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Psicologia em Revista

Print version ISSN 1677-1168

Psicol. rev. (Belo Horizonte) vol.16 no.2 Belo Horizonte Aug. 2010

 

ARTIGOS

 

O espaço aberto da educação infantil: lugar para brincar e desenvolver-se

 

El área abierta de la educación infantil: un lugar para jugar y desarrollarse

 

Decir el sufrimiento: fenomenología, cognitivismo, pragmática

 

 

Luana dos Santos Raymundo *; Ariane Kuhnen ** ; Lia Brioschi Soares ***

 

 


RESUMO

Este estudo teve como objetivo principal identificar as características existentes nas configurações dos espaços abertos de instituições de educação infantil, relacionando os aspectos físicos com as brincadeiras desenvolvidas pelos seus usuários, recorrendo à aplicação da técnica do mapeamento comportamental. O estudo foi conduzido em dois contextos educativos do município de Florianópolis-SC, nos quais os participantes, crianças entre 3 e 5 anos, foram observados no período de recreação. A análise dos dados evidenciou a preferência de determinados equipamentos por seus usuários. Em ambos os contextos, as meninas preferiram os equipamentos de balanço e caixa de areia, enquanto os meninos preferiram os equipamentos múltiplos (bombeiros e casa do Tarzan). Os equipamentos que obtiveram significativa ocupação foram aqueles que possibilitaram uma maior diversidade de brincadeiras (faz de conta). Concluímos que as características físicas dos espaços deram previsibilidade para algumas brincadeiras e continuidade a certos mecanismos biológicos, sociais e culturais experienciados pelos seus usuários.

Palavras-chave: Psicologia ambiental; métodos de observação, comportamento de brincar.


ABSTRACT

The purpose of this study was to identify the characteristics of open spaces in day-care centers, relating physical aspects with their users’ games through the technique of behavioral mapping. The study was conducted in two educational contexts of the city of Florianopolis, Santa Catarina State, in which participants, children aged between 3 and 5, were observed during recreation. Data analysis showed a preference for certain kinds of equipment. In both contexts girls liked better Swing and Sandbox, while boys preferred multiple equipment (Firemen and Tarzan’s House). The kinds of equipment that had significant occupation were those that allowed greater playing diversity (Make-believe). We concluded that the physical properties of spaces allow predictability concerning some games and continuity to certain biological, social and cultural mechanisms experienced by their users.

Keywords: environmental Psychology; observation methods; playing behavior.


RESUMEN

Este estudio tuvo como principal objetivo identificar las características existentes en la configuración de los espacios abiertos en las instituciones educativas, relacionando los aspectos físicos con los juegos desarrollados por sus usuarios, este estudio utilizó la aplicación de las técnicas de mapeo del comportamiento. El estudio se llevó a cabo en dos contextos educativos de la ciudad de Florianópolis, en el que los participantes, niños de entre 3 y 5 años, fueron observados durante el recreo. El análisis de los datos reveló una preferencia por determinados juguetes entre los usuarios. En ambos contextos las niñas preferían equipamientos como el columpio y la caja de arena, mientras que los niños preferían equipamientos múltiples como bomberos y casa de Tarzán. Los equipamientos que recibieron una mayor ocupación fueron los que permitían una mayor diversidad de juegos (fantasías). Observamos que las propiedades físicas de los espacios mostraron la previsibilidad de algunos juegos y la continuidad de ciertos mecanismos biológicos, sociales y culturales experimentados por sus usuarios.

Palabras clave: Psicología ambiental, métodos de observación, el acto de jugar.


 

 

Com o intuito de investigar o brincar nos processos de aprendizagem escolar, a atividade lúdica tem sido comumente vista no campo científico por meio da caracterização de suas peculiaridades e da identificação das suas relações com a saúde e o desenvolvimento psicológico. Portanto é consenso na ciência do desenvolvimento humano o papel fundamental do brincar na infância, para um crescimento integral saudável do indivíduo durante o seu ciclo vital (Carvalho, Alves & Gomes, 2005; Conti & Sperb, 2001; Hansen, Macarini, Martins, Wanderlind & Vieira, 2007; Kishimoto, 2001; Macarini & Vieira, 2006; Rossetti & Souza, 2005).

A legislação brasileira, por meio da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e dos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) para a educação infantil, enfatiza a importância do brincar para a faixa etária de 0 a 6 anos (Azevedo et alii, 2004). De maneira geral, a brincadeira é definida como a linguagem infantil que vincula o simbólico e a realidade imediata da criança, ou seja, é a forma pela qual a criança se apropria da cultura (Carvalho et alii, 2005).

A inserção do brincar livre e espontâneo no currículo educacional e, consequentemente, nos projetos pedagógicos das instituições educativas, é um processo de transformação política e social. No entanto, as escolas de educação infantil ainda não estão estruturadas para tal, organizam-se de forma que os espaços não são motivadores para as brincadeiras das crianças. Os espaços destinados ao brincar livre, como no caso do espaço aberto com equipamentos de playground é frequentemente negligenciado no planejamento político-pedagógico da escola (Zamberlan, Basani & Araldi, 2007).

É nesse cenário que a Psicologia ambiental vem travando um diálogo teórico-metodológico com a Psicologia do desenvolvimento, problematizando a relação entre a pessoa em crescimento e o ambiente físico (Elali, 1997). A Psicologia ambiental entende que a relação pessoa-ambiente deve ser compreendida observando o modo pelo qual os aspectos sociais e físicos dos ambientes interferem nos comportamentos e, da mesma forma, as ações humanas, por sua vez, afetam os entornos, culminando numa ideia de bidirecionalidade entre pessoa-ambiente (Corral-Verdugo, 2005).

O referencial teórico da abordagem bioecológica do desenvolvimento humano, proposta por Bronfenbrenner (1979/1996), por exemplo, pensa o desenvolvimento como uma função integrada da pessoa com o seu meio (contexto). Apesar de essa abordagem analisar o ambiente de desenvolvimento como um sistema de nichos ecológicos, de estruturas dinâmicas e interdependentes, abrangendo desde os ambientes mais imediatos de interação aos mais distantes, tais como a cultura, a subcultura e os sistemas de crenças, exploraremos neste estudo apenas as características físicas do ambiente imediato escolar e sua relação com as atividades do brincar. Já que, segundo essa teoria, o microssistema escolar tem várias especificidades, atividades planejadas, papéis, relações interpessoais e elementos como características físicas e materiais, que como mediadores dos padrões de interação social, conforme persistem e progridem no tempo, constituem veículos de mudanças comportamentais e de desenvolvimento individual.

A organização do ambiente, seus objetos e materiais educativos influenciam os usuários na representação, determinando, em parte, a maneira como adultos e crianças sentem, pensam e interagem nesse espaço, definindo formas de socialização e apropriação da cultura. Segundo Kishimoto (2001), a rotina das escolas municipais de educação infantil de São Paulo evidencia que, embora o discurso oficial e a retórica sobre a infância contemplem muito tempo de brincadeira para as crianças, as atividades dirigidas parecem expulsar o brincar do cotidiano infantil. As brincadeiras livres são vistas, por alguns educadores, como descanso de atividades dirigidas e não como forma de socialização e integração da criança, o que dificulta justificá-las como parte do projeto pedagógico da escola e denota como função da educação infantil estudar e não brincar.

Os valores que orientam a escolha de brinquedos e materiais pedagógicos nas escolas levam-nos a constatar que as concepções de criança e de educação infantil estão na base desses valores. No contexto atual da educação infantil, os brinquedos têm dois usos com significações distintas. Os educadores que valorizam a socialização como etapa importante do desenvolvimento adotam o brincar livre; e os que visam à escolarização ou aquisição de conteúdos escolares, o brincar dirigido e os jogos educativos. Enfim, quando a estrutura física e material revela valores assumidos pela organização escolar, pode-se inferir que a pequena participação de brinquedos de natureza simbólica, de construção e destinados à socialização no acervo da escola, por exemplo, revelam o pouco interesse na função simbólica, na criatividade e na socialização das crianças (Conti & Sperb, 2001; Kishimoto, 2001).

Também Conti e Sperb (2001) consideram que o ato de brincar é uma ação mediada pelo contexto sociocultural e o significado construído pela criança, acerca da função de determinados objetos e da sua participação em certas brincadeiras não é estático. Conforme as crenças e os valores dos adultos responsáveis por ela, ao serem colocados certos objetos à sua disposição, determinadas brincadeiras serão aceitas ou não, diferentes comportamentos serão desejáveis ou proibidos.

Gosso et alii (2006) ao comparar os brinquedos utilizados nas transformações simbólicas de brincadeiras de crianças de cinco grupos culturais brasileiros (comunidade praiana, aldeia indígena e de três grupos socioeconômicos diferentes – alto, baixo e misto de uma metrópole) de crianças de 4 a 6 anos de idade, constataram que a escolha da brincadeira relacionava-se com os objetos disponíveis: as crianças indígenas e da comunidade praiana usaram mais elementos naturais (partes de planta, areia, argila, pedra, pau, água); assim como as indígenas usaram mais utensílios (fragmentos de plástico, madeira, tecido, papel, papelão, canudo; recipientes, como lata, vasilhas, cestas; industrializados, como prego, botão de fogão, telefone, pneu; e objetos feitos à mão, como canoa, vestido); e as da metrópole, mais brinquedos manufaturados (veículos, armas, bonecos, utensílios domésticos); os objetos pouco estruturados prestaram-se a um grande número de transformações simbólicas no conjunto das cinco amostras de crianças; as meninas usaram mais reproduções de seres vivos, e os meninos, de veículos e armas.

Os efeitos das características dos ambientes assim classificados sobre o desenvolvimento da criança vêm sendo investigado pelos cientistas do desenvolvimento humano (Conti & Sperb, 2001; Eisenberg, Tryon & Cameron, 1984; Gosso et alii, 2006; Lordelo & Carvalho, 2006; Nelson, Hart & Evans, 2008; Sager & Sperb, 1998; Zamberlan et alii, 2007). Ao considerar que os brinquedos e materiais utilizados pelas crianças em suas brincadeiras influenciam na maneira como interagem e como brincam entre si. Sager e Spertb (1998) constataram que alguns materiais, como argila, areia e água, propiciam mais brincadeiras solitárias e paralelas, enquanto bonecas, carrinhos e jogos de panelinhas facilitavam a brincadeira de faz de conta em crianças de 3 a 5 anos. Para o desenvolvimento afetivo, as brincadeiras de dramatização de situações do cotidiano foram as mais suscetíveis de estimulação. Da mesma forma, as crianças tenderam a conflitar mais e a se engajar em atividades paralelas, quando a quantidade de brinquedos foi menor; já quando a quantidade de brinquedos aumentava, o brincar do tipo solitário passava a preponderar sobre os outros tipos.

Alguns outros estudos (Cordazzo, Westphal, Tagliari, Vieira & Oliveira, 2008; Hansen et alii, 2007; Lordelo & Carvalho, 2006; Macarini & Vieira, 2006; Wanderlind, Martins, Hansen, Macarini & Vieira, 2006) também enfatizam que a brincadeira é um fenômeno sensível às condições contextuais em que ela ocorre, ao mesmo tempo em que mostra forte estabilidade, sugerindo um fenômeno sob controle do próprio organismo. Nesses estudos, o brincar sugere que a motivação para a brincadeira no ser humano é intrínseca, varia em força ao longo da vida e é afetada pelas condições contextuais, seja nos aspectos materiais seja nos aspectos culturais do ambiente. Esse caráter motivacional responde pela universalidade do fenômeno e pela sua organização ontogenética – regularidade da idade de aparecimento, crescimento e declínio de interesses e formas de brincadeiras específicas, algumas mais frequentes em meninos do que em meninas e vice-versa.

Segundo Hansen et alii (2007), a brincadeira contribui de forma bastante efetiva para o relacionamento social das crianças, visto que oferece uma forma livre e autônoma de interação entre elas. Meninos e meninas, quando brincam, têm diferenças quanto ao brinquedo utilizado e ao tipo de brincadeira. As diferenças de gênero na brincadeira podem ser analisadas tanto no nível de estereotipia, ou seja, a preferência distinta de meninos e meninas por determinados brinquedos e brincadeiras, quanto por segregação, relacionada à preferência por brincadeiras em grupos homogêneos, ou seja, meninos e meninas geralmente não brincam entre si (Cardon, Cauwenberghe, Labarque, Haerens & Bourdeaudhuij, 2008; Pellegrini, Blatchford, Kato & Baines, 2004; Pontes, Magalhães & Martin, 2008; Rossetti & Souza, 2005). As diferenças são importantes quando possibilitam que meninos e meninas desenvolvam-se de maneira diferenciada, adquirindo habilidades diversificadas e, dessa forma, distinguindo seu papel de gênero de acordo com a sociedade e cultura nas quais estão inseridos (Wanderlind et alii, 2006).

Ao caracterizar o brincar de meninos e meninas em duas brinquedotecas (préescola e outra no ensino fundamental), Wanderlind et alii (2006) verificaram, em ambos os contextos, a predominância da estereotipia. Observaram também o predomínio de brincadeiras solitárias na pré-escola e de brincadeiras em grupo no ensino fundamental. Meninas, nos dois contextos, brincaram significativamente mais de faz de conta e com brinquedos que motivam o desenvolvimento afetivo do que meninos. Estes, em comparação com meninas, na pré-escola, experimentaram significativamente mais brincadeira realística e com brinquedos que reproduzem o mundo técnico. No ensino fundamental, meninos brincaram significativamente mais de brincadeira turbulenta e sem brinquedo do que as meninas.

Pellegrini et alii (2004) analisaram o papel dos jogos entre meninos e meninas de 7 e 8 anos para a adaptação destes ao ensino fundamental. Defendem que o momento de recreio, onde podem brincar livremente, serve como fator adaptativo à escola e à vida social. A pesquisa comparou escolas dos Estados Unidos com escolas da Inglaterra e identificou que o jogo difere conforme o nível de estereotipia que a cultura escolar ajuda a formar. De maneira geral, os meninos mostraram-se mais ativos fisicamente nas brincadeiras do que as meninas. Com o decorrer da adaptação, as atividades mais simples como pega-pega diminuíram e deram lugar às mais complexas, como as de regra com bola. Os meninos tenderam a desenvolver mais competências físicas, mais jogos competitivos com bola, e a meninas tenderam a inibir essa competência para corresponderem à expectativa da socialização, voltando-se para jogos que requerem facilidade verbal.

Enfim, as evidências mostram que não se devem deixar de lado os inseparáveis aspectos culturais, biológicos e do contexto que incluem o lugar onde a criança brinca e as crenças dos adultos (proposta pedagógica, estilo do educador), quando se busca compreender o modo de funcionamento básico (a brincadeira) e as maneiras como o ambiente circundante pode favorecêla. Arranjar o ambiente físico escolar de modo a prover espaço suficiente e a possibilidade de escolha de parceiros para brincar e brincadeiras diversificadas parece constituir uma medida simples, mas que provavelmente permitirá à criança engajar-se em atividades para as quais ela dispõe dos necessários recursos e motivação para autoexpressão e criação. Sendo assim, este estudo objetivou identificar as características existentes nas configurações dos espaços abertos de instituições de educação infantil, relacionando os aspectos físicos com as brincadeiras desenvolvidas pelos seus usuários. Para alcançar esse objetivo, recorreu à aplicação da técnica do mapeamento comportamental.

 

Método

A coleta de dados deu-se em dois contextos diferentes, porém com metodologia semelhante, sendo o contexto 1 uma instituição de educação infantil pública e o contexto 2 uma instituição de educação infantil privada. Os locais de coleta de dados de ambos foram os espaços de playground (espaços abertos) que eram diariamente frequentados pelas crianças em atividades recreativas.

 

Participantes

Em ambos os contextos, os grupos de crianças participantes corresponderam à faixa etária de 3 a 5 anos. No contexto 1, o grupo de participantes foi constituído por 65 crianças (35 meninos e 30 meninas), matriculadas em período integral. No contexto 2, os participantes foram 30 crianças (18 meninos e 12 meninas), matriculados em período parcial (vespertino).

 

Locais de observação

O contexto 1 tinha uma área construída de 391,52 m², que abrigava salas de aula, administração e banheiros. O espaço aberto tinha duas áreas principais, uma miniquadra e um playground. Este tinha 12 equipamentos (brinquedos) distribuídos em 266,91 m². As crianças frequentavam esse espaço diariamente em dois períodos de 40 minutos, um no turno matutino e outro no turno vespertino. Durante esse período, elas brincavam livremente nos equipamentos e com os utensílios disponíveis (bonecas, carrinhos, pazinhas, potinhos), sendo monitorados por, no mínimo, três educadoras.

O contexto 2 tinha uma área construída de 600,9 m², que englobava, além de salas de aula, biblioteca, refeitório, sala de arte, banheiros e área administrativa. O espaço aberto correspondia a duas áreas principais, um espaço menor (1 000,0 m²) e um espaço maior, com playground (2 161,0 m²). As crianças frequentavam o playground diariamente no turno vespertino por aproximados 40 minutos. Durante esse período, elas brincavam livremente nos equipamentos e usavam alguns utensílios (pazinhas, potinhos, bolas), sendo monitoradas por, no mínimo, três educadoras.

 

Procedimentos de coleta de dados

Após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (356/08), foram realizadas observações naturalísticas, usando-se as técnicas do mapeamento comportamental (centrado no lugar e na pessoa). No mapeamento comportamental centrado no lugar, os espaços abertos (divididos em setores) foram observados por meio do registro categorizado por amostragem de tempo (5 em 5 minutos). No mapeamento centrado na pessoa, 12 crianças (sujeitos focais) foram observadas em cada espaço no horário de atividades livres por meio do registro cursivo contínuo. Foram realizadas cinco sessões de observação do mapeamento centrado no lugar, totalizando 520 mapas no contexto 1 e 600 mapas no contexto 2. Para determinar a fidedignidade da coleta de dados, uma etapa inicial foi realizada com dois observadores, que registraram independentemente, durante três sessões, os mesmos setores do espaço aberto do contexto 1. O índice de concordância para cada categoria de comportamento foi de, no mínimo, 83%.

 

Instrumentos

Para o mapeamento comportamental centrado no lugar, construiu-se um protocolo composto por categorias comportamentais em relação aos setores observados. Para classificar os equipamentos identificados nos setores, usamos a identificação sugerida pela Associação Brasileira de Brinquedos (Abrinq). Conforme os fabricantes de equipamentos de playground, estes são planejados conforme o interesse de que promovam algumas habilidades específicas. Equipamentos de balanço (balanço duplo, balanço pneus, balanço bebês, cavalinho duplo) propiciam o desenvolvimento do equilíbrio e da autoconfiança, assim como os equipamentos de escalada (trepneu, miniescalada) e os equipamentos de desafio (túnel, trilha de pneus). Equipamentos de gangorra favorecem o desenvolvimento de habilidades motoras, sociais, integração, autonomia e cooperação, assim como os equipamentos de escorregar e de girar (carrossel). Equipamentos múltiplos propiciam a criação de diferentes brincadeiras de faz de conta, desenvolvendo habilidades motoras, sociais, integração e cooperação. Equipamentos de socialização (casinha de boneca) favorecem o desenvolvimento da criatividade e da comunicação, possibilitando a privacidade e a integração de crianças em idades diferentes.

Amparados pelos estudos de Sager et alii (2003) e Cordazzo (2008), os comportamentos que foram relacionados aos equipamentos foram selecionados conforme brincadeiras comumente observadas na educação infantil. Foram elas do tipo faz de conta: como uma situação imaginária criada pela criança e que podia envolver a representação de papéis (mamãe, professora, polícia, etc.); do tipo construtivas: quando envolviam uma construção. As crianças no espaço observado podiam estar manipulando qualquer tipo de objeto, desde que estivessem com a clara intenção de construir algo. As do tipo propostas, pelo adulto ou objeto: as crianças deviam estar seguindo a proposta de brincadeira que o adulto sugeriu ou o fabricante do objeto usado para brincar, com suas regras e procedimentos preservados. As do tipo jogos de regras, quando existia um conjunto de regras impostas e aprovadas pelo grupo. E do tipo turbulenta, que envolvia pular, correr, saltar, empurrar, puxar, perseguir e, ou, lutar. Ocorria quando no espaço observado existiam crianças que exibiam movimentos bruscos e vigorosos, porém manifestando expressões faciais hilariantes.

Para o mapeamento comportamental centrado na pessoa, elaboramos uma ficha de observação na qual constava de uma tabela esquemática que relacionava a localização da criança, a atividade realizada e o tempo de permanência em cada atividade. Também contava com um diagrama do espaço para o registro gráfico do percurso e ocupação da criança focada.

 

Análise de dados

Após a coleta dos dados, esses foram lançados em uma planilha dos programas estatísticos Excel – Microsoft Office e SPSS (Statistical Package for Social Sciences), que possibilitaram um tratamento estatístico descritivo (principalmente porcentagens) e relacional por meio de um teste não paramétrico de associação entre variáveis categóricas (teste qui-quadrado).

 

Resultados

Mapeamento comportamental centrado no lugar

Contexto 1: de maneira geral, o espaço aberto do playground é, em toda a sua totalidade, bastante ocupado pelas crianças. Todos os setores observados permaneceram ocupados em mais de 50% dos registros analisados, como mostra a figura 1.

As meninas tiveram preferência pelo balanço pneus (15,2%), enquanto que os meninos preferiram o bombeiro simples (16,2%) e se dividiram quase que equilibradamente entre os outros setores. Assim, constatamos a interferência do gênero na preferência pelo setor. Para sabermos até que ponto essas diferenças se devem ao acaso, ou a existência de associação entre as duas variáveis, aplicamos o teste qui-quadrado. O resultado obtido (² = 32,689, gl = 12, p = 0,001) mostrou-nos que essa relação é estatisticamente significativa, pois os setores do contexto 1 não apresentaram o mesmo grau de prevalência entre os meninos e as meninas. Entretanto essas diferenças entre as frequências observadas e esperadas dos registros foram mais significativas entre os setores de bombeiros (simples e duplo), balanços (duplo e pneus) e canto do mirante do que nos demais setores.

Quanto ao tipo de brincadeira no espaço em geral, 32,7% dos registros foram do tipo faz de conta, 20,1% do tipo construtiva, 38,8% do tipo proposta e 8,4% do tipo turbulenta (² = 46,97; gl = 3; p = 0,001). Nos balanços, os registros indicaram a brincadeira proposta (33%) predominando. Da mesma forma ocorrendo no carrossel (30%) e na gangorra (32%); enquanto no túnel (28%), no canto do mirante (36%), no trepneu (45%) e na casinha de bonecas (78%), registramos maior frequência da brincadeira de faz de conta; na caixa de areia (38%) e no espaço dos bombeiros (15%), a brincadeira construtiva (com areia) prevaleceu. Vale ressaltar também que, nos setores da árvore (50%) e do escorregador (40%) (destinado às crianças pequenas), houve o predomínio da brincadeira construtiva pela presença de areia no solo aliada ao conforto da sombra da árvore.

Contexto 2: adotando como critério de análise a porcentagem acima de 50%, o espaço aberto é principalmente ocupado em sua centralidade onde há os principais equipamentos. A maioria dos setores observados permaneceu vazia em mais de 70% do tempo analisado, veja figura 2.

As meninas tiveram uma preferência pela caixa de areia (32,4%), enquanto que os meninos preferiram o campinho de futebol (29,4%) e a casa do Tarzan (19%). Para sabermos até que ponto essas diferenças se devem ao acaso, ou a existência de associação entre as duas variáveis (gênero e setores), aplicamos o teste qui-quadrado (). O resultado obtido ( = 39,47, gl = 11 – nesta análise não foi considerado os setores do balanço de bebês e bebedor, pois os dois possuem frequência observada menor do que 5 – e p = 0,001), mostrou que essa relação foi estatisticamente significativa, principalmente nos setores da caixa da areia, do campinho, do cavalinho duplo e da choupana.

Quanto ao tipo de brincadeira no espaço como um todo, 32% dos registros foram de faz de conta, 18,5% do tipo construtiva, 19,5% do tipo proposta, 28% do tipo jogos de regras e 2% do tipo turbulenta ( = 25,62; gl = 4; p = 0,001). Nos balanços, na trilha de pneus e na miniescalada, predominaram 100% do registro da brincadeira proposta, com as regras de utilização preservadas e sem o incremento do faz de conta. Enquanto no canto de árvores, na miniquadra e na choupana, locais mais privativos no espaço aberto, e na casa do Tarzan, registramos a prevalência da brincadeira de faz de conta. Na caixa de areia (60%), a brincadeira construtiva prevaleceu. No cavalinho duplo, ocorreu, além das atividades propostas pelo equipamento, a possibilidade do faz de conta (19%). Os jogos de regra ocorreram preferencialmente no setor do campinho.

 

Mapeamento comportamental centrado na pessoa

Contexto 1: por meio da observação centrada na criança, foi possível também resgatar as variáveis idade e sexo intervenientes na ocupação do espaço. As crianças de 3 anos, por exemplo, manifestaram o comportamento de observação e conversa com os adultos como principal atividade. Dedicaram-se a observar as outras crianças brincando e a buscar a proximidade do adulto, por isso se localizaram a maior parte do tempo no setor da árvore e setor de entrada. Não observamos crianças de 3 anos no uso dos balanços (brinquedos mais disputados) e na casinha de bonecas. Quando se aproximavam desses equipamentos, mantinham o comportamento de observação. Em compensação, conseguiam se aproximar e brincar na gangorra (o brinquedo mais disponível). Os grandes equipamentos, como os bombeiros e o trepneu, que precisam ser escalados, ainda parecem desafiar essa faixa etária. Tanto os meninos quanto as meninas demonstraram o mesmo padrão de comportamento.

As crianças de 4 anos interagiram mais, participaram das atividades construtivas com areia e exploraram mais a totalidade do espaço. Percorreram todo o espaço a procura de novos desafios e objetos atraentes para brincarem. Verbalizaram mais nas brincadeiras e por isso deram indícios que já brincavam de faz de conta. Gostavam de fazer comidinha e nomear os papéis dos participantes, identificando a clássica brincadeira de casinha ou de polícia e ladrão. No faz de conta, elegeram o túnel e a casinha de bonecas como principais cenários de interação. Também gostaram de carregar utensílios para as plataformas dos bombeiros, sob ou sobre elas, e lá permaneceram por longo tempo. Demonstraram bastante familiaridade com os equipamentos, mas perderam na disputa dos mais solicitados para as crianças maiores.

As crianças de 5 anos dominaram os equipamentos mais disputados, passaram bastante tempo nos balanços, no trepneu e na casinha de bonecas, sempre em companhia de um colega. Também foram os principais protagonistas das brincadeiras turbulentas, correndo pelo espaço brincando de pega-pega, ou ainda das brincadeiras de faz de conta na casinha. Também foram observados em situações de conflitos e, algumas vezes, chorando. Enquanto as meninas cuidaram mais do lugar conquistado, brincando de faz de conta, os meninos se movimentaram mais pelo espaço e exploraram o ambiente como um todo.

Contexto 2: as crianças de 3 anos, nesse contexto, manifestaram o comportamento de serem balançadas como principal atividade de interação. Também foram observadas em maior interação com os educadores, solicitando ajuda ou participando de atividades planejadas em grupo (cantiga de roda). Por esse motivo, localizaram-se mais nos setores de balanços, explorando muito pouco o espaço total, não se aventurando em outros equipamentos.

As crianças de 4 anos interagiram mais, participaram das atividades associativas com bola e com areia e exploraram mais a totalidade do espaço. Correram, escalaram, balançaram, escorregaram e percorreram o espaço à procura de novos desafios motores e amigos para compartilhar. Os meninos, por gastarem mais tempo na atividade de jogar bola, acabaram explorando menos o espaço do que as meninas, sendo essa a principal diferença observada entre os gêneros.

As crianças de 5 anos foram as que mais aproveitaram o espaço aberto do contexto 2, além dos equipamentos principais, como a caixa de areia, a casa do Tarzan, a miniescalada e os balanços em geral, exploraram também os setores abertos que não têm equipamentos de brinquedo. Passaram bastante tempo na caixa de areia e na casa do Tarzan, onde brincaram de faz de conta, sempre na companhia de um amigo. Lideraram as brincadeiras de regra e construtiva. Dessa forma, foram protagonistas das situações de conflito e foram observadas chorando quando contrariadas. Enquanto as meninas localizavam-se mais nos setores onde havia equipamentos com utensílios, brincando de faz de conta de casinha, os meninos se movimentaram mais pelo espaço e exploraram o setor do canto de árvores, brincando de faz de conta de super-heróis, utilizando as raízes das árvores (solo sinuoso) como plataforma de escalada e fazendo dos pequenos gravetos caídos no chão as espadas que utilizam nas disputas entre eles.

 

Discussão

Segundo Bronfenbrenner (1979/1996), o ambiente imediato da escola (microssistema) claramente sofre influência dos ambientes mais remotos (meso, exo e macrossistema), como, por exemplo, as características socioculturais do bairro, município e país em que a escola está localizada. As práticas intervencionistas que ocorrem no ambiente escolar são determinadas por normas que regulamentam esses espaços, pelas leis que garantem a qualidade do atendimento, pelas políticas públicas que dão diretrizes de organização e pelas abordagens pedagógicas que oferecem uma compreensão do desenvolvimento infantil e do papel do espaço físico nisso tudo (Azevedo et alii, 2004). Como parte de um mesmo macrossistema, os dois contextos estão sujeitos às mesmas exigências de regulamentação do espaço e de atuação do profissional e, por conta disso, mostram-se similares quanto à organização e funcionamento da escola e ao atendimento das necessidades das crianças (Zamberlan et alii, 2007).

Entretanto, os contextos diferem quanto à oferta de espaços para os seus usuários. O contexto 1 oferece 3,5 m² de área construída por criança, enquanto o 2 consegue ofertar 11 m² para cada criança. A oferta de espaço é ainda menor no contexto 1 quando avaliamos apenas o espaço aberto, a densidade ocupacional gira em torno de 4 m²/criança, enquanto que, no contexto 2, em torno de 152,25 m²/criança. Entretanto, se considerarmos que a avaliação de qualidade desses espaços não se refere apenas ao seu tamanho, pois tanto os espaços pequenos quanto os generosos podem ser ambientes de qualidade, cabe-nos considerar também que a qualidade dos ambientes depende da diversidade de atividades e estímulos convidativos para o brincar, da flexibilidade ao rearranjo e da inclusão de diferentes faixas etárias nesses espaços (Campos-de-Carvalho, 2005; Kishimoto, 2001).

Assim, a falta de atenção com os espaços abertos compromete a qualidade dos serviços prestados por essas instituições. No caso do contexto 1, em função de uma situação socioeconômica menos favorecida, as crianças não têm acesso a espaços lúdicos no bairro em que moram. Recai sobre a escola a responsabilidade de ser o único espaço aberto destinado ao brincar, e isso gera uma superlotação e ocupação do espaço. Já no contexto 2, a oferta de espaços externos é muito maior, além das características do próprio bairro e da disponibilidade que o campus da Universidade (local da escola) oferece, a própria escola tem espaços diferenciados, biblioteca/sala de arte, pátio coberto, espaço aberto menor, para usarem, o que parece justificar o baixo uso e ocupação do playground constatados nos resultados da pesquisa.

Apesar das diferenças socioeconômicas (pública e privada) e ambientais dos dois contextos (periferia e central do município de Florianópolis-SC), que implicam uma maior oferta de espaços e de estímulos para brincar, os equipamentos, em ambas as escolas, tinham quase que as mesmas características e funções, assim como sua disposição no espaço, ou seja, nesses ambientes, ocorreram o predomínio dos equipamentos tradicionais (escorregador, balanços duplos, gangorra) e o sucesso dos contemporâneos (caixa de areia, balanço de pneus e bombeiros ou casa do Tarzan) entre os seus usuários.

Observamos também que as características de idade e gênero das crianças foram variáveis intervenientes nas suas motivações para as atividades no espaço aberto, bem como, determinaram valores e expectativas dos adultos para com elas. As expectativas do adulto puderam ser identificadas pelas configurações das turmas nos contextos (crianças separadas por idade no uso do espaço), pela disposição dos equipamentos (presença de equipamentos destinados aos menores) e pela oferta de materiais conforme o gênero da criança (bola para os meninos, potinhos para brincar com areia para as meninas), ou seja, pela compreensão dada pela escola como um todo das necessidades lúdicas de cada grupo dentro da faixa etária e gênero correspondente.

Quanto à preferência das crianças por alguns tipos de equipamentos, em ambos os contextos houve a preferência pelos balanços (balanço duplo e cavalinho), assim como os de múltiplas funções (bombeiros e casa do Tarzan) e pelas caixas de areia. Enquanto as meninas se preocuparam em cuidar do território conquistado, permanecendo no equipamento por mais tempo, os meninos, ao contrário, utilizaram mais os grandes equipamentos, cujo uso foi mais dinâmico (as crianças passavam por ele e iam para outras atividades). A localização dos equipamentos múltiplos, em ambos os contextos, pareceu dar previsibilidade para a sua ocupação, pois eles estavam localizados em cantos que têm um espaço aberto livre com caixa de areia (no contexto 1) e um espaço aberto livre gramado (no contexto 2), ou seja, onde ocorre a possibilidade de movimentos motores mais amplos (identificado nos meninos maiores) que interligam o equipamento com o espaço ao redor.

Portanto, se nos dois contextos, as meninas foram as responsáveis pela maior frequência de ocupação dos equipamentos de balanço e das caixas de areia, e os meninos foram os principais usuários dos equipamentos múltiplos e pelos cantos mais amplos e afastados, isso nos indica que, conforme Hansen et alii (2007), a brincadeira é um fenômeno sensível às condições contextuais (físicas) do lugar em que ocorre, mas, ao mesmo tempo, são estáveis, sugerindo um fenômeno sob controle do próprio organismo.

Outros dados ilustram essa afirmação quando, por exemplo, observamos que as crianças de 3 anos brincaram mais sozinhas, demonstrando um comportamento mais exploratório e de observação do espaço, mantendose próximas aos educadores, enquanto que as crianças maiores (4 a 5 anos) fizeram mais associações grupais, tiveram mais habilidade motora com os equipamentos e preferiram se desligar da presença do adulto, quando possível, brindando em cantos mais afastados.

Por fim, com relação aos tipos de brincadeiras e atividades, em ambos os contextos pesquisados, verificamos o predomínio da brincadeira de faz de conta e construtiva. Concluímos que a atividade proposta pelo equipamento (como escorregar, balançar, pendurar-se) revestiu-se dos jogos simbólicos e da interação social principalmente nos equipamentos mais contemporâneos como na casinha de bonecas, na caixa de areia e nos bombeiros (contexto 1), na casa do Tarzan, no cavalinho duplo e na caixa de areia (contexto 2), pois os espaços de ambos os contextos propiciaram atividades diversificadas, por meio da oferta de areia, água, vegetação, bem como utensílios, como pás e potes, e outros materiais versáteis (pano, papelão, etc.). O que corrobora com os dados, mostrando que, quanto mais flexíveis forem os espaços, maior diversidade no seu uso eles promoverão (Gosso et alii, 2006; Sager & Sperb, 1998).

 

Considerações finais

O estudo do espaço escolar em dois contextos distintos, como o realizado neste trabalho, evidenciou diferenças e semelhanças nas configurações dos espaços e nas características das brincadeiras. Essas comparações e paralelos visaram, além de preencher algumas lacunas existentes no estudo do espaço aberto da educação infantil, a fornecer diretrizes para as escolas que, com essas indicações, possam organizar seus recursos humanos, de espaço físico e de materiais, assim como auxiliar na compreensão e utilização desse local como uma estratégia promotora de bem-estar, qualidade de vida e aprendizagem para crianças e adultos.

Sendo assim, considerando ser a brincadeira um dos eixos principais para o desenvolvimento saudável e integral das crianças, reiteramos que cabe às instituições de educação infantil planejarem seus espaços lúdicos, a fim de que estes promovam um desenvolvimento saudável. Os resultados deste estudo confirmam a hipótese de que o espaço físico e os brinquedos oferecidos e usados pelas crianças são mediadores nas interações e no brincar.

Ao retornarmos esses resultados para as instituições pesquisadas, criouse um momento de reflexão sobre a importância do brincar e do papel do educador. Como principal mediador do desenvolvimento das crianças, cabe a ele tornar a atividade do brincar uma ação diversificada e intencional, por meio da organização conferida aos espaços lúdicos. Finalmente se conclui que as indicações foram avaliadas de forma positiva, avaliou-se que o espaço aberto pode ser modificado tornando o momento recreativo do parque uma vivência educativa a ser contemplada no projeto político-pedagógico da escola.

Por tudo isso, entre as principais sugestões de mudanças nos espaços abertos das instituições pesquisadas, teve-se a busca por flexibilidade nos espaços, pois os resultados mostraram que os equipamentos tradicionais (balanço, gangorra, carrossel e escalada), por exemplo, proporcionaram muitas vezes apenas a brincadeira, mas podendo ser ampliada para proposta, enquanto que os equipamentos múltiplos possibilitaram uma variedade maior de atividades, entre elas a brincadeira de faz de conta. Além disso, em ambos os contextos, esses equipamentos estavam na proporção (tamanho) de uso para crianças acima de 6 anos de idade, o que não corresponde à faixa etária atendida pela educação infantil. Dessa forma, outra questão levantada pelos resultados foi a busca de um espaço configurado para as características dos seus usuários. A sugestão foi a de criar zonas circunscritas (cantos) nos espaços abertos, com delimitações claras, com equipamentos móveis e adequados para as crianças de 3 anos de idade ou menos, e outras zonas circunscritas com características próprias para as crianças entre 4 e 6 anos de idade.

Depois de constatada a efetividade da brincadeira como um lócus importante de desenvolvimento infantil, propomos diretrizes para políticas públicas que visem a normatizar os espaços lúdicos escolares. Assim, sugerese o planejamento de um espaço de parque que, entre outras coisas, busque considerar a possibilidade de um constante rearranjo e reorganização, para que contemple as diferenças etárias da educação infantil, com delimitações claras de áreas e subáreas para diferentes brincadeiras; privilegie a aquisição e uso de equipamentos de playground móveis (de plástico); tenha uma área coberta (tipo quiosque) para os dias chuvosos; perante a limitação de oferta de espaço, que se realizem rodízios do uso entre turmas mistas (diferentes gêneros e idades); ofereça um conforto ambiental também para o adulto, com bancos e sombra para o profissional encarregado de supervisão das atividades recreativas; tenha uma constante manutenção, garantindo a segurança e; por fim, que o espaço ofereça uma diversidade de estímulos, incluindo brinquedos e utensílios transportáveis e transformáveis.

 

 

Referências

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Texto recebido em outubro de 2009
aprovado para publicação em julho de 2010.


Este trabalho é parte da Dissertação de Mestrado da primeira autora, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Ariane Kuhnen, no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis-SC. Apoio: CAPES.

 

* Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: lua-sr@yahoo.com.br.

** Doutora em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina, professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC. E-mail: ariane@cfh.ufsc.br.

*** Graduanda em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: liabs23@hotmail.com.

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