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Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.15 no.2 Itatiba Aug. 2016

 

 

Bender-Sistema de Pontuação Gradual: uma comparação por idade, ano escolar e sexo em crianças baianas

 

Bender Graded Scoring System: A comparison by age, school year and sex in Bahia children

 

Bender-Sistema de Puntuación Gradual: una comparación por edad, año escolar y sexo en los niños da Bahía

 

 

Adriana Cristina Boulhoça Suehiro1; Neméia Aiêxa Cardim

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

 

 


RESUMO

Este estudo buscou descrever o desenvolvimento perceptomotor de estudantes baianos, tal qual avaliado pelo Bender-Sistema de Pontuação Gradual, e explorar eventuais diferenças por idade, ano escolar e sexo. Participaram 388 escolares, ambos os sexos, entre 7 e 10 anos (M=8,94; DP=0,9), do segundo ao quinto ano do Ensino Fundamental de escolas públicas do interior da Bahia. Os resultados indicaram que 206 discentes apresentaram dificuldades na reprodução das figuras e, portanto, um desenvolvimento perceptomotor comprometido. Os estudantes em anos escolares mais avançados e mais velhos obtiveram melhores desempenhos no B-SPG do que os em anos escolares iniciais e mais novos. Embora os meninos tenham apresentado menos distorções no teste, não houve diferença significativa entre os sexos. Esses resultados são congruentes com os de outros estudos e apontam para a importância de que novas investigações sobre o tema sejam realizadas, especialmente em regiões ainda pouco investigadas.

Palavras-chave: avaliação psicológica; teste gestáltico de Bender; ensino fundamental.


ABSTRACT

This study aimed to describe the perceptomotor development of Bahian students, as evaluated by Bender–Gradual Scoring System (B-SPG), and to explore differences related to age, school year and gender among the participants. The sample was composed of 388 school children, of both sexes, between 7 and 10 years of age (M=8.94, SD=0.9), from 2nd to 5th grade in inner city public schools in the state of of Bahia. The results indicated that 206 students had difficulties reproducing figures and therefore an impaired perceptomotor development. Older students and those in later school years had better B-SPG performance tan younger students or those in the lower grades. Although the boys experienced less distortion in the test, there was no significant difference between the sexes. These results are consistent with other studies and point to the importance of further research on the subject, especially in poorly investigated regions.

Keywords: psychological assessment; Bender Gestalt test; elementary education.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo describir el desarrollo perceptomotor de los estudiantes de Bahía, como se evalúa por Bender- Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG), y explorar las diferencias entre ellos por edad, sexo y año escolar. Participaron 388 niños en edad escolar, de ambos sexos, entre 7 y 10 años (M=8,94, SD=0,9), el segundo al quinto año de educación primaria en escuelas públicas en una ciudad en el interior de Bahía. Los resultados indicaron que 206 estudiantes tenían dificultades para reproducir figuras y por lo tanto un desarrollo perceptomotor deteriorada. Los estudiantes en los años escolares posteriores y mayores tuvieron mejores actuaciones en la B-SPG que en los primeros años escolares y más jóvenes. Aunque los niños han experimentado una menor distorsión en la prueba, no hubo diferencia significativa entre los sexos. Estos resultados son consistentes con otros estudios y apuntan a la importancia de la investigación sobre el tema se llevan a cabo, especialmente en las regiones escasamente investigados.

Palabras-clave: evaluación psicológica; test de bender-gestalt; enseñanza de primer grado.


 

 

O Teste Gestáltico Visomotor de Bender está entre os instrumentos mais utilizados na avaliação psicológica, tanto no contexto clínico, quanto no escolar/ educacional (Noronha, Primi, & Alchieri, 2005; Oliveira et al., 2007; Santos, Anache, & Santana, 2015; Souza Filho, Belo, & Gouveia, 2006; Suehiro, Gaino, & Meirelles, 2012; Suehiro & Rueda, 2009). A habilidade perceptomotora ou visomotora, avaliada pelo teste demanda alguns princípios da gestalt que regem a forma de o sujeito perceber os estímulos visuais apresentados nas nove figuras que o compõem, quais sejam, fechamento, proximidade e continuidade. Tais princípios são formas primitivas da experiência, biologicamente determinados por um padrão sensório motor de ação e apresentam um caráter evolutivo (Bender, 1955; Sisto, Noronha, & Santos, 2005). Vários estudos que foram realizados com base no Bender-Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG – Sisto et al., 2005), não apenas têm confirmado o caráter evolutivo proposto por Bender em 1955, mas apontado diferenças no desempenho de seus respondentes no que diz respeito a diversas variáveis contextuais, tais como sexo, ano escolar, natureza jurídica da instituição e estado. Considerando o exposto, algumas das pesquisas mais recentes com o instrumento serão brevemente descritas a seguir.

A pesquisa realizada por Luca (2011), com 231 crianças de 5 a 11 anos, do 1º ao 5º ano do ensino fundamental de escolas públicas e particulares de uma cidade do estado da Paraíba, por exemplo, corrobora essa afirmativa no que concerne a algumas das variáveis contextuais anteriormente referidas. Os estudantes avaliados pela autora obtiveram uma média de 8,9 (DP=4,97) erros no B-SPG, com uma variação mínima de 0 e máxima de 21 pontos. Considerando que a pontuação máxima possível para o B-SPG é 21 pontos e que o ponto médio do instrumento é 10,5 pontos, bem como que o Bender pontua erros e, portanto, quanto maior é a pontuação, pior é o desempenho, a pontuação média obtida pela amostra pesquisada ficou abaixo da média, o que indicou, de maneira geral, um bom desempenho no teste. No que concerne ao sexo, não houve diferença significativa entre meninos e meninas, embora elas tenham apresentado maior número de erros. Também não foram encontradas diferenças ao se comparar o desempenho da amostra paraibana com as apresentadas no manual, no entanto as médias de erros de estudantes de escola pública foram significativamente maiores, quando comparadas aos de escola particular. Já no que concerne ao caráter maturacional da habilidade perceptomotora, os dados apontaram para uma melhora na execução das figuras com o aumento da idade e com o avançar dos anos escolares, demonstrando menor pontuação nos alunos mais velhos e nas séries mais avançadas.

Pinto (2011), ao comparar crianças mineiras com a amostra normativa, também verificou diferenças entre as pontuações no teste e variáveis contextuais como a idade e a escolaridade. A autora avaliou 298 crianças, ambos os sexos, com idades variando de 6 a 10 anos, cursando do 1º ao 5º ano de escolas públicas e particulares. A média obtida no B-SPG foi 9,35 erros (DP=4,22), variando de 0 a 20 pontos. A autora não identificou diferenças no desempenho entre meninas e meninos e entre estudantes de escola pública e particular, embora, em ambos os casos, os primeiros tenham apresentado um número maior de erros. Do mesmo modo, verificou que não houve diferenças significativas entre a amostra mineira e o grupo normativo, exceto para os meninos de 7 anos e as meninas de 10 anos. No que concerne à idade, o B-SPG se mostrou capaz de diferenciar as crianças em grupos de 6 e 7, 8 e 9/10 anos, mostrando uma diminuição significativa das médias obtidas à medida que as idades aumentavam. O mesmo ocorreu em relação à escolaridade, havendo a formação de três subconjuntos, sendo um grupo para 1º e 2º ano, outro para 2º e 3º e um terceiro grupo para 4º e 5º ano.

Semelhantemente, Carvalho, Noronha, Pinto, e Luca (2012), verificaram que, à medida que a idade e a escolaridade das 297 crianças, entre 7 e 10 anos, do 2º ao 5º ano de escolas, públicas e particulares, do interior do estado de São Paulo, de sua investigação avançaram, ocorreu uma diminuição nas médias de erros obtidas no B-SPG. Tais resultados, confirmam o aspecto maturacional avaliado pelo teste e caminham no mesmo sentido dos achados de Pinto e Noronha (2013) e Suehiro, Santos e Rueda (2015), também desenvolvidos com crianças do interior de São Paulo.

O estudo de Pinto e Noronha (2013) foi desenvolvido com 361 alunos, de ambos os sexos, entre 6 e 10 anos, do 1º ao 5º ano do ensino fundamental de escolas públicas e privadas. A pontuação média obtida pela amostra foi de 8,32 erros (DP=5,31), portanto, abaixo do ponto médio do instrumento, o que indica um bom desempenho dos participantes no teste. A comparação por idade mostrou que as distorções diminuíram com o aumento da idade, embora os dois grupos iniciais, de 7/8 anos e de 9/10 anos, tenham ficado congregados em grupos únicos, diferenciando-se do de 6 anos. As autoras também verificaram que, assim como para as crianças mais novas, para o 1º ano houve uma diferença significativa maturacional da percepção visomotora em relação aos anos mais avançados. Nesse sentido, observaram três subconjuntos para os anos escolares em relação às pontuações do B-SPG, sendo um grupo para o 1º ano, outro para o 2º e 3º ano e um terceiro grupo para 4º e 5º ano.

Por fim, mais recentemente, as 199 crianças de 7 a 10 anos, do 2º ao 5º ano do Ensino Fundamental pesquisadas por Suehiro, Rueda, e Silva (2015) apresentam um desenvolvimento perceptomotor considerado adequado, uma vez que sua pontuação média (M=9,51; DP=3,77) ficou levemente abaixo do ponto médio do instrumento que é 10,5 pontos. Ao lado disso, conforme esperado, evidenciaram um aumento gradual e significativo em seu desempenho em função da sua idade, uma vez que as crianças de 7 anos obtiveram pontuações maiores que as de 8, 9 e 10 anos, respectivamente, apesar da não diferenciação das quatro idades estudadas. As crianças de 7 e 8 anos ficaram congregadas em um agrupamento, enquanto as de 9 e 10 ficaram em outro.

Esses resultados, assim como outros que têm apontado para diferenças no desempenho no B-SPG em função de diversas variáveis contextuais, bem como os achados de vários outros estudos que têm confirmado sua sensibilidade para captar, não apenas a maturidade perceptomotora, mas outras habilidades específicas a ela associadas, tais como a leitura, a escrita e a inteligência, em diferentes amostras (Bartholomeu, Cecato, Montiel, Machado, & Sisto, 2012; Carvalho et al., 2012; Luca, 2011; Noronha, Santos, & Rueda, 2013; Pacanaro, Santos & Suehiro, 2008; Pinto, 2011; Rueda, Santos, Noronha ,& Segovia, 2013; Santos, Noronha, Rueda, & Segovia, 2014; Suehiro, Rueda, & Silva, 2007; Vendemiatto, Santos, & Suehiro, 2008), ressaltam a necessidade de novas pesquisas com o instrumento, especialmente em localidades nas quais essas questões foram ainda pouco exploradas.

Logo, o presente estudo se justifica não apenas pela necessidade de se conhecer a maturidade perceptomotora de uma amostra ainda não contemplada pelas pesquisas empreendidas com o B-SPG, ampliando territorialmente e quantitativamente o corpo de trabalhos com o instrumento, mas, sobretudo, por possibilitar a partir desse alcance da técnica, intervenções mais adequadas as diferentes realidades do Brasil e que possam minimizar os problemas detectados, uma vez que uma maturação perceptomotora adequada facilita o processo de aprendizagem, atuando, não apenas como um componente relevante para a evolução das habilidades acadêmicas, mas também para um bom desempenho escolar (Beery & Beery, 2010; Bender, 1955; Bonomo & Rossetti, 2010; Noronha, Rueda, & Santos, 2013; Pereira, 2012; Pinto & Noronha, 2010; Silva, 2008; Silva & Nunes, 2007; Sisto, Santos, & Noronha, 2010; Suehiro, 2008).

Diante do exposto, buscou-se, nesta pesquisa, descrever o desenvolvimento perceptomotor de estudantes baianos de ensino fundamental, de uma cidade do interior da Bahia, tal qual avaliado pelo Bender-Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG). Ao lado disso, pretendeu- -se identificar eventuais diferenças entre os escolares avaliados quanto a idade, ano escolar e sexo.

 

Método

Participantes

Participaram deste estudo 388 crianças, ambos os sexos, entre 7 e 10 anos (M=8,94; DP=0,9), do segundo ao quinto ano do Ensino Fundamental de escolas públicas de uma cidade do Recôncavo da Bahia. Do total da amostra, 85 crianças (21,9%) frequentavam o segundo ano, 131 (33,8%) o terceiro, 102 (26,3%) o quarto e 70 (18,0%) o quinto ano, sendo a maioria do sexo feminino (n=202; 52,1%).

Instrumentos

Questões de identificação – Os sujeitos informaram, na mesma folha do Teste Gestáltico Visomotor de Bender, os seguintes aspectos: nome, idade, sexo e ano escolar ao qual pertenciam.

Teste Gestáltico Visomotor de Bender – Consiste de nove figuras (A, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8), desenhadas em transparência, para serem copiadas em uma folha em branco, sem qualquer tipo de auxílio mecânico. Conforme o Bender – Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG), desenvolvido por Sisto et al. (2005), foi atribuída uma pontuação gradual a cada item, conforme a presença de desvios em cada uma das figuras do Teste Gestáltico Visomotor de Bender. No caso da falta de percepção de desvios relacionados à distorção da forma, não foi atribuído ponto algum e à medida que os desvios apareceram, dependendo da severidade do erro cometido, atribuiu-se de um a três pontos para a figura 6 e de um a dois pontos para as demais figuras, totalizando 21 pontos possíveis. Portanto, é importante ressaltar que o B-SPG pontua erros e que, quanto maior é a pontuação obtida, pior é o desempenho da criança.

Dentre os diversos estudos de evidência de validade para o B-SPG, conforme descrito em seu manual, pode-se destacar o realizado com base em mudanças no desenvolvimento. As análises foram realizadas com base nos protocolos de 1052 crianças, ambos os sexos, entre 6 e 10 anos, de pré-escola a quarta série (atual quinto ano) do ensino fundamental de oito escolas públicas da região de Campinas. Os resultados evidenciaram correlações de -0,58 (p<0,001) e -0,60 (p<0,001) entre a idade dos participantes e a pontuação obtida no B-SPG, bem como que houve diferença estatisticamente significativa entre as idades, sendo que, com o aumento da idade, houve uma diminuição progressiva das distorções de forma, demonstrando assim haver uma mudança desenvolvimental. O instrumento apresentou, ainda, bons índices nas análises para verificação da consistência interna (alfa de Cronbach 0,80; Spearman-Brown 0,77 e modelo Rasch 0,76), com valores altos para todos os participantes, independentemente de idade e sexo.

Procedimentos

Após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o questionário de identificação dos sujeitos e o Teste Gestáltico Visomotor de Bender foram aplicados, coletivamente, em horário de aula previamente cedido pelo professor, nas escolas que autorizaram a realização da pesquisa. As crianças foram submetidas, inicialmente, ao questionário de identificação do sujeito e, na sequência, foram solicitadas a copiarem da forma mais parecida possível as figuras que foram projetadas. Todo o procedimento planejado foi executado em 20 minutos.

Considerando-se os objetivos do estudo, bem como seu número de participantes, foram utilizadas provas de estatística descritiva e inferencial paramétricas. A análise paramétrica foi adotada por não se ter observado diferenças significativas em relação à não paramétrica e por se considerar, tal qual afirmado por Pestana e Gageiro (2014), que a amostra aqui investigada é suficiente para sua realização.

 

Resultados

A pontuação total média obtida pelos estudantes avaliados foi de 11,12 pontos (DP=4,96), sendo a pontuação mínima o e a máxima 21 erros. Do total da amostra, 53% (n=206) obtiveram 11 ou mais pontos, dos quais 11,9% (n=46) alcançaram 18 ou mais pontos e, portanto, uma grande quantidade de distorções no teste. Esses resultados sugerem que a maioria dos discentes avaliados está aquém do esperado para a etapa de escolarização na qual se encontram, não alcançando nem mesmo o ponto médio de pontuação do instrumento, que seria de 10,5 pontos. A Tabela 1 traz as estatísticas descritivas da amostra por idade.

 

 

Ao analisar os escores obtidos pelas crianças por idade, foram encontrados valores médios de 15,00 (DP=4,20), 13,32 (DP=4,27), 10,40 (DP=4,72) e 9,39 (DP=4,84), respectivamente para as idades de 7, 8, 9 e 10 anos. Foi possível verificar que as médias obtidas por idade foram diminuindo com a idade, o que corresponde à redução de erros ou distorções presentes nas reproduções das figuras do teste. Tal ocorrência também pode ser observada nos desempenhos representados pelos percentis, dispostos na Tabela 1.

Considerando-se os resultados relativos ao desempenho por idade anteriormente descritos, buscou- -se verificar se haveria diferença estatisticamente significativa entre os participantes em razão da variável idade. Para tanto, empregou-se a Análise de Variância (ANOVA). A ANOVA evidenciou diferenças significativas entre o desempenho no B-SPG ([F(3,384)=21,35; p<0,001]) e a idade dos estudantes. Os subgrupos formados pelo teste de Tukey estão dispostos na Tabela 2.

 

 

O teste de Tukey separou os participantes do estudo em dois grupos em termos de desempenho. O primeiro deles foi composto pelos estudantes de 9 e 10 anos e o segundo por alunos de 7 e 8 anos. Embora as quatro idades investigadas não tenham se diferenciado, é possível observar uma diminuição na quantidade de erros e, consequentemente, de distorções no teste com o aumento das idades. Tais resultados indicam, portanto, um incremento no desenvolvimento perceptomotor da amostra estudada em função do seu desenvolvimento maturacional.

Buscou-se ainda verificar se as pontuações obtidas no B-SPG sofreriam alterações ao se considerar variáveis como o ano escolar frequentado e o sexo dos estudantes. No primeiro caso, a análise realizada evidenciou diferenças significativas no desempenho dos alunos ([F (3,384)=29,68; p<0,001]), bem como que a média obtida pelos escolares do 2º ano foi maior que a dos de 3º, 4º e 5º ano, respectivamente. A Tabela 3 traz os resultados do teste de Tukey e as diferenças encontradas entre os anos escolares analisados.

 

 

Como pode ser observado na Tabela, os anos escolares se distribuíram em três subgrupos, sendo um grupo composto por estudantes do 4º e 5º ano, outro por escolares do 3º, e um por alunos do 2º ano. Embora 4º e 5º ano, tenham se agrupado, destaca-se que à medida que os anos escolares avançavam as médias obtidas no B-SPG diminuíam, o que traduz a redução das distorções das figuras do teste.

No que concerne ao sexo, apesar de os meninos terem apresentado uma média de erros menor (M=10,73), quando comparados às meninas (M=11,48), não houve diferença estatisticamente significativa entre eles (t=-1,43; p=0,142). Considerando que o manual do B-SPG traz interpretações para as idades de 7 e 10 anos por sexo, buscou-se verificar se neste estudo meninos e meninas de diferentes idades também apresentariam um desenvolvimento perceptomotor diferenciado. A Tabela 4 traz a comparação das pontuações obtidas pela amostra estudada de acordo com o sexo, por idade.

Ao se separar meninos e meninas e compará-los por idade, como evidenciado na Tabela 4, é possível observar que aos 7 anos as médias foram iguais para meninos e meninas e que somente a média obtida pelas meninas de 9 anos foi significativamente mais alta, quando comparada à dos meninos.

 

Discussão

O desenvolvimento perceptomotor, tal qual avaliado pelo B-SPG, tem sido alvo de diversas investigações que têm apontado sua sensibilidade para captar, tanto a maturidade perceptomotora, quanto habilidades específicas a ela associadas em diferentes amostras (Luca, 2011; Pacanaro, et al., 2008; Pinto, 2011; Rueda et al., 2013; Santos et al., 2014; Suehiro et al., 2007; Vendemiatto et al., 2008). No entanto, recentemente, apenas um artigo foi localizado considerando a região nordeste do país. Diante do exposto, o presente estudo teve como objetivo descrever o desenvolvimento perceptomotor de um grupo de estudantes baianos de ensino fundamental de uma cidade do interior da Bahia. Ao lado disso, pretendeu explorar eventuais diferenças entre eles no que se refere a idade, ano escolar e sexo.

O desempenho dos estudantes avaliados foi inferior ao ponto médio do instrumento, o que indicou que a amostra aqui pesquisada, com uma média de 10,68 erros, apresentou muitas distorções e, portanto, dificuldades na reprodução das figuras do teste. Dos 388 discentes avaliados, 206 obtiveram médias maiores que os 10,5 erros do ponto médio do B-SPG e 46 apresentaram 18 pontos ou mais, de um total de 21 erros possíveis. Sendo assim, os resultados aqui obtidos revelam um desempenho aquém do esperado e estão em dissonância com os obtidos por outros estudos que identificaram, médias abaixo do ponto médio da escala do B-SPG e, consequentemente, um bom desempenho por parte dos sujeitos examinados, tanto na região sudeste (Pinto, 2011; Pinto & Noronha, 2013; Suehiro et al. 2015), quanto na região nordeste do pais (Luca, 2011).

Essas diferenças poderiam ser explicadas pelas peculiaridades da amostra. É importante lembrar que a realidade aqui encontrada se diferencia um pouco da estudada na aplicação do Bender em crianças do Sudeste, como as avaliadas por Pinto e Noronha (2013), Carvalho et al. (2012) e Suehiro et al. (2015), e das crianças paraibanas analisadas por Luca (2011). A população desta pesquisa é oriunda exclusivamente de escola pública e situada no interior do estado da Bahia. Nesse sentido, variáveis como características socioeconômicas, culturais, níveis de estimulação, práticas educativas adotadas, entre outras poderiam ter contribuído para tais resultados. Sendo assim, faz-se necessário que mais estudos sejam produzidos, voltados para a população de outras regiões e do interior dos estados a fim de identificar, tanto as limitações do Bender quando aplicado neste contexto, quanto se de fato as diferenças encontradas entre elas são estatisticamente significativas e, consequentemente, as implicações da sua utilização em populações distintas. Essas pesquisas poderiam identificar a necessidade de normas específicas para essa nova realidade.

A análise realizada com base nos anos escolares mostrou uma diminuição da pontuação obtida no teste. Esses resultados evidenciaram que, conforme esperado, houve um incremento no desenvolvimento perceptomotor dos escolares com o avançar da escolaridade, refletido na queda progressiva do número de erros cometidos pelos estudantes no instrumento empregado. Tais achados estão em consonância com a literatura que tem observado que a medida que as crianças progridem nos anos escolares tendem a apresentar menos distorções no Bender (Carvalho et al., 2012; Luca, 2011; Pinto, 2011; Pinto & Noronha, 2013).

Do mesmo modo, tal qual esperado, o caráter maturacional no desenvolvimento perceptomotor preconizado por Bender (1955) foi corroborado. Os estudantes mais velhos da amostra obtiveram significativamente menos erros e, portanto, melhor desempenho do que os mais novos. Essa mesma tendência foi observada em diversos estudos realizados, tanto com crianças da região sudeste (Carvalho et al, 2012; Pinto, 2011; Pinto & Noronha, 2013; Suehiro et al., 2015), quanto na investigação empreendida por Luca (2011) em uma amostra de estudantes paraibanos. Destarte, mais uma vez, o B-SPG se mostrou capaz de diferenciar sujeitos em razão de sua escolaridade e idade, mostrando uma diminuição significativa das médias por eles obtidas à medida que os anos escolares e as idades aumentavam.

Outra variável contextual analisada foi o sexo. Resultados concernentes ao sexo não são unânimes na literatura, uma vez que há vários estudos menos recentes que apontam diferenças significativas no desempenho de meninos e meninas no B-SPG. Dentre os estudos mais recentes, diferentemente do observado por Pinto (2011), em crianças mineiras, e semelhantemente aos achados de Lucca (2011), com estudantes paraibanos, as meninas apresentaram uma tendência a mais dificuldades ou problemas relacionados ao desenvolvimento perceptomotor, tal como sugerido pela maior quantidade de distorções ou erros obtidos por elas no instrumento. Ao lado disso, há que se considerar o fato de que, diferentemente do apontado pelo manual, no qual as idades de 7 e 10 anos apresentam normas diferentes para meninos e meninas, foi possível observar que aqui aos 7 anos as médias foram iguais para ambos e que somente a média obtida pelas meninas de 9 anos foi significativamente mais alta, quando comparada à dos meninos.

Dadas as divergências em relação à literatura, ao manual e ao fato de a diferença aqui obtida poder ser atribuída ao acaso, novos estudos devem ser efetuados para que os resultados concernentes ao sexo possam ser, não apenas generalizados, mas investigados mais pormenorizadamente afim de se buscar compreender se o desempenho inferior observado reflete de fato uma dificuldade maior das meninas, ou diferenças de gênero no processamento da informação, tendo em vista que alguns estudos apontam que os meninos processam com maior facilidade estímulos como os demandados pelo Bender e isso justificaria o melhor desempenho por parte deles nas tarefas do teste.

Para além do já ressaltado, há que se sugerir que novas pesquisas busquem minimizar algumas das limitações deste estudo, considerando amostras mais representativas, de escolas de diferentes naturezas jurídicas, excluindo crianças com defasagens, e que comparem, não apenas diferentes cidades dentro da mesma região e estado, mas diversas regiões do país. Nesse sentido, considera-se que esta investigação se constituiu em um primeiro e importante passo para se conhecer a realidade local, já que pesquisas com populações diferentes das apresentadas no manual tendem a ampliar as possibilidades de uso do instrumento. Entretanto, ainda que suas análises estatísticas apresentem informações relevantes sobre uma amostra de uma localidade ainda pouco explorada, a comparação com outras cidades da região nordeste e de outras regiões como a contemplada pelo manual do instrumento se faz necessária. Estudos desse tipo poderão apontar, tal qual anteriormente referido, para o fato de que talvez o estado da Bahia e a região nordeste, por exemplo, exijam normas específicas que considerem a realidade neles vivenciada. Ao lado disso, tais estudos poderiam incluir outras medidas, tais como de controle da inteligência, leitura, escrita, problemas neuropsicológicos e situações adversas de desenvolvimento infantil a fim de verificar a relação desses construtos com o aqui estudado, e outros tipos de análise estatística como, por exemplo, a Análise Multivariada (MANOVA) para que diferentes variáveis possam ser analisadas simultaneamente. Ao considerar essas sugestões, essas investigações poderão contribuir, não apenas para a ampliação dos conhecimentos na área, mas, sobretudo, para o aprimoramento dos instrumentos e procedimentos técnicos empregados na avaliação psicológica e, como consequência, da prática profissional daqueles que atuam cotidianamente com essas crianças.

 

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recebido em agosto de 2015
1ª reformulação em fevereiro de 2016
2ª reformulação em março de 2016
aprovado em abril de 2016

 

 

Sobre as autoras

Adriana Cristina Boulhoça Suehiro é Psicóloga. Doutora em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco, pós-doutoramento em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp e docente da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Coordenadora do grupo de pesquisa do Laboratório de Instrumentação e Avaliação Psicológica da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (LABIAP).
Neméia Aiêxa Cardim: é Psicóloga. Membro do grupo de pesquisa do Laboratório de Instrumentação e Avaliação Psicológica da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (LABIAP).


1Endereço para correspondência: Avenida Carlos Amaral, 1015, Cajueiro, 44570-000, Santo Antônio de Jesus-BA. Tel.: (75) 3631-1113. E-mail: dricbs@yahoo.com.br


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