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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.12 no.2 Itatiba ago. 2013

 

 

Validação da Psychological Well-being Scale em uma amostra de estudantes universitários1

 

Validation of the Psychological Well-being Scale in an undergraduate student’s sample

 

Validación de la Psychological Well-being Scale en una muestra de estudiantes universitarios

 

 

Wagner de Lara Machado2,I; Denise Ruschel BandeiraI; Josiane PawlowskiII

IUniversidade Federal do Rio Grande do Sul
IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro

 

 


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo adaptar e validar a Psychological Well-being Scale (Escala de Bem-estar Psicológico – EBEP) em uma amostra de estudantes universitários. O processo de adaptação dos itens envolveu a tradução, análise de juízes e avaliação da familiaridade. Posteriormente, 313 estudantes universitários, com média de idade de 24,18 (DP = 6,44) anos, sendo 190 (60,7%) mulheres, responderam a EBEP. Para investigar a validade de construto foram conduzidas análises fatoriais confirmatórias e análises de correlação com indicadores de satisfação de vida, afetos positivos e negativos, balanço entre afetos e depressão. O modelo teórico de seis fatores oblíquos apresentou melhor ajuste e as seis subescalas se correlacionaram na direção e magnitude esperada com indicadores de bem-estar. A EBEP mostrou-se um instrumento válido e fidedigno.

Palavras-chave: bem-estar psicológico; escala psicométrica; avaliação psicológica; psicometria.


ABSTRACT

This study aimed to adapt and validate the Psychological Well-being Scale (PWBS) in an undergraduate student’s sample. The item adaptation process involved translation, judges’ analysis and evaluation of familiarity. Subsequently, 313 undergraduate students, with mean age 24.18 (SD = 6.44) years, with 190 (60.7%) females and 123 (39.3%) males, responded to PWBS. To investigate the construct validity confirmatory factor and correlation analyses with indicators of life satisfaction, positive and negative affect, affect balance and depression were conducted. The theoretical model of six oblique factors showed the best fit and the six subscales correlated in the expected direction and magnitude with others well-being indicators. The PWBS proved to be a valid and reliable instrument.

Keywords: psychological wellbeing; psychometric scale; psychological assessment; psychometrics.


RESUMEN

El objetivo de este estudio fue adaptar y validar al portugués brasileño la Escala de Bienestar Psicológico (EBP). El proceso de adaptación de los ítems ha involucrado la traducción, el análisis de jueces y la evaluación de la familiaridad. Posteriormente, 313 estudiantes universitarios, con edad media de 24,18 (DE = 6.44) años, 190 (60.7%) mujeres y 123 (39.3%) hombres, respondieron a la EBP. Para investigar la validez del constructo se realizó análisis factorial confirmatorio y los análisis de la correlación con los indicadores de satisfacción con la vida, afecto positivo y negativo, equilibrio entre afectos y la depresión. El modelo teórico de seis factores oblicuos mostró el mejor ajuste y las seis subescalas correlacionan en la dirección y magnitud esperada con los indicadores del bienestar. La EBP se demostró un instrumento válido y confiable.

Palabras-clave: bienestar psicológico; escala psicométrica; evaluación psicológica; psicometría.


 

 

A questão sobre o que constitui a essência do bem-estar em nível psicológico levou Carol Ryff a desenvolver o modelo de Bem-estar Psicológico (BEP, Ryff, 1989). A partir de teorias humanista-existenciais, do desenvolvimento humano e da saúde mental foram definidas as seis dimensões do construto (Tabela 1): relações positivas com outros, autonomia, domínio sobre o ambiente, crescimento pessoal, propósito na vida e autoaceitação (Ryff, 1989; Ryff & Singer, 2008). As dimensões do construto representam tarefas evolutivas características do desenvolvimento saudável, e estão associadas a indicadores de qualidade de vida, de bem-estar e a processos biológicos e psicossociais adaptativos (para uma revisão sobre os correlatos das dimensões do BEP, ver Machado & Bandeira, 2012; Ryff & Singer, 2008).

 

 

Após a operacionalização das dimensões do BEP, foram desenvolvidas escalas psicométricas para a avaliação objetiva do construto. No estudo original de Ryff (1989), a Psychological Well-being Scale (PWBS) possuía 20 itens por subescala, sendo a metade negativos, selecionados a partir do método de correlação item-total. A consistência interna (alpha de Cronbach) das subescalas variou de 0,86 a 0,93 e o coeficiente de estabilidade temporal (teste-reteste), avaliado no período de seis semanas em uma subamostra de 117 participantes, variou de r = 0,81 a 0,88. Posteriormente, versões alternativas e mais breves do instrumento foram desenvolvidas, mantendo a proporção de itens por dimensão e de itens positivos e negativos. A versão de 84 itens, 14 por subescala, é a mais utilizada em estudos do grupo de Ryff e colaboradores, apresentando índices de consistência interna variando de 0,83 a 0,91(Ryff & Essex, 1992). Outra versão, de 18 itens (três por dimensão), foi construída para grandes levantamentos, por questão de brevidade e economia. Essa versão, contudo, apresenta baixa consistência interna, variando de 0,33 a 0,56, o que se deve, em parte, ao número reduzido de itens por dimensão (Ryff & Keyes, 1995). Por fim, uma versão de 54 itens (nove por dimensão) vem sendo utilizada no Wisconsin Longitudinal Study pela equipe de Ryff. As subescalas dessa última versão apresentam medidas de fidedignidade de 0,61 a 0,83 (van Dierendonk, 2005).

As diferentes versões da PWBS foram adaptadas e/ou traduzidas em diversos países, incluindo Itália (Ruini, Ottolini, Rafanelli, Ryff, & Fava, 2003), Grécia (Vleioras & Bosma, 2005), Austrália (Burns & Machin, 2009), China (Cheng & Chan, 2005), Canadá (Clarke, Marshall, Ryff, & Wheaton, 2001), Alemanha (Fleeson & Baltes, 1996), Coréia do Sul (Jin & Moon, 2006; Keyes & Ryff, 2003), Portugal (Novo, 2003/2000), Suécia (Lindfors & Lundberg, 2002), Espanha (van Dierendonck, Díaz, Rodríguez- Carvajal, Blanco, & Moreno-Jiménez, 2007) e Holanda (van Dierendonk, 2005). Diversos estudos investigaram a validade de construto da Psychological Well-being Scale por meio de sua estrutura fatorial. Utilizando técnicas de análise fatorial confirmatória, alguns estudos corroboram o modelo teórico de seis fatores oblíquos (Cheng & Chan, 2005; Clarke e cols., 2001; van Dierendoncke cols., 2007), enquanto outros sugerem que um modelo incluindo um fator de segunda ordem apresenta melhor ajuste (Lindfors, Berntsson, & Lundberg, 2006; van Dierendonck, 2005; Ryff & Keyes, 1995). Essa última hipótese significa que as seis dimensões interdependentes medem em conjunto o mesmo construto. Entretanto, a interpretação do modelo hierárquico apresenta algumas dificuldades, tendo em vista que diferentes dimensões do BEP apresentam distintos padrões de variação em relação a critérios externos, como por exemplo, diferentes etapas do desenvolvimento (ver Ryff, 1989; Ryff & Keyes, 1995). Ainda, o número total de itens da escala original foi alterado na versão chinesa (24 itens; Cheng & Chan, 2005), espanhola (39 itens; van Dierendonck e cols., 2007) e holandesa (39 itens; van Dierendonck, 2005), com a finalidade de garantir as propriedades psicométricas do instrumento.

Outros estudos investigaram a validade de construto da PWBS por meio de sua relação com indicadores prévios de bem-estar em âmbito psicológico presentes na literatura. As seis dimensões do BEP se correlacionam positivamente com medidas de satisfação de vida, afetos positivos e balanço entre afetos, e negativamente com afetos negativos e depressão (Kafka & Kozma, 2002; Keyes, Shmotkin, & Ryff, 2002; Ryff, 1989; Ryff & Keyes, 1995; Ryff, Lee, Essex, & Schmutte, 1994). A magnitude dessas correlações varia de baixa a moderada, sendo sempre no sentido teoricamente esperado (Tabela 2).

 

 

Considerando que não há, até o presente momento, estudos brasileiros sobre a adaptação da PWBS e tendo em vista seu potencial uso em diversas áreas da psicologia, o presente estudo teve como objetivo adaptar a PWBS em uma amostra de estudantes universitários, a partir da versão de 84 itens do instrumento (Ryff & Essex, 1992). Para tanto, foram investigadas suas propriedades psicométricas e sua validade de construto por meio de análises fatoriais confirmatórias e das relações com indicadores de satisfação de vida, afetos positivos, afetos negativos, balanço entre afetos e depressão.

 

Método

Participantes

Na fase de adaptação do instrumento, participaram quatro alunos de pós-graduação em Psicologia, sendo um como tradutor do instrumento original para o Português brasileiro e os demais como juízes da adequação dos itens. Ainda, participaram, nessa etapa, 27 voluntários, sendo a maioria com nível superior de ensino completo (n = 10, 37%, amplitude de ensino médio a doutorado), sendo 19 (70,4%) mulheres com média de idade de 30,89 anos (DP = 7,89; amplitude de 19 a 48). Após a adaptação do instrumento, 313 estudantes de graduação de instituições públicas (n = 68, 21,7%) e particulares (n = 245, 78,3%) do interior e da capital do estado do Rio Grande do Sul responderam a Escala de Bem-estar Psicológico. A idade média do grupo foi de 24,18 anos (DP = 6,44; amplitude de 18 a 57), sendo 190 (60,7%) mulheres e 123 (39,3%) homens. A maior parte dos alunos era proveniente dos cursos de Administração (n = 72, 23,0%), Psicologia (n = 48, 15,3%), Direito (n = 45, 14,4%) e Fisioterapia (n = 30, 9,6%). Os demais cursos de graduação incluíam Biologia, Ciências Contábeis, Odontologia, Serviço Social, Educação Física, Pedagogia e Sistemas de Informação (n = 118, 37,7%).

Instrumentos

Foram aplicados de forma coletiva, em sala de aula, os seguintes instrumentos:

- Escala de Bem-estar Psicológico (EBEP): adaptada a partir da versão de Ryff e Essex (1992). A escala é composta por 84 itens, divididos em seis subescalas que avaliam as dimensões do BEP (contendo 14 itens cada). Os itens são respondidos em uma escala do tipo Likert de seis pontos, cujos extremos são “discordo totalmente” e “concordo totalmente”.

- Escala de Satisfação de Vida (ESV, Satisfaction With Life Scale, Diener, Emmons, Larsen, & Griffin, 1985): o instrumento possui cinco itens, respondidos em uma escala do tipo Likert de sete pontos em que os extremos são “discordo plenamente” e “concordo plenamente”. Estudos nacionais reportam medidas de consistência interna entre 0,72 e 0,80 (Gonçalvez & Kapczinski, 2008; Gouveia e cols., 2003).

- Escala de Afeto Positivo e Negativo (EAPN, Positive and Negative Affect Schedule, PANAS, Watson, Clark, & Tellegen, 1988): adaptada para o português por Giacomoni e Hutz (1997), é composta de 40 itens, sendo 20 adjetivos referentes ao afeto positivo e 20 ao afeto negativo. Os itens são respondidos em uma escala Likert de cinco pontos, em que os extremos são “nem um pouco” e “extremamente”.

- Inventário Beck de Depressão (BDI; Cunha, 2001): o instrumento é composto de uma escala de autorrelato, com 21 itens, com escores de 0 a 3 pontos. Quanto maior o escore, maior a intensidade dos sintomas de depressão.

- Questionário de dados sociodemográficos: utilizado para caracterizar os participantes em relação à idade, sexo, local de moradia (cidade natal ou outra), curso de graduação, e nível educacional.

Procedimentos e Considerações éticas

O presente projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Psicologia (CEP-PSICO) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), sendo obtida sua aprovação em 08/2009, sob o registro nº 25000.089325/2006- 58. Após a aprovação, foi solicitado o consentimento às instituições de ensino superior para a participação neste estudo. Os participantes foram informados pessoalmente a respeito dos objetivos do estudo, do sigilo e confidencialidade das respostas fornecidas e sobre o caráter voluntário de sua participação. Todos que concordaram em participar do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em conformidade com a resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

Análise dos dados

Os valores perdidos (missing values = 0,8%) foram substituídos pela mediana do grupo no item. Os itens negativos da EBEP foram invertidos e medidas de tendência central e dispersão foram calculadas a partir do somatório dos itens em cada subescala. Optou-se por seguir o mesmo método de seleção de itens do estudo original de Ryff (1989), analisando-se as matrizes de correlações item-total, aplicando-se o método de correlação item-total corrigida, com a finalidade de reter itens com alta comunalidade.

Posteriormente, foram conduzidas análises fatoriais confirmatórias, utilizando o método de estimação máxima verossimilhança robusto para os erros-padrão (Satorra & Bentler, 1994) e a matriz de correlações policóricas dos itens (Holgado-Tello, Chacón-Moscoso, Barbero-García, & Vila-Abad, 2010), por meio do software Structural Equations (EQS, v. 6.1, Bentler, 2004). Optou-se pela análise fatorial confirmatória devido ao grande número de estudos em diferentes línguas e culturas que corroboram a estrutura fatorial teórica de seis fatores oblíquos. Foram comparados três modelos concorrentes para a EBEP: o modelo teórico de seis fatores oblíquos; um modelo de seis fatores ortogonais, e um modelo de apenas um fator. O modelo de um fator representa a hipótese de que as seis dimensões teóricas do BEP podem ser sumarizadas em um único construto, de forma indiscriminada, enquanto o modelo de seis fatores ortogonais presume que as essas dimensões não são relacionadas entre si. Os índices utilizados para avaliar o ajuste dos modelos, e seus valores de referência, foram (Schreiber, Stage, King, Nora, & Barlow, 2006): Comparative Fit Index (CFI ≥0,90), Non-normed Fit Index (NNFI =0,90), Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA = 0,06 ou 0,08 com intervalo de confiança de 90%). Para a comparação dos modelos concorrentes foi utilizado o índice Consistent Akaike Information Criterion (valores menores indicam o modelo com melhor ajuste, sendo ΔCAIC ≥ 20 indicador de diferença significativa entre os modelos; Haughton, Oud, & Jansen, 1997). A carga fatorial mínima para retenção dos itens foi de λ = 0,32, e a consistência interna das subescalas foi estimada por meio do índice de fidedignidade composta, que é baseado nas cargas fatoriais padronizadas dos itens (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham, 2006). Nenhuma reespecificação foi realizada nos modelos, sendo priorizado o ajuste teórico dos mesmos. Foi realizada uma Análise Multivariada de Variância (MANOVA) para investigar possíveis diferenças nos escores da EBEP entre os sexos.

Para fins analíticos, foi subtraído o somatório da subescala de afetos negativos do somatório da subescala de afetos positivos da EAPN, para criar a medida de balanço entre afetos (Bradbrurn, 1969). Dessa forma, valores positivos representam um predomínio de afetos positivos, enquanto valores negativos indicam o predomínio de afetos negativos. Foram conduzidas análises de correlação de postos rho de Spearman entre os somatórios das seis subescalas da EBEP e o somatório dos instrumentos ESV, EAPN (subescalas de afeto positivo e negativo), BDI e a medida de balanço entre afetos. A consistência interna desses instrumentos foi estimada por meio do coeficiente alfa de Cronbach.

 

Resultados

Seguindo orientações gerais para adaptação de instrumentos (Beaton, Bombardier, Guillemin, & Ferraz, 2000; Geisinger, 1994; Sandoval & Durán, 1998), foi delineada uma estratégia que compreendeu as seguintes etapas: 1) Tradução da Psychological Well-being Scale (Ryff & Essex, 1992) para o Português brasileiro; 2) Produção de uma tradução sintetizada, somando-se à tradução anterior outra realizada pelos autores deste estudo; 3) Avaliação da adequação e reformulação dos itens por juízes, avaliando-se a necessidade de modificações na redação e no conteúdo dos itens; 4) Avaliação da familiaridade com os itens (Pasquali, 1999), por meio das respostas de 27 voluntários que avaliaram o quanto os itens do instrumento lhes pareciam familiares, em uma escala tipo Likert de sete pontos, em que os extremos foram 1 (não familiar) a 7 (completamente familiar); e 5) Reformulação final dos itens que apresentaram baixa pontuação na etapa anterior e produção da versão experimental do instrumento. O instrumento, a partir dessa etapa, passou a ser denominado Escala de Bem-estar Psicológico (EBEP). A avaliação dos juízes indicou que 57 (67,8%) itens necessitavam ajustes na redação ou no conteúdo. Na avaliação da familiaridade com os itens, o escore médio atribuído pelos participantes foi de 5,84 (DP = 1,02), numa escala de “1” a “7”. Tomando o ponto de corte no escore “6” nessa escala, foram conduzidas alterações em outros 15 (17,8%) itens do instrumento.

A partir das matrizes de correlações item-total/ dimensão, mesmo método do estudo original de Ryff (1989), constatou-se que muitos itens (n = 48) apresentavam baixas correlações com sua dimensão original (resultado não apresentado). Utilizando-se o método de correlação item-total corrigida, foram selecionados itens que mantivessem no mínimo uma correlação moderada (r > 0,5) com o restante dos itens de sua dimensão. Conforme esse critério, foram retidos seis itens em cada subescala, totalizando 36 itens para toda a EBEP.

Em relação à dimensionalidade da EBEP, os índices de ajuste dos três modelos concorrentes de sua estrutura fatorial são apresentados na Tabela 3. O modelo teórico, de seis fatores oblíquos, apresentou melhor ajuste e uma diferença significativa em relação aos modelos de um fator (ΔCAIC31 = -444,97) e de seis fatores ortogonais (ΔCAIC32 = -755,64). Todas as cargas fatoriais dos itens (λ) e correlações entre os fatores (Φ) foram estatisticamente diferentes de zero (p ≤ 0,001), e são apresentados na Tabela 4. Na mesma tabela, constam os índices de fidedignidade composta e medidas descritivas das seis subescalas da EBEP. A MANOVA demonstrou efeito multivariado das seis subescalas entre os sexos [λ de Wilks = 0,940; F (6, 306) = 3,24; p = 0,004[. Diferenças de médias foram evidentes para as dimensões crescimento pessoal [F (1, 311) = 11,50; p = 0,001; η² = 0,036[ e propósito na vida [F (1, 311) = 4,99; p = 0,026; η² = 0,016[. Tendo em vista que apenas 3% e 1% da variância dos escores nessas dimensões, respectivamente, são explicadas pelo sexo dos participantes, não foram realizadas análises diferenciadas segundo esse critério.

 

 

 

A associação entre as seis subescalas da EBEP e indicadores prévios de bem-estar em âmbito psicológico são apresentadas na Tabela 5. O padrão observado dessas associações no presente estudo é semelhante aquele relatado em estudos anteriores, em relação à magnitude e direcionalidade das mesmas (Kafka & Kozma, 2002; Keyes e cols., 2002; Ryff, 1989; Ryff e cols., 1994; Ryff & Keyes, 1995). As medidas desses indicadores prévios apresentaram consistência interna, variando de 0,77 a 0,89, garantindo assim sua adequação como variáveis-critério nessa análise.

 

 

 

 

 

Discussão

O número elevado de itens que sofreram modificações (n = 69, 82,14%) ao longo das etapas de adaptação da Psychological Well-being Scale (PWBS) reforça a posição de que não somente a tradução linguística é suficiente para a adaptação de instrumentos, mas também que alterações no estilo de redação e do conteúdo dos itens são indispensáveis neste processo (Beaton e cols., 2000; Geisinger, 1994; Sandoval & Durán, 1998). Contudo, devido às diferenças culturais e à dificuldade em se atingir a equivalência semântica de alguns itens (Sandoval & Durán, 1998) e aos valores das matrizes de correlações item-total dos itens (Ryff, 1989), optou-se por descartar itens que comprometessem as propriedades psicométricas do instrumento (n = 48, 57,14%), de forma semelhante a estudos prévios de adaptação da PWBS (Cheng & Chan, 2005; van Dierendonck, 2005; van Dierendonck e cols., 2007).

Corroborando os estudos sobre a dimensionalidade da PWBS (Cheng & Chan, 2005; Clarke e cols., 2001; van Dierendonck e cols., 2007), o modelo teórico de seis fatores oblíquos apresentou o melhor ajuste quando comparado aos modelos de um fator e de seis fatores ortogonais. Apesar de os seis fatores da EBEP apresentarem correlações de moderadas a elevadas, elas não estão suficientemente sobrepostas a ponto de serem sumarizadas em um único traço latente. Sabe-se que o método de análise fatorial confirmatória tende a superestimar a correlação entre fatores oblíquos, devido à restrição de carga cruzada dos itens (Brown, 2006). Todos os 36 itens apresentaram cargas fatoriais adequadas em seus respectivos fatores, e estes possuem consistência interna satisfatória, apesar do número reduzido de itens por subescala. Esse resultado sugere que as subescalas podem ser utilizadas separadamente, de uma forma compreensiva, além do escore total da EBEP.

As relações entre as seis dimensões do BEP e indicadores prévios de bem-estar corroboram aquelas encontradas em estudos anteriores, em termos de magnitude e direcionalidade (Kafka & Kozma, 2002; Keyes e cols., 2002; Ryff, 1989; Ryff e cols., 1994; Ryff & Keyes, 1995). Dessa forma, altos níveis de BEP estão positivamente associados a julgamentos de satisfação com a vida e afetos positivos. No entanto, as dimensões do BEP estão negativamente associadas a afetos negativos e sintomas de depressão. Eventuais correlações elevadas entre esses indicadores poderiam sugerir uma sobreposição entre os construtos, contudo, esta hipótese foi descartada no presente estudo, assim como em estudos anteriores. Embora correlacionados, esses construtos são empiricamente distintos, e o BEP cobre dimensões do bem-estar no âmbito psicológico não acessadas por outros indicadores.

 

Considerações finais

A partir de uma abordagem que envolveu diferentes níveis de análise da adequação dos itens (tradução sintetizada, análise de juízes e avaliação da familiaridade) foi realizada a adaptação da Psychological Well-being Scale em uma amostra de estudantes universitários, sendo denominada Escala de Bem-estar Psicológico (EBEP). Foi satisfeita a expectativa teórica de que o modelo de melhor ajuste para o instrumento é o de seis fatores oblíquos, sendo estes: relações positivas com outros, autonomia, domínio sobre o ambiente, crescimento pessoal, propósito na vida e autoaceitação. Essas seis dimensões estão positivamente associadas às medidas de satisfação de vida, afetos positivos e balanço entre afetos, e negativamente associadas às medidas de afetos negativos e depressão. Os achados apresentados neste estudo, tomados em conjunto, corroboram a validade de construto e fidedignidade da EBEP, em sua versão de 36 itens. Estima-se que o instrumento seja útil no diagnóstico do bem-estar no âmbito psicológico e na avaliação de intervenções que visem o desenvolvimento de características relacionadas às dimensões do construto.

É sugerido que estudos futuros investiguem o papel do gênero nas dimensões do BEP, tendo em vista as diferenças de pequena magnitude observadas no presente estudo. Da mesma forma, são sugeridos estudos que investiguem a validade da EBEP em diferentes populações, utilizando estratégias variadas no estudo das evidências de validade do instrumento (por exemplo: validade de critério, validade discriminante, funcionamento diferencial de itens etc.). Por fim, é aconselhado que o uso do escore global na avaliação do BEP seja interpretado com cautela, respeitando a dimensionalidade do construto. A EBEP é apresentada na íntegra no Anexo A, juntamente às orientações sobre o levantamento e a permissão para o uso do instrumento.

 

Referências

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Recebido em outubro de 2012
Reformulado em janeiro de 2013
Aprovado em fevereiro de 2013

 

 

Sobre os autores

Wagner de Lara Machado: é do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Denise Ruschel Bandeira: é do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Josiane Pawlowski: é do Departamento de Psicometria, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).


1Endereço para correspondência: Departamento de Psicologia, sala 14A, Campus Universitário UFSC Reitor João David Ferreira Lima, Trindade, 88040-970, Florianópolis-SC. Tel.: (48) 9998-4529. E-mail: helloiza.sousa@gmail.com