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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.14 no.2 Itatiba ago. 2015

 

 

Relação entre condições para criatividade e satisfação no trabalho de pesquisadores

 

The relation between conditions for creativity and job satisfaction of researchers

 

Relación entre condiciones para la creatividad y satisfacción laboral de investigadores

 

 

Giovana Zappalá Porcaro-SousaI; Cláudia Cristina Fukuda1, I; Jacob Arie LarosII

IUniversidade Católica de Brasília
IIUniversidade de Brasília

 

 


RESUMO

O objetivo deste trabalho foi desenvolver um modelo que relacione as condições para a criatividade no trabalho e a satisfação com o trabalho utilizando a técnica de Modelagem por Equações Estruturais. Participaram 367 pesquisadores de uma empresa pública com idade média de 45,8 anos (DP=9,8), sendo 62,1% homens. Foram aplicados dois instrumentos: Indicadores de Condições para Criar no Trabalho (ICCAT) e a versão reduzida da Escala de Satisfação no Trabalho (EST). Incialmente, os modelos de mensuração das escalas foram verificados. Depois de algumas modificações, os modelos demonstraram bons ajustes aos dados observados. Em seguida, foi avaliado o modelo estrutural integral da relação entre condições para a criatividade e satisfação no trabalho. Os índices de ajuste mostraram que o modelo se ajusta bem aos dados. Os resultados indicaram uma forte relação entre condições favoráveis à criatividade e satisfação no trabalho.

Palavras-chave: criatividade; satisfação no trabalho; modelagem por equações estruturais.


ABSTRACT

The purpose of this study was to develop a model relating conditions for creativity at work and job satisfaction using Structural Equation Modeling. The sample data analyzed comprised of 367 researchers with a mean age of 45.8 years (SD=9.8), 62.1% being male, from a public company in Brazil. Two instruments were applied: Indicators of Conditions to Create at Work and the reduced version of the Scale of Job Satisfaction. Initially, the measurement models of the scales were analyzed. After modifications these models showed a good fit to the observed data. Subsequently, the full structural model of the relationship between conditions for creativity at work and job satisfaction was assessed. The fit indexes showed that the full model fits the observed data well. The results indicated a strong relationship between favorable conditions for creativity and job satisfaction. Keywords: creativity; job satisfaction; structural equation modeling.

Keywords: creativity; job satisfaction; structural equation modeling.


RESUMEN

El propósito del estudio fue desarrollar un modelo que relacione condiciones para la creatividad en el trabajo con satisfacción laboral usando la técnica de Modelos de Ecuaciones Estructurales. Participaron 367 investigadores de una organización pública de Brasil, con una promedio de edad de 45,8 años (DP=9,8), de los cuales 61% fueron hombres. Se aplicaron dos instrumentos: Indicadores de Condiciones de Creatividad en el Trabajo y la versión reducida de la Escala de Satisfacción Laboral. Primero, fueron verificados los modelos de medida de las escalas, los cuales mostraron un buen ajuste a los datos observados después de algunas modificaciones. Posteriormente, fue verificado el modelo estructural integral de la relación entre condiciones para la creatividad en el trabajo y satisfacción laboral. Los índices de ajuste mostraron que el modelo integral se ajusta bien a los datos observados. Los resultados indican una relación fuerte entre condiciones favorables para la creatividad y satisfacción laboral.

Palabras-clave: creatividad; satisfacción laboral; modelos de ecuaciones estructurales.


 

 

Considera-se que os indivíduos apresentam características que são potenciais para o comportamento criativo, e que o ambiente pode estimular ou inibir a sua expressão. Assim, um dos focos deste estudo é o ambiente para a criatividade, que pode ser analisado a partir das condições de trabalho, que são um conjunto de variáveis do ambiente que circunda o indivíduo em suas atividades laborais (Bruno-Faria & Alencar, 1998; Gondim & Siqueira, 2004). Dessa forma, condições para criatividade podem ser compreendidas como um conjunto de variáveis do ambiente de trabalho que podem favorecer ou inibir a expressão criativa.

Além das condições do ambiente de trabalho para a criatividade, as organizações têm necessidade de investir em uma relação satisfatória com seus colaboradores. Isso porque essa satisfação pode viabilizar uma relação socioeconômica e interpessoal sustentável entre as pessoas e as organizações (Borges & Yamamoto, 2004; Khera & Gulati, 2012). Este estudo considera a satisfação no trabalho como resultante da interação das pessoas com as condições ambientais laborais, seguindo a concepção teórica de que satisfação é um tipo de vínculo afetivo e parte relevante do bem-estar no trabalho necessário para o equilibro da relação do indivíduo com a organização (Siqueira & Padovam, 2008). A satisfação no trabalho é conceituada como um estado emocional positivo advindo da vivência no ambiente organizacional (Siqueira, 2008). E, segundo Roelen, Koopmans, e Groothoff (2008), caracteriza-se na literatura tanto como um construto global quanto composto pela satisfação em diferentes facetas do trabalho.

Conforme Siqueira (2008), estudos sobre satisfação com o trabalho pautam-se nos movimentos de qualidade de vida no trabalho, têm sua base em pressupostos sociais, humanistas e em estudos de bem-estar laboral, defendem que o trabalhador satisfeito pode tornar-se uma pessoa com mais possibilidades de ser um cidadão integrado à sociedade, à sua família e de apresentar melhores índices de saúde física e mental. Além disso, essa concepção estabelece que as organizações deveriam manter uma relação de troca com seus colaboradores, ou seja, as empresas precisam cuidar da saúde daqueles que com ela colaboram.

Apesar de o mercado apontar para a necessidade de se estabelecer condições para a criatividade (Amabile, 1988; Udwadia, 1990), de a psicologia social e do trabalho apontarem para a necessidade de se ter satisfação no trabalho (Siqueira, 2008) e de a teoria indicar condições ambientais comuns à criatividade e à satisfação no trabalho (Alencar, 2011; Siqueira, 2008), são raros os estudos que analisaram a relação entre essas variáveis. Dentre eles, destacam-se dois estudos que exploraram a liderança apoiadora e o apoio organizacional para a criatividade como sendo condições que estimulam tanto a criatividade, quanto a satisfação (Berg & Hallberg, 1999). Em outro estudo, Shalley, Gilson, e Blum (2000) identificaram que, quando as organizações davam o apoio para a criatividade, conforme a necessidade de cada posto de trabalho, proporcionavam satisfação aos trabalhadores. Encontraram também que trabalhos que exigiam maiores níveis de criatividade estavam associados à autonomia, complexidade, desafios, assim como à percepção de maior apoio e de menor controle da organização. Segundo os autores, essas condições aumentam a satisfação no trabalho.

Autores relatam que o estilo criativo do líder, a personalidade proativa e a criatividade do grupo como características pessoais e grupais influenciam a satisfação no trabalho (Kim, Hon, & Crant, 2009; Koberg & Chusmir, 1987; Valentine, Godkin, Fleischman, & Kidwell, 2011). Nesses casos, a criatividade foi vista apenas como uma qualidade de pessoas ou grupos, e não como resultante de uma interação das características pessoais com o ambiente.

Zhou e George (2001) identificaram que pessoas insatisfeitas, desde que fossem comprometidas e assertivas, poderiam ser criativas. Pode-se entender que, havendo uma insatisfação com uma situação crítica, mas não havendo insatisfação geral com o trabalho, a insatisfação funcionou como um gatilho para a criatividade no trabalho. A criatividade seria a forma saudável de responder a um contexto que gera insatisfação no trabalho. Isso sugere que existem condições de trabalho diferentes para a promoção da criatividade e da satisfação.

Em geral, considerando os estudos descritos acima, pode-se observar que o ambiente que oferece suporte organizacional, suporte dos colegas, respeito às ideias, flexibilidade e confiança, características do ambiente para criar, promove a criatividade e a satisfação; que características pessoais podem facilitar a expressão criativa; e que existem condições que podem estimular a criatividade, mas não a satisfação. Nesse contexto, o objetivo do presente estudo foi verificar a relação entre as condições para a criatividade no ambiente de trabalho e satisfação com o trabalho de pesquisadores.

 

Método

Participantes

A amostra utilizada foi fruto de convite enviado por correio eletrônico institucional para os 2.093 pesquisadores de uma empresa pública de pesquisa. Desse total, 442 pesquisadores abriram e retornaram o questionário no prazo de um mês, sendo que 42 (9,5%) questionários estavam totalmente em branco, e 26 (5,9%) estavam com mais de 50% das questões em branco. Dessa forma, foram considerados 374 questionários válidos. No processo de limpeza dos dados descrito posteriormente, 7 dos 374 questionários válidos (1,6%) foram excluídos, restando 367 casos.

Assim, a amostra final foi composta por 367 participantes, dos quais 228 (62,1%) eram homens, 83,7% com doutorado, 12,0% com mestrado, e os demais especialistas ou graduados. A idade variou entre 26 e 70 anos (M=45,8; DP=9,8), e o tempo de trabalho na empresa variou entre alguns meses (indicando se tratar de um novo empregado) e 39 anos, com média de 14,1 anos (DP=11,7). Quanto ao cargo, apenas 35 participantes (9,5%) exerciam cargo de chefia, mas 172 (46,9%) gerenciavam equipes de trabalho. Quanto ao local de trabalho, os participantes estavam distribuídos por vários estados brasileiros, abrangendo as cinco regiões, com predomínio do Centro-Oeste (26,0%), seguida por Sudeste (21,6%), Nordeste (21,3%), Sul (16,5%) e Norte (14,6%).

Instrumentos

Foram utilizados dois instrumentos, um para avaliar as condições do ambiente para criatividade, denominado Indicadores de Condições para Criar no Trabalho (ICCAT), de Bruno-Faria e Veiga (no prelo), e outro para avaliar satisfação no trabalho, a Escala de Satisfação no Trabalho (EST), de Siqueira (2008). Também foi aplicado um questionário para caracterização dos participantes que incluiu variáveis sociodemográficas, variáveis do cargo e variáveis do local de trabalho.

Os ICCAT são compostos por 60 itens divididos em duas escalas, Condições Favoráveis à Criatividade (ECFC) e Condições Desfavoráveis à Criatividade (ECDC) no ambiente de trabalho, que são respondidas em uma escala de resposta do tipo Likert de cinco pontos. A ECFC é constituída de 36 itens organizados em seis dimensões teóricas. São elas: 1. Suporte do gerente imediato; 2. Atividades desafiantes; 3. Estratégias e ações organizacionais em apoio a ideias novas; 4. Clima entre colegas de trabalho; 5. Liberdade de ação; e 6. Características do ambiente físico. No estudo original dos ICCAT foram encontrados coeficientes de fidedignidade (alfa de Cronbach) das dimensões da ECFC entre 0,77 e 0,92 (Bruno-Faria & Veiga, no prelo).

A ECDC consiste de 24 itens divididos entre três dimensões. São elas: 1. Atuação inadequada do gerente (nove itens); 2. Dificuldades de comunicação e rigidez das normas e das regras (nove itens); e 3. Excesso de serviço e escassez de tempo (seis itens). Os coeficientes alfa de Cronbach obtidos pelas autoras foram entre 0,84 e 0,88 (Bruno-Faria & Veiga, no prelo).

A Escala de Satisfação no Trabalho (EST) apresenta- -se em duas formas: completa (composta por 25 itens) e reduzida (composta por 15 itens). Para esta pesquisa, utilizou-se o instrumento na forma reduzida. A escala de resposta é do tipo Likert de sete pontos. A EST afere cinco aspectos da satisfação com o trabalho, sendo eles: 1. Satisfação com os colegas; 2. Satisfação com o salário; 3. Satisfação com a chefia; 4. Satisfação com a natureza do trabalho; e 5. Satisfação com as promoções. As cinco dimensões apresentaram coeficientes alfa de Cronbach entre 0,77 e 0,90 (Siqueira, 2008).

Procedimentos

Uma vez obtida aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, foi estabelecido contato com a direção da empresa solicitando o consentimento para a realização da pesquisa. Após aprovação, enviou-se para o e-mail institucional de todos os pesquisadores um convite com o link para o questionário eletrônico, juntamente com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após o participante concordar com o TCLE por meio do aceite eletrônico, ele teve acesso ao questionário disponível no Lime Survey (software livre de pesquisa). Solicitou-se aos pesquisadores que respondessem ao questionário no prazo de uma semana, os convites para participação na pesquisa foram reforçados semanalmente durante um mês.

Análise de Dados

Para o tratamento de dados ausentes e o cálculo das estatísticas descritivas, utilizou-se o programa SPSS, versão 18.0. Para a verificação da normalidade univariada e multivariada e para a Modelagem por Equações Estruturais (MEE), utilizou-se o programa Amos 18.0. O cálculo da Confiabilidade Composta (CC) foi realizado com os parâmetros estimados no programa Amos 18. Os seguintes procedimentos de análise foram utilizados:

 

Análise exploratória dos dados

Na análise exploratória dos dados foram excluídos sete questionários (1,6%) que apresentavam dados omissos em algum dos itens das escalas. Em seguida, os dados foram submetidos à verificação de pressupostos para uso do método Maximum Likelihood na MEE. Conforme as recomendações de Weston, Gore, Chan, e Catalano (2008), primeiramente foi verificado o pressuposto de normalidade univariada por inspeção de assimetria e curtose dos itens. A distribuição de um item é considerada não normal se os valores absolutos de assimetria e curtose forem superiores a 2,0 (Miles & Shevlin, 2001). Posteriormente, a normalidade multivariada dos itens foi verificada usando o coeficiente de curtose multivariada de Mardia (1970).

Modelagem por Equações Estruturais (MEE)

Como primeiro passo da MME, três modelos de mensuração foram analisados: 1. um modelo para a ECFC com seis fatores de primeira ordem e um fator geral de segunda ordem; 2. um modelo para a ECDC com três fatores de primeira ordem e um fator geral de segunda ordem; e 3. um modelo para a EST com cinco fatores de primeira ordem e um fator geral de segunda ordem. A decisão de analisar os três modelos com um fator de segunda ordem, diferentemente da estrutura original proposta para as escalas (Bruno-Faria &&Veiga, no prelo; Siqueira, 2008), foi baseada nos índices de correlação entre os fatores e na coerência de fatores gerais com os conceitos de condições para criar no trabalho e satisfação com o trabalho (Bruno-Faria & Alencar, 1998; Gondim & Siqueira, 2004; Siqueira, 2008). Além disso, Thompson (2004) argumenta que quando fatores de primeira ordem são correlacionados, fatores de segunda ordem precisam ser extraídos e interpretados, principalmente quando os fatores de primeira ordem são fatores relativamente específicos. Para o autor, as análises hierárquicas oferecem informações adicionais.

Na MEE, utilizou-se o método Maximum Likelihood, e os seguintes índices recomendados por Byrne (2005) foram empregados para avaliar o ajuste dos modelos aos dados: o qui-quadrado (χ2) acompanhado dos graus de liberdade (gl), o Comparative Fit Index (CFI), o Root Mean Square Error of Approximation (RMSEA) com o intervalo de confiança de 90% e o Standardized Root Mean Square Residual (SRMR). A interpretação dos índices de ajuste foi baseada nos critérios sugeridos por Weston et al. (2008), que recomendam os seguintes valores para um bom ajuste: CFI=0,95, RMSEA≤0,06 e SRMR≤0,08.

Foram levados em consideração os índices de modificação fornecidos pelo programa Amos, porém optou-se por não incluir correlações entre termos de erros dos itens, uma vez que erros são teoricamente aleatórios. Segundo Byrne (2010), a única situação em que uma correlação entre os erros de itens faz sentido é quando os conteúdos desses itens são muito semelhantes. Dessa forma, com base nos índices de modificações, optou-se por excluir do modelo um dos itens com conteúdos considerados parecidos (o item com menor carga fatorial), tornando, assim, o modelo mais parcimonioso. Portanto, em vez de incluir correlações entre os erros de itens, optou-se pela exclusão de itens para melhorar o ajuste dos modelos iniciais aos dados. É importante ressaltar aqui que, depois de realizar as modificações no modelo original, deixa-se de trabalhar no modo confirmatório e começa-se a trabalhar no modo exploratório (Byrne, 2005). Dessa forma, os resultados das análises obtidos neste estudo precisam ser confirmados em outras pesquisas.

Em seguida, procedeu-se à análise do modelo estrutural, inicialmente pela análise do modelo path (modelo de caminhos), seguido do modelo estrutural completo (full structural model). Os modelos de mensuração, o modelo path e o modelo estrutural completo foram avaliados separadamente, seguindo as recomendações do McDonald e Ho (2002). Os autores justificam essa estratégia observando que assim é possível identificar eventuais fontes de mau ajuste.

Análise de fidedignidade

A fidedignidade foi avaliada para cada fator separadamente utilizando a CC (Hair, Blach, Babin, & Anderson, 2009). A CC é um índice de fidedignidade que normalmente é utilizado no contexto de MEE (Peterson & Kim, 2013). As cargas fatoriais dos itens são consideradas no cálculo da CC.

 

Resultados

Análise exploratória dos dados

A inspeção da assimetria e curtose dos itens revelou que nenhum dos itens das três escalas mostrou um valor da assimetria e curtose maior do que |2|, indicando que não houve um problema relevante de normalidade univariada (Miles & Shevlin, 2001). Quanto à normalidade multivariada, foram encontrados os seguintes valores de curtose multivariada de Mardia: 239,01 (p<0,05) para a ECFC; 63,19 (p<0,05) para a ECDC; e 136,77 (p<0,05) para a EST. Nenhuma das três escalas satisfez o pressuposto de normalidade multivariada do método de Maximum Likelihood utilizado neste estudo. Assim, optou-se pela realização da técnica de bootstrap com 500 amostras para verificar o efeito da não normalidade na estimação dos parâmetros dos modelos finais (Byrne, 2010).

Modelos de mensuração

Os três modelos iniciais de mensuração apresentaram CFI insatisfatórios, com valores abaixo de 0,95, conforme mostrado na Tabela 1. Para a EST, o RMSEA e o SRMR também não foram indicativos de um bom ajuste.

Depois da exclusão de itens, os CFI dos três modelos de mensuração indicaram um ajuste satisfatório. Os índices RMSEA e SRMR do modelo final da EST também indicaram um ajuste satisfatório, com valores de 0,059 e 0,045, respectivamente. Ressalta-se que os modelos de mensuração inicial e final da ECDC não contêm um fator de segunda ordem devido à baixa correlação (r=0,17) entre dois dos três fatores da escala. Para definir um fator de segunda ordem, são necessários pelo menos três fatores correlacionados de primeira ordem (Thompson, 2004).

 

 

As Tabelas 2, 3 e 4 apresentam a descrição dos itens, as cargas fatoriais e a fidedignidade dos fatores de cada modelo de mensuração. Todas as cargas fatoriais dos três modelos mostraram significância estatística (p<0,05). No geral, as cargas fatoriais foram altas: no modelo da ECFC, 84% das cargas apresentaram valores acima de 0,60; no modelo da ECDC essa percentagem foi 82,4%; e, no modelo da EST, todas as cargas fatoriais ficaram acima de 0,60.

 

 

Os fatores da ECFC mostraram valores de CC entre 0,71 e 0,90, com um valor médio de 0,81. Em relação à ECDC, observaram-se os seguintes valores de confiabilidade 0,78, 0,83 e 0,86, com um valor médio de 0,82. Por fim, a confiabilidade dos fatores da EST variou entre 0,76 e 0,92, com média de 0,87.

As cargas fatoriais dos modelos hierárquicos mostraram que a relação entre os fatores de primeira ordem com o fator geral de segunda ordem era forte. No caso da escala ECFC, o fator Liberdade de ação apresentou a maior relação com o fator geral, enquanto o fator Características do ambiente físico, a menor. No modelo da EST o fator de maior relação à Satisfação geral foi Satisfação com as promoções, e o com menor foi Satisfação com o salário.

O uso da técnica de bootstrap mostrou que as estimativas das cargas fatoriais praticamente não foram afetadas pelas distribuições não normais dos dados no presente estudo. A diferença entre a estimativa da carga fatorial pelo Maximum Likelihood e a média das estimativas da técnica bootstrap (bias) para os três modelos variou entre 0,000 e 0,007. Seguindo as recomendações de Byrne (2010), foram comparados os valores dos erros padrão das estimativas bootstrap e Maximum Likelihood. Os valores dos erros padrão das estimativas bootstrap não foram maiores do que os erros padrões obtidos com o Maximum Likelihood, conforme esperado.

 

 

 

Relação entre condições para a criatividade e satisfação com o trabalho

Depois da análise dos três modelos de mensuração, foi avaliado o path model, em que foram incluídos os fatores de primeira ordem das três escalas como variáveis observadas e os fatores de segunda ordem como variáveis latentes. Esse modelo demonstrou um ajuste muito insatisfatório e baixo valores de covariância entre os fatores de ECDC e EST. Assim, foi desenvolvido e avaliado um modelo alternativo, sem os fatores da ECDC, que demonstrou melhores índices de ajustes, porém com necessidade de modificações. As modificações foram realizadas com um procedimento semelhante ao adotado nos modelos de mensuração.

Depois dessa fase, foi desenvolvido e avaliado o modelo estrutural completo das relações entre os fatores relacionados com as condições favoráveis para criar no trabalho e os fatores relacionados à satisfação com o trabalho. No modelo estrutural completo foram incluídos os itens de cada fator como variáveis observadas e os fatores de primeira e segunda ordem como variáveis latentes. O modelo completo está representado na Figura 1.

 

 

No modelo estrutural completo, o fator geral da ECFC foi relacionado por uma seta unidirecional ao fator geral de EST. Assim, no modelo, as condições favoráveis à criatividade é preditiva da satisfação no trabalho. O modelo estrutural completo mostrou bons índices de ajuste: o CFI foi de 0,97; o SRMR, de 0,044; e o RMSEA, de 0,044. O χ2 foi 312,8, com 182 graus de liberdade.

Considerando-se que o modelo final foi bem ajustado, pode-se concluir que existe uma forte relação entre condições favoráveis à criatividade (Apoio a novas ideias, Suporte do gerente imediato e Liberdade de ação) e satisfação com o trabalho (Satisfação com os colegas, Satisfação com as promoções e Satisfação com a natureza do trabalho).

 

Discussão

A MEE demonstrou que a ECFC e a EST podem ser estruturadas pelos fatores de primeira ordem e um fator de segunda ordem. Os estudos originais das escalas (Bruno-Faria & Veiga, 2013; Siqueira, 2008) não propuseram fatores de segunda ordem, porém os elevados índices de correlação entre os fatores das escalas sugeriram a possibilidade de um modelo de mensuração hierárquica.

As condições para criatividade foram definidas como um conjunto de variáveis ambientais que favorecem ou inibem a criatividade, de forma que a análise tanto das diferentes condições do ambiente de trabalho como do conjunto dessas condições a partir de um fator geral é coerente à definição proposta. Da mesma forma, a satisfação com o trabalho pode ser compreendida como um construto geral e também multidimensional (Roelen et al., 2008). Assim, a possibilidade de extração de fatores de segunda ordem provém um acréscimo aos instrumentos de medida de forma a permitir tanto a análise de fatores específicos quanto do construto geral. Thompson (2004) considera que fatores de segunda ordem oferecem uma perspectiva mais geral e ampla dos dados e complementam a análise dos fatores de primeira ordem.

A baixa correlação entre os fatores Atuação inadequada do gerente e Excesso de serviço e escassez de tempo da ECDC não permitiu um fator de segunda ordem. Além disso, o fato de o instrumento avaliar apenas três aspectos do ambiente desfavoráveis à expressão criativa pode ter impossibilitado a formação de um fator geral, visto que a literatura também aponta outros aspectos do ambiente de trabalho que inibem a criatividade (Alencar, 2011).

Foi necessário realizar modificações em relação ao instrumento original para as três escalas, e itens foram excluídos do modelo original. Segundo Pilati e Laros (2007), o processo de modificação é possível em pesquisas de MEE, desde que essas alterações não sejam exclusivamente baseadas nos índices de modificação. A exclusão dos itens nos três modelos de mensuração do presente estudo ajudou a tornar os modelos mais parcimoniosos e não alterou substancialmente a consistência interna dos fatores de primeira ordem. Larwin e Harvey (2012) propõem o uso de MEE para reduzir o número de itens de uma escala e apontam que na MEE a estrutura do modelo é considerada, e não apenas os valores da carga fatorial, como ocorre na análise fatorial exploratória. Ressalta-se que os mesmos fatores dos instrumentos originais foram mantidos, apenas com acréscimo do fator de segunda ordem.

No modelo estrutural completo não entrou nenhum dos fatores da ECDC, aparentemente na modelagem da relação entre criatividade e satisfação no trabalho os fatores desfavoráveis à criatividade não acrescentaram informação adicional além da informação fornecida pelos os fatores favoráveis à criatividade. Considera-se que ambientes não propícios à criatividade não necessariamente levam à insatisfação com o trabalho, de forma que outras características do trabalho podem funcionar como elementos de compensação. Tal aspecto precisaria ser melhor compreendido, visto que na literatura são apontados principalmente aspectos do ambiente que contribuem para a satisfação com o trabalho (Berg & Hallberg, 1999; Kim et al., 2009; Koberg & Chusmir, 1987; Valentine et al., 2011). Como foram participantes de uma mesma empresa que responderam às três escalas, é possível que as características da empresa e a natureza do trabalho desenvolvido possam ter influenciado esse resultado.

Apenas três dos cinco fatores de EST entraram no modelo estrutural completo. O fato de o fator Satisfação com o salário não ter entrado no modelo pode ser explicado pela relação relativamente fraca desse fator ao fator geral. Uma possível razão do fator Satisfação com a chefia não ter sido incluído no modelo final pode ser atribuída ao fator ter sido mensurado por apenas dois indicadores. Por outro lado, a forte associação entre Satisfação com o salário e Satisfação com as promoções e entre Satisfação com a chefia e Satisfação com os colegas podem indicar certa semelhança entre os fatores, o que pode justificar a exclusão de um dos fatores do modelo. Da mesma forma, apenas três dos seis fatores da ECFC entraram no modelo final. A razão pela qual o fator Características do ambiente físico não entrou no modelo final pode ser a relação fraca desse fator ao fator geral. Dessa forma, seria possível inferir que as condições do ambiente físico podem ter um impacto menor na expressão criativa, mas considerando que os participantes eram da mesma empresa, tal suposição não é possível. A exclusão dos fatores Clima entre colegas de trabalho e Atividades desafiantes do modelo final pode ser devida à forte relação entre esses fatores e os fatores Suporte do gerente imediato e Liberdade de ação, respectivamente. Também pode ser atribuída à sua menor relação ao fator geral.

Identificou-se que as condições favoráveis à criatividade foram positivamente relacionadas à satisfação no trabalho dos pesquisadores. Tais resultados são coerentes aos resultados encontrados na literatura em outros contextos organizacionais e com outros profissionais (Shalley et al., 2000; Valentine et al., 2011). Além disso, tais resultados contribuem para reforçar as evidências de que ambientes favoráveis à criatividade, além de estimularem o desenvolvimento de processos criativos e de inovação nas empresas, aspectos essenciais para o trabalho de pesquisadores, podem aumentar a satisfação com o trabalho.

Enfim, os resultados mostraram que, na presença de condições favoráveis à criatividade, os pesquisadores sentiam-se mais satisfeitos no trabalho. A hipótese deste estudo foi confirmada, pois se identificou que as condições ambientais no trabalho favoráveis para a criatividade promovem a satisfação no trabalho dos profissionais. À medida que a organização investe em condições para criar no trabalho, ela promove satisfação no trabalho em aspectos fundamentais para esses profissionais, como a satisfação com a natureza do trabalho, com colegas e com as promoções.

O estudo também demonstrou que a estrutura fatorial original das escalas se manteve mesmo com um número reduzido de itens no primeiro nível hierárquico, além disso, introduziu os fatores de segunda ordem, como possibilidades de medidas gerais dos construtos. Thompson (2004) considera que muitos construtos psicológicos são multifacetados, o que torna soluções fatoriais hierárquicas mais adequadas.

Ressalta-se que, no presente estudo, o modelo da relação entre condições para criatividade e satisfação no trabalho foi desenvolvido por meio de MEE. Assim, a técnica de MEE foi utilizada de maneira exploratória em vez de confirmatória (Byrne, 2005; DiStefano & Hess, 2005). Dessa forma, o modelo desenvolvido precisa ser confirmado em estudos futuros. Além disso, estudos futuros precisam ser realizados buscando uma melhor compreensão da relação entre condições desfavoráveis à criatividade no trabalho e satisfação com o trabalho.

 

Referências

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recebido em junho de 2014
reformulado em outubro de 2014
aprovado em dezembro de 2014

 

 

Sobre os autores

Giovana Zappalá Porcaro Sousa: é Mestre em Psicologia pela Universidade Católica de Brasília.
Cláudia Cristina Fukuda: é Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília. Professora do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade Católica de Brasília.
Jacob Arie Laros: é Doutor em Personality and Educational Psychology pela University of Groningen, com estágio pós-doutoral pela University of Groningen e pela Universidad de Valencia. Professor do Programa de Pós-graduação em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações da Universidade de Brasília.


1Endereço para correspondência: SHIN QL 07, Conjunto 07, Casa 15, Lago Norte, 70515-075, Brasília-DF. Tel.: (61) 9978-2416 / 3448 7204. E-mail: fukuda@ucb.br


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