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Avaliação Psicológica

versión impresa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.12 no.2 Itatiba ago. 2013

 

 

O Desenho da Figura Humana na avaliação da agressividade infantil

 

 

Juliane Callegaro Borsa1,I; Mariana Bauermann2,II

IPontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
IIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul

 

 


 

 

O Desenho da Figura Humana (DFH) é uma técnica antiga e que vem sendo utilizada na avaliação do desenvolvimento cognitivo, das características emocionais e dos aspectos da personalidade dos indivíduos (Segabinazi & Bandeira, 2012). Econômico, de fácil e rápida aplicação, o DFH tem sido um dos instrumentos mais utilizados pelos psicólogos brasileiros (Bandeira & Arteche, 2008). Sua aplicabilidade se dá, sobretudo, em crianças (pois se trata de uma tarefa não-verbal) e em contexto clínico (como uma técnica livre de expressão gráfica).

A técnica do DFH propõe a realização do desenho de uma (Koppitz, 1966, 1984) ou duas figuras humanas (Machover, 1967) e, conforme os objetivos da avaliação, pode ser analisada a partir de três perspectivas: cognitiva, projetiva e emocional. A perspectiva cognitiva entende o desenho como uma medida de avaliação do desenvolvimento cognitivo da criança, por meio da pontuação da presença e qualidade de itens apresentados (Goodenough, 1974). Já a avaliação projetiva propõe que o desenho é uma forma de manifestação dos aspectos inconscientes e expressivos da personalidade (Hammer, 1991, Machover, 1967).

Uma terceira perspectiva, denominada avaliação dos aspectos emocionais, considera o DFH como uma técnica capaz de revelar aspectos das relações interpessoais e de interação com o ambiente (Koppitz, 1966, 1984). Tal proposta não apresenta uma teoria a priori para explicar o significado de cada item. A ideia é oferecer uma avaliação empiricamente baseada, tendo como premissa os dados que emergem da aplicação do instrumento em um número significativo de crianças. Nessa vertente, merece destaque o estudo brasileiro de Arteche (2006) e os estudos de Segabinazi e Bandeira (2012), este último apresentando evidências de validade das escalas globais de avaliação do DFH.

No contexto da avaliação psicológica clínica, o DFH vem se mostrando um instrumento sensível para avaliar problemas emocionais (Arteche, 2006) e, neste sentido, seu uso parece adequado em processos de triagem ou de avaliação inicial (Bandeira & Arteche, 2008). Dentre os aspectos emocionais avaliados pelo DFH está a agressividade infantil (Van Hutton, 1994). A agressividade é entendida como a conduta que visa a causar algum dano a alguém (Dodge & Coie, 1987). Trata-se de um problema frequente na infância e comumente associado a outras dificuldades, como intolerância à frustração, ansiedade e impulsividade (Borsa, 2012).

Van Hutton (1994) desenvolveu um sistema de escore objetivo, com a finalidade de avaliar principalmente crianças com suspeita de abuso sexual. Dentre as escalas criadas pela autora, uma delas corresponde aos construtos ‘Agressão’ e ‘Hostilidade’. Seriam indicadores de agressividade alguns critérios como: linha pesada, desenhos grandes, grande assimetria entre membros, presença de dentes, dedos em forma de garra, ênfase em caracteres faciais, dedos sem mãos e ombros quadrados. Olhos estrábicos e dentes também emergiram como indicadores de agressividade na pesquisa de Koppitz (1966), realizada com diferentes grupos de crianças. Além desses indicadores, nos desenhos de crianças diagnosticadas como ‘agressivas’, foram encontrados com maior frequência itens como braços longos, mãos grandes e genitais.

De acordo com Hammer (1991), estudos de Precker e de Zimmerman e Garfinkle verificaram que o tamanho exagerado dos desenhos pode ser considerado um indicador de agressividade. Outra pesquisa destacada pelo mesmo autor é a de Alschuler e Hattwick, que identificou uma tendência a menor controle de impulsos nas crianças cujos desenhos não eram centralizados na página. Nesse sentido, Machover (1949) aponta que o desenho grande e à esquerda é característico de indivíduos agressivos.

No Brasil, estudos vêm apresentando evidências de que o DFH é um instrumento sensível para avaliar agressividade em crianças. Na pesquisa de Bauermann (2012), que buscou a detecção de indicadores de agressividade no desenho, os seguintes itens emergiram com maior frequência no grupo de crianças agressivas: figura humana grotesca, presença de figuras de fundo, localização esquerda da página, braços juntos ao tronco, pernas unidas e presença de bolsos. Ressalta-se que, nesse estudo, o critério utilizado para a distinção entre grupos de crianças agressivas e não-agressivas foi o Questionário de Comportamentos Agressivos e Reativos entre Pares (Q-CARP), um inventário de autorrelato empiricamente baseado, destinado a avaliar os comportamentos agressivos de crianças de 7 a 11 anos bem como diferentes reações frente à agressão dos pares (Borsa, 2012). Esses, contudo, são resultados iniciais, e novos estudos estão sendo realizados pelo Grupo de Estudo, Aplicação e Pesquisa em Avaliação Psicológica (GEAPAP), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, coordenado pela Professora Denise Ruschel Bandeira.

É importante mencionar a relevância de avaliar precocemente a agressividade na infância, uma vez que a mesma pode contribuir para a prevenção de problemas futuros, tais como desajustamento social, abuso de substâncias, evasão escolar, comportamentos delinquentes e antissociais, entre outros (Borsa, 2012). Contudo, ainda são escassos os instrumentos disponíveis para esse fim e, dentre os existentes, predominam as escalas e os checklists (Borsa & Bandeira, 2011). Esses, por sua vez, apresentam vieses, tais como a desejabilidade social (instrumentos de autorrelato) e a avaliação comparativa ou com base em valores morais (instrumentos respondidos por pais e professores) (Borsa, 2012).

Entende-se que a avaliação deveria contar com diferentes técnicas e instrumentos, além dos testes padronizados. A inclusão de técnicas menos estruturadas, como as gráficas, permitiria uma avaliação mais completa da criança e menos enviesada por expectativas pessoais, estereótipos sociais e valores morais (Andreou & Bonoti, 2010). Nesse sentido, o DFH pode contribuir de forma significativa, permitindo à criança a expressão livre e não controlada das emoções que permeiam seus comportamentos. Especificamente, o DFH pode ser útil par avaliar a agressividade em pré-escolares por meio de um recurso lúdico e não-verbal (Bosacki, Marini, & Dane, 2006).

 

Referências

Andreou, E. & Bonoti, F. (2010). Children’s bullying experiences expressed through drawings and self-reports. School Psychology International, 31(2), 164-177.

Arteche, A. X. (2006). Indicadores emocionais do desenho da figura humana: construção e validação de uma escala infantil. Tese de Doutorado não publicada. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS.         [ Links ]

Bandeira, D. R. & Arteche, A. X. (2008). Desenho da Figura Humana. Em A. E. de Villemor-Amara, & B. S. G Werlang. (Org.), Atualizações em Métodos Projetivos para Avaliação Psicológica (pp. 205-119). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Bauermann, M. (2012). Indicadores de agressividade através do Desenho da Figura Humana. Monografia de Especialização não publicada. Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.         [ Links ]

Borsa, J. C. (2012). Adaptação e validação transcultural do questionário de comportamentos agressivos e reativos entre pares (Q-CARP). Tese de Doutorado não publicada. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.         [ Links ]

Borsa, J. C. & Bandeira, D. R. (2011). Avaliação de comportamentos agressivos na infância através de instrumentos psicológicos: análise da produção científica brasileira. Avaliação Psicológica, 10(2), 193-203.         [ Links ]

Bosacki, S. L., Marini, Z. A., & Dane, A. V. (2006). Voices from the classroom: pictorial and narrative representations of children’s bullying experiences. Journal of Moral Education, 35, 231-245.

Dodge, K. A. & Coie, J. D. (1987). Social-information-processing factors in reactive and proactive aggression in children's peer groups. Journal of Personality and Social Psychology, 53, 1146-1158.         [ Links ]

Goodenough, F. (1974). Test de inteligência infantil por medio del dibujo de la figura humana (7ª ed.). Buenos Aires, Argentina: Paidós.         [ Links ]

Hammer, E. F. (Org.). (1991). Aplicações clínicas dos desenhos projetivos. Rio de Janeiro: Interamericana.         [ Links ]

Koppitz, E. M. (1966). Emotional indicators on Human Figure drawings of children: a validation study. Journal of Clinical Psychology, 22, 313-315.         [ Links ]

Koppitz, E. M. (1984). El dibujo de la figura humana en los niños. Buenos Aires, Argentina: Guadalupe.         [ Links ]

Machover, K. (1949). Personality projection in the drawing of The Human Figure: A method of personality investigation. Springfield, IL: Charles C Thomas Publisher.         [ Links ]

Machover, K. (1967). O traçado da Figura Humana: um método para o estudo da personalidade. Em H. H. Anderson & G. L. Anderson (Org.), Técnicas projetivas do diagnóstico psicológico (pp. 345-370). São Paulo: Mestre Jou.         [ Links ]

Segabinazi, J. & Bandeira, D. R. (2012). Desenho da Figura Humana para avaliação emocional de crianças: evidências de validade de escalas globais. Em S. M. Wechsler & T. C. Nakano. O desenho infantil: formas de expressão cognitiva, criativa e emocional. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Van Hutton, V. (1994). House – Tree – Person and Draw – A – Person as Measures of Abuse in Children – A Quantitative Scoring System. Odessa, FL: Psychological Assessment Resources.

 

 

Recebido em outubro de 2012
Reformulado em fevereiro de 2013
Aprovado em março de 2013

 

 

Sobre as autoras

Juliane Callegaro Borsa: é Psicóloga, Mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É Professora Assistente do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Mariana Bauermann: é Psicóloga pela Universidade de Passo Fundo. É mestranda em Psicologia do Desenvolvimento na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e aluna do Curso de Especialização em Avaliação Psicológica na mesma instituição.


1E-mail: juliborsa@gmail.com

2E-mail: m.bauermann@yahoo.com.br