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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.12 no.3 Itatiba dez. 2013

 

 

Evidências de validade para o IDTP baseadas em variáveis externas1

 

Validity evidences for PDDI based on external variables

 

Evidencias de validez del IDTP basadas en variables externas

 

 

Lucas de Francisco Carvalho2; Ricardo Primi

Universidade São Francisco

 

 


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo buscar evidências de validade baseadas na relação com variáveis externas ao Inventário Dimensional dos Transtornos da Personalidade (IDTP), nomeadamente validade convergente e discriminante correlacionando-o, com o Millon Clinical Multiaxial Inventory III (MCMI-III) e de critério, buscando-se predizer a presença de transtornos psiquiátricos. Foram participantes 350 pessoas, cujas idades variaram entre 18 e 67 anos, sendo 71,7% do sexo feminino. Os participantes foram divididos em dois grupos: Grupo Não Psiquiátrico (GNP; n= 276) e Grupo Psiquiátrico (GPS; n= 74). Todos os participantes responderam ao IDTP e ao MCMI-III. Os dados encontrados apontam para convergência entre os resultados dos instrumentos, bem como para capacidade do IDTP em discriminar pessoas com funcionamento da personalidade mais patológico e mais saudável. Também foram encontrados bons índices de sensibilidade para o instrumento, mas não muito favoráveis para especificidade.

Palavras-chave: transtornos psiquiátricos; DSM-IV-TR; psicopatologia; testes psicológicos.


ABSTRACT

This study aimed to find evidence of validity based on the relationship with external variables to Personality Disorders Dimensional Inventory (PDDI), including convergent and discriminant validity by correlating the test with the Millon Clinical Multiaxial Inventory III (MCMI-III) and criterion validity seeking to predict the presence of psychiatric disorders. The participants were 350 people, whose ages ranged between 18 and 67 years, and 71.7% were female. Participants were divided into two groups: Group Not Psychiatric (GNP, n= 276) and Psychiatric Group (PSG, n= 74). All participants answered both, PDDI and MCMI-III. The data found in the analysis point to convergence between the instruments, as well as the PDDI ability to discriminate people with pathological personality functioning and healthier people. We also found good sensitivity for the instrument, but not so much favorable for the specificity of PDDI.

Keywords: psychiatric disorders; DSM-IV-TR; psychopathology; psychological tests.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo buscar evidencias de validez con base en la relación con variables externas al Inventario Dimensional dos Trastornos da Personalidad (IDTP), más específicamente validez convergente y discriminante correlacionándolo con el Millon Clinical Multiaxial Inventory III (MCMI-III), y de criterio buscando predecir la presencia de trastornos psiquiátricos. Participaron 350 personas, con edades variando entre 18 y 67 años, siendo 71,7% del sexo femenino. Los participantes fueron divididos en dos grupos: Grupo No Psiquiátrico (GNP; n= 276) y Grupo Psiquiátrico (GPS; n= 74). Todos los participantes respondieron el IDTP y el MCMI-III. Los datos encontrados en los análisis apuntan una convergencia entre los instrumentos IDTP y MCMI-III, así como también una capacidad del IDTP para discriminar personas con funcionamiento patológico de la personalidad y personas más saludables. También fueron encontrados buenos índices de sensibilidad para el instrumento, pese a no haber sido muy favorables para la especificidad del IDTP.

Palabras-clave: trastornos psiquiátricos; DSM-IV-TR; psicopatología; pruebas psicológicas.


 

 

Na teoria desenvolvida por Theodore Millon, os transtornos da personalidade são compreendidos como construtos teóricos empregados para representar diversos estilos ou padrões em que a personalidade funciona de maneira mal-adaptada em relação ao seu ambiente (Millon, Grossman, & Tringone, 2010; Millon, Millon, Meagher, Grossman, & Ramanath, 2004). Funcionamentos patológicos da personalidade se configuram quando estratégias empregadas para atingir objetivos, se relacionar com outros, ou lidar com o estresse são poucas e rígidas (inflexibilidade adaptativa); quando percepções habituais, necessidades, e comportamentos perpetuam e intensificam dificuldades pré- -existentes (círculos viciosos); e quando a pessoa tende a uma baixa resiliência frente a condições de estresse (estabilidade tênue).

A proposta de Millon, na busca por um sólido pano de fundo que englobasse os diferentes domínios (processos cognitivos, comportamentos, conteúdos inconscientes, entre outros) que representam os estilos de personalidade, utiliza-se de três esferas, fases evolutivas, que são baseadas nos princípios evolutivos: Orientações para Existência, Modos de Adaptação e Estratégias para Replicação (Strack & Millon, 2007).

A fase Orientações para Existência se refere à tendência do organismo adaptado a expressar mecanismos que favoreçam o aumento da qualidade de vida e a preservação da qualidade de vida. O aumento da qualidade de vida está relacionado com indivíduos orientados para o aumento da sobrevivência e a melhora na qualidade de vida, enquanto a preservação da qualidade de vida diz respeito a indivíduos que evitam ações ou situações que diminuam a qualidade de vida ou ameace sua existência. Nesse sentido, a bipolaridade (prazer-dor) que representa essa fase é, de um lado, a busca pelo prazer (aumento da qualidade de vida), e de outro, a evitação da dor (preservação da qualidade de vida).

Uma vez que o indivíduo exista, ele precisa manter sua existência por meio de trocas de energia e informações com o ambiente. A fase evolutiva seguinte, Modos de Adaptação, concerne aos modos de se adaptar de um organismo que tornam as trocas entre organismo e ambiente possíveis. Alguns indivíduos tendem a modificar o ambiente ao redor e outros são mais propensos a acomodar- se ao ambiente em que vivem. Assim, a bipolaridade (ativo-passivo) representante dessa fase é, em um polo, a tendência a modificar o meio em que vive (ativo) e, em outro polo, a tendência à adaptação ao meio em que está inserido (passivo).

Ainda que os indivíduos possam estar bem adaptados ao ambiente em que vivem, a existência desses organismos é limitada pelo tempo. Por isso, os organismos desenvolvem estratégias para tentar driblar essa limitação. A última fase evolutiva, Estratégias de Replicação, diz respeito a estratégias desenvolvidas pelos indivíduos para ultrapassar a limitação da própria existência. Essas estratégias podem ser de autopropagação, isto é, ações que maximizem a autorreprodução, ou, de cuidados com o outro, representadas por ações de proteção e de sustento à prole. Em decorrência, a bipolaridade (eu-outro) que diz respeito a essa fase aponta, em um extremo, à perpetuação de si próprio (eu) e, em outro extremo, ao foco no cuidado e proteção dos filhos (outro).

Em decorrência das fases evolutivas propostas por Millon, são derivados 15 estilos da personalidade (Millon e cols., 2004; Millon & Grossman, 2007a; Millon & Grossman, 2007b). A partir desse entendimento, Millon, Millon e Davis (1994) desenvolveram um instrumento para avaliação dos transtornos da personalidade, que é amplamente utilizado no contexto de pesquisa e clínica no âmbito internacional. O Millon Clinical Multiaxial Inventory (MCMI) se encontra, atualmente, em sua terceira versão (MCMI-III) e é composto por 175 itens, distribuídos em 28 escalas distintas. Essas escalas podem ser divididas em três grupos distintos: 24 escalas clínicas, 3 escalas de adaptação, e 1 escala de validade. Das 24 escalas clínicas, 14 têm como objetivo avaliar os transtornos da personalidade derivados da teoria de Millon. Cada escala foi nomeada de acordo com o transtorno representado, sendo elas, Depressivo, Esquizoide, Evitativo, Dependente, Histriônico, Narcisista, Antissocial, Sádico, Compulsivo, Negativista, Masoquista, Esquizotípico, Paranoide e Borderline.

O manual do MCMI-III (Millon e cols., 1994) apresenta estudos que sugerem uma alta concordância entre as escalas do instrumento e sua versão anterior, o MCMI-II, indicando que a terceira versão do instrumento contempla, em grande parte, o que já estava proposto na segunda versão. No que concerne às escalas de transtornos da personalidade, as correlações entre as escalas correspondentes de ambos os instrumentos variaram entre 0,59 (escala Dependente) e 0,87 (escala Negativista), apresentando magnitudes moderadas e altas de correlação entre as escalas. Vale a pena ressaltar que alguns itens de ambas as versões do MCMI aparecem em mais de uma escala do instrumento (item overlapping) o que tem como consequência magnitudes artificialmente potencializadas nas correlações entre as escalas (Strack & Millon, 2007).

Marlowe, Festinger, Kirby, Rubenstein e Platt (1998) também verificaram possíveis relações entre as escalas do MCMI-III e MCMI-II, em uma amostra de pacientes viciados em cocaína. As correlações variaram entre 0,27 (escala Negativista) e 0,73 (escala Histriônico), de modo que, das treze escalas avaliadas (o MCMI-II não possui a escala Depressivo, por isto, ela não foi considerada na análise), onze apresentaram magnitude de correlação superior a 0,50 (p<0,001).

Ao lado disso, Rossi, Brande, Tobac, Sloore e Hauben (2003) verificaram as magnitudes das correlações entre as escalas de transtornos da personalidade do MCMI-III e as escalas clínicas e de transtornos da personalidade da segunda versão do Minnesota Multiphasic Personality Inventory (MMPI-2), em uma amostra de prisioneiros e pacientes psiquiátricos. A maior parte das correlações evidenciadas foi significativa, de modo que as correlações mais altas foram com as escalas Esquizoide, Evitativo, Depressivo, Dependente, Negativista, Masoquista, Esquizotípico e Borderline do MCMI-III.

O estudo realizado por Hicklin e Widiger (2000) também investigou, entre outros dados, os coeficientes de correlação entre as escalas de transtornos da personalidade do MCMI-III e do MMPI-2. Praticamente todas as correlações evidenciadas entre as escalas dos dois instrumentos foram significativas, com exceção à escala Compulsivo. A magnitude das correlações variou entre -0,26 (escala Compulsivo) e 0,84 (escalas Esquizotípico e Evitativo). Vale a pena ressaltar que diferentes estudos encontraram que a escala Compulsivo tende a apresentar menor relação com as outras escalas de transtornos da personalidade do MCMI-III em relação às correlações verificadas entre as outras escalas do instrumento (Dyce, O´Connor, Parkins, & Janzen, 1997). Essa distinção entre a escala Compulsivo pode estar refletindo características mais funcionais e desejadas socialmente do funcionamento compulsivo da personalidade, o que pode ser verificado também no funcionamento narcisista (Choca, 2004; Strack & Millon, 2007).

Ao lado disso, ainda na busca por evidências de validade de critério, estudos buscaram verificar a capacidade discriminativa do MCMI-III, isto é, a capacidade das escalas do instrumento em diferenciar diagnósticos de transtornos e grupos patológicos de não-patológicos. Os índices de sensibilidade e especificidade são investigados a fim de verificar tal capacidade, sendo que a sensibilidade indica quantos respondentes, divididos em grupos distintos (por exemplo, amostra psiquiátrica e não psiquiátrica), foram corretamente diagnosticados pelo instrumento; e o índice de especificidade aponta para quantas pessoas da amostra não psiquiátrica foram corretamente identificadas (Braga, 2000). Um bom instrumento diagnóstico possui alta sensibilidade e alta especificidade; entretanto, muitas vezes o aumento da sensibilidade compromete a especificidade, e vice-versa.

Millon e cols. (1994) apresentaram os índices de sensibilidade e especificidade das escalas para avaliar transtornos da personalidade do MCMI-III, que foram obtidos por meio da correspondência entre o instrumento e um questionário criado pelo próprio autor, com itens sobre o funcionamento dos pacientes, que deveria ser respondido por clínicos. Os índices de sensibilidade variaram de 0 (escala Sádico) a 53,1 (escala Negativista). E, os índices de especificidade variaram entre 63,5 (escala Dependente) e 98,9 (escala Sádico). No geral, as escalas do MCMI-III tendem a apresentar maiores índices de especificidade em comparação aos índices de sensibilidade.

De acordo com os estudos apresentados anteriormente, pode-se verificar que as escalas do MCMI-III para avaliação dos transtornos da personalidade apresentam uma tendência para se correlacionarem de maneira significativa com escalas de outros instrumentos (por exemplo, as versões anteriores do MCMI e o MMPI-2, mas também outros instrumentos como o NEO-PI-R; vide Millon e cols., 1994; Millon & Davis, 1997) avaliando os mesmos transtornos. Também, observa-se que houve grande variabilidade nos índices de sensibilidade e especificidade. Em geral, esses estudos procuram investigar a legitimidade das interpretações realizadas por meio dos escores nas escalas do MCMI-III, por meio de critérios externos, como o MMPI-2 ou o MCMI-II.

Apesar da consistência da teoria de Millon na área dos transtornos da personalidade, dos dados satisfatórios previamente relatados em relação às escalas do MCMIIII, e a relevância da avaliação dos transtornos da personalidade (Millon & Grossman, 2007a, 2007b), são escassos os instrumentos em âmbito nacional para avaliação de características patológicas da personalidade e transtornos da personalidade (Carvalho, Bartholomeu, & Silva, 2010). Dada a escassez de instrumentos para avaliação dos distintos transtornos da personalidade, validados para a realidade brasileira, Carvalho (2008) desenvolveu um instrumento, o Inventário Dimensional dos Transtornos da Personalidade (IDTP), para avaliação dos quatorze transtornos da personalidade propostos por Millon.

As propriedades psicométricas do IDTP já foram verificadas em estudos prévios Carvalho (2008). Carvalho e Primi (2009) verificaram a estrutura fatorial do instrumento por meio da análise fatorial exploratória, sendo que foram encontradas empiricamente doze das quatorze escalas esperadas teoricamente, indicando um ajustamento parcial à estrutura esperada inicialmente. O índice de fidedignidade das escalas variou entre 0,65 e 0,89, sendo que somente a escala Narcisista apresentou coeficiente inferior a 0,71. Também a partir do modelo de Rasch com base na Teoria de Resposta ao Item (TRI) foram verificadas evidências de validade com base na estrutura interna para o IDTP (Carvalho, Primi, & Meyer, 2012). Em outro estudo (Carvalho & Primi, 2010), na busca por evidências com base na relação com variáveis externas, cujo objetivo era avaliar características da personalidade em pacientes com diagnóstico de dor crônica, duas escalas do IDTP, Histriônico (positivamente correlacionada) e Sádico (negativamente correlacionada) demonstraram ser preditoras adequados para dor crônica. Além disso, observou-se por meio da curva ROC que a sensibilidade dessas escalas foi igual a 83,3% e a especificidade igual a 31% para avaliação da dor crônica.

Considerando as informações acerca das propriedades psicométricas do IDTP e os dados obtidos anteriormente por meio do MCMI-III, bem como a importância da investigação de evidências de validade para instrumentos clínicos, o presente estudo tem como objetivo buscar evidências de validade baseadas na relação com variáveis externas ao IDTP, nomeadamente validade convergente e discriminante. Para tanto, foram observadas as correlações entre o IDTP e o MCMI-III, bem como se considerou a variável diagnóstico psiquiátrico como um indicativo de funcionamento patológico (critério externo).

 

Método

Participantes

Participaram do estudo 350 pessoas, selecionadas por conveniência, cujas idades variaram entre 18 e 67 anos (M=27,02; DP=10,13), sendo 71,7% (n=251) do sexo feminino. Dos 350 participantes, 290 eram universitários dos cursos de Psicologia (n=158), Arquitetura (n=68), e Administração (n=64) de uma cidade do interior de São Paulo. Os outros 60 participantes eram pacientes psiquiátricos de uma clínica de uma cidade do interior de São Paulo.

Os participantes foram divididos em dois grupos: Grupo Não Psiquiátrico (GNP) e Grupo Psiquiátrico (GPS), de acordo com dois critérios que tipicamente caracterizam pacientes psiquiátricos, “fazer tratamento psiquiátrico” e “tomar remédio psiquiátrico”. Os participantes que responderam afirmativamente para ambas as variáveis, isto é, responderam estar em atendimento psiquiátrico atual e usar algum tipo de medicação psiquiátrica, foram colocados no GPS (n = 74). Nesse sentido, o GPS ficou composto por 60 indivíduos provenientes de uma clínica psiquiátrica e mais 14 sujeitos que responderam afirmativamente às duas variáveis critério. Especificamente em relação aos 14 sujeitos provenientes de clínica psiquiátrica, todos apresentaram diagnósticos psiquiátricos fornecidos por avaliação clínica de um psiquiatra. O diagnóstico psiquiátrico desses pacientes foi variando, mas serviram para o propósito desta pesquisa, considerando a variabilidade de funcionamentos e considerando que, de modo geral e independente do diagnóstico psiquiátrico, pacientes psiquiátricos tendem a obter pontuações mais altas em instrumentos avaliando características patológicas da personalidade quando comparados à população geral (Millon, 2011). Ainda, tipicamente, o diagnóstico psiquiátrico conferido por profissionais e o uso de medicamentos psicotrópicos têm sido utilizados como indicativos importantes de tendências a apresentar características patológicas da personalidade. Diferentemente, os participantes que responderam não estar em atendimento psiquiátrico ou não fazer uso de remédio psiquiátrico quando participaram da pesquisa, foram colocados no GNP (n = 276).

Instrumentos

Foram aplicados dois instrumentos distintos: o Inventário Dimensional dos Transtornos da Personalidade (IDTP), e uma versão traduzida e adaptada culturalmente para o Brasil do Millon Clinical Multiaxial Inventory III (Boucinhas, Cysneiros, Rocha, & Alchieri, 2006; Rocha, Sousa, Alchieri, Sales, & Alencar, 2011). Ambos serão apresentados de maneira sintetizada na sequência.

O IDTP é um instrumento para avaliação dos transtornos da personalidade de acordo com a teoria de Millon. Trata-se de um inventário de autorrelato composto por 100 itens, distribuídos em 15 escalas distintas: Escala Esquizoide, Escala Evitativo, Escala Depressivo, Escala Dependente, Escala Histriônico, Escala Narcisista, Escala Antissocial, Escala Sádico, Escala Compulsivo, Escala Negativista, Escala Masoquista, Escala Paranoide, Escala Esquizotípico, Escala Borderline, e Escala de Validade e Desejabilidade Social/ Escala XV. Ressalta-se que a última escala, Escala XV, visa avaliar a motivação dos respondentes ao teste e o nível de desejabilidade social. O tempo estimado para sua aplicação é de aproximadamente 20 minutos. No tocante às propriedades psicométricas do instrumento, estas foram apresentadas em síntese na introdução deste estudo.

O MCMI-III foi desenvolvido por Millon e cols. (1994) e adaptado para o Brasil (Boucinhas e cols., 2006; Rocha e cols., 2011), tratando-se de um inventário de autorrelato para avaliação dos transtornos da personalidade. É composto por 175 itens distribuídos em 28 escalas, sendo 24 escalas clínicas e 4 escalas para verificar a validade do protocolo de resposta e a ocorrência de desejabilidade social. As 24 escalas se referem aos quatorze protótipos de transtornos da personalidade propostos por Millon e aos transtornos do Eixo I. As escalas de adaptação são utilizadas como indicativo de tendências dos sujeitos para expressar mais ou menos patologia em relação ao seu verdadeiro funcionamento. E, por fim, a escala de validade visa verificar se o indivíduo demonstrou mais dificuldade do que o esperado e/ou pouca motivação e atenção para responder ao instrumento. Neste estudo foram consideradas 16 escalas: para avaliação dos transtornos da personalidade (apresentadas anteriormente), de validade e a de desejabilidade, considerando os objetivos deste estudo. Entre as escalas, 14 buscam mensurar características típicas dos transtornos da personalidade, a de validade visa verificar se o respondente não está respondendo ao instrumento aleatoriamente, e a de desejebabilidade tenta verificar se o respondente está respondendo mais de acordo com o que é esperado pela sociedade do que o que seria verdadeiro para ele. Estima-se 30 minutos para a aplicação do MCMIIII. Vale ressaltar que a versão brasileira do MCMI-III demonstrou evidências de validade na discriminação entre diferentes grupos, pacientes e não pacientes (Rocha e cols., 2011).

Procedimentos

Inicialmente, o projeto que deu base para esta pesquisa foi submetido a um Comitê de Ética em Pesquisa e, somente após sua aprovação deu-se prosseguimento à coleta de dados. Os instrumentos foram aplicados em ambos os grupos de participantes, GNP e GPS. Para todos foi entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) que apresentava o objetivo principal deste estudo, bem como informava os participantes acerca da divulgação dos resultados de acordo com as normas éticas. Somente após concordar e assinar o TCLE, os participantes foram habilitados a participar do estudo.

No momento da aplicação dos instrumentos, cuidou- se para que o pesquisador sempre estivesse presente, possibilitando o esclarecimento de dúvidas dos participantes. Os participantes foram convidados a participar da pesquisa em salas de aula de uma universidade particular e em uma clínica psiquiátrica, ambas de uma cidade do interior de São Paulo. As aplicações se deram nas salas de aula de diferentes cursos universitários e na sala de espera da clínica psiquiátrica, e em ambos os casos a aplicação foi coletiva. O tempo para aplicação foi de aproximadamente 50 minutos.

Análise de Dados

correlações entre as escalas dos instrumentos aplicados com o intuito de verificar a concordância entre as escalas dos mesmos. Na sequência, para investigar a capacidade de discriminação do IDTP e do MCMI-III, entre os dois grupos de participantes, realizou-se a análise de perfis por medidas repetidas para diferentes variáveis (ANOVA). Por último, foi utilizado o procedimento Curva ROC para verificar a capacidade preditiva do IDTP e do MCMI-III em relação aos pacientes com funcionamento patológico da personalidade. Ainda, foi realizada a análise de regressão logística para obtenção do melhor conjunto de itens para previsão da variável utilizada na Curva ROC.

 

Resultados

Em um primeiro momento, utilizou-se a correlação de Pearson para verificar as relações entre as escalas do IDTP e as escalas de transtornos da personalidade e desejabilidade e validade do MCMI-III. Os dados são apresentados na Tabela 1.

 

 

Pode-se observar que as correlações esperadas entre as escalas, isto é, as escalas do IDTP se correlacionarem positiva e estatisticamente com as escalas correspondentes do MCMI-III, foram obtidas. Contudo, nota-se também que praticamente todas as correlações entre as escalas dos instrumentos foram positivas e significativas, ainda que, em grande parte dos casos, as maiores correlações foram entre as escalas esperadas. As escalas do IDTP que apresentaram magnitudes de correlação com as escalas esperadas do MCMI-III maiores do que com outras escalas do instrumento foram: Depressivo, Evitativo, Dependente (apresentou a mesma magnitude com a escala Masoquista), Borderline (apresentou a mesma magnitude com as escalas Esquizotípico e Evitativo), Narcisista, Sádico, Compulsivo, Masoquista, Esquizotípico, e Escala XV (apresentou a mesma magnitude com a escala Narcisista). Diferentemente, algumas escalas do IDTP apresentaram magnitudes de correlação mais altas com escalas não correspondentes do MCMIIII, foram elas: Esquizoide, Paranoide, Antissocial, Negativista, e Histriônico.

Na sequência, para investigar as possíveis diferenças e interações entre os grupos de participantes GNP e GPS, foi utilizada a Análise de Perfis por Medidas Repetidas empregando a ANOVA. Essa análise verifica se o perfil de médias de um conjunto de medidas (parte intra-sujeito do delineamento) é diferente para grupos distintos (parte entre-sujeitos do delineamento) (Tabachinick & Fidell, 2007). Para a realização dessa análise, é necessário que as escalas estejam em uma mesma métrica. Por isso, foram utilizadas as concordâncias médias (em uma escala de 1 a 4) como escores para as escalas de cada instrumento. Cabe ressaltar que, de acordo com Howell (2010), os valores da ANOVA foram corrigidos pela fórmula de Greenhouse-Geiner para compensar a violação do postulado de simetria composta.

Os resultados indicaram que tanto os efeitos principais (IDTP; F=132,46; gl=8,28; p<0,01; MCMI-III F=148,17; gl=5,85; p<0,01) quanto as interações (IDTP; F=10,78; gl=8,28; p<0,01; MCMI-III F=6,90; gl=5,85; p<0,01) foram significativas. Assim, observou-se que a média global (em todas as escalas) difere significativamente nos dois grupos GNP e GPS, sendo que o GPS tende a apresentar escores maiores (efeito entre-grupo, GNP&GPS). No entanto esse efeito interage significativamente com as escalas (efeito intra- -grupo IDTP X GNP&GPS, MCMI X GNP&GPS), indicando que em algumas escalas essa diferença é mais pronunciada do que em outras.

Complementar aos dados apresentados, em relação ao IDTP, as maiores diferenças entre os grupos encontram- se nas escalas Depressivo, Esquizoide, Paranoide, Masoquista, Dependente, Negativista e Evitativo. Ao lado disso, as médias mais elevadas, para ambos os grupos, ocorreram nas escalas Compulsivo, Borderline e Narcisista. Diferentemente, as médias mais baixas, para o GNP, foram nas escalas Negativista, Sádico e Depressivo; e, para o GPS, nas escalas Sádico, Negativista e Dependente. De maneira similar, no que se refere ao MCMI-III, as maiores diferenças entre os grupos se encontram nas escalas Depressivo, Esquizoide, Borderline, Paranoide, Masoquista, Antissocial, Negativista, Esquizotípico e Evitativo. As médias mais elevadas, para ambos os grupos, ocorreram nas escalas Compulsivo, Histriônico e Desejabilidade. E, as médias mais baixas ocorreram nas escalas Esquizoide, Masoquista, Esquizotípico e Validade.

Na continuidade, para investigar a capacidade preditiva do IDTP e do MCMI-III para distinguir os respondentes dos grupos GNP e GPS, isto é, pessoas com um funcionamento mais patológico da personalidade e pessoas com funcionamento mais saudável, realizou-se o procedimento Curva ROC. Para tanto, foi realizada, inicialmente, a análise de regressão logística, já que a variável dependente utilizada era dicotômica, visando obter o melhor conjunto de itens para previsão da variável “grupo de participantes” a qual foi codificada como 1 se o participante fosse do grupo de pacientes (GPS) e zero se não fosse (GNP).

A regressão logística estima a probabilidade de um sujeito pertencer ao grupo clínico. Para cada coeficiente, a regressão logística apresenta a estatística de Wald indicando se o coeficiente é estatisticamente diferente de zero (Tabachinick & Fidell, 2007). Nas análises realizadas, foram considerados como variáveis independentes, os escores totais das escalas do IDTP e os escores totais das escalas do MCMI-III. Para essas análises, foi utilizado o método Forward para inserção ou não das variáveis na equação de regressão, e foi considerado o critério p<0,15 para significância.

Das 15 escalas do IDTP que poderiam entrar na equação, três foram selecionadas por ajudar na melhoria da previsão, sendo elas os escores totais das escalas Depressivo (B=1,557; gl=1; p<0,01; R2=0,23), Negativista (B=1,131; gl=1; p<0,01; R2=0,02) e Esquizotípico (B=-0,893; gl=1; p<0,01; R2=0,02). Foram classificados corretamente 57,6% (38 casos) do grupo psiquiátrico e 83,7% (226 casos) foram classificados corretamente como pertencentes ao grupo não psiquiátrico. Diferentemente, das 16 escalas do MCMI-III que poderiam entrar na equação, quatro entraram, sendo elas os escores totais das escalas Depressivo (B=2,379; gl=1; p<0,01; R2=0,18), Evitativo (B=-1,881; gl=1; p<0,01; R2=0,01), Dependente (B=-1,142; gl=1; p<0,01; R2=0,03) e Masoquista (B=2,105; gl=1; p<0,01; R2=0,01). Ainda em relação à regressão logística, também foi verificada a comparação entre os grupos previamente formados (GNP e GPS) e o agrupamento realizado por meio dos escores do IDTP e do MCMI-III. Observou-se que foram classificados corretamente 56,7% (34 casos) dentre os pacientes do grupo psiquiátrico e 87,6% (234 casos) dentre os respondentes do grupo não psiquiátrico.

Na continuidade, para o cálculo das curvas ROC para ambos os instrumentos, foram utilizadas variáveis geradas na análise de regressão logística, que predizem a probabilidade de cada caso ser pertencente ao grupo clínico. Por meio da análise da curva ROC, obtém-se as áreas abaixo da curva para cada uma das variáveis consideradas. Entendese que quanto maior a área abaixo da curva, maior deve ser a sensibilidade e a especificidade do teste (Lopes, Ribeiro, Carvalho, Franco, Loschi, & Braga, 2007). Contudo, como ressaltado por Braga (2000), dependendo do ponto de corte estabelecido, o teste será ou muito sensível e pouco específico, ou muito específico e pouco sensível.

As Áreas Abaixo da Curva (AACs) encontradas foram de 0,80 para o IDTP e 0,81 para o MCMI-III, o que pode ser considerado como adequado (Braga, 2000). O procedimento da curva ROC, além de possibilitar a verificação a AAC também fornece dados acerca da sensibilidade e especificidade para os vários pontos de corte, o que permite definir o ponto “ótimo” (optimal cutoff) considerando esses dois parâmetros. As coordenadas da curva ROC, por meio de uma análise qualitativa dos índices obtidos, apontou que o ponto de corte mais adequado corresponde à probabilidade 0,152, para o IDTP. Nesse ponto, a sensibilidade é igual a 82,1%, mas a especificidade é de apenas 29,2%. No caso do MCMI-III, o ponto de corte mais adequado corresponde à probabilidade 0,134. Nesse ponto, a sensibilidade é igual a 80,3%, mas a especificidade é de apenas 33,2%.

 

Discussão

Inicialmente, foram verificadas as relações entre as escalas do IDTP e as escalas do MCMI-III. Pode-se considerar que os dados obtidos fornecem evidências de validade para o IDTP, uma vez que as escalas correspondentes dos instrumentos demonstraram magnitudes altas de correlação. Contudo, verificou-se também que praticamente todas as correlações entre as escalas dos instrumentos foram positivas e significativas. Magnitudes expressivas eram esperadas para as correlações entre as escalas dos instrumentos, já que ambos provêm do mesmo arcabouço teórico. Além disso, o fato de grande parte das escalas apresentarem correlações estatisticamente significativas é um possível resultado já reportado na literatura (Hicklin & Widiger 2000; Marlowe e cols., 1998; Millon e cols., 2004; Rossi e cols., 2003; Strack & Millon, 2007) que pode ser decorrência de diferentes fatores, tais como: sobreposição de itens, dimensão geral para transtornos da personalidade, variabilidade insuficiente da amostra, entre outros. Esses fatores não foram testados no presente estudo, mas sugere-se que futuras pesquisas verifiquem a ocorrência desses fatores e como eles interferem nos dados obtidos.

Ressalta-se a correlação significativa encontrada entre a escala Histriônico (IDTP) e Narcisista (MCMIIII). Como já apontado na literatura, os funcionamentos histriônico e narcisista da personalidade têm em comum características desejadas socialmente e, por isto, podem ser compreendidas como adaptativas (Millon e cols., 2004). Ainda, para ambos os funcionamentos da personalidade, o tema central diz respeito a uma necessidade de ser percebido pelo outro de determinada forma (Millon e cols., 2004). No caso do estilo histriônico, como alguém sociável e desejado nos eventos sociais; e, no caso do estilo narcisista, como alguém especial, de habilidades inigualáveis.

Também a escala Borderline (MCMI-III) e a escala Depressivo (IDTP) apresentaram altos níveis de correlação. Não foram encontrados dados empíricos que corroborassem esse dado de maneira específica, apesar de outros estudos também terem encontrado essa relação (Millon e cols., 1994). Ainda assim, pode-se hipotetizar que um dos fatores importantes que contribuíram para a correlação entre as duas escalas respeita às características em comum apresentadas pelo funcionamento borderline e depressivo, tais como, destrutividade autodirecionada, instabilidade de humor (o que inclui humor triste), e ideação suicida (Millon e cols., 2004).

Observou-se, também, que as escalas Compulsivo e Narcisista foram aquelas que apresentaram as maiores magnitudes de correlação com a escala de Desejabilidade Social do MCMI-III. Esse dado pode ser considerado como mais uma evidência de que características não patológicas, e até mesmo esperadas pela sociedade, estão relacionadas aos funcionamentos Compulsivo e Narcisista da personalidade, como já evidenciado em outros estudos (Choca, 2004; Hicklin & Widiger, 2000; Strack & Millon, 2007). Também a Escala XV, representada por itens de desejabilidade social e itens de validade (tais como “Sempre tento conhecer pessoas novas e fazer novas amizades” e “Estive na capa de várias revistas o ano passado”, respectivamente), apresentou correlação significativa e moderada com a escala de Desejabilidade social do MCMI-III, o que sugere que os itens da Escala XV do IDTP estão mais atrelados à desejabilidade social do que à questão da validade.

No que respeita especificamente à escala Compulsivo do IDTP, ressalta-se que esta foi a escala que apresentou o menor número de correlações com as escalas do MCMI-III. Esse dado corrobora resultados encontrados em outros estudos (Hicklin & Widiger, 2000; Dyce e cols., 1997), e possivelmente está atrelado à questão dos atributos socialmente esperados que estão relacionados à Escala Compulsivo, isto é, ela apresenta menos relação com as outras escalas, pois há um fator de desejabilidade social importante implícito à ela.

Na continuidade, buscaram-se diferenças entre os grupos GNP e GPS nas médias de pontuações das escalas do IDTP e do MCMI-III. Para ambos os instrumentos, o grupo GPS obteve pontuações mais altas que o grupo GNP em todas as escalas dos instrumentos. Também em ambos os instrumentos os respondentes apresentaram médias altas na escala Compulsivo, e, no caso do IDTP, na escala Narcisista e Boderline, e para o MCMI-III, na escala Histriônico e Validade.

Escalas que avaliam os funcionamentos compulsivo, narcisista e histriônico, como já evidenciado anteriormente, podem tender a apresentar médias mais altas de pontuação uma vez que estes funcionamentos da personalidade estão mais relacionados a atributos saudáveis, e também a comportamentos socialmente desejados (Choca, 2004; Strack & Millon, 2007). A alta pontuação na escala Borderline, como ressaltado por Millon e cols. (2004) pode estar relacionada com um aumento, constatado na clínica psicológica e psiquiátrica, de pacientes com funcionamento borderline, possivelmente em decorrência aos padrões típicos da sociedade contemporânea. Entretanto, sugere-se que essa questão seja testada em futuros estudos, já que não foi verificada neste trabalho. No que se refere à alta pontuação na escala Desejabilidade, este pode ser um indicativo de uma tentativa de responder ao que é socialmente desejado, por parte dos respondentes, e não à resposta que julgam ser a verdadeira. Contudo, futuros estudos devem apontar para pontos de corte adequados para uma adequada interpretação dessa escala na realidade brasileira.

Especificamente em relação ao IDTP, as pontuações mais baixas ocorreram, comumente para os dois grupos de respondentes, para as escalas Sádico e Negativista. Segundo Millon e cols. (2004), esses dois estilos de personalidade estão relacionados a características como oposição aos outros e não-cooperação, atributos estes que podem se manifestar no momento da aplicação do instrumento de avaliação da personalidade. Nesse sentido, a baixa pontuação nessas escalas pode estar relacionada, entre outros fatores (como uma baixa prevalência de indivíduos com características desses estilos na amostra deste estudo) a uma dificuldade na avaliação direta desses estilos da personalidade, reflexo direto do funcionamento subjacente desses estilos da personalidade. Apesar do mesmo não ter ocorrido com o MCMI-III, os estilos Sádico e Negativista também apresentaram baixos escores. Vale a pena ressaltar que a escala Validade do MCMI-III apresentou uma baixa pontuação, o que pode sugerir algum viés dos participantes na situação de testagem. Contudo, assim como na escala Desejabilidade, é necessário que futuros estudos verifiquem um ponto de corte adequado para a pontuação nesta escala para a população brasileira.

Para verificar o melhor ponto de corte para o IDTP e o MCMI-III, por meio da curva ROC, inicialmente foi calculada a análise de regressão logística. Para ambos os instrumentos a maior porcentagem de acertos foi para o GNP. Ainda assim, a média de acerto dos instrumentos foi de 78,6% e 82%, respectivamente, para o IDTP e para o MCMI-III, o que pode ser considerada uma média satisfatória. A partir desses dados, a curva ROC foi analisada para os dois instrumentos.

No que concerne às AACs encontradas, pode-se considerar um resultado satisfatório para o IDTP (0,80), assim como para o MCMI-III (0,81). Contudo, apesar de não haver dúvidas sobre o modelo ideal ser aquele que a AAC seja igual a 1 (Metz, 1978), deve-se ressaltar que não há um consenso entre os autores em relação à categorização dos índices obtidos na AAC. Contudo, parece ser mais frequente na literatura o uso do índice 0,8 como adequado. Por exemplo, de acordo com Lopes e cols. (2007, p. 176), “um modelo é considerado como tendo muito boa capacidade de classificação se a área sob a curva ROC é superior a 0,8”.

 

Considerações finais

O presente estudo teve como objetivo buscar evidências de validade baseadas em critérios externos para o IDTP. No geral, os dados encontrados representam evidências de validade para o instrumento. Em um primeiro momento, as correlações entre as escalas dos instrumentos aplicados foram coerentes com o que era esperado; na sequência, as diferenças entre grupos de participantes e as similaridades entre os resultados evidenciados em ambos os instrumentos na análise de perfis por medidas repetidas sugeriram que o IDTP e o MCMI-III são capazes de distinguir entre os diferentes funcionamentos da personalidade; e, por último, a análise de regressão logística e as curvas ROC apresentaram dados importantes acerca da sensibilidade e especificidade dos instrumentos.

Apesar das evidências de validade presentemente encontradas, cabe ressaltar duas importantes limitações deste estudo. A primeira se refere à amostra, considerando que o IDTP tem como principal objetivo avaliar transtornos da personalidade, seria importante um número maior de pacientes diagnosticados com algum transtorno clínico. E, segundo, refere-se à ausência de um critério externo estruturado e validado para os dados encontrados com o IDTP, por exemplo, a entrevista diagnóstica estruturada para o Eixo II (SCID-II). As limitações apontadas são algumas das mais relevantes deste estudo, contudo, de maneira alguma diminuem a importância dos dados encontrados.

 

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Recebido em outubro de 2012
Reformulado em março de 2013
Aprovado em abril de 2013

 

 

Sobre os autores

Lucas de Francisco Carvalho: é Psicólogo, mestre e doutor pela Universidade São Francisco (USF) e docente do Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu da Universidade São Francisco (USF).
Ricardo Primi: é Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em Avaliação Psicológica, Universidade São Francisco; bolsista de produtividade em pesquisa em nível 1A do CNPq/MCTI.


1Fomento: CAPES; CNPq.
2Endereço para correspondência: Universidade São Francisco, R. Alexandre Rodrigues Barbosa, 45, 13251-900, Itatiba-SP. E-mail: lucas@labape.com.br