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Revista da SPAGESP

Print version ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP vol.15 no.1 Ribeirão Preto  2014

 

ARTIGOS

 

Processo grupal mediado por filmes: espaço e tempo para pensar a Psicologia

 

Group process mediated by movies: space and time to think over Psychology

 

Procesos grupales mediados por películas: espacio y tiempo para pensar en la Psicología

 

 

Tales Vilela Santeiro1; Fabíola Ribeiro de Moraes Santeiro2; Aurélia Magalhães de Oliveira Souza3; Ana Paula de Melo Juiz4; Lucas Rossato5

Universidade Federal de Goiás, Jataí-GO, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo relata o uso de recursos fílmicos no acolhimento de calouros de Psicologia e na formação de habilidades clínicas do psicólogo. As atividades semanais foram desenvolvidas com voluntários (entre 11 e 23 participantes), em ambiente de serviço-escola de um curso de Psicologia, por equipe de três psicólogos e uma estudante. Os participantes avaliaram o projeto semestralmente, no meio e ao final das atividades, momentos nos quais responderam a um questionário composto por perguntas mistas. O grupo operou no formato fechado e integralizou 32 encontros, nos quais 31 filmes comerciais foram exibidos. Com amparo no trabalho grupal e nas metáforas fílmicas, os participantes puderam compartilhar aprendizados sobre as suas inserções na universidade e no curso de Psicologia.

Palavraschave: cinema, formação do psicólogo, grupos operativos, Psicologia Clínica, estudantes universitários


ABSTRACT

This article reports the use of film resources to welcome Psychology freshmen and to develop psychologists' clinical skills. Three Psychologists and a student conducted weekly activities with volunteers (between 11 and 23 participants) in a clinical training school of a Psychology course. Participants evaluated the project in every six months, in the beginning and in the end of the activities. 31 commercial films were exhibited during 32 encounters among a closed group. Supported by the group work and metaphors in films, participants could share experiences when entering university and the Psychology course.

Keywords: motion pictures, psychologist education, operative groups, Clinical Psychology, college students


RESUMEN

Este artículo relata el uso de recursos cinematográficos en la acogida a novatos de Psicología en la formación de habilidades clínicas del psicólogo. Las actividades semanales fueron desarrolladas con voluntarios (entre 23 y 11 participantes) en un ambiente de servicio escuela de un curso de Psicología, por un equipo de tres psicólogos y una estudiante. Los participantes evaluaron el proyecto semestralmente, en el medio y al final de las actividades, momentos en los cuales respondieron a un cuestionario compuesto por algunas preguntas mixtas. El grupo funcionó en un formato cerrado e integró un total de 32 encuentros, en los cuales 31 películas fueron exhibidas. Con amparo en el trabajo grupal y en las metáforas cinematográficas, los participantes pudieron compartir aprendizajes sobre su inserción en la universidad y en el curso de Psicología.

Palabras clave: cinema, formación del psicólogo, grupos operativos, Psicología Clínica, estudiantes universitarios


 

 

O trabalho em grupo operativo valoriza a contribuição de cada um e de todos, contudo é uma aprendizagem de modéstia e humildade no conhecimento, e das limitações humanas diante do desconhecido e do conhecido (Bleger, 1980/1998, p. 91).

Este artigo relata a implantação do projeto Grupo de Encontro e Reflexão: Escolhi a Psicologia. E agora?, que tem como público-alvo calouros do curso de Psicologia da Universidade Federal de Goiás, Regional Jataí (UFG), e utiliza a linguagem dos filmes como recurso mediador. A partir de 2014, terceiro ano de funcionamento do projeto, o título foi revisto para "Grupos de promoção de saúde para calouros e egressos do curso de psicologia". O projeto original contempla egressos como público-alvo, mas eles não têm aderido, e, assim, trabalhos desenvolvidos com calouros são enfocados no texto. A esse propósito, em 2013 uma egressa se integrou aos trabalhos, mas na condição de membro da equipe executora. O projeto surgiu, essencialmente, diante de três constatações básicas do primeiro autor, as quais foram consolidadas ao longo de suas experiências de formação de psicólogos clínicos. A primeira delas diz respeito à função do cinema como facilitador do processo de aprendizado de estudantes, porque metaforiza situações e manifestações humanas, muitas das quais podem suplantar as próprias experiências de vida dos aprendizes, ampliando-as (Santeiro & Rossato, 2013).

Um segundo fator subjacente às concepções do projeto – e não menos relevante – refere-se à aquisição de competências e habilidades para manejo de grupos serem ressaltadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia (DCN; Brasil, 2011). A terceira constatação, inspirada no modelo psicanalítico de formação, baseia-se na importância de o estudante de Psicologia precisar se conhecer e compreender seus próprios dilemas, de modo diferenciado em relação ao que fariam outros profissionais, submetendo-se a um processo psicoterapêutico. Assim, ele poderia vir a ser um instrumento mais adequado para trabalhar com o outro em condição de sofrimento, porque, de fato, sabe que a psicoterapia funciona (Calligaris, 2004) e também porque isso favoreceria ser mais empático em relação ao outro e menos centrado em si mesmo (Gallo-Belluzzo, Corbett, & Aiello-Vaisberg, 2013).

Se a necessidade de o psicólogo integrar-se ao processo de psicoterapia pessoal existe, tem sido visto empiricamente o quanto ela é pouco ou quase nunca atendida. Isso tem gerado um contingente enorme de profissionais parcialmente aptos a lidar com a clínica em sua acepção plena, na proporção em que, depois de findada a graduação, oferecem um tipo de trabalho ancorado em estudos exclusivamente "teóricos" ou ainda com um número mínimo de estágio desenvolvido em processos clínicos, embora, quando no mercado de trabalho, optem em trabalhar nesta área. Conforme observado em relatos de egressos, essas atuações clínicas ocorrem, ainda, sem auxílio de um supervisor.

É sabido que esse quadro é desenhado a partir de inúmeras condições; dentre estas, são destacadas as financeiras e as temporais dos estudantes, bem como as políticas governamentais pertinentes ao Ensino Superior de Psicologia. Nem sempre o custeio de um processo de autocuidado é viável, em especial aos acadêmicos vinculados a instituições pagas e em período noturno, que trabalham durante o dia. Não verificamos estudos que informassem motivos que levam estudantes brasileiros a não buscarem práticas de autocuidado, o que fundamentou essas ponderações em nossas experiências profissionais. É importante considerarmos que essa percepção também se estende aos psicólogos de nosso convívio, situados em diversas realidades. A esse respeito, Bearse, McMinn, Seegobin e Free (2013) contribuem para averiguarmos que profissionais de outras realidades também encontram barreiras para procurar psicoterapia pessoal, sendo a dificuldade de selecionar um terapeuta aceitável, a falta de tempo e a de recursos financeiros as três maiores delas. Além disso, nas DCN para cursos de Psicologia, práticas de autocuidado não são exigências regulamentadas (Brasil, 2011).

Diante das últimas constatações, um formador de psicólogos pode fazer algo? Ele pode propor alternativas que busquem contrapor-se ao estado de coisas vigente no campo da formação do psicólogo clínico brasileiro, para que ele possa inserir-se no mercado com habilidades clínicas mais fortalecidas? Se sim, o que ele pode oferecer ao estudante para que ele esteja mais atento ao imperativo de "viver" a Psicologia Clínica e seus instrumentais, extrapolando aprendizados possíveis de serem obtidos em sala de aula e em práticas de estágios supervisionados, ao longo dos anos de formação acadêmica?

Essas indagações estiveram presentes no planejamento e execução do projeto relatado. Para enquadrar a proposta do ponto de vista teórico, duas concepções foram fundamentais e serão apresentadas daqui em diante: a técnica de grupos operativos (Bleger, 1980/1998; Pichon-Rivière, 1983/2009) e o uso de filmes em processos de formação de psicólogos e de psicólogos clínicos (Santeiro, 2013; Santeiro & Barbosa, 2013; Santeiro & Santeiro, 2013).

 

PROCESSOS GRUPAIS E FILMES EM PROCESSOS DE FORMAÇÃO CLÍNICA

Um grupo pode ser entendido basicamente como sendo uma associação ou um conjunto de pessoas, reunidas com um objetivo comum, desde que seus integrantes estejam em constante interação e que, por meio desta, o conhecimento de suas singularidades seja possível (Osório, 2013). Sendo assim, todo conjunto de pessoas ligadas entre si por constantes de tempo e espaço, articuladas por sua mútua representação interna, configura uma situação grupal. Essa situação se sustenta por uma rede de motivações e as pessoas interagem entre si por meio de complexos mecanismos de assunção e atribuição de papéis (Pichon-Rivière, 1983/2009). É durante esse processo grupal que surgiria o reconhecimento de cada pessoa em sua própria singularidade, e de outras, em diálogos e intercâmbios permanentes.

No que tange aos modelos grupais, os grupos operativos podem ser terapêuticos ou não (Bleger, 1980/1998; Pichon-Rivière, 1983/2009). Em situações como as que se pretende apresentar e discutir, a inspiração teórico-técnica prioriza o grupo operativo como não terapêutico, de modo que ele se centra em tarefas promotoras de aprendizados que visam o pensar em termos da resolução de dificuldades criadas e manifestadas no campo grupal, e não no campo individual de seus integrantes (Pichon-Rivière, 1983/2009).

O grupo operativo, como espaço e tempo que favorece o pensar e o aprender, permite superar dificuldades de aprendizagem inerentes à determinada tarefa. Ele permite transformar situações dilemáticas, que estagnam e dificultam o processo de mudança grupal, em situações dialéticas, por meio de um processo dinâmico, que remete à necessidade de trabalho incessante em direção à superação de resistências às mudanças. Ele "(...) ajuda a transpor o estancamento enriquecendo o conhecimento de si e do outro na tarefa; daí que seja terapêutico no sentido de que permite a superação de transtornos na aprendizagem, no pensar, no contato com a realidade" (Pichon-Rivière, 1983/2009, p. 253).

Na visão proposta, o processo de aprender consiste, em sua acepção ótima e fundamental, na permanente revisão dos esquemas referenciais que cada pessoa traz consigo, a partir das situações vividas tanto no domínio grupal quanto fora dele. "Trata-se, portanto, de aprender a manter um esquema referencial plástico e não estereotipado como instrumento que se vai continuamente retificando, criando, modificando e aperfeiçoando" (Bleger, 1980/1998, p.79). Essas concepções podem favorecer a compreensão das tarefas grupais como fenômenos que se dão na área transicional (Castanho, 2007), os quais permitem e consolidam o brincar com amparo nos vínculos formados nos movimentos do grupo.

De acordo com Pichon-Rivière (1983/2009), num grupo, as pessoas desempenham papéis de modo dinâmico e intercambiável entre elas, mesmo sem terem consciência disso. Três dos papéis mais comumente presentes nos processos grupais são o de liderança, o de porta-voz e o de bode expiatório, exemplificados do seguinte modo: o grupo deposita sobre o líder aspectos positivos; são esperadas "denúncias" a respeito de necessidades, fantasias e ansiedades grupais por parte do porta-voz; o bode expiatório tende a polarizar aspectos negativos ou atemorizantes do grupo. O cumprimento desses papéis, em quaisquer circunstâncias e em graus diversos, presta-se a instigar rupturas em situações dilemáticas e estereotipadas.

Bleger (1980/1998) ainda lembra que em alguns momentos a alternância de papéis entre membros de um grupo propicia viradas totais em situações anteriormente representadas por estereotipia dos integrantes e do processo grupal, o que por sua vez proporciona, de modo gradual, retificações a um só tempo subjetivas e grupais. Esse dinamismo envolvido nas representações de papéis no campo dos trabalhos operativos também implica em dizer que aprender é algo que se faz na ação e que, repetimos, na visão debatida "(...) sempre se aprende mais do que se pensa, do que se pode demonstrar verbalmente ou declarar conscientemente" (p. 89).

Sobre o uso de filmes em processos de formação de psicólogos, estes vêm sendo utilizados com base em diversos enfoques teóricos e cenários (Santeiro & Barbosa, 2013; Santos, Costa, Carpenedo, & Nardi, 2011). Relatos sobre o uso da linguagem cinematográfica que podem beneficiar processos formativos de clínicos e psicoterapeutas são relativamente comuns na realidade brasileira (Heidemann, Montagner, Brunstein, & Eizirik, 2012; Scorsolini-Comin & Santos, 2013; Souza, 2012) e na estrangeira (Fleming & Bohnel, 2009; Gabbard & Crisp-Han, 2010; Wedding, Boyd, & Niemiec, 2010). Entretanto, eles parecem retratar este uso de modo parcial, posto que nem todo recurso didático-pedagógico utilizado, fílmico ou não, recebe a correspondente publicação em veículos acadêmicos de caráter clínico. Este texto pretende contribuir para ampliar esse panorama.

Em relação às ações propriamente clínicas, Santeiro (2013) e Santeiro e Santeiro (2013) ilustram algumas maneiras sobre como utilizar filmes em processos de formação de estudantes. Santeiro (2013), inspirado no modelo teórico psicanalítico, propõe considerar filmes como mediadores fecundos para acesso à realidade subjetiva e intersubjetiva de seus espectadores. Para além da linguagem do cinema ser utilizada como recurso para discussões técnicas, "operando a propósito de seus aspectos racionais" (p. 197), o autor a considera como "mediadores de diálogos entre espectadores, como forma de aproximação das realidades de si e do outro" (p. 197).

Nessa mesma direção, Santeiro e Santeiro (2013) propõem que exibições fílmicas coordenadas por psicólogos clínicos e em modalidade grupal podem privilegiar o olhar do estudante sobre a obra assistida e sobre a própria profissão. Portanto, a ênfase para construir diálogos recairia propositalmente sobre a concepção edificada pelos estudantes, junto aos seus pares, sendo o formador um elemento facilitador das expressões coletivas. Por essa via, ouvir e ser ouvido seriam instâncias fomentadas no espaço formativo, as quais são tidas como fundamentais para o desenvolvimento de competências e habilidades clínicas. A linguagem fílmica pode, ao mesmo tempo, ser utilizada como metáfora facilitadora para a compreensão de situações e temáticas de interesse de um psicólogo e para incorporar ludicidade ao ambiente acadêmico (Santeiro & Rossato, 2013).

Ponderadas as questões teóricas norteadoras dos trabalhos grupais, neste artigo objetivamos relatar nossas experiências quanto ao uso de recursos fílmicos no acolhimento de calouros de Psicologia. De modo indireto, pretendemos ilustrar como esse tipo de trabalho pode contribuir para o processo formativo de habilidades clínicas do psicólogo.

 

MÉTODO

Participantes

Calouros do curso de Psicologia da Universidade Federal de Goiás, Regional Jataí, cidade situada no Sudoeste do Estado, a 320 km da capital. De um convite feito aos 40 matriculados em 2012, 23 iniciaram os trabalhos, sendo 16 mulheres e sete homens, e, destes, 11 os concluíram (sete mulheres e quatro homens).

Equipe executora

Três psicólogos: uma profissional da prática privada, uma técnica administrativa em assuntos educacionais e um professor vinculado ao curso de Psicologia (média de 13 anos de prática clínica). Uma bolsista, estudante de 8º/9º período de Psicologia.

Local

Miniauditório, com capacidade para 30 pessoas, situado no Serviço de Psicologia Aplicada, órgão vinculado ao curso de Psicologia. Neste espaço são desenvolvidas atividades integradas de ensino, pesquisa e extensão, tendo por enfoque a prevenção e a promoção de saúde.

Procedimento

Os filmes eram exibidos em TV de 32 polegadas, com o auxílio de aparelho DVD. Os estudantes dispunham cadeiras de forma similar às de um cinema, uma ao lado da outra e enfileiradas. Após exibição das obras, havia pequeno intervalo para reorganizar o recinto de modo que as cadeiras fossem colocadas em formato circular. Feito isso, os diálogos eram iniciados. Usualmente a equipe executora escolhia o tema da película a partir de assuntos trazidos pelo próprio grupo durante trabalhos anteriores, sendo que a escolhida não era informada previamente à exibição. Após alguns encontros, os próprios estudantes escolheram filmes de sua predileção. Nesse sentido, nos três últimos encontros eles escolheram os títulos, a partir de consenso e de modo independente em relação à equipe. Também como ocorria quando os coordenadores traziam o filme, o "segredo" sobre o nome da obra era mantido, de forma que essa medida pudesse otimizar seu eventual impacto "emocional" no grupo.

As atividades ocorreram durante o ano letivo de 2012 por meio de um estudo piloto. Projetos semelhantes foram desenvolvidos anteriormente (Santeiro & Santeiro, 2013), contudo, pela primeira vez o trabalho aconteceu na UFG e com a equipe executora ampliada. Os trabalhos operaram no formato de grupo aberto até o 4º encontro, de modo que, enquanto a proposta era apresentada, novos integrantes poderiam integrá-la; a partir do 5º encontro o grupo operou no formato fechado, aspecto este contratado desde o primeiro encontro.

Os trabalhos foram realizados semanalmente, e miraram a promoção de discussões e reflexões acerca de aspectos relacionados à entrada ao ambiente universitário. Angústias e outros fatores emocionais envolvidos na escolha e na formação da identidade profissional como estudante de Psicologia eram experiências priorizadas nos debates.

É necessário observar que 67% dos integrantes eram recém-chegados a Jataí e também viviam a primeira experiência de residir fora da casa dos pais. Por razões como essas e por ser um critério essencial ao trabalho do psicólogo, o contrato previa o sigilo profissional.

Os trabalhos diários tinham duração aproximada de três horas e meia, incluindo discussões realizadas em separado pela equipe, antes e depois da estadia com os calouros. Além disso, a confecção e a partilha de relatórios necessitavam de reserva de tempo.

Após a exibição da obra escolhida, os participantes eram encorajados a iniciar os diálogos. Cabia à equipe coordenadora ponderar sobre os conteúdos surgidos espontaneamente, procurando manter focos consonantes com as diretrizes constantes do projeto político-pedagógico do curso de Psicologia, especialmente em temas relacionados à ênfase curricular em processos clínicos (Brasil, 2011).

A equipe também procurava centrar os diálogos em tarefas que visavam promover aprendizados sobre pensar em resoluções de dificuldades criadas e manifestadas no campo grupal (Pichon-Rivière, 1983/2009). Nesse sentido, cabe ainda retomar que, ao pensarmos as dinâmicas grupais, procurávamos manter em mente o eixo horizontal proposto por Pichon-Rivière: aquele referente ao grupo pensado em sua totalidade. Portanto, evitávamos compreender as manifestações em seu eixo vertical, o qual prioriza "cada elemento do grupo, distinto e diferenciado do conjunto" (Castanho, 2012, p.49).

Os trabalhos geravam relatórios semanais, realizados pela bolsista. Estes registravam a síntese do filme visto, os diálogos dos integrantes e incorporavam teorias sobre temas debatidos durante os encontros, que eram recuperadas em bases de dados científicas. Posteriormente, após revisão pelos psicólogos, esse material era compartilhado com os integrantes, para eles acompanharem o desenvolvimento do grupo e da bolsista, e para sugerirem mudanças de conteúdo e/ou realizarem comentários.

Além desses procedimentos, para direcionar os trabalhos em andamento e para fundamentar planejamentos posteriores, realizamos duas avaliações complementares às avaliações processuais, por meio de questionários, aplicados ao final do primeiro semestre (13º encontro – avaliação 1) e no final do segundo semestre (31º encontro – avaliação 2). Nesse sentido, os objetivos das avaliações eram basicamente acompanhar o processo e os participantes. O questionário de avaliação inicial era composto por dez questões mistas e foi respondido por 19 estudantes; e o da final continha 13 questões mistas, que foram respondidas por 11 pessoas. Por questões de objetividade, apenas quatro dessas questões serão priorizadas no item "Síntese dos trabalhos e das avaliações".

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Síntese dos trabalhos e de avaliações

Ao longo do ano letivo de 2012, 32 encontros foram realizados. Nesse ínterim houve suspensão de atividades por quatro meses, entre o primeiro e o segundo semestres, o que se estendeu até 2013 por conta da greve nacional das universidades federais. O grupo acompanhou esta trajetória, concluindo o cronograma previsto, apesar de sofrer variações na quantidade de seus membros.

Ao longo das atividades, 31 obras foram escolhidas, contemplando diferentes gêneros (comédia, drama, animação, romance, ação e suspense) e nacionalidades (estadunidenses, espanholas, francesas, brasileiras, italianas e australianas, dentre outras). Buscamos selecionar títulos variados, na tentativa de abranger predileções dos estudantes e temas tidos como relevantes ao processo de formação, em especial, como dito anteriormente, relativos à ênfase clínica (Figura 1).

 

Sobre as duas avaliações complementares, retomamos que elas ocorreram por meio da aplicação de questionários, no final do primeiro e do segundo semestres. A primeira pergunta era referente a como os integrantes se sentiam enquanto estudantes da UFG após a participação no grupo. Na primeira avaliação, quatro (21,0%) pessoas relataram não perceber mudanças advindas dos trabalhos, mas também não se sentiram pior em decorrência destes, enquanto 15 (79,0%) sentiam-se melhor. Na segunda avaliação, um (9,1%) estudante sentia-se da mesma forma, enquanto dez (90,9%) relataram sentir melhorias.

A segunda questão focava se os participantes observavam alguma alteração no seu processo de adaptação à universidade, advinda de contribuições prestadas pelo grupo. Neste sentido, na primeira avaliação, duas (5,0%) pessoas declararam não ter observado mudanças, 11 (64,0%) perceberam poucas mudanças e seis (31,0%) constataram muitas delas. Na segunda avaliação, quatro (36,4%) estudantes relataram poucas mudanças e sete (63,6%) perceberam muitas delas.

Para os discentes que indicaram ter percebido algum tipo de mudança, nas duas avaliações era solicitada a descrição de quais seriam elas. Nesse sentido, declararam (transcrições literais): percepção de mudanças nas formas de relacionamentos com os colegas, com fortalecimento de amizades; maior socialização e integração; desenvolvimento de senso crítico; capacidade de manter a calma; apoio e convicção de ter feito a escolha certa; melhor adaptação; aprendeu a ouvir e a compreender o que o outro apresentava.

A terceira questão avaliava como se sentiam enquanto estudantes do curso de Psicologia após a participação no grupo. A avaliação 1 demonstrou que cinco (26%) deles se sentiam iguais a como se sentiam anteriormente e 14 (74,0%) relataram se sentir melhor. A avaliação 2 demonstrou que os 11 participantes (100%) se sentiam melhor.

A quarta questão verificava se as pessoas notavam alguma mudança no processo de adaptação ao curso de Psicologia, advindas de contribuições geradas pelo grupo. Neste sentido, a avaliação 1 demonstrou que três estudantes (16,0%) não notaram mudanças, sete (37,0%) perceberam poucas e nove (47,4%) declararam muitas. A avaliação 2 apresentou três (27,3%) participantes que perceberam poucas mudanças, enquanto oito detectaram muitas delas (72,7%).

Para os integrantes que declararam ter percebido poucas ou muitas mudanças, a descrição delas era pedida. Assim, as principais contribuições constatadas foram (transcrições literais): possibilidade de maior contato com a Psicologia; otimismo nas perspectivas profissionais; agregação de valores pessoais e profissionais; maior segurança em relação à escolha profissional; maior cuidado ao discutir temas diversos; desenvolvimento da capacidade de manter sigilo e a percepção da importância deste na profissão; aproximação de temas que demonstram o que seria a Psicologia e o trabalho do psicólogo; e maior adaptação ao curso.

Apresentadas as maneiras como os trabalhos vêm sendo desenvolvidos em suas características essenciais e em como têm sido avaliados pelos calouros, no próximo item procuraremos ordenar e exemplificar alguns elementos das experiências vividas no primeiro ano de trabalho. Neste texto nos ateremos a algumas questões gerais que têm marcado o cotidiano dos processos grupais, assumindo que esse exercício não pretende abarcar a totalidade das experiências.

Ordenando e exemplificando elementos das experiências

Algo corriqueiro observado e construído no processo grupal foi que os filmes suscitaram temáticas heterogêneas (Figura 1). Estas contemplavam tanto discussões sobre "as personagens" quanto englobavam momentos nos quais "as personagens precisavam sair de cena", e conteúdos abertamente focados nas experiências das pessoas e do grupo tomavam vigor. Por exemplo, se consideramos a protagonista de O labirinto do Fauno (Del Toro, 2006), Ophelia, de modo semelhante ao que os estudantes viviam, é entendida como uma jovem em pleno processo de movimentação por entre descobertas, as quais nem sempre são prazerosas e/ou se dão em cenários bem iluminados.

No dia a dia, a equipe executora ouvia diversas queixas dos estudantes sobre questões inerentes aos seus momentos acadêmicos, como, por exemplo: as disciplinas que configuram a grade curricular nem sempre são as desejadas ou são compreendidas de modo parcial quanto aos motivos de existirem no momento de entrada no curso. Seus desempenhos acadêmicos são reconhecidos aquém de suas expectativas e as avaliações nem sempre são justas. Os professores atribuem mais responsabilidade e dirigem com restrições o modo como o conhecimento deve ser buscado.

Características como estas pareciam avizinhar Ophelia e os universitários, que se encontravam imersos num espaço e num tempo que pressupunha a independência quanto aos seus referenciais antigos, sejam acadêmicos, pessoais ou familiares. Para os estudantes, as "saídas" que Ophelia precisava fazer para alcançar seus objetivos acentuavam angústias e sofrimentos envolvidos na saída, concreta ou não, que precisaram fazer da casa dos pais ou dos responsáveis, uma vez que, paulatinamente, aproximavam-se da vida adulta e de suas reivindicações.

No decorrer da discussão sobre os filmes, ainda foi possível percebermos o modo como alguns integrantes lidavam com situações "difíceis" encenadas: num primeiro momento, após identificarem-se com diversos protagonistas, algo que era verbalizado por eles, mudavam o teor dos diálogos espontaneamente. Estes passavam a contemplar tópicos como filmes infantis, situações vividas na esfera familiar quando eram crianças, para em sequência conter experiências situadas no ambiente acadêmico propriamente dito. O papel da equipe executora era fundamental quando esse tipo de movimento em direção às questões de cunho mais íntimo vinha à tona, no sentido de que o foco da situação grupal precisava ser retomado, que eram as questões acadêmicas envoltas no aprender a ser psicólogo e aprender o que é a Psicologia.

Nessa direção, os dinamismos de situações vividas pelos integrantes no passado e no presente se materializavam a cada encontro: o que parecia ter sido vivido num momento longínquo ganhava novas formas no presente da situação grupal. Os estudantes buscavam elaborar os momentos de infância acadêmica? Se estivessem na casa dos pais ou responsáveis, estariam mais seguros (na zona de conforto)? A infância das pessoas do grupo estava prestes a se encerrar e elas deviam encarar a continuidade do crescimento, abraçando de modo progressivo, a escolha profissional que fizeram?

Nos encontros também pudemos perceber a descontração na relação entre os participantes, na medida em que os diálogos mantidos geravam risos e brincadeiras. O espaço grupal, construído após a série de 32 encontros, parece ter indicado aos seus integrantes que ali poderiam discutir assuntos "sérios" de um jeito "leve". Acreditamos que estes momentos descontraídos conferiram experiências enriquecedoras àqueles que pretendem ser psicólogos. O brincar entre os integrantes denotava uma condição grupal amadurecida ao longo do processo, especialmente quando consideramos que a ludicidade se manifesta nas relações humanas quando embasada em graus de confiança mútua.

Momentos nos quais os próprios integrantes "tomavam a frente" para procurar esclarecer o que o outro "não conseguiu compreender" sobre determinado filme foram frequentes ao longo do ano de trabalhos efetivados pelo grupo. Em situações semelhantes, a equipe sempre procurou encorajar os próprios integrantes a fomentarem os aprendizados que eles pudessem ter "sobre o filme". Porém, isso era feito com embasamento na crença de que, ao responder às "incompreensões" manifestadas, o mais relevante não seria o "esclarecimento" prestado por si mesmo, e sim o "tom" como ele seria prestado. Havia cuidados constantes no sentido de frisarmos que, na relação entre as pessoas, a tolerância ao olhar diferente que o outro pudesse ter sobre um determinado evento (cena do filme ou o próprio filme) seria sempre uma prioridade e um alvo a ser atingido. Esse exercício constante permitiu compreender, de modo gradual, que "Formar um grupo é então dar possibilidade para a conversa e a tensão entre as contradições." (Castanho, 2012, p.53).

Diálogos tidos entre os estudantes movimentaram, assim, a dinâmica grupal. Além disso, em alguns momentos, debates surgidos em grupo pareciam ressoar nas vidas dos participantes, para além dele. No instante em que certa pessoa "dizia algo", ela podia desempenhar o papel de "porta-voz". Sendo assim, conversas tidas no acontecer grupal podem ser vistas como indicadores de que as vinculações dos integrantes os fortaleceram quanto aos apoios que podiam construir ao longo da vida universitária iniciada, tendo filmes como pretextos, o que promovia aprendizagens intersubjetivas variadas. Vale lembrar que as mediações profissionais procuraram facilitar a escuta e trocas empáticas entre os membros do grupo para que eles próprios fortificassem seus aprendizados profissionais e pessoais.

O crescimento do grupo, igualmente, ganhava visibilidade quando os estudantes conseguiam fazer conexões com momentos vividos em encontros passados, no presente, ressaltando aprendizagens conquistadas no grupo, ou mesmo quando percebiam relações com outras situações ou produções fílmicas. Por exemplo, num momento dos diálogos estabelecidos sobre O labirinto do Fauno (Del Toro, 2006), dois integrantes debateram um filme não utilizado nos trabalhos:

Giovanni:

Me lembrei muito agora do filme Alice no País das Maravilhas, ele traz muito todo este colorido que nós estamos falando. Tem inclusa aquela cena em que ela [Alice] toma a pílula para crescer e depois para diminuir, que também se faz uma analogia ao crescimento dela de criança para adulta. Eu particularmente gosto mais de filmes que retratam um pouco mais o colorido.

Dênis:

E tem aquela cena do gato, em que ela está perdida e tem que tomar um cami-nho, aquela cena é muito legal.

O diálogo entre estes dois estudantes foi entendido como ampliador do que a equipe executora pretendeu discutir naquele determinado encontro, a partir da escolha do filme de Del Toro (2006). As relações que puderam ser feitas entre Alice e todo o trabalho que pode ser desenvolvido a partir de O labirinto do Fauno trouxeram à tona discussões pertinentes ao crescimento e aos "atordoamentos" que lhe são característicos (Alice estava "perdida"). Além do mais, como o grupo selava o 27º encontro neste dia (Figura 1), podemos dizer que esse tom confluente de assuntos denotava uma "sintonia" entre os modos como um filme poderia ser "lido" por estudantes e pela equipe executora, coletivamente.

Muitos desafios têm integrado o fazer da equipe executora e os processos grupais. Um dos maiores se refere à proposta ser de duração anual. Sustentar os trabalhos com esta extensão temporal requereu esforços e investimentos concretos por parte de todos os envolvidos, em especial porque o primeiro ano de funcionamento foi interrompido pela greve, que durou quatro meses (de maio a setembro de 2012). Se por um lado o aspecto temporal impulsiona questionamentos, por outro ele pode sinalizar o que há de positivo na empreita, integrando pessoas em espaço e tempo compartilhados. Ele pode promover fortalecimentos de aprendizados sobre a Psicologia e sobre relacionamentos humanos para aqueles que se prontificam a isso, e de modo espontâneo (não havia obrigatoriedade em integrar o grupo).

Temos, ainda, que reconhecer o quanto a manutenção da proposta é "cara", na medida em que todos abrem mão de praticamente um período de trabalho e/ou de estudos para estarem ali. Essa seria uma característica que poderia desencorajar a ocorrência de iniciativas semelhantes em outras instituições, em especial naquelas que oferecem atividades em turno único (diurno ou noturno). Uma alternativa viável para a diminuição do tempo e dos custos despendidos a cada encontro refere-se ao uso de filmes de curta-metragem ou ainda de outras linguagens artísticas (poesias, contos, crônicas, músicas etc.).

Compreendermos o significado do decréscimo no número de participantes quando da transição de um semestre letivo para o outro (em torno de 50%) tem sido provocativo. As mudanças nas grades horárias do curso explicam em algum grau essa característica, o que inclusive foi relatado por alguns calouros quando da avaliação final do projeto. Neste mesmo momento, outra explicação dada pelos participantes a esse fenômeno é que alguns colegas se ocuparam de outras atividades acadêmicas, oferecidas de modo concomitante ao horário do grupo (atividades de pesquisa, cumprimento de disciplinas optativas). Sobre esse tipo de constatação, em discussões e avaliações processuais ocorridas entre a equipe executora, reconhecemos que a mudança de semestre letivo e a consequente diminuição de integrantes não somente ilustra percalços do projeto, como também pode sublinhar o quanto ele tem cumprido sua função de acolher os calouros: se eles prescindem dele, é porque "chegaram" e encontraram outros sustentos para suas vidas universitárias.

Sobre limitações, elas não se desvinculam dos desafios. Contudo, grifamos as focalizadas no ambiente físico onde os trabalhos ocorrem. Temos que improvisar recursos para driblar o calor, como criar cortinas e levar ventiladores, e assistirmos aos filmes em uma televisão relativamente pequena, dada a escassez de recursos multimídia disponíveis.

Observamos, além disso, que a diminuição gradual de estudantes na virada de semestre letivo indica outro modo como o projeto poderia funcionar: em lugar de ser oferecido em caráter anual, oferecê-lo em um único semestre letivo. Os estudantes, sempre que indagados sobre essa modalidade de funcionamento, negam-na com veemência. Porém, na "ação" metade deles tem optado por isso.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na medida em que os encontros transcorreram no formato grupal e foram coordenados por psicólogos clínicos, acreditamos que as experiências dos estudantes possam constituir, para eles mesmos, novos modelos a serem ponderados em suas futuras atuações profissionais, assim como se espera quando este tipo de trabalho é colocado em exercício (Pichon-Rivière, 1983/2009). Por fim, como diz Bleger (1980/1998, p.89), cada membro do grupo alternou papéis entre si, desempenhando papéis uns dos outros e, nesse jogo dinâmico, pode incorporar "os diferentes momentos da aprendizagem" e pode ter conseguido maior integração do ser estudante de Psicologia.

Conforme dito anteriormente, o direcionamento dos trabalhos foi feito de modo que os coordenadores procurassem evitar a utilização do material emergente para fazer considerações que invadissem a vida privada dos participantes. Contudo, isso não implicou em descartarem fatores íntimos surgidos a cada dia de trabalho. Sendo assim, a equipe buscou focar a eficiência do grupo enquanto instrumento de aprendizagem, a despeito do reconhecimento do quanto, na prática, elementos de "aprendizagem" e "terapêuticos" estão frequentemente superpostos. Lembramos que: "A terapia não é o objetivo principal do grupo operativo de aprendizagem, mas algumas de suas consequências podem ser consideradas terapêuticas na medida em que capacitam o sujeito para operar na realidade" (Pichon-Rivière, 1983/2009, p.253).

O sigilo foi uma regra constantemente ressaltada e tranquilamente acatada pelos integrantes dos trabalhos nos seus distintos momentos. Essa característica foi sempre estimada de modo positivo, dada sua função essencial no desenvolvimento profissional dos estudantes.

O relato se referiu ao 1º ano de funcionamento do projeto e novas experiências têm ajudado a equipe executora a amadurecê-lo, juntamente com cada um dos calouros. Como psicólogos, procuramos estar incluídos e comprometidos no próprio terreno de nossas investigações e temos nos apropriado da ideia de que, ao operarmos, produzimos algum grau de impacto no grupo (Pichon-Rivière, 1983/2009). Nessa direção, tem havido aprendizados coletivos, visando aprimorar o sentido e a função acadêmica e social do projeto, enquanto peça inserida na realidade pessoal e institucional dos estudantes que iniciam seus estudos como psicólogos na Regional Jataí. Retomando a epígrafe deste texto e transformando-a, o trabalho em grupo tem procurado valorizar a contribuição de cada um e de todos. Essas contribuições têm propiciado aprendizagens constantes sobre modéstia e humildade face ao conhecimento que ali é produzido, e sobre barreiras que se encravam no fazer e no pensar a Psicologia, ocasionadas por situações novas.

As avaliações do projeto demostraram que os seus integrantes sentiram-se mais bem adaptados à universidade, às novas relações interpessoais e mais amadurecidos quanto à escolha feita pela Psicologia. Elas também indicaram que os trabalhos promoveram acolhimento e auxílios complementares às estruturas oferecidas pela UFG e pelo próprio curso em momento de transição de identidade para a esfera universitária. Um tempo e um espaço foram criados, com amparo nas metáforas trazidas pelos filmes. Estas, dialogadas, parecem ter ajudado as pessoas a dissiparem parte dos receios e ansiedades envolvidos neste momento de suas vidas.

O processo grupal relatado parece ter se inserido, assim, como recurso possível na vida dos estudantes, num momento no qual ambivalências são marcas cotidianas do universo acadêmico: desejam ser psicólogos e sofrem pela escolha feita porque ela parece implicar em inúmeras perdas paralelas aos ganhos; almejam transitar do Ensino Médio à universidade, bem como da adolescência para a vida adulta, e temem as dificuldades intrínsecas a este momento. A tarefa colocada aos integrantes aludia ao dinamismo próprio ao cotidiano, no qual calouros e psicólogos puderam aprender, em grupo, a solucionar o que seriam algumas características da ciência e da profissão.

Para finalizar, a proposta relatada mantém as linhas de inspiração teórica e prática detalhadas por Santeiro (2013) e Santeiro e Santeiro (2013) e tem sido ampliada e amadurecida, pois está materializada noutra ambientação institucional, com adendos aos recursos humanos e ao número possível de participantes. Para a consideração dos seus contornos, é necessário, ainda, refletirmos que no encontro possível entre espectadores, trocas intersubjetivas podem ocorrer, ultrapassando discussões formais sobre filmes assistidos, porque os envolvidos que se disponibilizam a dialogar sobre o que a obra instiga podem acrescer amplas variantes de situações e condutas humanas às suas experiências pessoais e acadêmicas. Esse exercício compartilhado em âmbito grupal, mediado pela presença de profissionais que busquem favorecer a escuta e trocas empáticas entre seus integrantes, é entendido como recurso auxiliar no processo de formação de um psicólogo e em última instância pode espelhar vertentes possíveis de atuação clínica para o estudante.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência
Tales Vilela Santeiro
E-mail: talessanteiro@hotmail.com

Submissão: 03/12/2013
1ª reformulação: 10/03/2014
Aceite final: 19/05/2014

 

 

1 Tales Vilela Santeiro é professor adjunto da Universidade Federal de Goiás, Campus de Jataí.
2 Fabíola Ribeiro de Moraes Santeiro é mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
3 Aurélia Magalhães de Oliveira Souza é psicóloga técnica administrativa da Universidade Federal de Goiás, Campus de Jataí.
4 Ana Paula de Melo Juiz é psicóloga pela Universidade Federal de Goiás, Regional Jataí; integrou a equipe como estudante, bolsista PROBEC-UFG, até 2013.
5 Lucas Rossato é psicólogo pela Universidade Federal de Goiás, Regional Jataí; integrou a equipe como estudante, bolsista PIVIC-UFG, até 2014.