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Revista da SPAGESP

versão impressa ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP vol.20 no.2 Ribeirão Preto jul./dez. 2019

 

ARTIGOS

 

Avaliação de distorção cognitiva de autores de agressão sexual de criança e adolescente (AASCAS): Revisão sistemática da literatura

 

Cognitive distortion assessment of sexual offender of children and adolescents: review of systematic literature

 

Evaluación de distorción cognitiva de agresor sexual de niño y adolescente: revisión de la literatura sistemática

 

 

Daniela Castro dos Reis1, I; Lília Iêda Chaves Cavalcante2, II

IUniversidade Federal Rural da Amazônia, Parauapebas-PA, Brasil
II
Universidade Federal do Pará, Belém-PA, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A distorção cognitiva (DC) é um tema que vem sendo estudado amplamente quando se avalia os autores de agressão sexual de criança e adolescente (AASCA). Assim, esta revisão sistemática teve como objetivo identificar e sintetizar os resultados de pesquisas que utilizaram instrumentos de DC nesta população. Utilizando os critérios de inclusão e exclusão de busca no Periódico CAPES, foram encontrados 64 artigos, sendo 56 selecionados, um escrito em português e os outros 55 em inglês. Nestes estudos, identificaram-se 92 instrumentos, sendo nove deles em seis artigos. Os resultados demonstraram que a DC é utilizada na literatura como fator preditor para o cometimento da agressão sexual de criança; correlaciona-se a variáveis como negação/minimização da agressão sexual; tem sido estratégica para avaliar perfis distintos entre grupos de análise; e, por fim, usada como uma medida a ser avaliada no tratamento de risco de reincidência de AASCAs. Sendo assim, conclui-se que os estudos de DC e seus instrumentos apresentam grande heterogeneidade de resultados, mas confirmam-na como uma variável essencial a ser considerada para avaliar AASCAs.

Palavras-chave: Criança; Adolescente; Violência Sexual.


ABSTRACT

Cognitive distortion (CD) is a subject that has been extensively studied when assessing the authors of sexual aggression of children and adolescents (AASCA). Thus, this systematic review had the objective of identifying, analyzing and synthesizing the results of researches that used DC instruments in this population. Using the search inclusion and exclusion criteria in the CAPES Journal, 64 articles were found, of which 56 were selected, one is in Portuguese and the others 55 in English. In these studies, we identified 92 instruments was used, nine of them in six articles. The results showed that CD is used in the literature as a predictor for sexual aggression of child; correlates with variables such as denial/insignificantion of sexual aggression; has been strategic to evaluate distinct profiles between analysis groups; and, finally, used as a measure to be evaluated in the treatment of risk of recurrence of AASCAs. Thus, it is concluded that the CD studies and their instruments present a great heterogeneity of results, but confirm it as an essential variable to be considered to evaluate AASCAs.

Keywords: Child; Adolescent; Sexual Violence.


RESUMEN

La distorsión cognitiva (DC) es un tema que viene siendo estudiado ampliamente cuando se evalúa a los autores de agresión sexual de niño y adolescente (AASCA). Así, esta revisión sistemática tuvo como objetivo identificar, analizar y sintetizar los resultados de investigaciones que utilizaron instrumentos de (DC) en esta población. Utilizando los criterios de inclusión y exclusión en búsqueda en el Periódico CAPES, se encontraron 64 artículos, siendo 56 seleccionados, uno escrito en portugués y los otros 55 en Inglés. En estos estudios, se identificaron 92 instrumentos, siendo nueve de ellos en seis artículos. Los resultados demostraron que la DC se utiliza en la literatura como factor predictor para la comisión de la agresión sexual de niño; se correlaciona con variables como negación / minimización de la agresión sexual; ha sido estratégica para evaluar perfiles distintos entre grupos de análisis; y, por último, se utiliza como una medida a evaluar en el tratamiento del riesgo de reincidencia de AASCA. Siendo así, se concluye que los estudios de DC y sus instrumentos presentan gran heterogeneidad de resultados, pero la confirman como una variable esencial a ser considerada para evaluar AASCA.

Palabras clave: Niño; Adolescente; Violencia Sexual.


 

 

A distorção cognitiva (DC) de autores de agressão sexual de criança e adolescente (AASCA) tem despertado a atenção de profissionais há, aproximadamente, trinta anos. Estudiosos como Abel, Becker e Cunningham-Rathner (1984), Finkelhor (1984) e Marshall e Barbaree (1990) foram os primeiros que relataram a presença de DCs entre os AASCAs. O termo foi introduzido, pela primeira vez, por Abel, Becker e Cunningham-Rathner, em 1984, justamente para descrever o pensamento distorcido desta população (Marunna & Mann, 2006) e, entre outras aplicações, justificar o comportamento desse tipo de AASCA.

Praticamente todas as teorias contemporâneas sobre a etiologia da agressão sexual infantil, como o Modelo de Pré-Condições (Finkelhor, 1984), o Modelo de Abel, Becker e Cunningham-Rathner (Abel, et al., 1984), o Modelo Multifatorial (Marshall & Barbaree, 1990), entre outros, outorgaram um papel fundamental à cognição daqueles que praticam agressão sexual (Finkelhor, 1984; Hall & Hirschman, 1991; Ward & Beech, 2002). O pressuposto básico subjacente a estas teorias defende que os AASCAs apresentam ideias distorcidas no modo como pensam e interpretam a si mesmo, o mundo e as relações com outras pessoas ou com outros grupos (Nunes, 2012; Silva, 2013), justificando, por meio dos pensamentos distorcidos, certos comportamentos.

A DC tem sido entendida como crença disfuncional e mal-adaptativa que pode estar relacionada com a visão que o indivíduo tem sobre outra pessoa, sobre si mesmo e o mundo que o cerca (Nunes, 2012; Silva, 2013). Ou seja, duas pessoas podem ter acesso à mesma informação e, ainda assim, construírem crenças sobre elas muito diferentes. Todavia, entende-se que esses estados mentais podem mudar ao longo do tempo, dependendo da disponibilidade da informação e dos fatores biopsicossociais envolvidos (Vieira, 2010).

Com o passar do tempo, o uso do termo DC se tornou mais comum e tem sido empregado para se referir as atitudes e crenças, bem como, desculpas e justificativas para a perpetração da agressão. Nesse sentido, pode-se dizer que a DC remete à constituição de um influente sistema de crença capaz de explicar e até justificar o que pensa o AASCA sobre o próprio comportamento e o quanto considera legítima a relação sexual que envolve crianças e adolescentes (Vieira, 2010).

Conforme sinalizam estudos recentes Boillat, Deuring, Pflueger, Graf e Rosburg (2017), Szumski, Bartels, Beech e Fisher (2018), Tülü e Erden (2014), Vieira (2010), Ware, Marshall e Marshall (2015), consideram que não é a presença de DC que diferencia o AASCA do restante da população em geral, mas sim, o conteúdo do pensamento distorcido e o objetivo que o indivíduo pretende atingir com o comportamento. Assim, o que distingue o AASCA dos demais indivíduos é que a DC destes últimos é pró-social e não adaptada a comportamentos desviantes ou agressivos. Ou seja, elas não são utilizadas para justificar a prática de comportamentos desse tipo.

Segundo Marunna e Mann (2006), as pesquisas sobre DC precisaram contemplar, desde as primeiras iniciativas, uma série de questões sobre o pensamento do AASCA, tendo por objetivo compreender a lógica e a organização da forma de expressão do pensamento distorcido. Por meio da investigação sistemática e contextualizada da DC, tem-se buscado conhecer a perspectiva adotada por esses indivíduos em diferentes épocas e sociedades, no sentido de entender o quão legítimas são as razões que justificam essa forma peculiar de se comportar e de se relacionar sexualmente com criança e/ou adolescente (Marunna & Mann, 2006).

Diante da atualidade dos estudos com o AASCA, a DC é proposta como um atraente objeto de estudo e se firma como uma área do conhecimento emergente, principalmente pela importância em se compreender a forma como é construído o pensamento e seu conteúdo daqueles que perpetram a agressão sexual contra criança/adolescente. Assim, algumas tentativas de estudo têm sido realizadas no sentido de favorecer medidas que permitam o acesso ao que pensa o AASCA sobre a agressão praticada e os argumentos por ele utilizados para explicar e justificar esse comportamento. Essas tentativas envolveram a elaboração de instrumentos padronizados ou não, sempre com o objetivo de captar ou entender o estilo e o conteúdo do pensamento distorcido nas mais diversas formas de se manifestar.

Como exemplo desse esforço, tem-se o estudo de Abel et al. (1989), intitulado The measurement of the cognitive distortions of child molesters, que apresenta um questionário o qual foi elaborado para medir a força do sistema de crenças e a idiossincrasia das cognições dos AASCAs. Tal instrumento apresentava itens gerais, tais como, examinar a existência da DC relativa à agressão sexual infantil e se os AASCAs poderiam ser discriminados do grupo controle (Gannon, Ward, & Collie, 2007; Marunna & Mann, 2006).

Posteriormente, o questionário, utilizado pela primeira vez por Abel et al. (1984), foi adotado por vários investigadores interessados em avaliar a DC dos AASCAs (Bumby, 1996; Hanson, Gizzarelli, & Scott, 1994), sendo considerado, até recentemente, como um método capaz de avaliar a DC para essa população (Gannon, Ward, & Collie, 2007; Marunna & Mann, 2006; Nunes, 2012; Silva, 2013). Apesar, de ter se tornado um instrumento largamente aceito entre os pesquisadores do tema, o questionário recebeu uma crítica importante originada nos trabalhos de Neidigh e Kropp (1992). Esses autores avaliaram que o instrumento criado por Abel et al. (1984) deve ter sua importância reconhecida pelos pesquisadores atuais, porém este deve ser visto como uma escala que não mede o que pretende medir. Para Neidigh e Kropp (1992), trata-se de uma escala que mede atitude, mas não, exatamente, formas particulares de DC.

Apesar das críticas feitas às tentativas anteriores, de se utilizar um instrumento consistente o suficiente para acessar a DC dos AASCAs, novas escalas e questionários para medir DC foram relatadas em pesquisas recentes, por exemplo, a Attributional Dimension Scale, Child Molester Scale, Multiphasic Sex Inventory, Comprehensive Inventory of Denial-Sex Offender Version (CID-SO), entre outras. Assim, os estudos sobre os instrumentos de DC foram se disseminando na literatura, gerando uma série de controvérsias, sobretudo quanto aos aspectos conceituais e metodológicos.

Os instrumentos de avaliação da DC vêm recebendo pouca atenção no meio científico, haja vista o interesse contínuo dos pesquisadores em relação ao que os AASCAs, pensam, fazem e sentem. Entre as pesquisas realizadas com essa população, poucas levaram em consideração a DC e suas implicações para a compreensão do fenômeno em questão. Frequentemente, as pesquisas mais recentes (Silva, 2013; Tülü & Erden, 2014) procuram avaliar o perfil dos AASCAs e os crimes por eles praticados, ou mesmo, buscam estimar taxas de reincidência e os efeitos de protocolos de tratamento destinados a essa população, mas, muitas vezes, sem considerar diretamente o papel cumprido pela DC na composição de análises mais amplas sobre o problema em questão (Amirsardari, Azari, & Kooraneh, 2014; Tülü & Erden, 2014).

De maneira geral, entender a DC é uma forma de começar a compreender as características da pessoa a partir da perspectiva bioecológica aqui adotada. Um método eficaz para a realização desse tipo de investigação pode ser a revisão sistemática de literatura científica sobre o tema. Assim, estudos de revisão sistemática de literatura (RSL) sobre determinado assunto objetivam identificar e caracterizar o tema estudado, sinalizando semelhanças e lacunas entre os resultados divulgados nas publicações. Eles servem, ainda, para sinalizar a importância teórica, acadêmica e social do que já foi publicado sobre um determinado tema, sintetizando o que foi pensado e demonstrado até o momento como um ponto de partida para novas investigações e desafios científicos.

Em termos de contribuição teórica, as revisões literatura apontam para a realização do levantamento de produção conhecimento sobre o tema, testando hipóteses teóricas averiguadas em investigações empíricas. Como exemplo pode-se avaliar os conteúdos e os processos mentais que envolvem a DC em AASCA, comparando com outros grupos; ou ainda analisar os construtos teóricos da área por meio de instrumentos ainda não validados para o uso em outras culturas.

No estudo de revisão aqui proposto, pretendeu-se apontar a relevância teórica, acadêmica e social das investigações que podem suscitar o tema sobre DC como um objeto de estudo atual, sobretudo conhecer e avaliar os resultados de pesquisas que têm permitido acessar a DC atribuída aos AASCAs. Além da relevância teórica, acadêmica e social dos estudos que lançaram instrumentos de avaliação de DC e suas propriedades psicométricas, deve-se considerar igualmente importante a avaliação dos resultados e as conclusões obtidas a partir da aplicação de escalas, testes e inventários na medida em que permitem acessar padrões de pensamento distorcido entre AASCAs.

Sendo assim, esta revisão de literatura teve como objetivo identificar e sintetizar os resultados de pesquisas que utilizaram instrumentos de DC na população em análise. Tais estudos representam, aqui, a produção científica formada por pesquisas que investigaram o modo de pensar de AASCAs, na literatura nacional e internacional, publicadas entre 1980 e 2013.

 

Método

Esta revisão está adequada ao modelo PRISMA, o que compreende as fases de escolha das fontes de dados, eleição dos descritores, busca de artigos, análise dos títulos e resumos, leitura dos textos na íntegra, adoção de critérios de inclusão e exclusão, extração dos dados e avaliação das publicações selecionadas, conforme o Fluxograma na figura 1.

A pesquisa envolveu a produção científica disponível em bases bibliográficas eletrônicas que compõem os Periódicos de Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Esta fonte de dados foi escolhida por atender aos critérios de confiabilidade e abrangência de periódicos científicos e por dispor de um acervo extenso com os principais artigos publicados em diversas áreas, nacional e internacional, com fácil acesso para a maioria dos pesquisadores.

Procedimentos gerais

Para a realização das buscas dos artigos científicos, os critérios de inclusão e exclusão foram delimitados: (a) inclusão: artigos publicados em português e inglês; artigos completos e empíricos; artigos que envolvessem exclusivamente AASCAs e acima de 18 anos de idade; artigos que utilizaram instrumentos de DC; não foi estipulado o período de abrangência, sendo que os artigos encontrados se concentraram entre 1980 e 2013; (b) exclusão: literatura cinzenta (por exemplo: documentação técnica, anúncio de jornais, entre outros); teses; dissertações e demais trabalhos de conclusão de curso; artigos teóricos e de revisão sistemática de literatura; estudos com vítimas de agressão sexual; artigos que apresentavam no título termos que representam tipos específicos de AASCAs: pedófilo, psicopatas, aliciador, traficante sexual, explorador sexual.

Concomitante à definição dos critérios de inclusão e exclusão, foram pesquisados descritores na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), especificamente na sessão que trata da terminologia. Todos os descritores foram checados, no entanto, nenhum termo correlato foi encontrado na literatura da área. Desta forma, os descritores foram definidos considerando-se, para tanto, os termos encontrados em publicações da área.

Seleção dos descritores

Foram selecionados 10 descritores, sendo cinco em português (agressor sexual, abusador sexual, perpetrador sexual, estuprador sexual, molestador sexual) e cinco em inglês (sexual aggressor, sexual abuser, sexual perpetrator, rapist, sex ofender), combinados com as palavras criança/child e adolescente/adolescent. Utilizou-se operadores booleanos (AND), delimitando o escopo da pesquisa.

Após essa etapa, procedeu-se à apreciação dos artigos por três juízes, (dois alunos de mestrados e um doutorando) para avaliação do nível de concordância entre eles quanto à inclusão na revisão proposta. Para que os juízes pudessem avaliar os artigos selecionados assegurou-se que todos conhecessem previamente o objetivo da pesquisa, dominassem os critérios de inclusão e exclusão, tivessem a capacidade de ler e compreender textos escritos na língua inglesa, assim como conhecessem o Teste de Relevância (Azevedo, 2010) e sua aplicação nesse tipo de pesquisa.

Para se chegar ao índice de confiabilidade foi calculado IC = A (concordância) x 100÷A + D (discordância) segundo Pereira e Bachion (2006). Dessa forma, para o autor, o índice de confiabilidade aceitável é IC > 80%. Assim, foi realizada a análise para os artigos escolhidos, pois entre os 64 artigos pré-selecionados, 56 foram selecionados por pelo menos dois juízes, obtendo o IC de 87,5%.

Procedimento de análise dos artigos seleconados pelos juízes

Para a análise dos dados, a pesquisa considerou a análise crítica dos artigos identificando os instrumentos de DC e seus resultados encontrados nos estudos analisados. Cada artigo foi triado pelo título e pelo resumo e posteriormente encaminhado aos juízes para a seleção. Após avaliação, cada estudo foi lido na íntegra, considerando algumas categorias para a análise desta pesquisa: tipo de procedimento metodológico (documental, empírico e misto), tipologia (padronizado e não padronizado) e nomenclatura (psicológico, cognitivo e fisiológico) dos instrumentos, análise dos objetivos dos artigos e síntese dos resultados obtidos nos artigos que avaliaram a DC.

 

Resultado e Discussão

Dentre os 64 artigos pré-selecionados, 56 foram escolhidos pelos juízes, sendo um escrito em português e os outros 55 em inglês. Os demais oito artigos foram excluídos pelos juízes por não contemplarem os objetivos do estudo. (Figura 1).

 

 

Para a análise crítica dos artigos, os estudos foram analisados considerando o tipo de procedimento metodológico assim identificado: os que utilizaram exclusivamente método documental, empírico e misto. No total, nove (16,1%), artigos apresentaram método de coleta de dados mistos (documentais e empíricos) fontes de informação primárias e secundárias, 11 (19,6%) artigos utilizaram exclusivamente dados documentais, como exemplo, aqueles que usam fontes de informação exclusivamente secundárias, e 36 (64,3%) deles envolveram, unicamente, método de coleta de dados empíricos. Os artigos que utilizaram a coleta de dados exclusivamente documental foram descartados desta análise.

Para a análise da tipologia dos instrumentos foram priorizados os artigos com método de coleta misto ou, exclusivamente, empírico, totalizando 92 instrumentos de coleta. Destes, foram identificados 20 (21,7 %) instrumentos sem padronização (aqueles que envolvem entrevistas, formulários e questionários sem validação) e 72 (78,3%) instrumentos com padronização, tais como escalas, questionários e inventários validados cientificamente. Ao final, incluíram-se, nesta revisão de literatura, 45 estudos que apontaram a utilização de 72 instrumentos validados para pesquisa com os AASCAs.

Entre os 72 instrumentos encontrados, 24 (33,3%) destinavam-se à investigação de medidas psicológicas (testes de personalidade, emoção, ansiedade e estilo de apego), 13 (18,1%) medidas cognitivas (testes de inteligência, empatia e DC) e cinco (6,9%) medidas fisiológicas (testes falométricos).

Como parte da análise, entre os 13 instrumentos de medidas cognitivas, nove instrumentos de DC foram encontrados, concentrados em seis artigos destacados nesta revisão de literatura conforme tabela 1. Para tanto, considerou-se o objetivo dos instrumentos, o título do artigo no qual estes foram localizados, as variáveis consideradas na análise e o teste estatístico aplicado para checar presença e nível de associação entre elas.

 

 

Como discutido anteriormente, as DCs podem ser usadas para justificar a agressão sexual ou podem, ainda, ser estudadas como um preditor para a reincidência do ato. Os artigos incluídos nesta revisão de estudos, com AASCAs, tentam identificar a presença das DCs e a forma como estiveram correlacionadas com variáveis como: empatia, apego, negação/minimização da agressão sexual, atitudes, responsabilidade pessoal pelo ato perpetrado, deficiência intelectual, entre outras.

Para a análise dos objetivos dos seis artigos que avaliaram DC foram organizados os dados em quatro categorias baseadas em temas gerais: (a) DC como fator preditor para o cometimento da agressão sexual de criança; (b) DC correlacionada a variáveis como negação/minimização da agressão sexual; (c) DC e sua distinção entre os grupos de análise; e, por fim, (d) DC como uma medida a ser avaliada no tratamento de risco de reincidência de AASCAs.

Dc como fator preditor para o cometimento da agressão sexual de criança

Para avaliar as DC como fator preditor para o cometimento da agressão sexual de criança, utilizou-se o CMS o qual foi revisado para avaliar se, combinado ao estilo de apego, à empatia pela vítima e às DCs, tais variáveis seriam preditoras para a agressão sexual de criança, sendo encontrado em um (1) artigo intitulado Predictors of Child Molestation Adult Attachment, Cognitive Distortions, and Empathy (Wood & Riggs, 2008). Testaram-se dois modelos de regressão logística: o primeiro modelo para analisar variáveis sociodemográficas, que, no entanto, não foram significativas; e o segundo modelo, que consistiu na entrada simultânea das duas escalas de apego adulto (ansiedade e evitação), o escore total do CMS e as duas escalas de Empatia (Empatia Geral e Empatia pela vítima), deixando de lado as variáveis sociodemográficas (Wood & Riggs, 2008).

Contrário às hipóteses previstas no estudo, o apego de esquiva não foi significativo, mas todas as outras variáveis foram relacionadas significativamente como preditoras para agressão sexual de criança conforme esperado. Um exame das razões de chances para cada preditor revelou que os níveis crescentes de apego ansioso e empatia pela vítima aumentaram as chances dos participantes em cometer a agressão de 56% e 15%, respectivamente.

Outra análise similar foi realizada no mesmo estudo com as seguintes variáveis: DC e empatia pela vítima. A chance de uma pessoa vir a cometer agressão sexual, para cada razão, foi de 11% e 5%, respectivamente. Isto significa que há uma probabilidade de o participante ter uma predisposição para cometer agressão sexual contra criança diante daquelas variáveis. De maneira geral, o estilo de apego ansioso, a presença das DCs e a baixa empatia pela vítima podem atuar como preditores significativos para o cometimento da agressão sexual de criança (Wood & Riggs, 2008).

DC e sua correlação com as variáveis de negação/minimização da agressão sexual

Na análise deste estudo, a literatura apontou que a categoria negação e minimização devem e podem ser estudadas como variáveis distintas das DCs mais gerais, conforme discutido por Nunes (2012). É necessário ressaltar que, apesar da DC ser, quase sempre, tratada como sinônimo da negação/minimização da agressão, neste estudo os autores avaliaram os instrumentos considerando DC como o conceito mais geral e negação/minimização, como categorias a parte da DC.

Para verificar a correlação entre as variáveis DCs e a negação/minimização, quatro instrumentos foram revisados: SOARS, CID-SO, MOLEST Scale e HSAQ no estudo Are Cognitive Distortions Associated With Denial and Minimization Among Sex Offenders? (Nunes & Jung, 2012). O SOARS e o CID-SO são instrumentos que avaliam variáveis de negação e minimização do ato praticado, enquanto a MOLEST Scale e o HSAQ são instrumentos que analisam DCs (Tabela 1). O desenho da pesquisa foi elaborado para testar a correlação entre um instrumento de DC e os demais que mensuraram negação/minimização da agressão sexual. Para tanto, o estudo foi apresentado em três partes distintas.

A primeira avaliou a correlação entre as variáveis do instrumento SOARS e da MOSLEST Scale, encontrando-se correlações médias (0,3) entre a MOLEST Scale e quatro dos seis domínios do SOARS. Assim, houve correlação com maior endosso da DC menor (baixa) aceitação da agressão sexual praticada, aceitação do planejamento da agressão, aceitação do dano causado à vítima e motivação para mudança comportamental.

A segunda análise avaliou as variáveis do SOARS correlacionadas com a escala de justificativa para agressão sexual do HSAQ. Encontraram-se correlações médias (0,3) entre um item da escala denominado de Direito Sexual sobre as vítimas HSAQ e três dos itens do instrumento SOARS (aceitação de crime sexual, aceitação do planejamento da agressão e aceitação de danos à vítima). Especificamente, houve maior endosso de DC sobre o direito sexual à vítima, correlacionado com menor (baixa) aceitação de crime sexual, da aceitação do planejamento da agressão e da aceitação de danos à vítima. O item do HSAQ relacionado à criança se sentir motivada para manter relação sexual com o adulto foi moderadamente correlacionado, apenas para justificativa da agressão sexual do SOARS.

Na terceira análise, a correlação entre o CID-SO e a MOLEST Scale ocorreu da seguinte forma: a MOLEST Scale foi moderadamente (0,3) correlacionada com a subescala minimização de danos do instrumento CID-SO, porém as demais correlações como negação do desvio sexual, negação da necessidade de tratamento e negação da responsabilidade obtiveram uma correlação baixa (0,1) com a DC da MOLEST Scale. Assim, houve maior endosso de DC acerca da agressão sexual infantil e foi correlacionada com a minimização de danos para as vítimas.

Os dados extraídos do Are Cognitive Distortions Associated With Denial and Minimization Among Sex Offenders? (Nunes & Jung, 2012) confirmaram que há uma correlação positiva entre DC e a negação/minimização de culpa e da agressão, do dano à vítima e da responsabilidade, mas não foram associados à negação/minimização do desejo sexual desviante. De maneira geral, a negação/minimização do dano à vítima foi a variável correlacionada com DC encontradas em todas as análises realizadas. A negação/minimização do crime praticado e a negação/minimização do planejamento foram variáveis correlacionadas às DCs encontradas na 1ª e 2ª análises (Nunes & Jung, 2012). No entanto, são necessários novos estudos para que seja possível fazer afirmações mais consistentes sobre a correlação existente entre determinado tipo de DC e as negações/minimizações comumente consideradas em pesquisas com essa população.

Dc e sua distinção entre os grupos de análise

Os resultados demonstraram a existência de pesquisas que se propuseram comparar grupos de amostra diferentes, com características distintas. Para realizar a comparação de dois grupos de participantes, as variáveis como autoestima, solidão, ausência de intimidade, empatia, assertividade e DC foram utilizadas. O objetivo foi comparar a presença de diferenças entre os dois grupos. Para analisar as DCs, utilizou-se o instrumento Children and Sex Cognitions Scale do artigo Comparison of Sex Offenders to Nonoffenders on Selected Psychological Measures de (Fisher, Beech, & Browne, 1999).

Os dados revelaram que os dois grupos (AASCAs e grupo controle), quando comparados em termos de características gerais, não diferiram significativamente nas escalas de níveis de DC. Para uma análise mais detalhada, separaram-se grupos com características distintas: AASCAs com baixo e alto desvio sexual, e grupos intra e extrafamiliar. Quando realizada a comparação entre a amostra dos grupos de criança e o grupo controle específico, obteve-se o seguinte resultado: AASCAs, com baixo desvio sexual, são indistinguíveis do grupo controle em termos de DC. Os resultados mudaram quando os AASCAs, com alto desvio sexual, foram comparados com o grupo controle. Os dados revelaram diferenças significativas entre os grupos, com maior presença de DC no grupo de AASCAs, com alto desvio sexual (Fisher, Beech, & Browne, 1999).

Tendo em vista o fato de que ser pai poderia ter um impacto significativo sobre a forma como uma criança é considerada individualmente, propôs-se outra comparação no estudo, qual seja a separação dos grupos de não pais (extrafamiliar) e pais (intrafamiliar) que agrediram sexualmente seus filhos. Comparou-se, primeiramente, o AASCAs extrafamiliar com o grupo controle sem filhos cujos resultados apontaram diferenças significativas nos níveis de DCs. A amostra de AASCAs extrafamiliar apresentou maiores níveis de DC. O grupo com AASCAs intrafamiliar e o grupo controle com filhos não apresentou diferença significativa nas medidas dos instrumentos de DC (Fisher, Beech & Browne, 1999).

De maneira geral, os dados relevaram que os AASCAs, com alto desvio e extrafamiliar, quando comparados com o grupo controle, apresentaram diferenças significativas referentes à DC. No entanto, outra parcela dos grupos de AASCAs parece ser indistinguível do grupo controle quando relacionado à DC (Fisher, Beech, & Browne, 1999).

Dc como uma medida a ser avaliada no tratamento de risco de reincidência de AASCAS

Neste tópico, três estudos consideraram a DC como variável importante na prevenção para reincidência (Lindsay, Michie, Steptoe, Moore, & Haut, 2011; Marques, Nelson, West, & Day, 1994; Ward, Hudson, & Marshall, 1994) o primeiro estudo avaliou a percepção das causas da reincidência do ato sexual; o segundo estudo considerou a DC e o risco de reincidência; e o terceiro trabalho avaliou a DC relacionada ao tipo de agressão sexual e o risco de reincidência.

Percepção das causas da reincidência do ato sexual

A DC tem sido também usada em pesquisas para aferir como os AASCAs percebiam as causas da reincidência do ato sexual. Para avaliar esse construto foi utilizado o instrumento ADS cujo objetivo foi medir as causas das reincidências em termos emocionais e atribucionais, isto é, como os participantes percebiam os eventos e as circunstâncias envolvidos na reincidência do ato praticado. Para a análise deste dado, usaram-se quatro variáveis: incontrolabilidade, estabilidade, localidade e globalidade.

Os dados do artigo The Abstinence Violation Effect In Child Molesters de Ward, Hudson, e Marshall (1994) aferiram sobre o grau de reincidência dos participantes e a sua relação com as causas da agressão sexual, bem como se os motivos eram controláveis e/ou estáveis, isto é, se os AASCAs tinham controle sobre os eventos após tratamento. Os resultados significativos mostraram que o grupo de AASCAs percebe as causas do comportamento sexual como desviante e que estas eram incontroláveis e estáveis, sendo indicado tratamento e terapia para esse grupo. Após o tratamento, o estudo sinalizou que houve alteração (redução) na forma como os AASCAs percebiam sua incontrolabilidade e instabilidade frente a uma nova situação da agressão sexual.

DC e o risco de reincidência

Para aferir sobre o risco de reincidência, a variável DC foi considerada para avaliação de um programa de tratamento no artigo de Marques, Nelson, West e Day (1994). O instrumento MSI foi revisado para avaliar duas medidas: a justificativa para a agressão sexual (J) (mede a disponibilidade do AASCA em exteriorizar a culpa por seus crimes sexuais), a DC e imaturidade (CDI) (que identifica a tendência à expressão de ideias egoístas gerais sobre si mesmo em relação à outra pessoa).

A pesquisa analisou duas amostras, os AASCAs e o grupo de agressão sem violência sexual, e avaliou esses grupos a partir de um programa de tratamento em dois momentos, no início e no final do tratamento. Os resultados preliminares sobre a prevenção de recaída de AASCAs mostrou progressos significativos no final do programa de tratamento considerando a J e a DCI. Estas medidas comparadas com risco de reincidência entre o grupo de AASCAs não mostrou correlação significativa com o perigo de novos crimes sexuais (Marques, Nelson, West & Day, 1994).

A constatação de que a amostra pós-tratamento melhorou significativamente na aplicação do MSI, no sentido de aceitar a responsabilidade completa por seus crimes, foi encorajador, contradizendo a hipótese levantada de que os AASCAs apresentam uma tendência a não se responsabilizarem pela agressão sexual praticada contra criança. Apoiando esta conclusão, o grupo de AASCAs, em tratamento, teve uma redução significativa na CDI e J no final do tratamento (Marques, Nelson, West & Day, 1994).

No entanto, nem a CDI e nem a J, associada à taxa de risco de reincidência, ligada à agressão sexual testada no estudo, foi significativa, quando comparada com os AASCAs. Uma das várias interpretações possíveis para essa falha pode estar ligada, primeiramente, às crenças e atitudes medidas por essa escala, podendo ser menos importantes como antecedentes para delitos sexuais do que tem sido geralmente realizada. Ou seja, as DCs e justificações podem ser o resultado de tentativas para aliviar a culpa após a agressão, ao invés de ser um fator precursor da agressão sexual (Marques, Nelson, West & Day, 1994).

DC e tipo de agressão sexual e o risco de reincidência

A DC foi avaliada a partir de uma série de tipos de situação de agressão sexual, tais como: estupro, exibicionismo, voyeurismo, data do abuso, perseguição. Para aferir e comparar os diferentes tipos de situações de agressão sexual com as DCs no artigo Comparing Offenders against Women and Offenders against Children on Treatment Outcome in Offenders with Intellectual Disability de Lindsay, Michie, Steptoe, Moore, e Haut, (2011) consideraram-se, para a análise, dois grupos experimentais que apresentavam deficiência intelectual e um grupo que representava a linha de base: os autores de agressão sexual adulto (Grupo 1) e os AASCAs (Grupo 2), comparados com dados da linha de base (Grupo linha de base). Tais grupos foram avaliados durante 36 meses de tratamento. O instrumento utilizado para avaliar a DC nas situações de agressão sexual foi o QACSO.

Os resultados apontaram que ambos os grupos apresentaram diferenças entre os escores de linha de base, isto é, houve diminuição da presença da DC nos dois grupos que envolviam as situações de agressão sexual de criança. A pontuação, em 36 meses de tratamento, indicou uma redução significativa no número de situações avaliadas. Sobre as DCs do Grupo 2, os participantes reduziram suas pontuações, mais acentuadamente, durante os primeiros 6 meses de tratamento. Depois disso, o progresso foi mais uniforme e, dos 24 meses em diante, os resultados que envolviam as DCs foram se aproximando dos níveis registrados nos grupos de linha de base, isto é, foram equiparados aos padrões normais da população em geral (Lindsay, et al. (2011).

O fato de que as DCs continuaram a mostrar reduções após 12 meses de tratamento sugere que as DCs relacionadas aos aspectos da sexualidade com as crianças são mais difíceis de mudar, mas, eventualmente, são mais suscetíveis à mudança. Embora, houvesse diferenças entre os grupos no início do estudo, estas diferenças deixaram de existir com a progressão do tratamento e, no final do processo, os dois grupos endossaram as DCs a uma taxa consistente com a linha de base. Este resultado sugere os efeitos satisfatórios do tratamento, desde que seja de maneira contínua e estendido por longo período (Lindsay, et al. (2011).

Considerando os resultados das pesquisas analisadas nesta revisão, percebeu-se uma heterogeneidade de estudos que avaliaram uma diversidade de situações envolvendo DC. De maneira geral, os resultados sugerem que o estilo de apego ansioso, a baixa empatia pela vítima e a presença de DC têm grandes chances de serem variáveis preditoras para o cometimento da agressão sexual perpetrada contra a criança.

Outros resultados sugerem, ainda, que as DCs, além de serem identificadas no grupo de AASCAs, há uma multiplicidade de justificativas que vão desde os diversos tipos de negações e minimizações sobre a agressão sexual perpetrada, até aquelas que são reconhecidas pelos AASCAs como DCs incontroláveis e estáveis. Os dados das pesquisas sinalizaram também, dentro da mesma amostra de AASCAs, que há distinções claras quanto à presença de DCs quando se reagrupa diferentes características de grupos específicos (alto e baixo desvio, intra e extrafamiliar) demonstrando a heterogeneidade destes grupos.

De maneira geral os resultados demonstraram que as pesquisas sobre programas de tratamento sugerem também que muitos criminosos sexuais podem continuar a manter crenças distorcidas sobre o sexo entre adultos e crianças, apesar de receberem aconselhamento e tratamento para minimizar a agressão sexual em uma provável recaída. Por outro lado, os estudos analisados demonstraram que tratamentos longos e duradouros podem promover uma melhor percepção das crenças distorcidas sobre relação sexual com criança/adolescente.

 

Considerações Finais

De modo geral, pesquisadores sugerem que as DCs entre AASCAs emergem de crenças causais subjacentes que eles têm de si mesmos, de suas vítimas e do mundo que o cerca (Burn & Brown, 2006; Drake, Ward, Nathan, & Lee, 2001). Essa conceituação é coerente com uma determinada perspectiva teórica adotada pela pesquisa em psicologia do desenvolvimento, a qual vê o desenvolvimento cognitivo como impulsionado pela aquisição de teorias implícitas que começam a se desenvolver na primeira infância, quando as crianças formam hipóteses sobre si mesmo, sobre o outro e sobre o mundo ao seu redor.

Apesar dos instrumentos acerca da DC serem maioria entre os instrumentos de avaliação cognitiva, há a necessidade de se consolidar uma base teórica consistente sobre a discussão das DCs como conteúdo, estrutura e processo que envolve AASCAs. Isso quer dizer que a identificação da DC como um construto presente nos AASCAs é algo que ainda carece de uma discussão teórica e metodológica capaz de ampliar e aprofundar esse tema.

Este estudo pode, efetivamente, contribuir para o aprofundamento do conhecimento disponível sobre os instrumentos de DC e os resultados das pesquisas que os utilizaram. Este parece ser o ponto de partida para se entender a diversidade das DCs atribuídas aos AASCAs, o que pode estimular a realização de outras pesquisas visando tornar as análises mais consistentes e abrangentes.

Como limitação desta revisão de literatura, destaca-se o fato de não terem sido utilizadas, como estratégias de busca, descritores capazes de traduzir de forma mais específica o tema e os objetivos desta investigação, envolvendo, portanto, palavras-chaves como avaliação, instrumentos, e DC. Outra limitação apontada está relacionada aos artigos analisados até o ano de 2013, sendo necessárias pesquisas futuras para que se avalie se novos artigos foram publicados considerando as avaliações de DC na população de AASCAs.

Especificamente sobre pesquisas futuras, sobretudo no Brasil, esta revisão sistemática sinaliza a necessidade de se investir mais em estudos com ênfase na validação dos instrumentos de DC para a realidade brasileira, com a finalidade de produzir um conhecimento contextualizado. Conforme Gosling e Abdo (2011) reforçam, há necessidade de pesquisas em contexto culturais diversos de forma a privilegiar os aspectos culturais locais.

Ainda dentro das pesquisas futuras, propõem-se mais estudos comparativos em termos contextuais, isto é, em culturas diferentes, como no caso do Brasil, já que faltam normas para comparação dos escores, sendo necessário comparar com outras populações. Apresenta-se, também, a ideia de estudos com AASCAs do sexo feminino com o objetivo de avaliar as DCs deste seguimento. Conforme indicam Colson, Boyer, Baumstarck e Loundou (2013), crimes sexuais cometidos por mulheres são um assunto que não tem recebido muita atenção até este momento. A criminalidade sexual feminina fica sempre em um plano secundário, sendo, frequentemente, esquecida nessa área de pesquisa. Finalmente, observa-se a necessidade de se pesquisar as DCs a partir de uma perspectiva bioecológica. Com isso, objetiva-se entender os processos de desenvolvimento e a estrutura das trajetórias de vida que contribuem para a construção e a solidez das DCs.

 

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Endereço para correspondência
Daniela Castro dos Reis
E-mail: danireispara@gmail.com

Recebido: 10/12/2017
1ª reformulação: 17/06/2018
Aprovado: 05/08/2018

 

 

Esta pesquisa foi financiada pelo CNPq.

 

 

1 Doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará e professora da Universidade Federal Rural da Amazônia.
2 Doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará e professora do mesmo programa.

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