrumentos de avaliação psicológica. Assim, se de um lado existe a necessidade de estudo dos instrumentos de avaliação psicológica, incluindo estudos normativos para os diferentes segmentos etários e, de outro lado, a importância de investimentos científicos para com os idosos, a busca de sistematização de estratégias técnicas e de investigação que possibilitem a obtenção de informações acerca da afetividade mostra-se como um importante passo para as pesquisas acerca da velhice.

Tendo-se em vista a necessidade de aprimoramento técnico dos instrumentos de avaliação psicológica no Brasil, o presente trabalho objetivou desenvolver padrões normativos para indivíduos com mais de 60 anos no Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister. Esta pesquisa também objetivou caracterizar índices da dinâmica afetiva e do funcionamento psicológico de idosos não-pacientes por meio desse método projetivo de avaliação psicológica, almejando caracterizar processos psicológicos envolvidos no envelhecimento.

 

Objetivos

Em termos gerais, o presente trabalho objetivou elaborar padrões normativos para idosos no Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister. Procurou- -se caracterizar particularidades do funcionamento afetivo da velhice a partir da citada técnica, numa tentativa de apresentar argumentos e evidências empíricas para aprimorar processos de avaliação psicológica com indivíduos idosos no contexto sociocultural brasileiro contemporâneo. Buscou-se ainda comparar esses novos referenciais de produção obtidos com idosos às normas brasileiras disponíveis para adultos nesse método projetivo (A. E. Villemor-Amaral, 2005), explorando a questão da especificidade das vivências afetivas durante o envelhecer.

 

Método

Participantes

A partir dos objetivos propostos, voltados à caracterização dos padrões de resposta de idosos em método projetivo de avaliação psicológica, tornou- se necessário selecionar cuidadosamente uma amostra de indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos, obtidos no contexto de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. Buscando-se evitar grande variação etária entre os participantes deste estudo, decidiu-se, por viabilidade técnica e operacional, selecionar a faixa de 60 a 75 anos de idade como foco da presente investigação, distribuídos entre os sexos. A cidade de Ribeirão Preto (SP) foi o local de realização deste trabalho, caracterizando- -se como um centro urbano promissor para pesquisa com idosos, pois apresentou crescimento bastante expressivo da faixa etária idosa nas últimas décadas, correspondendo a um aumento de 43,4% de 1991 para 2000 (IBGE, 2000). Estima-se cerca de 51.194 indivíduos acima de 60 anos nessa cidade do interior do Estado de São Paulo, com cerca de 500.000 habitantes (IBGE, 2000).

Levando-se em conta a meta de estudar os processos da velhice normal (não-paciente), a delimitação de adequados critérios de inclusão e de exclusão dos participantes tornou-se ponto central neste trabalho. Nesse sentido, optou-se por buscar eventuais participantes entre os idosos atendidos por Núcleos de Saúde da Família, unidades de atenção primária à saúde, onde seria possível o acesso a mínimos dados de caracterização sociodemográfica dos indivíduos, permitindo sua rápida identificação como fonte de estudo. Em Ribeirão Preto, existem cinco Núcleos de Saúde da Família vinculados ao Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, ambiente facilitador e devidamente autorizado para realização da presente investigação.

Em rápido levantamento inicial das informações dos prontuários médicos dessas unidades de atenção primária à saúde, foram identificadas aproximadamente 960 pessoas na faixa de 60 a 75 anos, funcionando como base ativa da população alvo. Desse universo, foram selecionados 100 participantes, ou seja, cerca de 10% do grupo base, considerando-se número viável e suficiente para os objetivos pretendidos neste estudo. Esses participantes foram selecionados por meio de randomização de 10% dessa faixa populacional em cada um dos citados Núcleo de Saúde da Família. Ocorrendo recusas, desistências ou não preenchimento dos critérios de seleção, novas randomizações foram efetuadas com base nos mesmos critérios, até ser completado o número pretendido de 100 indivíduos na amostra.

Foram observados ainda como critérios de seleção para a composição desta amostra: apresentação de bom estado geral de saúde, inexistência de comprometimentos físicos e psíquicos severos ou demais patologias descompensadas que comprometessem a execução das tarefas propostas (de acordo com avaliação médica prévia à avaliação psicológica). Foram excluídos do estudo portadores de deficiências sensoriais graves e limitantes ao contato visual e social. Deve-se destacar que todos os idosos foram voluntários e, estando cientes e informados a respeito da pesquisa, apresentaram consentimento livre e esclarecido à mesma.

A caracterização da amostra alcançada para o presente trabalho encontra-se na Tabela 1, apresentando a distribuição dos idosos em função do sexo, da idade e da escolaridade, consideradas informações sociodemográficas básicas e necessárias ao estudo aqui pretendido.

 

 

Observa-se, no que se refere à idade, que os voluntários do sexo masculino (totalizando 38 indivíduos) concentraram-se na faixa de menor idade, entre 60 e 64 anos (42,1%). Já o sexo feminino (correspondendo a 62 pessoas do grupo avaliado) apresentou distribuição etária levemente diferente do sexo masculino: maior frequência entre 65 e 69 anos (45,3%). Não houve diferença estatisticamente significativa entre as diversas faixas etárias da amostra em função do sexo (p=0,997), a partir da análise por meio do Teste Mann-Whitney. Dessa maneira, conseguiu-se compor adequada amostra para atender aos objetivos delineados na presente investigação.

Em termos de escolaridade, avaliada por meio dos anos de estudo completados pelos participantes, a maioria da amostra referiu ter, no máximo, quatro anos de estudo (62%), independentemente do sexo (55,2% do sexo masculino e 66,2% do sexo feminino). No entanto, pode-se notar uma diferença entre os sexos nessa variável, uma vez que a distribuição da frequência de mulheres por anos de estudo vai decrescendo à medida que aumenta a escolaridade, o que não se verificou na amostra masculina. Estatisticamente, essa diferença mostrou tendência à significância (p = 0,059) de acordo com o Teste Mann-Whitney. Pode-se inferir que o conjunto de participantes deste trabalho caracterizou-se por baixo nível de escolaridade, típico dos idosos no Brasil até a atualidade.

Quanto ao estado civil, a maioria da amostra é de indivíduos casados (65,0%), tendência compartilhada tanto pelos voluntários masculinos (86,8%) quanto femininos (51,6%). Em seguida estão os indivíduos viúvos, que representam 20,0% da amostra e são todos do sexo feminino (32,7%). A terceira maior frequência é a de voluntários solteiros, com 8,0% do total de idosos. Em menor frequência observou-se os indivíduos separados ou divorciados e, por fim, os amasiados. Sendo assim, pode-se ressaltar que, comparativamente ao sexo feminino, os indivíduos do sexo masculino apresentaram maior porcentagem de vivências conjugais e relacionamentos não regulamentados (amasiados) e menores frequências de solteiros e separados ou divorciados, além de não existirem viúvos do sexo masculino neste estudo. Quando essas classificações foram subdivididas em apenas dois conjuntos (indivíduos com relacionamento conjugal: casados e amasiados X aqueles que não tiveram ou já tiveram vivências conjugais, mas atualmente estão sozinhos: solteiros, viúvos e separados ou divorciados), encontrou-se diferença significativa (p=0,000) entre os sexos, de acordo com o Teste Qui-quadrado. Dessa forma, pode-se identificar que, no momento da pesquisa, mais indivíduos do sexo masculino encontravam- -se comprometidos em um relacionamento, quando comparados ao grupo do sexo feminino presentemente avaliado.

Materiais

Foram utilizados, para este estudo, os seguintes materiais:

a) Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para a pesquisa.

b) Roteiro semiestruturado de entrevista, para conhecimento das características sociodemográficas dos eventuais voluntários para a pesquisa, fonte básica de informações para poder decidir sobre sua inclusão ou não no estudo (conforme critérios propostos no estudo).

c) Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister, método projetivo de avaliação psicológica, para avaliar a dinâmica afetiva dos idosos. Para aplicação e avaliação desse instrumento psicológico foram utilizados o manual e os parâmetros normativos de A. E. Villemor-Amaral (2005). A instrução do teste consiste em solicitar a construção de três pirâmides bonitas, a partir de quadrículos coloridos, sobre um esquema em papel- -cartão de uma pirâmide. O teste conta com uma diversidade de dez cores, sendo que sete delas (com exceção do preto, branco e cinza) ainda contam com a apresentação em tons variados: quatro tons de azul, quatro de vermelho, quatro de verde, três de violeta e dois de laranja, de amarelo e de marrom.

d) Equipamento e programas computacionais para registro e análise estatística dos dados, em especial o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences), versão 13.0.

Procedimentos

Este projeto de pesquisa foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Saúde Escola da FMRP – USP. Aprovada a proposta de trabalho, inicialmente foi realizado um levantamento dos possíveis participantes dos Núcleos de Saúde da Família do município de Ribeirão Preto (SP), almejando-se compor a amostra pretendida neste estudo. Identificados, esses idosos foram contatados por telefone ou pessoalmente pela primeira pesquisadora para efetivar a explicação e o convite à pesquisa. Quando houve aceitação, foi agendado dia e hora para comparecimento do idoso ao ambulatório de saúde, local em que foi aplicado o instrumento de avaliação psicológica em sessões únicas e individuais de cerca de 45 minutos de duração.

A aplicação e a avaliação do Teste de Pfister seguiram os parâmetros propostos por A. E. Villemor-Amaral (2005), sendo realizada pela primeira pesquisadora, com equipe de colaboradoras devidamente treinadas e supervisionadas pela segunda autora. Após a apuração completa dos dados, foram registrados em programa estatístico (SPSS 13.0) para sua devida análise descritiva e estatística.

Os resultados globais obtidos com o Pfister dos idosos foram comparados às normas elaboradas com indivíduos adultos de A. E. Villemor-Amaral (2005), dado que se trata de recente estudo com a técnica, e por inexistir padrão específico para a faixa etária de idosos, razão inclusive do presente trabalho. Para estas análises recorreu-se ao Teste t de Student (One Sample), comparando-se seus resultados médios nos indicadores deste método projetivo.

 

Resultados

A técnica de Pfister oferece ampla diversidade de informações, com possibilidade de ricas combinações de suas variáveis. A sua organização, neste estudo, seguiu os parâmetros propostos em A. E. Villemor-Amaral (2005). Assim, no presente relato, as variáveis deste método projetivo serão apresentadas separadamente, para clareza didática, embora posteriormente analisadas e discutidas em função do objetivo maior de caracterização das vivências afetivas de idosos não-pacientes.

A média de tempo gasto para a execução de todo o teste (somatória do tempo total das três pirâmides) foi de 345,6 segundos (5 minutos e 46 segundos) e a mediana foi equivalente a 311,0 segundos (5 minutos e 11 segundos), quando calculados para o total de idosos que fizeram parte deste estudo. Houve diferença significativa entre os sexos (p = 0,014), segundo o Teste Mann-Whitney, sugerindo que o grupo feminino trabalhou mais rápido do que o masculino. Os valores médio e mediano no grupo feminino, para o tempo total nessa técnica, foram de 314,9 segundos (5 minutos e 15 minutos) e 284,0 segundos (4 minutos e 44 segundos), respectivamente. Por sua vez, o grupo masculino apresentou tempo médio de 395,8 segundos (6 minutos e 36 segundos) e mediana equivalente a 355,5 segundos (5 minutos e 56 segundos).

Examinando-se agora o intervalo de tempo entre a instrução dada e o início de construção das pirâmides, não se encontrou diferença significativa entre os sexos quando enfocados os tempos de latência das três pirâmides (separadamente ou mesmo tomando a somatória destes), segundo o mesmo teste estatístico acima mencionado. A média para o total de participantes foi 17,8 segundos e a mediana 12,0 segundos. A média do tempo de latência para o grupo masculino alcançou 17,8 segundos, com mediana de 13,5 segundos. Já, no grupo feminino, o tempo de latência médio correspondeu a 17,8 segundos, com mediana de 11,5 segundos. Sendo assim, o grupo feminino e o masculino não se diferenciaram no tempo de compreensão das instruções e na organização para a execução da tarefa. Assemelharam-se nesse aspecto cognitivo, porém, distanciaram-se no tempo total, sugerindo que o efeito do treino de uma pirâmide para outra foi maior no grupo feminino, que completou a tarefa em tempo menor.

As evidências relativas à dinâmica afetiva, na técnica de Pfister, estão fortemente associadas às escolhas cromáticas e ao equilíbrio encontrado nas distribuições dos estímulos no momento de construção das três pirâmides propostas. Dessa forma, as frequências cromáticas tornam-se dados bastante relevantes na análise dos resultados desse instrumento avaliativo. Os resultados do presente trabalho, referentes à sistematização da frequência das escolhas cromáticas pelo conjunto de idosos avaliados, bem como em função do sexo dos participantes, encontra-se apresentado na Tabela 2. A frequência das escolhas das dez cores do Pfister foi organizada de forma descritiva, apresentando-se resultados relativos à média, ao desvio padrão (DP), aos valores mínimo e máximo encontrados, aos percentis 25, 50 (Mediana) e 75, caracterizando perfil geral de distribuição deste indicador técnico nos idosos avaliados.

 

 

A análise do conjunto das informações trazidas pela Tabela 2 permite apontar que as três cores mais utilizadas pelos idosos foram o verde, o vermelho e o azul. Embora não na mesma proporção, elas também foram as três cores de maior frequência entre os não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005), assim como nas demais amostras apresentadas pelos citados autores, o que, novamente, pode ser considerado resultado sugestivo de adaptação sócio-afetiva dos idosos presentemente avaliados.

Realizando-se análise estatística (Teste Mann-Whitney) na distribuição das escolhas das cores do Pfister em função do sexo dos idosos do presente trabalho, notou-se uma única diferença significativa: frequência da cor azul (p = 0,031). Considerando o valor interpretativo do azul no teste, tal diferença quanto a sua utilização, mais acentuada no grupo feminino, pode estar refletindo maior tendência para desenvolver depressão entre estas participantes, conforme sugerido pela literatura científica da área (A. E. Villemor-Amaral, 2005), apesar de ser necessário lembrar que elas não se encontram distantes dos parâmetros normativos de adultos, sinalizando apenas tendência vivencial e não sinal psicopatológico neste grupo.

Seguindo a análise dos dados da Tabela 2, pode-se verificar que a cor laranja, o amarelo e violeta foram as cores mais escolhidas neste estudo, após o uso do verde, do vermelho e do azul, como já apontado. Essa frequência de escolha das cores no grupo total de idosos foi equivalente à distribuição das cores no grupo feminino, mas um pouco diferente em relação aos indivíduos do sexo masculino. Novamente, pode-se observar maior correspondência do grupo feminino com a amostra de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005). No grupo masculino, a cor amarela apresentou leve predomínio sobre o laranja e, por sua vez, o violeta também foi a sexta cor mais utilizada pelos indivíduos desse grupo.

Por fim, com sequência igualmente compartilhada entre os sexos, ocorreram o marrom, branco, preto e cinza. Desse modo, a ordem de utilização dessas cores encontradas em menor frequência nos idosos seguiu distribuição bastante peculiar, quando comparada com a amostra de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005).

Efetuou-se a comparação desses resultados de frequência média das escolhas cromáticas com aqueles apresentados para o grupo de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005), recorrendo-se ao Teste t de Student (One Sample t test), com nível de significância menor ou igual a 0,05. Uma apresentação sintética desses resultados pode ser visualizada na Tabela 3.

 

 

Pode-se notar que, dentre as dez cores comparadas, somente três delas não apresentaram diferença significativa entre as referidas amostras. Assim, apresentaram diferença significativa: azul, vermelho, amarelo, marrom, preto, branco e cinza. Observa-se ainda que, no que se refere a essas cores, que os idosos apresentaram menores valores médios em relação aos adultos de A. E. Villemor-Amaral (2005) para o azul, preto, branco e cinza e maiores valores para o vermelho, amarelo e marrom. Assim, usaram menos as cores de baixa estimulação afetiva, o que, juntamente com o menor uso do azul, representa simbolicamente que os idosos recorreram menos aos mecanismos defensivos de repressão, inibição, dissimulação, racionalização, negação e atuação (A. E. Villemor-Amaral, 2005). Os idosos sinalizaram necessitar das defesas psicológicas em nível diferente dos adultos, de forma a conseguirem preservar sua estrutura interna e adequarem-se ao ambiente. Seguindo-se essa linha interpretativa, utilizaram-se mais as cores de excitação e intensa estimulação afetiva (com exceção do laranja), trazendo, aliado ao maior uso da cor marrom, um sentido de energia, vitalidade, socialização e manifestação do afeto. Tais considerações se opõem à visão de velhice como decrepitude e isolamento, sugerindo que os idosos se mostraram abertos aos estímulos do meio, ativos e participantes no ambiente.

Essas evidências empíricas são sugestivas da necessidade de tratar os idosos separadamente, em relação aos adultos, para a análise e a interpretação dos resultados no Teste de Pfister, exigindo padrões normativos específicos para os indivíduos na velhice. Reafirma-se, portanto, a possibilidade de contribuição dos atuais achados.

As síndromes cromáticas referem-se às variáveis do Pfister compostas pela soma da frequência de utilização de algumas cores em específico, para as quais foram construídas hipóteses interpretativas também peculiares, justificando-se análise complementar às frequências das escolhas cromáticas, já realizada anteriormente. As principais síndromes, que serão tratadas aqui, seguindo a proposta avaliativa de F. Villemor Amaral (1978), são: Síndrome Normal (capacidade reguladora do afeto e adaptação ao meio ambiente); Síndrome Estímulo (receptividade aos estímulos e manifestações afetivas); Síndrome Fria (elaboração dos estímulos externos e internos); Síndrome Incolor (estruturação do ego e defesas) e Síndrome de Dinamismo (ação-realização-produtividade).

Os resultados encontrados neste trabalho foram, então, classificados em função dessas categorias avaliativas da composição das síndromes cromáticas, chegando-se à elaboração da Tabela 4. Novamente, os dados a serem apresentados focalizarão: média, desvio-padrão (DP), valores mínimo e máximo, e os percentis 25, 50 (mediana) e 75.

 

 

Esses resultados permitem considerar que as principais síndromes do Pfister ocorreram na seguinte ordem decrescente de frequência entre os idosos avaliados: normal, fria, estímulo, dinamismo e incolor. Essa mesma distribuição, em termos de ordem de ocorrência das principais síndromes do Pfister, foi também observada na amostra de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005), reforçando as colocações anteriores acerca dessas aproximações dos achados com amostras de não-pacientes.

Essa frequência das síndromes cromáticas do grupo geral de idosos foi a mesma sequência apresentada pelo grupo feminino, diferindo levemente da ordem apresentada no grupo masculino. Para eles, a frequência das síndromes do Pfister seguiu a sequência: síndrome normal, estímulo, fria, dinamismo e, por fim, síndrome incolor. No entanto, analisando-se estatisticamente (Teste Mann-Whitney) essas peculiaridades de desempenho dos sexos na frequência das síndromes cromáticas, verificou- -se apenas uma diferença significativa, a saber: na síndrome fria (p = 0,014), em que o grupo feminino apresentou frequência maior do que o grupo masculino. Provavelmente, esse achado pode estar associado à frequente utilização da cor azul por parte do grupo feminino, sendo esta cor uma das três componentes dessa fórmula. A. E. Villemor-Amaral (2005) afirma que os sentidos atribuídos a essa síndrome devem ser considerados somente quando todos os componentes da fórmula seguem a mesma direção de frequência (aumentados ou diminuídos), circunscrevendo, desta forma, este achado às interpretações realizadas quanto à frequência da cor azul. Assim, somente com essa ressalva, pode-se considerar que os idosos do sexo masculino e feminino apresentaram grande proximidade em sua dinâmica afetiva, expressa pelos indicadores das fórmulas cromáticas.

Efetuou-se a comparação destes resultados de frequência média das síndromes cromáticas com aqueles apresentados para o grupo de não-pacientes por A. E. Villemor-Amaral (2005), recorrendo-se ao Teste t de Student (One Sample t test), com nível de significância menor ou igual a 0,05. Uma apresentação sintética dos resultados pode ser visualizada na Tabela 5.

 

 

Nota-se que as diferenças foram significativas para todas as síndromes cromáticas presentemente avaliadas. Os idosos, comparativamente aos adultos, apresentaram maiores valores médios para as síndromes normais, estímulo e dinamismo e menores médias para as síndromes fria e incolor. Assim, dadas as interpretações brevemente citadas para cada síndrome, esses achados, de um modo geral, corroboram as hipóteses anteriormente formuladas a respeito das frequências cromáticas. Em outras palavras, poder-se-ia apontar o padrão de comportamento dos idosos como adequado, adaptativo e ativo em relação ao meio, com receptividade aos estímulos e manifestação dos afetos. Sinalizaram recorrer aos mecanismos defensivos em proporção diferente dos adultos, contudo, alcançando preservação de sua funcionalidade e integridade egóica (A. E. Villemor-Amaral, 2005).

Deve-se, no entanto, fazer a ressalva de que tais considerações devem ser tratadas com cautela, uma vez que as diferenças nos valores finais das síndromes podem ser decorrentes de alterações em sentidos diferentes dos componentes das mesmas. Somente na síndrome incolor foram verificadas diferenças entre adultos de A. E. Villemor-Amaral (2005) e os atuais idosos, para as três cores componentes de tal síndrome, diferenças estas observadas na mesma direção (menores valores), endossando, assim, a interpretação exposta acerca das síndromes cromáticas, correspondendo ao funcionamento das defesas egóicas.

 

Discussão

Um primeiro aspecto a ser abordado é referente à composição da amostra. O predomínio de mulheres no presente grupo de idosos avaliados, seguindo-se os critérios de seleção aqui adotados, refletem dados da população idosa brasileira, como coloca Camarano (2002). A autora ainda afirma que, com o aumentar da idade, o contingente feminino também aumenta sua frequência na população.

O maior número de homens casados ou amasiados no grupo presentemente avaliado, comparativamente às mulheres, é outro dado coincidente com a população brasileira. Camarano (2002) afirmou que enquanto cerca de 80% dos homens idosos mantém algum tipo de união conjugal, existe uma tendência por parte das mulheres idosas em viver sozinhas. Em síntese, poder-se-ia afirmar que a amostra utilizada no presente trabalho alcançou seus objetivos de ser representativa, em termos globais, das características dos idosos do contexto sociocultural contemporâneo. Obviamente possui limites de representação efetiva dessa população, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos, por não contemplar um real mapeamento dos idosos em termos de múltiplas características sociodemográficas. No entanto, para subsidiar a elaboração de padrões típicos de desempenho em técnicas psicológicas específicas (Teste de Pfister), considera-se que a presente amostra se mostrou adequada a seus propósitos, inexistindo até o momento perfis de desempenho nesses instrumentos de avaliação psicológica com esse número de participantes avaliados (N = 100) para pessoas idosas no Brasil, onde ainda são escassos os estudos com a referida técnica, sobretudo os normativos (A. E. Villemor-Amaral, 2005).

Assim, apesar da existência de pesquisas brasileiras com o Pfister, as análises efetuadas no presente estudo circunscreveram-se a comparações com outra amostra normativa para o referido método projetivo. Desse modo, optou-se pela comparação com a amostra de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005), por ser a que apresenta as características mais próximas com a população alvo deste estudo.

Neste momento de reflexão sobre os resultados, vale a pena destacar algumas relações interessantes identificadas entre as evidências empíricas alcançadas. Nesse sentido, por exemplo, as diferenças encontradas entre idosos do sexo masculino e feminino com relação ao uso do azul no Teste de Pfister. Cabe lembrar que foi apenas nessa cor do Pfister que os idosos presentemente avaliados se diferenciaram significativamente, justificando sua análise em específico nesse momento. Há que ser lembrado ainda que, apesar dessa diferença específica, ambos os grupos de idosos apresentaram semelhança nas escolhas cromáticas e nas síndromes cromáticas em relação às expectativas normativas disponíveis para adultos, apontando para seu adequado funcionamento sócio-afetivo.

A utilização da cor azul no Pfister está simbolicamente associada ao controle e à regulação dos afetos, fornecendo sinais sobre a adaptação e a canalização afetiva, tendo função frenadora ou elaboradora dos estímulos externos. De acordo com F. Villemor-Amaral (1978), a significação do azul está relacionada tanto a uma conotação positiva, que corresponderia a uma função reguladora e de adaptabilidade, quanto a uma conotação negativa, pois, quando há demasia desta função regulativa, existe uma constrição da personalidade.

Para Marques (1988), o azul, juntamente com o amarelo e o cinza, é mais representativo das funções do ego, dos mecanismos defensivos e das influências do ego sobre o supererego. O azul representaria os recursos de ordem racional, permitindo que o indivíduo atenda à realidade externa e interna, bem como aos mecanismos defensivos desta mesma ordem, a saber: racionalização e intelectualização. Está associado ainda às funções do pensamento, da inteligência, da percepção e da atenção. Quando excessivamente elevado, mostra predominância do superego sobre o ego e, por conseguinte, sinaliza constrição e limitações do ego frente à realidade externa e interna. Para Anzieu (1984), o azul estaria relacionado ao controle da afetividade. A. E. Villemor-Amaral (2005) afirmou que a elevação do azul pode se relacionar tanto a sentimentos de inferioridade e de incapacidade, a insatisfações e a ambivalências, quanto a supercontrole e compulsividade.

Assim, num primeiro momento, poder-se- -ia considerar que o maior uso de azul por parte do grupo feminino de idosas sinalizaria alguma maior propensão a vivências depressivas e a maior uso de mecanismos de racionalização, comparativamente aos idosos do sexo masculino, embora ambos estejam próximos aos padrões normais de produção no Pfister. Camarano (2002), remetendo-se aos dados do IBGE de 1998, afirma que as idosas estão mais sujeitas a deficiências físicas e mentais. Especificamente a respeito da depressão, a autora mostra existir maior prevalência desta entre as mulheres na faixa de 60 a 80 anos, faixa em que se encontra a amostra desta pesquisa, quando comparada à prevalência de depressão em homens idosos, relação que se inverte no segmento de 80 anos ou mais.

Ainda o azul, quando em elevação, foi associado por A. E. Villemor-Amaral (2005) ao Transtorno do Pânico. Gordilho (2002) afirma que as idosas apresentam maior tendência a transtornos ansiosos quando comparadas aos homens, uma vez que tais categorias nosológicas são duas vezes mais frequentes entre as mesmas.

Considerando-se esses tipos de evidências encontradas nos atuais resultados, o Teste de Pfister se mostrou sensível a possíveis especificidades da dinâmica afetiva dos idosos em função do sexo. Esses resultados foram sugestivos de que o grupo feminino presentemente avaliado necessitou, em maior proporção, dos controles afetivos associados ao aumento da cor azul do Pfister, para se apresentar de forma estável e adaptativa em seu contexto ambiental.

Essas considerações também podem ser relacionadas a outras especificidades de produção no Pfister, identificadas no presente grupo feminino avaliado. Houve indicativos de maior rapidez desse grupo feminino na realização desse método projetivo de avaliação psicológica, além de elevação da síndrome fria, em comparação aos resultados do Pfister alcançados pelo grupo masculino de idosos desta amostra. De acordo com os pressupostos de F. Villemor Amaral (1978) e A. E. Villemor-Amaral (2005), faz-se necessária elevação equilibrada dos três componentes da síndrome fria para se efetivar, com clareza, as interpretações a ela relacionadas, o que acabou não ocorrendo nos atuais resultados. Neste estudo ficou evidente apenas a elevação da frequência do uso da cor azul no grupo feminino, circunscrevendo as possíveis interpretações apenas para este indicador técnico do Pfister.

Procurando-se elaborar uma síntese das análises realizadas sobre os resultados do Pfister em função do sexo, poder-se-ia concluir pela similaridade dos atuais achados entre idosos do grupo masculino e feminino, sinalizando preservação de sua afetividade. Cabe a ressalva, sobre essa possível conclusão, de que o grupo de idosos avaliados ficou majoritariamente composto pelo sexo feminino, podendo, eventualmente, mascarar especificidades menores que se mostrariam apenas em comparações com grupos realmente representativos e significativos da população idosa, ultrapassando, no entanto, as atuais possibilidades deste trabalho.

Partindo agora para a reflexão sobre a tendência geral dos resultados do Pfister no conjunto de idosos avaliados, independentemente do sexo, faz-se importante destacar a frequência de algumas cores em especial. Nesse sentido, vale apontar que o verde foi a cor de maior frequência neste estudo. Também foi a cor mais utilizada pela amostra de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005). Esses resultados corroboraram os argumentos apresentados por F. Villemor Amaral (1978) em outra época e outro contexto sociocultural, como se depreende de sua passagem em relação ao estudo do Pfister no Brasil:“O verde foi e continua sendo a cor mais utilizada pelos brasileiros.” (pág. 67). Pode-se pensar, portanto, sobre a necessidade de estudos longitudinais relativos às características das vivências afetivas dos indivíduos, de modo a poder identificar eventuais marcadores socioculturais e específicos para etapas do desenvolvimento humano.

Embora a frequência da cor verde, a exemplo do violeta e laranja, não tenha sido significativamente diferente entre a amostra deste estudo e a de não-pacientes de A. E. Villemor-Amaral (2005), as outras sete cores o foram, a saber: azul, vermelho, amarelo, marrom, preto, branco e cinza. Dessa forma, a hipótese de existirem diferenças entre idosos e adultos é reforçada, bem como a necessidade de padrões normativos que se adequem às particularidades desse segmento populacional, objetivo maior da presente pesquisa.

Essa interpretação foi corroborada pelas diferenças encontradas entre os adultos de A. E. Villemor-Amaral (2005) e os atuais idosos nas frequências e síndromes cromáticas do Pfister. Com menor uso das cores de baixa estimulação afetiva, e do azul, menores médias para as síndromes fria e incolor, maior utilização das cores de excitação e estimulação afetiva (com exceção do laranja), maior uso da cor marrom, juntamente com valores médios maiores para síndromes normais, estímulo e dinamismo, os idosos sinalizaram comportamento adaptativo e ativo em relação ao meio. Evidenciaram, dessa forma, adequada receptividade aos estímulos e preservada manifestação dos afetos, apontando diferentes arranjos defensivos comparativamente aos adultos não-pacientes dos referidos pesquisadores. Desse modo, o conjunto desses indicadores técnicos do Pfister pode ser interpretado no sentido da preservação da dinâmica afetiva na velhice, dentro das possibilidades informativas deste método projetivo.

Pode-se, dessa maneira, pensar que os atuais achados poderão contribuir com a área da avaliação psicológica no contexto sociocultural contemporâneo de nosso país, embora colhidos numa região específica, uma vez que apresentam informações ainda não divulgadas no meio científico e que buscam adequações dos procedimentos técnicos do psicólogo ao ambiente onde trabalha, prerrogativa das diretrizes do Conselho Federal de Psicologia. Também se considera que este estudo poderá colaborar com a compreensão sobre o complexo processo do envelhecimento, lançando luz ou sugerindo direções de investigação acerca de processos psicológicos envolvidos nesta etapa do desenvolvimento humano.

 

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Recebido em março de 2012
Reformulado em junho de 2012
Aceito em julho de 2012

 

 

Sobre as autoras:

Mariana de Siqueira Bastos-Formighieri: Psicóloga. Mestre em Ciências, Área Psicologia. Atualmente é psicóloga FAEPA, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP.
Sonia Regina Pasian: Psicóloga. Professora Associada do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto-USP. Coordenadora do Centro de Pesquisas em Psicodiagnóstico – FFCLRP- -USP; Membro do Conselho Consultivo da Associação Brasileira de Rorschach e Métodos Projetivos (ASBRo). Editora Associada da Revista Avaliação Psicológica (IBAP).


1Endereço para correspondência:
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