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Revista da SPAGESP

Print version ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP vol.9 no.1 Ribeirão Preto June 2008

 

ARTIGOS

 

Atendimento psicológico em grupo a jovens adultos portadores de necessidades especiais

 

Psychological group care for young adults with special needs

 

Atendimento psicológico en grupo a jòvenes adultos portadores de necesidades especiales

 

 

Terezinha Pavanello Godoy Costa 1; Mateus Pavanello Godoy Costa 2

Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo avaliar o repertório de habilidades sociais de um grupo de jovens adultos, portadores de necessidades especiais inseridos no mercado de trabalho. Participaram oito jovens adultos portadores de necessidades especiais (deficiência mental), todos do sexo masculino, com idade variando entre 16 e 21 anos, alunos de um Centro de Educação Especial que trabalham sob regime de contrato com uma empresa. Os participantes receberam atendimento semanal em grupo em uma clínica psicológica universitária. Avaliou-se o repertório de Habilidades Sociais dos participantes utilizando-se de duas sessões de observação e entrevistas individuais, momento em que foi aplicada a tabela de Auto-Informe de Asserção adaptada para este estudo. Os dados coletados serviram de base para o início do treinamento das habilidades sociais. Foram realizadas 26 sessões de treinamento, nas quais foram utilizadas vivências para a ampliação do repertório das habilidades sociais e técnicas cognitivas comportamentais. Os resultados demonstram que ocorreu a ampliação do repertório de habilidades sociais dos jovens adultos portadores de necessidades especiais, o que resultou em melhora na competência social e nas relações interpessoais.

Palavras-chave: Necessidades especiais; Habilidades sociais; Mercado de trabalho.


ABSTRACT

The present study aimed at assessing the social abilities repertoire of a group of young adults with special needs inserted in the work market. Eight young adults with special needs (mental handicap) took part in this research, all males, varying between 16 and 21 years old, being pupils at a Special Education Center, and working under a regimen contract within a company. The participants have had weekly group sessions at an university psychological clinic. The social abilities repertoire of the participants was evaluated through two observational sessions and individual interviews with each participant. It was applied the Auto-Informe de Asserção table adapted for this study. The collected data served as the basis for the beginning of the social abilities training. Twenty six sessions of training have been carried through involving practical experiences for the social abilities repertoire expansion and behavioral and cognitive techniques. The results demonstrate the occurrence of social abilities repertoire expansion of young adults with special needs and the improvement of their social skills and their own interpersonal relationships as a consequence.

Keywords: Special needs; Social abilities; Work market.


RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo avaliar el repertorio de habilidades sociales de un grupo de jóvenes adultos portadores de necesidades especiales inseridos en el mercado de trabajo. Participaron de esta pesquisa ocho jóvenes adultos portadores de necesidades especiales (deficiencia mental), todos del sexo masculino con edad entre 16 y 21 años, alumnos de un centro de educación especial que trabajan bajo régimen de contrato con una empresa. Los jóvenes adultos recibieron atendimiento en grupo en la clinica de psicologia de la universidade, una vez por semana. Fue avaliado el repertorio de Habilidades Sociales de los participantes utilizando dos sesiones de observación y entrevistas individuales con cada participante, momento en que fue aplicado la tabla de Auto-Informe de Acerción adaptada para este estudio. Los datos colectados sirvieron de base para iniciar el entrenamiento de las habilidades sociales. Fueron realizadas 26 sesiones, durante las cuales fueron utilizadas vivencias para ampliar el repertorio de las habilidades sociales y técnicas cognitivas comportamentales. Los resultados demuestran que hubo ampliación del repertorio de habilidades sociales de jóvenes adultos portadores de necesidades especiales, y eso mejora la competencia social y sus relaciones interpersonales.

Palabras clave: Necesidades especiales; Habilidades sociales; Mercado de trabajo.


 

 

A integração social de portadores de necessidades especiais tem sido motivo de grande preocupação, pois se sabe que a integração pode acontecer ou não de acordo com a atuação destes. Muito se fala em apoiar ou facilitar esta integração tanto na sociedade de modo geral como também nas famílias, nas escolas e no mercado de trabalho.

Inúmeros trabalhos tem sido desenvolvidos com o objetivo de explicar ou refletir sobre as deficiências e quanto estas interferem na vida do indivíduo e de sua família. Também têm sido realizadas pesquisas a respeito da inclusão/integração dos portadores de necessidades especiais nas escolas regulares apoiando-se no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), na Constituição Brasileira e na Declaração de Salamanca.

Em nossa sociedade a maioria dos jovens cresce esperando trabalhar. Com relação ao jovem portador de necessidades especiais não seria diferente, pois este é uma pessoa como qualquer outra com direitos e deveres. Ele, ao desenvolver-se, apresentará as mesmas necessidades e desejos de trabalhar que as demais pessoas adultas da sociedade apresentam.

Trabalhou-se com o primeiro grupo de jovens portadores de necessidades especiais no período de agosto de 2003 a dezembro de 2004, obtendo-se resultados bastante interessantes no tocante à ampliação das habilidades sociais desta clientela e, consequentemente, em sua integração social. Apoiado no estudo de 2003/2004 e na literatura disponível sobre métodos e técnicas para proporcionar a integração social de portadores de necessidades especiais, iniciou-se a presente pesquisa em fevereiro de 2005.

Este estudo teve como objetivo avaliar o repertório de habilidades sociais de um grupo de jovens adultos portadores de necessidades especiais inseridos no mercado de trabalho.

A justificativa para o trabalho é a de que considerando que as habilidades sociais são aprendidas e podem ser objeto de intervenções terapêuticas e educativas, a avaliação e o treinamento das habilidades sociais de portadores de necessidades especiais inseridos no mercado de trabalho, podem ampliar o repertório destes jovens adultos e conseqüentemente melhorar a integração social dos mesmos.

 

MÉTODO

Sujeitos

Participaram deste estudo oito jovens adultos portadores de necessidades especiais com deficiência mental (leve/moderada), com idade variando entre 16 e 21 anos, todos do sexo masculino, que trabalham na Empresa 3M do Brasil SA no município de Bonfim Paulista - SP. Estes participantes eram alunos do Centro de Educação Especial e Ensino Fundamental Egydio Pedreschi, localizado na cidade de Ribeirão Preto, Estado de São Paulo.

Esses jovens portadores de necessidades especiais iniciavam sua inserção no mercado de trabalho, em regime de contrato, na referida empresa privada.

Procedimento

Sabe-se que jovens portadores de necessidades especiais com deficiência mental apresentam déficits de comportamento social interferindo em suas relações interpessoais e, conseqüentemente, em sua integração (COSTA, 2000). Optou-se por trabalhar na ampliação das habilidades sociais destes, como recurso para que possam melhor integrar-se no trabalho e na sociedade.

Foi utilizado como instrumento de avaliação das habilidades sociais dos participantes: entrevista psicológica, com preenchimento da tabela de Auto-informe Assertivo de Galassi, realizado pelo autor da pesquisa com cada participante e observação dos comportamentos dos participantes através de quatro sessões interacionais (duas sessões na avaliação inicial e duas sessões na avaliação final).

As sessões do programa de treinamento de THS apresentaram uma organização interna adaptada para o grupo em questão e apoiada nos trabalhos disponíveis na literatura, tais como os de Del Prette e Del Prette (2001, 2004) e Cabalo (2003). Cada sessão foi organizada em três partes distintas:

1- Parte inicial: Sondagem realizada pelo pesquisador sobre interesse, motivação e problemas do grupo. Fornecimento de avisos ou instruções, verificação de tarefas de casa e proposta de treinamento de habilidades.

2- Parte central: Aplicação de procedimentos relacionados à proposta especifica de treinamento ou às queixas registradas nas entrevistas iniciais: tabela de Auto-informe Assertivo de Galassi e observações preliminares.

3- Parte final: O pesquisador solicitava avaliação da sessão, fornecia feedback sobre essa avaliação, atribuía tarefas de casa, verificava se todos se sentiam confortáveis e encerrava a sessão.

Foram utilizadas as técnicas comportamentais tais como: Ensaio comportamental, Reforçamento, Modelagem, Modelação (modelação real e simbólica), Feedback verbal, Relaxamento. Técnicas Cognitivas tais como Terapia racional-emotiva-comportamental, resolução de problemas, Instruções, auto-instruções e técnicas orientadas para a melhoria da atratividade física e aparência física, também foram adicionadas.

Na aplicação do treinamento do repertório de habilidades sociais dos participantes também foram utilizados os quatro elementos propostos por Cabalo (2003). Foi realizada uma entrevista mencionando o objetivo do trabalho e solicitando que o participante colaborasse, respondendo as perguntas da forma mais sincera possível. Com a tabela Auto-informe de Asserção de Galassi em mãos, o pesquisador questionava o entrevistado e preenchia simultaneamente a tabela, com a colaboração do mesmo.

Foram agendadas entrevistas individuais com cada um dos participantes deste estudo. As entrevistas aconteceram a partir da segunda quinzena de outubro. Esteve presente apenas o pesquisador e o participante na sala. O pesquisador iniciava as entrevistas solicitando que o entrevistado respondesse ao questionário de auto-informe da asserção de Galassi, de modo sincero e objetivo.

Os dados colhidos através da primeira entrevista com cada participante foram compilados em tabela individual, e será apresentada na seção dos resultados, complementada pelas observações realizadas pelo pesquisador nas sessões interacionais.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram realizadas 26 sessões de THS (Treino de Habilidades Sociais). Utilizou-se para o treino, as orientações constatadas na literatura já mencionada anteriormente, considerando os déficits apresentados no repertório das Habilidades Sociais dos participantes.

Os conteúdos utilizados foram: treinamento das habilidades utilizando as vivências para o trabalho em grupo de Del Prette e Del Prette (2004), redução de ansiedade em situações problemáticas com técnicas comportamentais, reestruturação cognitiva e algumas técnicas de Terapia Racional Emotiva Comportamental de Ellis (1962), Terapia cognitiva de Beck (1960) e Terapia Multimodal do Comportamento de Lazarus (1971). Também foram utilizados treinamento em resolução de problemas através de ensaios comportamentais, role-play, modelação e reforço positivo mencionados por Cabalo (2003).

Deve ser ressaltado que na presente pesquisa foram trabalhados os componentes comportamentais, verbais e não verbais das habilidades sociais. Alguns componentes cognitivo-afetivos também foram treinados incluindo expectativas e crenças, e habilidades de processamento. Incluiu-se ainda o trabalho com outros componentes das habilidades sociais, tais como atratividade física e aparência física pessoal.

Pode ser verificado no presente estudo que o THS possibilitou aos oito participantes ampliar seus comportamentos habilidosos, fato este que encontra apoio nos trabalhos de Cabalo (2003), Del Prette e Del Prette (2001, 2004). Os participantes tiveram no geral um acréscimo de 45% em seu repertório de habilidades sociais.

Todos os participantes deste estudo apresentavam uma evolução bastante interessante no que se refere aos comportamentos de expressar amor, agrado e afeto, aceitar elogios, fazer elogios e desculpar-se. Estes componentes cognitivos afetivos das habilidades sociais referem-se à forma como o individuo estrutura o mundo.

Os comportamentos de expressar amor, agrado e afeto, aceitar elogios, fazer elogios e desculpar-se estão relacionados com a questão da auto-estima, esta por sua vez relaciona-se com os pensamentos e sentimentos elaborados pelo indivíduo a partir de seus comportamentos e das conseqüências deste no ambiente (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001).

Os componentes não verbais das habilidades sociais tais como olhar, o contato visual, o sorriso, expressão facial, gestualidade e contato físico regulam o comportamento final desejado (CABALO, 2002; DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001). Pode se verificado neste estudo, que os participantes após o THS, que inclui os componentes não verbais, melhor adaptaram-se a aquisição de novos comportamentos.

O comportamento de pedir desculpas também foi bastante adquirido pelos participantes, possibilitando a eles melhora nas relações interpessoais.

Oferecer desculpas é uma ação legítima. Por meio deste procedimento, desculpamos o comportamento que foi injusto ou incômodo para a outra pessoa, sem comunicar que normalmente fazemos danos aos demais ou que não temos valor como pessoas. A desculpa também permite que reconheçamos o sentido da outra pessoa e que ela saiba que nos demos conta do que aconteceu. Um indivíduo que nunca se desculpa ou não admite ter tratado mal a outra pessoa, provavelmente experimenta problemas para manter relações interpessoais. Pelo outro lado, as pessoas que são constantemente feridas por outro individuo tenderão a evitar as interações com esse individuo no futuro (CABALO, 2003).

Os comportamentos de aceitar e fazer elogios também foram ampliados, no tocante a diferentes tipos de pessoas, facilitando assim a comunicação social dos participantes. Para Del Prette e Del Prette (2004), o elogio é entendido como qualquer comentário positivo em direção à, e sobre outra pessoa ou a alguma coisa feita pra ela. Em nossa sociedade, o elogio costuma ser avaliado positivamente, quando percebido como sincero e pertinente, e negativamente quando objetiva a manipulação ou a bajulação. Portanto, a competência em fazer elogios implica coerência entre o pensar, sentir e o agir e depende de uma apurada discriminação sobre o que, a quem, como e quando elogiar.

Quanto aos comportamentos de iniciar e manter conversações, pedir favores, expressar opiniões pessoais e defender seus direitos, os participantes também apresentaram uma boa evolução.

O comportamento de expressar opiniões pessoais, também teve boa aprendizagem, sendo que é uma habilidade importante para a construção de relações de confiança, honestas e saudáveis. Segundo Del Prette e Del Prette (2004), esta habilidade envolve concordar, mas igualmente discordar das idéias. Algumas situações são mais desafiadoras para o exercício desta habilidade como os contextos de grupo e de relação com as pessoas de autoridade que ocorreu no presente estudo para alguns participantes com maior dificuldade em expressar suas opiniões para com autoridades.

Cabalo (2003) diz que expressar os direitos legítimos é importante quando nossos direitos pessoais são ignorados ou violados. Alguns exemplos dessas situações incluem situações do consumidor, situações de família, situações de autoridade e situações de amizade. Pode ser constatado neste estudo que a defesa dos direitos foi melhor adquirida para com a família e amizades do que para com situações de autoridade.

O comportamento de recusar pedidos e enfrentar critica, são comportamentos mais elaborados e envolve algumas habilidades como dizer não sem se desculpar ou, se necessário, apresentando uma justificativa, sendo, portanto um comportamento bastante complexo para a aquisição de jovens de modo geral. No caso de portadores de necessidades especiais, esta não seria diferente, porém verificou-se que mesmo com certas limitações, os participantes obtiveram êxito.

Também o comportamento de enfrentar críticas é bastante complexo. Para Cabalo (2003), a maneira como se enfrenta as observações criticas, tem um papel importante na determinação da qualidade das relações das pessoas.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se concluir que, após 30 sessões de atendimento em grupo, os participantes da pesquisa adquiriram diversos comportamentos habilidosos, colocando-os em prática no seu dia-a-dia e também nas sessões de grupo. Dos comportamentos habilidosos que foram avaliados e treinados, constatou-se que os participantes adquiriram e ou ampliaram a maioria deles para com determinadas pessoas em questão.

Considerando que as relações interpessoais estão presentes no cotidiano dos participantes e interferem consideravelmente em seus desempenhos enquanto pessoas e funcionários acreditam-se que o trabalho realizado tenha possibilitado uma ampliação das habilidades sociais destes e conseqüentemente suas relações interpessoais, que influenciaram na interação social dos mesmos. A competência em habilidades sociais, principalmente as assertivas e de enfrentamento, tem sido percebida como fator de proteção e resiliência para um funcionamento psicossocial adaptativo diante dos fatores de risco que surgem no cotidiano.

Uma vez que os jovens participantes deste estudo estão inseridos no mercado de trabalho e que praticamente toda atuação profissional envolve interações com outras pessoas, requerendo assim metas e variadas habilidades sociais, pode-se concluir que as habilidades adquiridas pelos participantes poderão favorecer seu desempenho no trabalho.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CABALO, V. E. Manual de técnicas de terapia e modificação do comportamento. São Paulo: Livraria Santos Editora, 2002.         [ Links ]

CABALO, V. E. Manual de avaliação e treinamento das habilidades sociais. São Paulo: Livraria Santos Editora, 2003.         [ Links ]

COSTA, T. P. G. Influência da aparência física de crianças deficientes nas relações interpessoais, segundo a percepção de seus pais. 2000. 272 f. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Marília, 2000.         [ Links ]

DEL PRETTE, Z. A. P.; DEL PRETTE, A. Psicologia das habilidades sociais, terapia e educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.         [ Links ]

DEL PRETTE, Z. A. P.; DEL PRETTE, A. Psicologia das relações interpessoais: vivências para o trabalho em grupo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Terezinha Pavanello Godoy Costa
E-mail: tcosta@unaerp.br

Recebido em 16/09/07.
1ª Revisão em 08/11/07.
Aceite Final em 21/03/08.

 

 

1 Psicóloga. Docente e coordenadora do Curso de Psicologia da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP).
2 Aluno do curso de Psicologia da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP).