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Revista da SPAGESP

versión impresa ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP v.8 n.2 Ribeirão Preto dic. 2007

 

EDITORIAL

 

O grupo como espelho da diversidade da condição humana: a busca de novos paradigmas que orientem o fazer clínico

 

Manoel Antônio dos Santos 1

 

Temos a grata satisfação de colocar em circulação mais um fascículo da Revista da SPAGESP, que apresenta um acervo de contribuições originais de colegas pesquisadores para a prática grupal. Os artigos tratam de diferentes temáticas que têm sido objeto de atenção dos profissionais e pesquisadores que se dedicam à produção do conhecimento no domínio dos grupos. Ao passar em revista o conteúdo desses estudos, torna-se patente que a investigação de diferentes contextos e cenários revela a pluralidade salutar que se reflete nas publicações que se seguem.

Nesse sentido, levando-se em conta a produção de conhecimento estampada no presente número da Revista da SPAGESP, confirma-se a impressão de que as intervenções em grupo na contemporaneidade têm funcionado como um espelho que reflete os dilemas colocados pela diversidade da condição humana nesse início de milênio. O que os artigos expressam com bastante nitidez é a forma como os dispositivos grupais têm sido sensíveis para captar as diversas facetas do devir humano, repercutindo as inquietações que tensionam o campo das interações e configurações sociais. A complexidade das áreas cobertas pelo extenso campo grupal pode ser aquilatada pelas temáticas abordadas pelos artigos: drogadição, organização do trabalho, farmacoterapia, interpretação, vínculos amorosos, inclusão via educação. Como fio condutor, observa-se claramente a ênfase na vincularidade e no estabelecimento de parâmetros teóricos e técnicos que possam balizar o enquadre no qual as intervenções grupais ocorrem, evidenciando seus limites e possibilidades.

A aposta no acolhimento solidário da diversidade e do sofrimento humano levanta uma outra questão fundamental: a necessidade de redescrever os paradigmas que orientam o fazer clínico em nossa realidade. Nesse âmbito os desafios são monumentais. A questão que se coloca é como intervir nos diferentes cenários mantendo-se a qualidade das abordagens, ao mesmo tempo em que se respeitam integralmente as peculiaridades de cada situação. Em outros termos, ao se trabalhar com grupos, como preservar a particularidade da constituição subjetiva de cada participante?

A primeira contribuição, intitulada Dispositivos para a realidade institucional, da autoria de Silvia Brasiliano, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, trata da questão da clínica institucional em drogadição. A autora sustenta o ponto de vista de que é inevitável introduzir modificações na prática psicanalítica contemporânea frente às demandas atuais, utilizando o contexto do tratamento dos transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas como um modelo a partir do qual se pode refletir sobre o sentido dessas mudanças. Nessa direção, descreve a experiência de uma equipe multidisciplinar que atua em um programa para dependentes de álcool e drogas em um hospital público universitário. Nesse contexto particular houve uma reestruturação da psicoterapia de grupo, culminando com a proposta de mudanças no enquadre, que por sua vez repercutiram na vinculação dos pacientes ao grupo.

O artigo O momento da tarefa no grupo: aspectos psicanalíticos e psicossociais, de Pablo de Carvalho Godoy Castanho, do CEFAS de Campinas-SP, explora o conceito de Tarefa cunhado por Pichon-Rivière, a partir de duas vertentes essenciais: psicossocial e psicanalítico. As implicações de cada ponto de vista são explicitadas ao longo do estudo de maneira esclarecedora e didática, culminando com a proposta de pensar a Tarefa como o momento em que se estabelece um espaço transicional que torna o fazer do grupo uma modalidade qualificada de brincar.

Em Integrando farmacoterapia à psicoterapia e a medidas gerais no tratamento dos quadros ansioso-depressivos, o autor Breno Serson postula que os transtornos do espectro ansioso-depressivo são melhor tratados quando se utiliza uma combinação de modalidades terapêuticas que se potencializam mutuamente, como a farmacoterapia, a psicoterapia e outros recursos que visam a promoção da saúde. Após abordar separadamente as contribuições potenciais de cada modalidade, o autor coroa seu estudo sustentando a possível sinergia resultante de sua aplicação combinada no tratamento da depressão e ansiedade.

O próximo artigo, Uma revisão teórica sobre a interpretação aplicada aos grupos, de Antonios Terzis, Carla Pontes Donnamaria, Cíntia C. Vigiani Carvalho, Cybele C. Moretto, Fatima R. M. Nascimento e Valéria Cristina Pereira Verzignasse, da Pontifícia Universidade Católica - PUC Campinas, SP, apresenta uma revisão teórica sobre a interpretação em psicanálise. Valendo-se de um panorama histórico, os autores apresentam a evolução desse construto desde sua formulação na clínica freudiana até os seus desdobramentos na contemporaneidade, em particular no enquadre grupal.

No artigo A má vontade e as possibilidades de crescimento mental a partir do fortalecimento dos vínculos amorosos, Waldemar José Fernandes, do NESME - Núcleo de Estudos em Saúde Mental e Psicanálise das Configurações Vinculares e da SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo, examina a questão da boa vontade em contraposição à má vontade. O autor utiliza a concepção de vínculo como estrutura relacional interna e externa, em que predomina alguma experiência emocional, considerando-se os espaços intra, inter e transubjetivos. Postula que boa parte dos mal-entendidos e do sofrimento vivenciado por pessoas agrupadas são experiências decorrentes das dimensões constitutivas dos vínculos humanos. O autor conclui que é necessário fortalecer o altruísmo como expressão refinada dos sentimentos amorosos nos contatos interpessoais. A promoção de relações mais amistosas nos diversos grupos e instituições sociais seria o antídoto necessário contra o ressentimento e a mágoa, que podem envenenar as relações humanas quando não se consegue conviver com as frustrações inerentes às interações.

Esse número se fecha com o artigo A lógica da exclusão alimentada pelos programas de inclusão, de Carolina de Araujo Malaquias e Solange Aparecida Emílio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Nesse artigo as autoras colocam em discussão a inclusão do aluno beneficiado pelo ProUni, programa criado pelo Governo Federal com o objetivo de eliminar desigualdades historicamente acumuladas, na tentativa de assegurar a igualdade de oportunidades e compensar os prejuízos causados pela discriminação. A questão é tratada de maneira mais ampla do que tradicionalmente tem sido abordada no âmbito social e acadêmico, incluindo nessa concepção ampliada a participação efetiva das pessoas que compõem o cenário da Educação. Os resultados do estudo trazem importantes contribuições para a reflexão acerca do programa, indicando a necessidade de submetê-lo a uma perspectiva de análise crítica, que considere o ponto de vista do aluno beneficiado. Só assim, concluem as autoras, será possível evitar que a lógica da exclusão se mantenha sob o véu diáfano da inclusão.

Depois de enveredar pelo conjunto de estudos publicados, o leitor certamente poderá sedimentar a convicção de que o grupo põe em andamento distintas formas de subjetivação. Nesse sentido, as intervenções grupais nos âmbitos da saúde, do trabalho e da educação têm contribuído para o reorientação desses campos, que nas últimas décadas evoluíram desde uma perspectiva individual para a coletiva. Sendo fiel a esse pressuposto, pode-se afirmar, sem exagero, que os estudos publicados no presente número da Revista da SPAGESP oferecem pistas que sugerem a expansão das fronteiras do trabalho com grupos no mundo contemporâneo.

Apostando nessas premissas, o Conselho Editorial da Revista da SPAGESP saúda os leitores ávidos por conhecimento qualificado e torna público a gratidão aos assessores ad hoc, pelo trabalho árduo que tiveram para o aprimoramento dos manuscritos. Também é preciso mencionar a confiança dos autores que submeteram seus trabalhos na expectativa de encontrarem uma avaliação justa e equilibrada. Esperamos que a leitura dos artigos possa estimular outros autores a encaminharem seus trabalhos à publicação.

 

 

1 Professor Doutor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Editor da Revista da SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo, e-mail: masantos@ffclrp.usp.br