SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.17 issue1Validity evidence of the free will inventory for the brazilian population author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.17 no.1 Itatiba Jan. /Mar. 2018

http://dx.doi.org/10.15689/ap.2017.1701.ed 

EDITORIAL

 

Modelo latente para itens de escolha forçada

 

 

Destaquei, em editorial anterior (Avaliação Psicológica, v16, n2) que vieses de resposta são ameaças à validade e à precisão dos escores estimados por meio de itens do tipo Likert (cujas respostas recebem âncoras numéricas, por exemplo, de "1-discordo fortemente a 5-concordo fortemente"). Nesse contexto, pesquisadores têm se preocupado quando os participantes concordam indiscriminadamente com os itens (i.e., aquiescência), ou quando usam apenas as âncoras "concordo fortemente" e "discordo fortemente" (i.e., respostas extremas). Contudo, Ana Brown questionou o porquê de tanto espanto com esses padrões se, efetivamente, continuamos perguntando ao participante o quanto ele "concorda" com o item. Ou seja, o tipo de resposta da escala parece ser uma das próprias causas do viés de resposta. E se, em vez de controlá-lo por meio de técnicas estatísticas a posteriori, pudermos evitá-lo por meio do delineamento a priori do questionário? Essa é a proposta do uso de itens de escolha forçada ou de ranqueamento, que será abordada neste editorial.

No delineamento de escolha forçada, os itens de um questionário são apresentados em blocos. O respondente deve refletir sobre o quanto os itens descrevem adequadamente as suas características pessoais e, então, ordená-los, em cada bloco, do mais ao menos característico (ou frequente). Em cada bloco, é possível observar as preferências dos sujeitos por meio de comparações binárias (por exemplo, item A versus B, B versus C e, indutivamente, A versus C). Considerando que o examinando não pode "concordar fortemente" com (ou discordar de) todos os itens, em mesmo grau, não há respostas idiossincráticas ou extremas.

Itens de ranqueamento são tão antigos quanto o tipo Likert (Thurstone, 1931)No entanto, análises da teoria clássica para itens de escolha forçada produzem escores ipsatizados, isto é, ainda que os ranqueamentos para os itens sejam distintos entre os indivíduos, a soma dos escores totais será, sempre, igual para todos os participantes (Brown & Maydeu-Olivares, 2013).

Dados ipsatizados, sem nenhum tipo de tratamento, não são passíveis de análise por meio de modelagens latentes, uma vez que essas últimas exigem variabilidade entre indivíduos nos escores fatoriais. Além disso, as correlações com variáveis externas tendem a ser enviesadas, uma vez que as covariâncias devem apresentar soma igual a 0. Para contornar o problema dos escores ipsatizados, Brown e Maydeu-Olivares (Brown, 2016; Brown & Maydeu-Olivares, 2011, 2013) propuseram o modelo Teoria de Resposta ao Item Thurstoniano (TRI-T).

No modelo TRI-T, um dos aspectos centrais é a utilidade, cujo conceito, proposto por Thurstone, está relacionado ao afeto ou à motivação que o conteúdo do item elicia no sujeito. Nesse sentido, itens mais "úteis", que descrevem mais a percepção do sujeito, serão preferidos aos menos "úteis". Destaca-se que a utilidade não é observada diretamente, mas trata-se de uma variável latente, que explica os itens observados. Assim, a utilidade pode ser estimada por meio de modelos latentes.

Os parâmetros de utilidade, por sua vez, são explicados por dimensões latentes associados ao conteúdo descritivo (ou, simplesmente fatores). A Figura 1 contém um exemplo simples do modelo para um bloco de três itens e três fatores.

No exemplo, os itens A, B e C são explicados pelos fatores f1, f2 e f3, respectivamente. As preferências indicadas pelo respondente, nos quadrados, recebem códigos binários. Por exemplo, se o participante ordenou o item A como mais característico (isto é, identificou-se mais com o conteúdo do item A) do que o B, a comparação {A, B} recebe valor igual a 1 (caso o ranqueamento fosse inverso, o valor seria igual a 0). Tais comparações binárias (observadas) são explicadas pelas utilidades dos respectivos itens (ua e ub, por exemplo). Por isso, na Figura 1, existe uma seta explicativa de uma utilidade x em direção a todas as comparações (quadrados) realizadas com o item x. Portanto, toda a relação entre a comparação observada de itens (quadrados) e o fator de conteúdo (f) é mediada pelas utilidades (u) dos itens envolvidos na comparação.

Ressalto que a Figura 1 apresenta um modelo genérico e apenas ilustrativo. Tecnicamente, para ser identificado, o modelo necessitaria de, ao menos, três itens por fator, bem como a imposição de alguns constraints, tais como fixar como iguais as cargas de todas as comparações da mesma variável latente de utilidade (maiores detalhes técnicos podem ser consultados em (Brown, 2016; Brown & Maydeu-Olivares, 2011).

Minha intenção é apresentar, neste editorial, apenas a ideia geral desse recente modelo, que pode reduzir e evitar vieses de resposta em pesquisas de auto e heterorelato. Sugiro que o pesquisador interessado busque as referências citadas antes de planejar a sua pesquisa! Além disso, mais uma vez, ressalto a abertura da revista para receber manuscritos que utilizem métodos inovadores no controle de vieses de resposta.

Felipe Valentini

Editor Associado

 

Referências

Brown, A. (2016). Item Response Models for Forced-Choice Questionnaires: A Common Framework. Psychometrika, 81(1), 135-160. doi: 10.1007/s11336-014-9434-9        [ Links ]

Brown, A., & Maydeu-Olivares, A. (2011). Item Response Modeling of Forced-Choice Questionnaires. Educational and Psychological Measurement, 71(3), 460-502. doi: 10.1177/0013164410375112        [ Links ]

Brown, A., & Maydeu-Olivares, A. (2013). How IRT Can Solve Problems of Ipsative Data in Forced-Choice Questionnaires. Psychological Methods, 18(1), 36-52. doi: 10.1037/a0030641        [ Links ]

Thurstone, L. L. (1931). Rank order as a psychophysical method. Journal of Experimental Psychology, 14(3), 187-201. doi: 10.1037/h0070025        [ Links ]

Creative Commons License