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Avaliação Psicológica

versión impresa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.13 no.2 Itatiba ago. 2014

 

 

Velocidade de processamento da informação em adolescentes de escolas públicas e privadas

 

Speed of Information processing in adolescents from public and private schools

 

Velocidad de Tratamiento de la información en los adolescentes de escuelas públicas y privadas

 

 

Luciene de Fátima Rocinholi1, I; Mirian Akiko Furutani OliveiraII; Ana Luiza Costa ZaninottoII; Mara Cristina Souza De LúciaII; Milberto Scaff

IUniversidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ
IIUniversidade de São Paulo – FMUSP

 

 


RESUMO

A velocidade de processamento da informação se refere à atividade mental por certo período de tempo. O objetivo do estudo foi investigar esta velocidade de processamento em adolescentes de 14 anos de escolas públicas e privadas. Foram selecionadas 14 adolescentes (sexo feminino) que cursavam o 9º ano do Ensino Fundamental ou o 1º ano do Ensino Médio. Foram avaliadas por meio do IVP (Código, Procurar símbolos e Cancelamento) da WISC-IV e do Teste de Trilhas Coloridas Infantil (TTCI). O teste qui-quadrado apontou maior número de quase erros no TTCI em meninas que frequentavam escola privada. Nenhuma diferença foi encontrada entre os grupos no IVP. Embora o tipo de escola não pareça produzir diferenças entre os grupos no IVP, o número de quase erros, indicativo de distração, mostrou-se mais sensível para identificar essas diferenças. Sugere-se que o número de quase erros possa indicar diferenças mais sutis entre os grupos.

Palavras-chave: velocidade de processamento; teste de trilhas coloridas infantil, WISC-IV.


ABSTRACT

The speed of information processing refers to attainment of mental activity in a certain period of time. The aim of this study was investigate the speed of information processing in 14 years old girls, who attended public and private schools. We selected 14 girls who were in the 9th grade of elementary school or 1st year of high school. Half of them attended public school and the other half attended private school. They were evaluated by: Processing Speed Index - PSI (Coding, Symbol Search and Cancellation) of the WISC - IV and the Trail Making Test Colored Children (TTCI). The chi-square test showed a higher number of near-misses in CCTT in girls attending private school compared to girls attending public school. No difference was found between the two groups in the PSI. Although the type of school does not seem to produce significant differences between the groups in the PVI, the number of nearmisses showed a more sensitive measure to identify these differences. It is suggested that the number of near-misses may indicate subtle differences between groups.

Keywords: processing speed; children´s color trails test; WISC-IV.


RESUMEN

La velocidad de procesamiento de información se refiere a la realización de actividad mental en un determinado período de tiempo. El objetivo de este estudio fue investigar la velocidad de procesamiento de información en adolescentes de 14 años que asisten a escuelas públicas y privadas. Fueron seleccionado 14 adolescentes, de sexo femenino que curzaban 9 º o 10º grado. La mitad asistia a la escuela pública y la otra mitad a la escuela privada. Fueron evaluadas utilizando las siguientes pruebas: IVP (Código, búsqueda y cancelación de símbolos) de la bacteria WISC-IV y test infantil de sequencias coloreadas (TISC). El t-test mostro un mayor número de casi errores en TISC en las niñas que asisten a las escuelas privadas. No se encontraron diferencias entre los dos grupos en las otro pruebas. Se sugiere que la medición de la cantidad de casi errores revelan una mayor sensibilidad en TTCI.

Palabras-clave: velocidad de procesamiento; test infantil de sequencias coloreadas; WISC-IV.


 

 

A partir da década de 1960, uma das grandes preocupações dos psicólogos era compreender os fenômenos cognitivos e os fatores que mais o influenciavam (Meyer, Osman, Irwin, Yantis, & Meyer, 1988). Profissionais da psicologia, da neuropsicologia e das neurociências fizeram um grande esforço para investigar aspectos da inteligência. Assim, modelos neuropsicológicos e instrumentos de mensuração da inteligência foram criados com o intuito de investigar as habilidades, as capacidades e o modo como o cérebro processa as informações que recebe (Mäder, Thais, & Ferreira, 2004). As teorias do processamento da informação (PI) passaram a se concentrar na procura de respostas sobre como o ser humano processa a informação mentalmente (Cid & Alves, 2006).

Na abordagem do processamento da informação, o primeiro modelo foi o modal, proposto por Atkinson e Shifrin, na década de 1960, para explicar a memória humana. Neste modelo, a memória é compreendida numa sequência de etapas: começa com a entrada do estímulo ativador da memória sensorial, com informações sendo transferidas para a memória de curto prazo. Se usado de modo repetido, este conteúdo pode ser armazenado na memória de longo prazo (Matlin, 2004). Embora o modelo modal seja o mais conhecido na abordagem do processamento da informação, foi alvo de críticas, especialmente no que se refere à memória de curto e longo prazo. Assim, outros modelos mais complexos têm sido propostos para a compreensão do pensamento humano.

Nos anos de 1970, a neuropsicologia cognitiva propôs o modelo de processamento da informação para análise dos subcomponentes das habilidades cognitivas, procurando compreender como a informação é transformada e processada para uma finalidade. O uso desse modelo permitiu a postulação e o fracionamento de diversos componentes das funções cognitivas (Miotto, 2007). Compreendendo que o estudo das funções cognitivas pode auxiliar o entendimento sobre esta capacidade humana extremamente ampla, vários conceitos de inteligência foram propostos. As definições abrangem: habilidade intelectual geral, julgamento, senso prático, pensamento racional, resolução de problemas, adaptação ao meio e, ainda, abstração. Sendo assim, diversos modelos foram construídos para a mensuração da inteligência, considerando tanto fatores gerais de inteligência (Spearman) como as múltiplas inteligências, sendo que cada modelo refletiria uma dimensão específica das habilidades cognitivas (Strauss, Sherman, & Spreen, 2006).

Modelos atuais, como o de inteligência de Carrol- Horn-Catell (CHC), abrangem habilidades cognitivas complexas (tais como inteligência fluida, inteligência cristalizada, memória de curto e de longo prazo, processamento de informações) bem como fatores primários de funcionamento cognitivo, raciocínio quantitativo, habilidade ortográfica, recordação livre e tempo de reação (Flanagan, McGrew, & Ortiz, 2000). Desta forma, instrumentos construídos com base em modelos capazes de avaliar estas habilidades são mais adequados para investigar inteligência.

A quarta versão da escala WISC é um dos instrumentos que foi reformulado e que permite a avaliação da inteligência de acordo com o modelo CHC. A WISC-IV está validada nos Estados Unidos desde 2003 (Strauss et al., 2006) e, atualmente, é comercializada no Brasil, com validação brasileira pela Editora Pearson. A WISC-IV apresenta, na atual forma, quatro índices para avaliação: índice de compreensão verbal (ICV), índice de raciocínio perceptual (IRP), índice de memória de trabalho (IMT) e índice de velocidade de processamento (IVP). Considerando especificamente o IVP, pode-se investigar os domínios de velocidade de processamento mental e grafomotor através dos subitens código, procurar símbolos e cancelamento. Contudo, deve ser lembrado que, apesar desses subitens participarem do IVP, individualmente eles não avaliam a velocidade de processamento, sendo utilizados para indicar outras habilidades. Por exemplo, o subitem 'código' é utilizado para investigar a memória de curto prazo, aprendizado, percepção visual, coordenação visual e motora, amplitude visual, flexibilidade conectiva, atenção e motivação. Já o subitem 'procurar símbolos' avalia memória visual de curto prazo, coordenação visual e motora, flexibilidade cognitiva, discriminação visual e concentração, e o subitem 'cancelamento' possibilita verificar atenção visual seletiva, vigilância ou negligência visual (Mäder et al., 2004).

Nos estudos sobre velocidade de processamento da informação, têm sido utilizadas tarefas diferenciadas no volume e na natureza da informação a processar. Recorre-se ou não à informação retida na memória de curto prazo e avalia-se o tempo de reação a estímulos auditivos ou visuais em função da quantidade de informação transmitida. O tempo, como medida de velocidade de processamento, permite detectar mudanças sutis num período curto (Ribeiro & Almeida, 2005).

A velocidade de processamento de informação parece ser um dos principais fatores limitantes a diferentes desempenhos numa larga variedade de tarefas cognitivas em crianças e adolescentes (Hale, 1990; Kail, 1991). Por exemplo, a velocidade de processamento de informação mais rápida pode influenciar o desenvolvimento da linguagem, porque permite que operações sejam realizadas mais rapidamente e, indiretamente, porque aumenta a capacidade da memória de trabalho (Rose, Feldman, & Jankowski, 2009).

A leitura e a escrita são atividades complexas, compostas por múltiplos processos interdependentes, geralmente representados por modelos de processamento da informação. A consciência fonológica, definida como a capacidade de refletir sobre a estrutura sonora da fala e manipular seus componentes estruturais, constitui uma das habilidades envolvidas no processo da aquisição da leitura e da escrita (Paula, Mota, & Keske-Soares, 2005). Também está associada à presença de outras habilidades cognitivas necessárias à leitura e à escrita, como o processamento auditivo e visual e a velocidade de processamento. Conforme Cardoso-Martins e Pennington (2001), a rapidez é um fator importante para a leitura textual fluente, com correlação entre o desempenho em tarefas de nomeação seriada rápida e o desempenho em medidas de leitura fluente de texto.

Assim como o IVP da WISC-IV, outros testes podem auxiliar na investigação da velocidade de processamento. O Teste de Trilhas Coloridas Infantil (TTCI) avalia primordialmente atenção sustentada e dividida, e verifica as habilidades subsidiárias ao funcionamento do lobo frontal, como rastreamento perceptual, processamento visual e seqüenciamento. Também permite a observação das habilidades grafomotoras do examinando e como estas habilidades estão envolvidas na velocidade de processamento. Este teste pode atuar como ferramenta auxiliar à investigação. No instrumento, utilizam-se números e cores (símbolos universais), e são verificados o tempo para realização da tarefa, o número de erros e o número de quase erros cometidos (Strauss et al., 2006). A medida do número de quase erros não está validada na versão americana do TTCI, mas esta investigação pode oferecer um refinamento para uma análise qualitativa dos resultados.

Existem estudos que sugerem também uma correlação entre, de um lado, redução na velocidade de processamento e, de outro, Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e dificuldade de leitura, tanto quando ocorrem separadamente (Seidman, Bierderman, Monuteaux, Doyle, & Faraone, 2001) como quando em comorbidade (Katz, Brown, Roth, & Beers, 2011, Willicutt, Pennington, & Olson, 2005).

Recentemente, estudos da literatura avaliaram habilidades cognitivas (atenção, habilidades de construção, memória-codificação e evocação-percepção, linguagem oral, habilidades metalinguísticas, leitura, escrita, matemáticas, habilidades visuo-espaciais, habilidades conceptuais e funções executivas) em 625 crianças e adolescentes de ambos os sexos, com idades entre 6 e 15 anos, de escolas públicas e privadas em Guadalajara, no México, e em Manizales, na Colômbia. As crianças das escolas privadas tiveram um melhor desempenho nas provas de leitura. O estudo revelou que as habilidades de leitura em crianças de idade escolar são influenciadas pela idade e pelo tipo de escola frequentada (Rosselli, Matute, & Ardila, 2006).

Outro estudo investigou a fluência de leitura e de escrita em 61 escolares, matriculados regularmente no 4º e no 5º anos do Ensino Fundamental de uma escola da rede pública e outra de ensino privado, da Região Metropolitana de Belo Horizonte. O estudo mostrou que crianças de escola pública apresentaram desempenho inferior em fluência de leitura e de escrita do que crianças de escola privada (Pontes, Diniz, & Martins-Reis, 2013).

Considerando que a velocidade de processamento pode limitar o desenvolvimento da linguagem e as tarefas escolares de leitura e de escrita (Cardoso-Martins & Pennington; 2001, Hale, 1990; Kail, 1991; Rose et al., 2009), que o tipo de escola pode influenciar a habilidade de leitura (Rosselli et al., 2006) e, ainda, que algumas correlações foram encontradas entre redução na velocidade de processamento e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e dificuldade de leitura (Katz et al., 2011, Seidman et al., 2001; Willicutt et al., 2005), o objetivo deste estudo foi investigar se a velocidade de processamento e as habilidades atencionais envolvidas nesta velocidade diferem em adolescentes de 14 anos que frequentam escolas públicas ou privadas no município de Seropédica, estado do Rio de Janeiro, através da WISCIV e do TTCI.

 

Método

Participantes

Foram selecionadas 14 adolescentes, com 14 anos, do sexo feminino, estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental ou do 1º ano do Ensino Médio. Metade das adolescentes (sete) frequentava uma escola pública e a outra metade (sete), uma escola privada. Os critérios de elegibilidade foram: ter 14 anos de idade; não ter sido reprovada ou não apresentar histórico de dificuldade de aprendizagem registrado pela escola; não apresentar diagnóstico psicológico, psiquiátrico ou neurológico (como deficiência intelectual e TDAH) de conhecimento da escola.

Instrumentos

Os instrumentos utilizados nesse estudo foram: Teste de Trilhas Coloridas Infantil (TTCI) para crianças e adolescentes de 6 a 17 anos, e os subitens 'código', 'procurar símbolos' e 'cancelamento' do WISC-IV, que possibilitam avaliar crianças de 6 a 16 anos.

TTCI. Este teste é composto pelas formas 1 e 2. A forma 1 apresenta a folha de avaliação e solicita-se que a criança ligue os números em ordem crescente sem retirar o lápis do papel. Deve ser salientado para a criança que cada número é apresentado em círculos de cores diferentes (rosa ou amarelo) e que ela deve alternar do rosa para o amarelo. A forma 2 apresenta a folha de avaliação e solicita-se que a criança ligue os números em ordem crescente sem retirar o lápis do papel. Deve ser salientado para a criança que o mesmo número está apresentado em círculos rosas ou em amarelos e que, portanto, ela deve alternar do rosa para o amarelo. Nas duas formas, a criança treina antes de iniciar o teste. Na forma 1, são registrados o número de erros, de quase erros e o tempo para realização da tarefa. Na forma 2, a medida do número de erros é registrada separadamente para número e cor. Nas duas formas, depois de 10 segundos sem resposta, um aviso é fornecido à criança e a localização do círculo correto é apontada – ao fim, registra-se o número total de avisos.

WISC-IV Código – B. Neste subteste, apresenta-se um modelo com quadrados com números de 1 a 9, os quais apresentam códigos específicos para cada número. A ficha de aplicação apresenta os mesmos quadrados somente com os números. Solicita-se que a criança preencha o símbolo correspondente ao número do modelo. A criança treina antes de iniciar o teste. O tempo limite para o teste é 120 segundos.

Procurar símbolos – B. Em cada item deste subteste, são apresentados dois símbolos modelos para comparação com um conjunto de 5 símbolos. A criança deve marcar a resposta "sim" se um dos símbolos modelo estiver presente no conjunto de comparação e "não" se o símbolo não estiver presente. A criança treina antes de iniciar o teste. O tempo limite para o subteste é 120 segundos.

Cancelamento. Neste subteste, a criança deve marcar no protocolo de respostas os animais que encontra dentre os objetos apresentados, passando com um lápis vermelho (cancelamento) um traço sobre eles. A tarefa deve ser demonstrada em exemplo e, em seguida, a criança realiza um treino. São aplicadas as formas 1 e 2. Os objetos são apresentados aleatoriamente na forma 1 e de modo estruturado na forma 2. O tempo limite para a realização de cada forma é 45 segundos.

Procedimento

Esta pesquisa faz parte de um projeto intitulado "Avaliação da atenção infantil por meio do Teste de Trilhas Coloridas: adaptação para população brasileira de 6 a 17 anos" aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Divisão de Psicologia do ICHC-FMUSP/ COSEPE sob o nº 01/12 e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de São Francisco CAAE sob o nº 0470.0142.000-11.

Trata-se de um estudo aninhado neste projeto maior, sendo que aqui se avaliou somente meninas com 14 anos de Seropédica. A cidade tem 78.000 habitantes e, embora tenha uma população urbana maior (segundo censo de 2010), apresenta características rurais marcantes, devidas, entre outras causas, aos cursos da área agrícola da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Desta forma, ainda que no projeto maior tenham sido avaliadas crianças de ambos os sexos de 6 a 17 anos, meninos de 14 anos não foram avaliados e, devido às características peculiares da população, não foi possível comparar estes dados.

A seleção das adolescentes foi realizada em conjunto com a direção da escola com recurso às fichas de matrícula das alunas, em que constava a data de nascimento e o ano acadêmico. Esta seleção foi realizada para garantir os critérios de elegibilidade como ausência de dificuldades escolares, repetência e outras queixas. Posteriormente, foram enviados aos pais o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o qual informava sobre os objetivos do estudo e solicitava a autorização para as adolescentes participarem da pesquisa.

Após a assinatura dos termos de consentimento, os testes foram aplicados individualmente numa sala silenciosa e arejada da escola na qual a adolescente estava matriculada. As adolescentes responderam aos testes TTCI, WISC-IV (subitens: código, procurar símbolos e cancelamento). A sessão teve duração de aproximadamente 50 minutos.

Análise de Dados

Os dados foram analisados com o pacote estatístico SPSS 20.0®. O teste qui-quadrado foi utilizado para comparar o desempenho entre o grupo de meninas de escola pública (EPU) e o de escola privada (EPR) no IVP (código, procurar símbolos e cancelamento) da WISC-IV e também no TTCI (medidas de tempo, erros e quase erros) nas formas 1 e 2, considerado valores significativos para p<0,05. O teste de correlação de Spearman foi utilizado para investigar a correlação entre o IVP da WISC-IV e as medidas avaliadas no TTCI (tempo, número de erros, número de quase erros, avisos e índice de interferência) nas formas 1 e 2, em cada tipo de escola avaliada.

 

Resultados

O grupo de meninas da EPR apresentou maior número de quase erros no TTCI – forma 1 – do que o grupo de meninas da EPU. Nenhuma diferença foi encontrada no desempenho entre os dois grupos nas categorias tempo, erro e avisos na forma 1 do TTCI. Não foram encontradas diferenças entre os Grupos EPU e EPR nos parâmetros: tempo, erro de cor, erro de número, quase erro, avisos na forma 2 do mesmo teste, tampouco no índice de interferência (TF1/TF2). Na Tabela 1, podemos observar as médias dos grupos para cada medida do TTCI e os valores do teste de qui-quadrado e de p correspondentes.

Nenhuma diferença foi apontada pelo teste de qui-quadrado entre os grupos EPU e EPR no IVP ou nos escores ponderados dos subitens código (Cod), procurar símbolos (PS), cancelamento (Canc) da WISC-IV. Na Tabela 1, podemos ver as médias de cada grupo para o IVP e cada subitem do WISC-IV, e os valores do teste de qui-quadrado e de p correspondentes nas medidas.

 

 

A análise de correlação entre o IVP e as medidas do TTCI nos grupos EPU e EPR mostraram que somente o número de erro de cor se correlaciona com o número de quase erro na forma 2. Não foram encontradas correlações entre o IVP, TF1, EF1, QEF1, TF2, EF2 e QEF2 (Tabela 2).

 

 

A observação dos dados brutos de cada grupo nos permite identificar que uma menina do grupo EPU, que realizou o teste mais rapidamente (11s), cometeu 1 erro, enquanto as outras não cometeram erros ou quase erros na forma 1 do TTCI. Contudo, na forma 2, esta mesma menina realizou o teste em 40s (próximo à média) e também cometeu 1 quase erro. Por outro lado, uma menina do grupo EPU realizou o teste mais lentamente do que as demais (65s) e cometeu 1 erro de cor e 2 quase erros.

Quando observamos o grupo EPR, verificamos que três meninas cometeram 1 quase erro na forma 1, sendo que uma delas realizou o teste mais rapidamente que o restante do grupo (8s) e as outras duas meninas fizeram o teste em 19s (valor próximo à média do grupo). Na forma 2, somente uma menina do grupo escola privada cometeu 1 quase erro; ela realizou o teste em 36s, tempo próximo à média (39s).

 

Discussão

A redução na velocidade de processamento e no Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem sido correlacionada a alterações na capacidade de leitura de crianças (Seidman et al., 2001; Willicutt et al., 2005; Katz et al., 2011). Estudos da literatura mostram que o tipo de escola frequentado por uma criança também influencia a atividade de leitura, sendo que crianças das escolas privadas demonstraram melhor desempenho nas provas de leitura que as crianças das escolas públicas (Rosselli, et al., 2006; Pontes et al., 2013).

Considerando que tanto a velocidade de processamento como o tipo de escola podem alterar a capacidade de leitura. Adicionalmente, foram investigadas habilidades atencionais através do TTCI, considerando que estas podem influenciar a velocidade de processamento. Embora não tenham sido encontradas diferenças entre os grupos EPR e EPU no IVP, meninas de EPR apresentaram maior número de quase erros no TTCI – forma 1 – comparadas a meninas de EPU. No TTCI, uma resposta de quase erro é definida como um início de resposta incorreta ou distração, autocorrigida antes da conexão com o círculo incorreto seguinte. Esse tipo de resposta ocorre quando o sujeito começa a cometer um erro na Sequência de Números no TTCI – forma 1, ou ainda na Sequência de Números ou Sequência de Cores do TTCI – forma 2, mas autocorrige sua resposta antes que o lápis toque o estímulo errado.

A resposta de quase erro fornece uma avaliação qualitativa de ocasionais deslizes cognitivos ou degenerações no funcionamento decorrentes de disfunções cerebrais leves ou de pequena lesão similar. Estes escores registrados no TTCI tentam aumentar a sensibilidade do teste, ainda que não haja normas disponíveis para respostas quase erradas (Strauss et al., 2006,). Desta forma, as diferenças encontradas na avaliação dos quase erros entre os grupos de adolescentes de escolas públicas e privadas corroboram a idéia de que este escore é um índice de maior sensibilidade neste instrumento. Em adição, o estudo não apontou diferenças entre grupos de adolescentes de escola pública e privada nos outros itens avaliados no TTCI forma 1 e 2, tampouco nos subitens 'código', 'procurar símbolos' e 'cancelamento' da WISC-IV e no IVP, apontando também para maior sensibilidade da medida de quase erros no TTCI.

Considerando a possibilidade de maior sensibilidade da medida de quase erros, as diferenças apresentadas entre os grupos podem apontar para alterações no processo de atenção sustentada, atenção dividida e sequenciamento nas adolescentes de EPR. Isto pode demonstrar dificuldade no estado de prontidão para identificar e responder a estímulos por período prolongado (Matlin, 2004; Mioto et al., 2012; Sternberg, 2008), dificuldade em dividir a atenção entre os estímulos (números e cores), e ainda dificuldade em realizar uma tarefa que exige ordem sequencial das partes constituintes. Deve ser lembrado que, no TTCI, o sequenciamento foi exigido para ordem dos números e também das cores.

O estudo não apontou diferenças entre grupos EPU e EPR nos outros itens avaliados no TTCI (formas 1 e 2), tampouco no subitem cancelamento da WISC-IV, que possibilita verificar atenção visual seletiva, vigilância ou negligência visual. Este resultado também pode indicar maior sensibilidade da medida de quase erros no TTCI.

Outro aspecto importante é a possibilidade do grupo de escola privada apresentar dificuldades no controle inibitório, o que pode levar à redução na velocidade de processamento da informação. Isso parece ser um dos principais fatores limitantes a diferentes desempenhos em tarefas cognitivas em crianças e adolescentes (Hale, 1990; Kail, 1991).

É importante salientar que as adolescentes avaliadas pertenciam a escolas da Região Central da cidade de Seropédica. Algumas das adolescentes tiveram os mesmos professores na sua formação acadêmica, fator que pode mitigar diferenças entre os grupos. Os níveis socioeconômico e cultural das famílias das meninas avaliadas não foram investigados, impossibilitando correlações com as medidas estudadas.

Na forma com que este estudo foi conduzido, pode- se concluir que o tipo de escola não parece interferir no IVP em meninas aos 14 anos. Contudo, o número de quase erros, indicativo de distração, mostrou-se uma medida mais sensível para identificar diferenças entre os grupos EPU e EPR – pode, portanto, funcionar como medida adicional na identificação de diferenças nos processos cognitivos de crianças.

Embora alguns estudos tenham mostrado que crianças de escolas privadas, em comparação a crianças de escolas públicas, apresentam melhor desempenho em tarefas que envolvem velocidade de processamento da informação (Rosselli et al., 2006), a possibilidade de maior sensibilidade da medida de quase erros no TTCI pode revelar diferenças não identificadas em outras medidas, podendo ser utilizada como ferramenta adicional na identificação destas diferenças.

Finalmente, é importante reconhecer que, neste estudo, foi avaliado um número pequeno de sujeitos por grupo, o que dificulta uma análise que aponte diferenças mais robustas entre os grupos avaliados. Considerase adequada a realização de outros estudos com maior número de sujeitos por grupo avaliado, para verificar diferenças na velocidade de processamento da informação em crianças de escolas públicas e privadas, a fim de investigar também outros fatores como gênero, idade, escolaridade e níveis socioeconômico e cultural.

 

Referências

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Recebido em julho de 2013
Reformulado em novembro de 2013
Aprovado em fevereiro de 2014

 

 

Sobre os autores

Luciene de Fátima Rocinholi: é Mestre e Doutora em Psicobiologia pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo – USP. Professora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Mirian Akiko Furutani Oliveira: possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná e mestrado em Ciências pelo departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo. Doutorado em Ciências pela FMUSP pelo departamento Neurologia.
Ana Luiza Costa Zaninotto: possui graduação em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina UEL. Atualmente é Neuropsicóloga Supervisora na Divisão de Psicologia do ICHC-FMUSP.
Mara Cristina Souza De Lúcia: possui doutorado e mestrado em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Diretora técnica de divisão de saúde da Divisão de Psicologia do Hospital das Clínicas da FMUSP (Secretaria de Estado da Saúde São Paulo).
Milberto Scaff: possui graduação em Medicina pela Universidade de São Paulo e doutorado em Neurologia pela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor titular da Universidade de São Paulo.


1Endereço para correspondência: Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, R. Santa Clara, 340, apto 501, Copacabana, 22041-012, Rio de Janeiro-RJ. Tel.: (21) 7621-4349 / 2548-4979. E-mail: lurocinholi@uol.com.br