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Psicologia em Revista

versão impressa ISSN 1677-1168

Psicol. rev. (Belo Horizonte) v.12 n.20 Belo Horizonte dez. 2006

 

ARTIGOS

 

O corpo como container da ciência

 

The body as container of science

 

 

Maria Rita de Oliveira Guimarães*

Rede de Saúde Mental de Belo Horizonte

 

 


RESUMO

O estatuto do corpo do homem atual mostra-o na condição de desmembrado, fragmentado como órgãos-reserva em disponibilidade para reposições, segundo os requerimentos do mundo técnico. O “humus” da humanidade não passa mais, necessariamente, pela palavra do pai, mas pela palavra do cientista. O corpo deve funcionar como deve, isto é, programar-se para a fecundação, ao mesmo tempo em que o dever ser mãe está garantido pelos direitos universais, direitos adquiridos por toda mulher desde sua condição de cidadã nos tempos modernos. Pelo pensamento de Heidegger, a questão da desumanização do mundo se coloca não exatamente sobre os dispositivos técnicos (sobre uma técnica, por exemplo, o congelamento dos óvulos) ou sobre uma “empreitada” qualquer (por exemplo, o biologismo), mas sobre uma disposição histórica de outra maneira mais profunda que modifica limites da natureza e os homens em utensílios..

Palavras-chave: Corpo, Técnica, Ciência moderna, Procriação medicamente assistida.


ABSTRACT

The statute of the modern human body shows it as a dismembered entity, fragmented into spare organs available for replacement, according to the requirements of the technical world. Mankind’s humus does not necessarily follow the father’s word, but the scientist’s. The body must function as it must, that is, program itself for fecundation, while the duty to be a mother is guaranteed. by universal rights, acquired by each woman since her condition as a citizen in modern times. According to Heidegger, the issue of de-humanization of the world does not concern exactly technical devices (a technique, for example, the freezing of ovules), or any given enterprise (for example, biologism), but ‘a deeper historical disposition that overcomes nature’s limits and changes men into utensils’.

Keywords: Body, Technique, Modern science, Medically assisted procreation.


 

 

O que a fisiologia e a química fisiológica podem investigar cientificamente no homem como organismo não é prova de que neste organismo, quer dizer, no corpo cientificamente explicado, descanse a essência do homem. (Heidegger, 1970)

 

Um absoluto estado técnico

A pergunta imemorial sobre a fatalidade humana revelada em seu nascer e morrer se presentifica, neste tempo contábil de fechamento de século e inauguração do terceiro milênio, travestida em resposta. Uma resposta em dupla perspectiva: ora comparece o horror ora comparece o fascínio.

Horror diante do futuro vivido e projetado na visão de uma besta nunca antes imaginada ou sonhada, que carrega cestos onde, por força de um cinematográfico realismo mágico, estão bebês advindos do congelado sono dos embriões humanos de última tecnologia. Uma besta sem precedentes chamada “mercado” é o piloto automático das pesquisas em torno da questão da procriação jorrando puro ouro no “teatro cirúrgico”, onde nasce o homem moderno.

Do lado do fascínio estão os que supõem, como sabemos, uma civilização aquém do mal-estar freudiano. Será o “melhor dos mundos”, como se pode ler na utopia na qual se prevê que – da origem a seu termo – o desenvolvimento fetal poderá ser realizado sem gestação, em uma espécie de incubadora. Seria um progresso ao qual nada poderia se opor. Em tais circunstâncias, a mulher alcançará, afinal, sua liberação, ainda que seu papel privilegiado como mãe cesse junto aos bebês.1 De sobra, esse progresso nos economizará distâncias lunares de tinta e papel, obrigados que somos a dar conta da desigualdade entre os sexos. A igualdade enfim conquistada!

De nova barbárie a vir, ou já instalada, ao inumano de suas práticas, correse o risco de, pelo menos no caso da medicina da reprodução, jogar fora o bebê com a água do banho, isto é, recusar em bloco as técnicas da Procriação Medicamente Assistida – PMA.2 Ter-se-ia que recordar os sonhos de tantos casais que se realizaram na maternidade e paternidade possibilitadas pela PMA da mesma forma como não se pode silenciar sobre os enormes benefícios resultantes do desenvolvimento nesse campo, nos aspectos referentes ao próprio desenvolvimento embrionário, à neonatologia e à pediatria.

Por outro lado, o entrelaçamento do mercado capitalista com a correspondente evacuação da subjetividade efetuada pela ciência culmina seu movimento de desintegração do conceito de experiência humana na Técnica. Esta se torna, portanto, a expressão direta do anonimato como marca do vínculo social de nossa época, da desfiliação sem Pátria, pátrio poder: o pater desaparece – ou quase – na figura da “criança generalizada”.

Há um outro modo por onde igualmente se revela que a desaparição do pai está “se realizando” sem que o “crime inútil”, como postulou Freud em Totem e tabu, se realize. O “humus” da humanidade não passa, na atualidade, necessariamente, pela palavra do pai, mas pela palavra do cientista. Dessa maneira, nascem muitas crianças com sêmen de um doador anônimo. Seja qual for a modalidade escolhida dentro do amplo espectro oferecido pela medicina da reprodução ao “fazer um filho”, podemos reconhecer, nos termos colocados, a presença de um imperativo, através da obscena aliança entre demanda e oferta. O enunciado superegóico é formulado sob tríplice ação verbal: “Querer, Poder, Fazer”. A ideologia voluntarista revela a vontade de gozo, desse objeto/criança que a ciência formalizada faz existir. O “desejo de filho”, como programação da ciência, é a colocação em ato – o mais “natural” –, isto é, a maneira de conceber a reprodução humana na perspectiva animal, já que tomam o corpo em sua dimensão meramente fisiológica, biológica e funcional (Pereña, s/d, p. 66).

Significa, portanto, uma impropriedade chamar a esse modo de reprodução de “artificial”, porque, como está afirmado, desconhece-se em tal procedimento a maternidade como nó estabelecido entre os registros psíquicos que opera como algo fecundante. O que é dizer a mesma coisa: a fecundação só pode ser pensada como efeito no corpo biológico – então afetado por uma conexão significante geradora da possibilidade da maternidade.

O inconsciente, estando desconsiderado pela ciência, dá passagem ao que podemos chamar l’effét-mére – homofonia que na língua francesa evoca o efêmero, efêmero no que desconhece do tempo subjetivo, tempo distante da contagem cronológica, resultante do desejo de filho. O corpo deve funcionar como deve, isto é, programar-se para a fecundação, ao mesmo tempo em que o dever ser mãe está garantido pelos direitos universais, direitos adquiridos por toda mulher desde sua condição de cidadã nos tempos modernos. O desejo de filho torna-se direito ao filho e, dessa forma, o desejo desaparece sob o programa de tecnologização, deixando espaço somente para a ordem superegóica da demanda, demanda de homogeneização do gozo. Se for um filho que faz falta à mulher, vamos repositivar sua falta, isto é, já temos embriões em estoques, para reposição.

Portanto, a criança ganhou estatuto de necessidade, seja a que custo for, incluindo, nesse custo, a própria constituição, por efeito perverso, de nova figura: embriões órfãos. Já que há certo abuso de linguagem em se expressar dessa maneira em relação aos embriões supranumerários, lembramos que “os pais”, por tampouco saberem como nomeá-los, usam o “isso”, o “ça” do idioma francês.

Constata-se o fato de que a ciência, em uma irmandade proveniente dos termos técnica e técnico, organizou a superpotência planetária, da qual o homem se encontra desenraizado. Deste modo, vale a pena indagar por qual inextrincável e inevitável fatalidade o homem, no mundo da Técnica, vê-se desenraizado de seu lugar, de seu mundo, da domesticidade de seu lar – e por que não? – de seu corpo, desmembrado, fragmentado e exilado de sua humanidade.

Seria esse inumano uma responsabilidade da Técnica, do desenvolvimento técnico dos procedimentos postos a serviço pela conquista científica? Seria, talvez, a instrumentalização do corpo humano? Quem o instrumentaliza: a ciência ou a técnica? Que diferença há entre os termos?

A extensão do trabalho não permitiria estabelecer os fundamentos e o exame da lógica mercadológica e suas relações com o corpo humano. Os limites do mesmo se propõem a demarcar, pelo pensamento de Heidegger, que a questão da desumanização do mundo se coloca não exatamente sobre os dispositivos técnicos (sobre uma técnica, por exemplo, o congelamento dos óvulos) ou sobre uma “empreitada” qualquer (por exemplo, o biologismo), mas “sobre uma disposição histórica de outra maneira mais profunda, que tende a metamorfosear sem limites a natureza e os homens em utensílios” (Heidegger, 1976).

 

Que tudo funcione, é o inquietante

Creio que, ao longo desse período histórico, o desejo do homem, longamente apalpado, anestesiado, adormecido pelos moralistas, domesticado por educadores, traído pelas academias, muito simplesmente refugiou-se, recalcou-se na paixão mais sutil, e também a mais cega, como nos mostra a história de Édipo, a paixão do saber. É essa que está tendo um andamento que ainda não deu sua última palavra. (Lacan, 1988, p. 388-38)

Uma ciência “cega”, cujo programa é aquele que traga luz onde sempre houve obscuridade, mas não, necessariamente, obscurantismo. A origem humana, sob sua ótica, está sem sombras. Tendo alcançado a “transparência do embrião” (Testart, 1988) e avançando sobre o genoma humano, mirou fundo nas covas da sexualidade, da origem e da morte. A transparência, como programa, é devidamente forjada em uma nomenclatura do instrumental técnico. A proximidade do vocabulário técnico com os órgãos humanos manifesta a complexidade das relações estabelecidas nos dois campos, a tal ponto que não nos fica esclarecido quando se trata de corpo humano ou de um instrumento. Uma descrição ilustra o embaraço.

Podemos detalhar o instrumental que permite medicalizar a procriação do homem moderno. Para começar, o receptáculo em que se verte a semente, cilindro largo como o polegar e longo como a mão, cuja considerável antecâmara está bordejada por uma franja vulvar. Este cálice destinado à oferenda viril é um negativo fálico ou um molde vaginal? Logo vem o tubo para misturar gametas frágil e comprido, carece de saliências O idioma inglês, o de Louise Brown,3 utiliza a mesma palavra tubo para designar a trompa uterina e a proveta. O tubo está situado no recinto cálido, ventre que, ademais, abriga a bebês prematuros. Quando acaba a epopéia das células destinadas à procriação, as compridas mãos do espéculo distendem o sexo feminino e o ovo é conduzido até o útero graças a um fino cateter que mima o largo meato do falo. O músculo delega na seringa sua função ejaculatória. Os instrumentos têm um signo comum: paredes delgadas e transparentes. O receptáculo, a proveta, a incubadora e o cateter somente são limites convencionais, desenhados no espaço ao redor de diversas cavidades também conhecidas como luzes. Os gérmens do humano macho e do humano fêmea transitam hoje por esses vasos de luz. O embrião também é transparente. (Testart, 1988, p. 21-22)

Aqui, pode-se compreender a proximidade dos termos Técnica e técnico e a impressionante solidariedade com as funções dos órgãos humanos. São utensílios-órgãos. Órgãos-próteses. Mas é exatamente esta a definição do que seja uma ferramenta, um utensílio: um prolongamento dos órgãos humanos, com maior ou menor “especialização”, uma prótese removível segundo as necessidades em jogo.

Será a isso que a crítica ao progresso se refere sob a expressão “instrumentalização do corpo?” A dúvida terá seu lugar, se sabemos que a definição de instrumento difere daquela usada para a ferramenta.

Um instrumento é uma possibilidade de medida, de mensuração das coisas e do mundo. Compasso e régua desenham o mundo com os traços que nele introduzem. Salienta-se que a categoria máquinas mereceria comentários do ponto de vista de seu uso, o que ultrapassa o interesse imediato do nosso exame.

Também nessas condições fica somente citado todo o conjunto de técnicas que, por estarem em toda a parte e porque são freqüentemente escondidas nos fins a que se permitem alcançar, estão, quase sempre, despercebidas. Daí que resulta mais fácil a identificação como técnicas aquelas que são visíveis como instrumentos, ferramentas e máquinas. “Mas, sobretudo, a Técnica moderna não é um utensílio e nada que tem que ver” (Heidegger, 1976).

 

A pergunta pela Técnica

Em seu texto “A pergunta pela Técnica” (Heidegger, 1985), o filósofo analisa a determinação instrumental e antropológica da técnica, enfatizando o caráter “inquietante” que tem o primeiro aspecto, que, aliás, se aplica à técnica moderna. Esta é, sem dúvidas, um meio para certos fins. Mas se isso é a razão de esforçarse o homem para colocar-se em relação à técnica, no manejo cada vez mais adequado dela, é o que o faz – o homem – ficar como um ser incansável em busca do domínio da técnica. Pode-se indagar se essa é uma prerrogativa do homem moderno, isto é, se no passado as relações entre o homem e a técnica estiveram marcadas por conceitos distintos dos atuais. Pelas mãos de Heidegger, pode-se chegar ao pensamento grego, no qual a palavra Técnica apresenta dois significados:

1- modo de produção;
2 - desvelamento.

Como modo de produção, a palavra Técnica, em grego, refere-se ao âmbito de atividade e do poético. Ao mesmo tempo, algo referido ao artesão e ao artista. Mas será necessário pensar no que expressava a palavra “produzir”, à maneira grega. Produzir pode ser pensado como fazer aparecer algo, isto é, avançar desde o não-presente até a presença de algo presente. O sair de uma flor ao florescer (Heidegger, 1985, p. 12) é uma produção ao modelo grego.

Como desvelamento, a técnica desvela aquilo que não se produz por si mesmo e que ainda não está adiante. Trata-se, nesse caso, de um conhecimento, de um saber (episteme). É uma terminologia que situa o saber, o conhecer em seu sentido mais amplo, como uma antecipação às regras de fabricação, mas não faz referência à fabricação. Essa é uma das distinções importantes que faz Heidegger.

Ainda que se deixe surpreender, Heidegger pergunta:

Onde nos extraviamos? Perguntamos pela técnica e agora chegamos juntos ao desvelar (desocultar). O que tem que ver a essência da técnica com o desvelar? Resposta: tudo. Pois no desvelar se funda todo o produzir. (Heidegger, 1985, p. 12)

No entanto, não é uma distância demasiado longa – da técnica tomada desde os gregos – até a técnica moderna? Por que argumentar desde essa distância? Não seria algo impensável para nossa época “motorizada”? O filósofo se explica tomando a técnica moderna como um retorno sobre a primeira, isto é, sobre aquela pensada pelos gregos. Entretanto, uma importante diferença entre elas se nota e está localizada, em sua raiz, no modo de “desvelamento” da técnica moderna.

Que característica possui a técnica moderna em seu modo de “desvelamento” (desocultamento)? Em que seu desvelar se difere do desvelar do pensamento grego?

A palavra-chave é “provocação”. “O desocultar que impera na técnica moderna é um provocar (Herausfordern) que exige à natureza fornecer energia que como tal pode ser extraída e armazenada.” (Heidegger, 1985, p. 12).

É o mesmo rio Reno que foi homenageado por Hölderlin com o hino “O Reno na obra de Arte” e o Reno que contém uma central hidroelétrica? Devido à hidroelétrica, sua corrente se desvia, ela é requisitada para que leve sua pressão hidráulica, procedendo a um encadeamento de ações próprias ao requerimento de energia elétrica. Em verdade, não é a central que se implanta na corrente: é o próprio rio que se insere na central, ficando sua passagem obstruída. Mesmo a consideração de que o rio Reno ainda seja um rio de passagem, como fica? Não de outra forma que “encarregado” por uma agência de viagens, como objeto de visitas turísticas.

No entanto, sobre o rio, uma ponte une uma margem a outra há séculos e aí traça a abóbada respeitando a corrente. Deixa-o ser.

Dessa forma, percebem-se as diferenças que se delimitam entre o produzir segundo o modelo grego e o produzir da técnica moderna. Na primeira, quando encarregar (bestellen) ainda queria dizer “cuidar com solicitude”, a semente era deixada “com solicitude” na terra para que a natureza a fizesse crescer. Na segunda, quando a agricultura participa de um “bestellen” de tipo diferente – “a agricultura agora é indústria motorizada dos alimentos” – a natureza é provocada, isto é, exige-se da natureza a energia necessária ao desenvolvimento da semente. A “coisa”, a natureza, ela mesma resta um fundo (Bestand), isto é, fundo disponível, reserva.

É nesta realidade que se move o homem atual, realidade cujos traços mais significativos são ditados pela moderna ciência natural. É nesta que se apóia a Técnica: porém, há que ser levado em conta o fato de que, na moderna ciência natural, já estaria, agarrada e escondida, não a técnica, mas a essência da Técnica. Ou seja, aqui se trata da idéia de uma ciência antecipadamente técnica, numa aparente complicação cronológica, já que a ciência precede em quase dois séculos a técnica como a conhecemos hoje em dia. Aprende-se com Heidegger que não se deve pensar que a técnica seria a ciência natural aplicada, ainda que só depois dos descobrimentos científicos surja a técnica que os faz circular.

Resumindo: a provocação, que torna patente a energia que estava escondida, que passa a conformá-la, distribuí-la, armazená-la e comutá-la, reduz o mundo técnico a um imenso armazém de energias, de “estoques”, nos quais os homens buscam os meios para satisfação de suas necessidades. Necessidades humanasque, por sua vez, já de igual sorte “encarregadas” por uma direção dominante de opinião. A conclusão parece evidente: o homem provoca a natureza, mas é no mesmo ato provocado a provocar. Ele é o escravo do provocar.

Já nos acercamos bastante da idéia sustentada por Heidegger de que o extremo perigo para o homem não reside na questão da técnica, por exemplo, na construção de próteses como extensão e prolongamento dos órgãos humanos, mas estaria na “essência” da técnica (“a essência da técnica não é absolutamente nada técnico”). Sequer como coisa (o real se transforma em fundos) ou como objeto (Gegenstand) está o homem, pois, “O que está (steht) no sentido do fundo (Bestand), já não está frente a nós como objeto” (Heidegger, 1985, p. 15).

“A disponibilidade dos embriões deveria ser regulada”, linguagem corrente na imprensa, é a dimensão mais evidente das reservas. Nela se inclui a reposição, no sentido comum da idéia de estoque. Assim, encontramo-nos com o estatuto do corpo do homem atual, quando a metodologia da clonagem dá consistência ao fantasma do corpo em reserva. Os anúncios de venda de órgãos, as barrigas de aluguel, a doação presumida para as doações de órgãos (trata-se de pensar em uma “nacionalização do corpo”?) as doações e vendas (inclusive pagamentos realizados por poderes governamentais) de óvulos e sêmen e... dispensemos a lista. Esses exemplos são eloqüentes para que se “desvele” o inumano deste corpo tornado estoque. Corpo “container” da ciência ou armazenado num “container” pela ciência?

 

Referências

Heidegger, M. (1970). Carta sobre el humanismo. Madrid: Ediciones Taurus.        [ Links ]

Heidegger, M. (1976). Las declaraciones póstumas de Heidegger. por Rodríguez, Ramón. Revista de Occidente, tercera época, Madrid, n. 14, p. 10.        [ Links ]

Heidegger, M. (1985). La pregunta por la Técnica. Tradução Adolfo P. Carpio. In: Revista Época de Filosofia, n. 1, p. 7-29. Madrid.        [ Links ]

Lacan, J. (1988). Livro 7, A ética da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.        [ Links ]

Sève, L. (1994). Pour une critique de la raison bioéthique. Paris: Éditions Odile Jacob.        [ Links ]

Testart, J. (1988). El embrión transparente. Barcelona: Ediciones Juan Granica.        [ Links ]

 

 

Texto recebido em setembro/2006.
aprovado para publicação em dezembro/2006.

 

 

*Psicanalista, membro da Escola Brasileira de Psicanálise (EBP) e da Associação Mundial de Psicanálise (AMP), profissional da Rede de Saúde Mental de Belo Horizonte. E-mail: mariarita.guimarães@gmail.com
1Cf. citação e comentários feitos por Sève, 1994, p. 216.
2PMA: a forma como se convencionou chamar o conjunto de diferentes técnicas médicas utilizadas no processo “artificial” de nascimento de uma criança: Procriação Medicamente Assistida.
3O autor refere-se ao bebê-proveta nascido no ano de 1978, aos cuidados da equipe britânica R. Edwards y P. Steptoe.

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