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Psicologia USP

versión On-line ISSN 1678-5177

Psicol. USP v.1 n.2 supl.2 São Paulo dic. 1990

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

A personalidade narcisista segundo a Escola de Frankfurt e a ideologia da racionalidade tecnológica

 

The narcissistic personality according to the Frankfurt School and the ideology of the technological rationality

 

 

José Leon Crochik

Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia da USP

 

 


RESUMO

Discute a relação entre a ideologia da racionalidade tecnológica e a personalidade narcisista, com base nas reflexões de alguns filósofos da Escola de Frankfurt. Localiza esta relação historicamente de forma a explicitar algumas das transformações de certas instituições sociais que mediatizam a relação entre o indivíduo e a cultura. Investiga a possível influência dessas transformações sobre a constituição da personalidade.

Descritores: Narcisismo. Traços de personalidade. Distúrbios mentais. Autoritarismo.


ABSTRACT

Discuss the relation between the ideology of the technological rationality and the narcissistic personality based on the theory of the Frankfurt School. This relation is historically situated in order to explain some of the transformations of certain social institutions which mediate the relation between individual and culture. The possible influence of those transformations on the personality constitution is also investigated.

Index terms: Personality traits. Narcissism. Mental Disorders. Authoritarianism.


 

 

A relação entre personalidade e ideologia vem sendo estudada desde o início do século, por diversos pensadores que tinham como meta apreender o que contribui para a manutenção de uma sociedade considerada injusta para, assim, poder pensar nas condições de sua transcendência. Desta forma, a esfera psíquica na sua dupla dimensão irracional-racional, passou a ser enfatizada dentro de um referencial materialista-histórico, no qual antes se dava primazia às relações sociais de produção em sua contradição com o desenvolvimento das forças produtivas.

O fracasso da revolução socialista mundial, na década de 10, levou, segundo Jacoby (1977) e Rouanet (1989), a se repensar o marxismo ortodoxo que percebia nos movimentos estruturais da sociedade, a base de sua virtual modificação. Como poderia se explicar, por exemplo, com aquela teoria, que apesar do enfraquecimento da burguesia na primeira Guerra Mundial e o estado de miserabilidade do proletariado, este último não tomasse o poder? A explicação deveria ser buscada na configuração da personalidade. Ou seja, haveria uma espécie de resistência psíquica às alterações sociais que implicassem na emancipação do indivíduo e da cultura de seu estado de minoridade.

O psicanalista Wilhelm Reich, segundo diversos autores (Jacoby, 1977; Marcuse, 1981; e Rouanet, 1989) foi um dos pensadores pioneiros a analisar a relação entre configuração psíquica e estrutura social. Julgava Reich que a repressão sexual característica de nossa sociedade e exercida, entre outras instâncias sociais, pela família, seria a responsável pela aceitação e submissão às ideologias autoritárias e contrárias à felicidade do indivíduo. Assim, a ascenção do nazismo na Alemanha, na década de 30, fora possível devido à figura da autoridade repressora representada pelo pai, na qual a figura de um ditador poderia se basear. A força da autoridade do Estado, reproduzida pela figura do pai impelia à submissão, à "raison d'Etat".

Já Adorno e Horkheimer (1978), ao contrário de Reich, expõem que a ascenção do nazismo e, portanto, a aceitação e submissão da personalidade à ideologia autoritária, se devia ao enfraquecimento da família dado no período da República de Weimar. Com o declínio da figura do pai, enquanto figura de autoridade, a formação do Ego e do Superego do indivíduo foi prejudicada, facilitando o surgimento de um líder que possibilitasse mais a imitação (mimésis), do que a identificação. O avanço social teria levado a uma regressão dos ideais do Iluminismo de indivíduo e cultura. A autonomia do indivíduo possibilitada pelo conflito com o poder, perdeu-se na aceitação cega deste. E a idéia de uma cultura humana, calcada na universalidade e solidariedade entre os homens guiados pela razão é substituída por uma idéia de cultura natural, calcada na irracionalidade da raça e baseada na força.

Assim, a esfera psíquica passa a espelhar a sua anulação frente à irracionalidade das forças objetivas. Exige-se não somente a concordância com a ordem social, mas a anulação de todo e qualquer espaço psíquico dado à contestação. A vigilância não deve mais se dirigir ao exercício do poder social, mas aos desejos individuais que não se coadunam àquele.

Na década de 40, ao final da 2ª Guerra Mundial, havia preocupação nos Estados Unidos com a predisposição dos americanos em aceitar uma ideologia anti-democrática, e mais especificamente, a ideologia fascista. Adorno et alli (1965) realizaram um estudo sobre a personalidade autoritária (1), que estaria predisposta à aceitação e reprodução daquela ideologia. A hipótese do trabalho dos autores, era a de que a personalidade é a mediadora entre a estrutura social e a ideologia, de forma que a personalidade autoritária se relacionaria com o ideário político-econômico conservador e a personalidade não autoritária com o ideário político definido como liberal. Os autores concluíram que além da relação esperada, havia também pessoas com personalidade não autoritária que endossavam os ideais conservadores e, com menor freqüência, pessoas com personalidade autoritária que defendiam alguns dos ideais liberais.

Marcuse (1981), na década de 50, explicita de forma mais enfática, que a mediação entre o indivíduo e a totalidade, dada antes pela família, enfraqueceu, fazendo com que o indivíduo seja socializado diretamente pelo todo. No período do capitalismo concorrencial, o Ego elaborava os desejos do id e os submetia à apreciação do superego e à realidade externa; a sublimação tinha importante papel na constituição do indivíduo e da cultura. No capitalismo dos monopólios, em contraste, o controle dá-se diretamente sobre a consciência, através da liberação dos instintos, ou seja, a repressão se dá pela liberdade instintiva, naquilo que Marcuse denominou "dessublimação repressiva". Com esta modificação, Eros, o construtor da cultura transforma-se em sexualidade submetida aos valores do mercado. Se o indivíduo autônomo tinha difícil existência no capitalismo liberal, agora, a questão da autonomia não é mais colocada, e a Indústria Cultural e os especialistas dão os modelos a serem imitados.

Se, antes, no pensamento de Adorno, sublinhamos a aniquilação do indivíduo na ascenção do nazismo, com o estudo sobre a personalidade autoritária e a análise de Marcuse, deparamo-nos com a relação entre o fascismo e o capitalismo, ou melhor, entre o fascismo e o avanço cego das forças produtivas, que mantêm as relações sociais de produção. A submissão ao aparato tecnológico não é independente da submissão aos líderes fascistas; ambos impelem ao fim da subjetividade, pois tal subjetividade reage aos ditames culturais. Mas, mais do que isso, segundo Adorno (1967), o indivíduo é determinado pela totalidade e é sua antítese; a diferença entre indivíduo e sociedade, na origem, é social. No entanto, uma sociedade que regride à barbárie anula esta diferenciação.

Adorno (1967, 1968) dá indícios sobre a passagem da estrutura autoritária da personalidade para a narcisista, como forma de ajustamento social requerido. A personalidade autoritária traz consigo a submissão cega à autoridade e uma violência, também cega, contra aqueles que de alguma forma neguem aquela. Já a personalidade narcisista, com um ego enfraquecido, se guia por estímulos externos, quase sem ter consciência da distinção entre mundo interno e mundo externo.

A personalidade narcisista tem parentesco com a personalidade autoritária: ambas evitam contactos com outros egos, e, desta forma, contacto consigo mesmas. No caso extremo da personalidade autoritária, denominado "manipulador" , e no narcisismo, há o isolamento de afetos que, se conscientizados, trariam ansiedades reprimidas à tona. Nos dois casos, o Ego quase não media mais os conflitos entre o id e o superego e entre o id e o mundo externo, pois com o enfraquecimento da família, o indivíduo passa a ser socializado diretamente, como acentuado por Marcuse, o que impede a diferenciação. Com esta não diferenciação, Lasch (1983) aponta para a perda da noção do tempo e, com isso, a impossibilidade de pensar em uma outra ordem social que contemple a liberdade e a justiça.

Se o narcisismo é a personalidade adequada à sociedade atual e se, como apontam Marcuse (1982) e Habermas (1983) a ideologia da racionalidade tecnológica é própria desta sociedade, então, como se dá a relação entre ambas? O objetivo deste artigo é dar alguns elementos para refletir sobre esta relação.

Cumpre-nos, num primeiro momento, delimitar os termos "personalidade" e "ideologia" , mesmo que de forma sumária. O termo personalidade é entendido, neste artigo, como uma série de características individuais que são produtos de um conjunto de forças psíquicas que atuam, ora conjuntamente, ora antagonicamente no indivíduo e nas suas relações com o meio. Estas características significam uma solução de compromisso entre os objetivos para os quais tendem aquelas forças e as possibilidades de suas realizações. O enquadre desta conceituação é freudiana, de forma que as concepções de desenvolvimentos psicossexuais e das pulsões e suas representantes estão nele presentes.

O termo ideologia é definido, neste trabalho, como um conjunto de valores, idéias, ideais cuja função principal é a de obscurecer, ou melhor, encobrir as contradições existentes entre as relações de produção e as forças produtivas e as existentes nas próprias relações de produção. Obviamente, estes dois tipos de contradições não são independentes. Originada nas condições concretas da vida social, a ideologia não é mero reflexo da aparência destas condições, mas criação ilusória sobre elas (Chauí, 1981). Neste sentido, a ideologia guarda uma relativa autonomia dos processos de produção, mantendo com estes uma relação dialética, ao negarem-se e afirmarem-se simultaneamente, ou seja, ela não é somente reprodutiva, produz também: é justificativa da aparência.

Se, o enquadre dado ao termo personalidade é freudiano, o do termo ideologia é marxiano, e cabe-nos explicitar que o enquadre deste artigo é o da teoria crítica. Neste sentido, o conceito de ideologia adotado sofre modificações na história, tanto o conceito, quanto o seu objeto. Adorno e Horkheimer (1978) confrontam a ideologia liberal com a atual, mostrando que a primeira tinha elementos críticos, devido à sua relativa autonomia frente à realidade material, enquanto que a atual, além de sua dependência total do status-quo, não traz elementos racionais. Esta transformação ocorre devido ao "deslocamento geológico" como denomina Adorno, da infra-estrutura para a superestrutura social. Assim, a base do conceito pode ser situada no pensamento de Marx, mas o seu sentido é modificado, segundo as alterações da própria realidade, onde Adorno e Horkheimer apontam para a perda de seu sentido crítico.

Na perspectiva da Teoria Crítica, a história do indivíduo e a história da cultura estão interligados entre si e com as relações de produção, o que significa dizer que as alterações sociais que implicam em um controle maior da natureza, implicam, também, alterações na personalidade.

A seguir discutiremos o trabalho de Adorno et alii (1965) sobre a "personalidade autoritária" , para depois refletirmos sobre a relação entre a personalidade narcisista e a sua relação com a ideologia da racionalidade tecnológica.

 

1. A personalidade Autoritária

Como dito antes, Adorno et alii (1965) realizaram um estudo sobre qual era a predisposição dos americanos em aceitar uma ideologia anti-democrática e, mais especificamente, a ideologia fascista. Levantaram a tese de que a personalidade seria a mediadora entre a estrutura social e a ideologia. A estrutura social foi entendida dentro das relações entre capital e trabalho e a personalidade como um conjunto de forças psíquicas, que levam a características de pensar e agir mais ou menos duradouras; já a ideologia foi definida como um conjunto de idéias, pensamentos, opiniões.

Os autores construíram quatro escalas contendo itens, do tipo Likert, que permitiram inferir, de um lado, características de personalidade e, de outro lado, detectar pensamentos e posicionamentos sobre ideários políticos-econômicos. As escalas construídas foram as seguintes: Escala de Antisemitismo (AS), Escala de Etnocentrismo (E), Escala de Fascismo (F) e a Escala de Conservadorismo Político-Econômico (CPE).

A Escala F substituiu as escalas AS e E com as quais teve correlações elevadas e sobre as quais possuía a vantagem de ser mais dissimulada. Sobre a construção destas escalas cabe ressaltar que: 1. os itens foram elaborados de forma negativa, ou seja, o escore máximo para cada item (7 pontos) implicou um elevado grau de antisemitismo, etnocentrismo ou fascismo; e 2. a formulação dos itens se deu de tal forma que, aquilo que se pretendeu medir era relativizado. A segunda condição foi observada, dado o clima geral de democracia, na época, com o qual os sujeitos dificilmente exporiam diretamente as suas tendências antidemocráticas. Isto possibilitou que um alto escore em uma destas escalas poderia significar, tanto um não-democrata sem medo de expor as suas opiniões, quanto um pseudodemocrata. Se os itens demonstrassem uma atitude ou pensamento extremado, os pseudodemocratas não concordariam com eles, confundindo-se com os democratas genuínos, por isso nos dizem os autores: "Formulamos parte dos itens da escala AS em termos tais que se aproximariam ao máximo da ideologia pseudodemocrática." (Adorno et alii, p.81).

Já a escala de conservadorismo político-econômico (CPE) incluía itens positivos e negativos que não precisavam ser dissimulados. Os autores queriam medir a predisposição dos sujeitos à ideologia conservadora ou à ideologia liberal. A distinção entre as duas ideologias, que permitiu a construção da escala baseou-se em quatro critérios: 1. apoio ao status-quo; 2. resistência à mudança social; 3. apoio aos valores conservadores; e 4. idéias sobre o equilíbrio de poder entre capital, trabalho e Estado.

Além das escalas, os autores utilizaram-se de entrevistas semidirigidas e do Teste de Apercepção Temática (T.A.T) para estudar as dinâmicas da família e da personalidade dos sujeitos. Fizeram análises qualitativa e quantitativa dos resultados encontrados através do uso dos instrumentos. Entre estes resultados, salientam-se as correlações obtidas entre as escalas de Etnocentrismo (E) e de Fascimo (F) com a escala de Conservadorismo-Político-Econômico (CPE), que foram respectivamente de 0,57 (E com CPE) e 0,52 (F com CPE), ou seja, há correlação entre personalidade e ideologia, no sentido que, a personalidade autoritária (alto escore em E ou em F) abarcaria a ideologia conservadora (alto escore em CPE) e a personalidade não-autoritária (baixo escore em E ou em F) se relacionaria com a ideologia liberal (baixo escore em CPE). A direção das correlações apoiam os resultados encontrados pelos estudos de Fromm, na década de 30 e postuladas por Reich, segundo Rouanet (1989), mas como as correlações tiveram uma magnitude mediana, os autores explicaram outros tipos de relação entre personalidade e ideologia.

Se quase não foram encontrados sujeitos com altos escores em E ou F e baixos em CPE, apareceram sujeitos com escores baixos em E e F e medianos em CPE, que pela análise feita pelos autores poderiam ser considerados como "liberais politicamente pacifistas" e, também, sujeitos com alto escore em E e escore mediano em CPE, que mais do que se adaptarem a ideologias novas, expressando um conservadorismo moderno, adotam posições próximas dos liberais, mas para fortalecer mais ainda a segregação social expressa na divisão endogrupo-exogrupo e assim: "... podem considerar conveniente o aumento das funções econômicas do Estado, mas não por razões humanitárias, mas sim como um meio de limitar a força dos trabalhadores e outros grupos" (Rouanet, p. 190). Estes sujeitos, segundo os autores, podem ser considerados como reacionários e, em última instância como fascistas.

Antes de nos determos em outros dados obtidos na pesquisa, pensemos em algumas questões que os resultados acima indicam. Uma delas refere-se a separação entre ideologia, de um lado, e personalidade, de outro lado. Tal separação pareceria indicar que tratam-se de duas totalidades, em si mesmas, que se relacionariam entre si. Visão estranha, ao que parece, a um pensador como Adorno.

Segundo alguns autores (Jacoby, 1977; Mattos, 1989 e Rouanet, 1989) os pensadores da Escola de Frankfurt sofreram influência do pensamento de Hegel, mas o modificaram, especialmente, no que tange a relação particular-todo, no presente caso, indivíduo-cultura. Marcuse (1988) escrevendo sobre Hegel, aponta no pensamento desse a relação do indivíduo com a totalidade:

O ser humano, por exemplo, encontra sua identidade própria somente naquelas relações que são, afinal, a negação de sua particularidade isolada — na sua qualidade de membro de um grupo ou de uma classe social, cujas instituições, organizações e valores determinam sua própria individualidade. A verdade do indivíduo transcende sua particularidade e encontra uma totalidade de relações conflitantes nas quais a individualidade se perfaz (p. 124).

Assim, para Hegel, segundo Marcuse, o ser humano, enquanto particular, só encontra a sua verdade na totalidade.

Para os frankfurteanos, segundo Mattos (1989), o particular não tem um significado preciso, mas também, se remete ao homem: "É essencialmente ambígua a utilização dos conceitos de particular, particularidade, singular, singularidade, subjetivo, indivíduo, individualidade pela teoria crítica... A teoria crítica testemunha, ainda, em Horkheimer, Adorno, Marcuse e Benjamin o esforço em subtrair a particularidade individual à dominação abstrata do conceito em oposição a Hegel, Husserl, Heidegger..." (p. 307). Portanto, o ser humano pode ser entendido como particular e opondo-se ao Todo.

E, Rouanet (1989), ao comentar o pensamento de Adorno e Horkheimer sobre a síntese da Psicanálise com o Materialismo-histórico, alega; "O mesmo princípio da não identidade, que impede o reducionalismo objetivista e o subjetivista, veda a dissolução do particular no universal. O particular vale, em sua irredutível especificidade, como representante do universal, através da categoria da Vermettlung, da mediação, pela qual a parte é índice do todo, mas não pode ser absorvido pelo todo" (p. 75).

Assim, o particular, o subjetivo, o individual, não parece ser uma totalidade, mas parte da totalidade, que afirma o todo ao ser o seu índice e o nega por não ser idêntico a ele; necessita do todo para se constituir e para negá-lo. Desta forma, a personalidade como representante do indivíduo, não é totalidade e não se confunde com o todo, embora seja determinada por ele.

A autonomia individual é assinalada por Adorno et alii (1965) na ideologia individual, que é um processo seletivo e dinâmico que ocorre de acordo com as necessidades e desejos pessoais. De outro lado, acentuam a influência do todo: "...o espírito objetivo de nossa sociedade fomenta grandemente a mentalidade e a ideologia "altas" (p. 702). E, quanto a relação de ambos afirmam: "... o caráter fascista em potência é o produto da interação entre o ambiente cultural que inclina ao preconceito e as respostas "psicológicas a esta incitação" . (p. 702).

Rouanet (1989), na análise que faz da "Personalidade Autoritária" diz: "O que é decisivo, em praticamente todos os casos, é o general cultural climate, que ou constitui a própria personalidade ou a captura, indiretamente, imediata, ou mediatizada, com o status-quo" (p. 195).

Mas, se é assim, a que se deve a separação entre a ideologia e personalidade? Antes de tentar responder a esta questão vejamos a implicação de outra separação inerente a esta. Os autores de "A Personalidade Autoritária" separam a ideologia conservadora da ideologia liberal, de um lado, e a personalidade autoritária da personalidade não-autoritária, de outro lado. Se, a personalidade autoritária aparece em diversos pontos da elaboração da pesquisa, caracterizada como neurótica e, algumas vezes, beirando a psicose e a personalidade não autoritária aparece como não problemática, com um bom equilíbrio das três instâncias psíquicas — id, ego e superego (2), a comparação entre a ideologia conservadora e a ideologia liberal não é tão clara, e o tipo "conservador genuíno" atesta isto. Rouanet (1989), por exemplo, o interpreta como uma pessoa que se guia, predominantemente, pela razão e não pelos desejos, da mesma forma que o liberal genuíno, embora a razão que guia o conservador, seja, segundo esse autor, a da racionalidade instrumental, e ao liberal genuíno uma razão emancipatória. Por outro lado, Carone aponta as críticas de Shils à pesquisa, alegando que os seus autores associaram o conservadorismo ao fascismo e deixaram de lado, outro tipo de autoritarismo, o de "esquerda" . Das colocações dos dois autores podemos inferir a dificuldade de comparar os dois tipos de ideário quanto à valorização que possamos atribuir a eles.

Mas, algumas observações de Adorno et alii (1965) mostram a desvalorização do ideário conservador em relação ao liberal. A relação entre conservadorismo e etnocentrismo, de um lado, e de liberalismo e antietnocentrismo, de outro lado, é realçado pelos autores:

Certas semelhanças das principais tendências fundamentais do conservadorismo e do etnocentrismo sugerem qual pode ser a base teórica de sua estreita relação. Aparentemente, o apoio à ideologia político-econômica e a autoridade reinantes só formam parte da tendência etnocêntrica geral a submeter-se em todos os aspectos da vida social a autoridade aceita. De modo similar, a rejeição etnocêntrica dos exogrupos se manifesta na esfera político-econômica como uma resistência às mudanças sociais e como uma tendência a reunir as ideologias políticas progressivas sob o rótulo geral de exogrupos e idéias estranhas (ameaças contra a autoridade do endogrupo) e, mais adiante: Também há razões teóricas para supor que existe uma relação entre liberalismo e antietnocentrismo. Em geral, ambos têm uma atitude de crítica com respeito às autoridades e às tradições predominantes (p. 188).

Assim, o conservadorismo está associado ao fascismo e o liberalismo ao antietnocentrismo. Mas, então, como explicar o tipo "conservador genuíno" , que sustenta o ideário conservador, mas é capaz de criticar os endogrupos?

Como vimos anteriormente, Rouanet (1989) o vê dotado de uma ação guiada pela razão instrumental e é mister lembrar que Adorno e Horkheimer, em seu texto Dialética do Esclarecimento, contemporâneo de a Personalidade Autoritária, criticam a cegueira e a amnésia da razão positivista, algo já feito por Marcuse em 1941, no seu texto Razão e Revolução. A razão positivista, guia-se pela lógica do equivalente, tornando todos particulares, membros de uma mesma espécie; esta razão desconsidera o único e a sua relação com a totalidade, tornando o pensamento estranho a si mesmo. Como veremos mais a frente, a ideologia da racionalidade tecnológica, herdeira do Positivismo, tem características da estereotipia, tais como, divisão do mundo em categorias lógicas e uma suposta indiferença ao mundo externo. Se estes elementos podem ser associados ao etnocentrismo, o conservador que pensa através deles parece ser candidato ao fascismo, mais do que o liberal genuíno.

A crítica de Shils, explicitada anteriormente, ao estudo de Adorno et alii (1965), também nos auxilia a pensar sobre esta questão. Segundo Carone, o argumento deste autor é que:

A Personalidade Autoritária se baseia na distinção esquerda-direita, que é um esquema político simplificado e superado pelo próprio movimento histórico no século XX. No entanto, continua, os pensadores marxistas permaneceram presos a este esquema e interpretaram o fascismo, quando irrompeu na Europa nos anos 30, como uma acentuação do conservadorismo burguês, um conservadorismo levado ao desespero por causa da inevitável crise do capitalismo (p. 30).

Shils e outros autores, como nos informa Carone querem associar a personalidade autoritária ao totalitarismo, tanto de esquerda, quanto de direita, de uma forma ahistórica, ou seja, dentro da perspectiva que Horkheimer (1983) denominou Teoria Tradicional.

Mas, a Teoria Crítica por resgatar a importância da cultura no movimento histórico, e por ressaltar a subjetividade humana, não reduz a idéia de uma sociedade emancipada a uma revolução econômica, o que a levaria a se identificar com o marxismo vulgar e, como isto não ocorre, as sociedades socialistas que não preservam a individualidade são por ela criticados, como pode ser visto em Marcuse (1982). A sociedade soviética fez a revolução econômica, mas o indivíduo ainda vive no mundo da necessidade.

Em Adorno et alii (1965), a definição do liberalismo reflete mais do que alterações econômicas, reflete, também, a possibilidade dos indivíduos serem diferentes entre si e um contacto personificado entre as pessoas. Em suma, se o autoritarismo está presente em sociedades que não fazem da vida humana um fim, podendo ser elas capitalistas ou socialistas, o não autoritarismo só pode se apresentar numa sociedade que não precise ocultar as suas contradições sociais e seja voltada para a felicidade e liberdade humanas e, tal sociedade, parece-nos aproximar-se mais do socialismo do que do capitalismo.

Mas, Adorno et alii (1965) apontam para a superação da contradição do termo "conservador genuíno" no Movimento social:

Nos aventuramos a dizer que os conservadores "genuínos" que ainda sobrevivem, e cujo número provavelmente vá a míngua, podem chegar a sentir-se cada vez mais molestados ao tomar consciência de que as camadas conservadoras importantes da sociedade norte-americana se encaminham rapidamente até o ódio radical e a oposição contra os trabalhadores. Quanto mais marcada se faz tal tendência, tanto mais obrigado se sentirá o conservador "genuíno" a professar ideais democráticos, ainda quando os mesmos sejam algo incompatíveis com a educação que tinham recebido e com suas pautas psicológicas. Se cabe generalizar esta observação, ela implicaria que a dinâmica social atual empurra o conservador autêntico cada vez mais ao campo liberal (p. 639-640).

Ou seja, embora a relação entre personalidade e ideologia não seja estática e a divisão entre "genuíno " e "pseudo" não seja absoluta, o liberalismo se aproxima mais de uma sociedade que pretenda a maioridade para os seus indivíduos.

Cabe ainda ressaltar o "clima cultural geral" que Adorno et alii (1965) supõem levar às atitudes pseudodemocráticas, ou seja, a proposta existente na época, da liberdade individual de escolha e participação a nível político e, de respeito às minorias, dificulta a expressão clara e direta de preconceitos. Tal clima implica na conservação da democracia, mas uma democracia plena supõe inclusive a alteração do sistema econômico, portanto, pode-se defender o sistema político, desejando-se manter ou alterar o sistema econômico. Quando se deseja preservar a democracia para manter-se o "status-quo" , ela deve ser defendida com ressalvas e, neste sentido, não é plena; quando ela é defendida, tendo em vista profundas alterações sociais, ela deve ser ampliada, pois nasceu de uma estrutura social que lhe atribui algumas de suas marcas.

Mas, a personalidade autoritária, que age, predominantemente, através de "impulsos irracionais" é ambivalente, ou seja, necessita manter e destruir ao mesmo tempo, embora esta destruição deva caminhar no sentido reacionário e não revolucionário. Assim, esta mudança se caracteriza pelo conservadorismo.

Claro, deve se enfatizar que as determinações ideológicas não são independentes das determinações sócio-econômicas e, neste sentido, a ideologia conservadora se relaciona, ou melhor é determinada pelo capitalismo e por isso, Rouanet (1989) pode afirmar em relação aos autores da Personalidade Autoritária:

Apesar da aparente imparcialidade com que definem a ideologia, sem entrar no seu mérito, como um sistema de opiniões, valores e atitudes, os autores rejeitam o relativismo que equipara todas as filosofias, qualquer que seja seu conteúdo, e afirmam a validade de "uma visão do mundo que um homem razoável, compreendendo o papel de certos determinantes, e com acesso completo aos fatos necessários, organizará por si mesmo" (p. 169).

Mas, a ideologia para Adorno e Horkheimer (1978) não é somente falsa, ela o é quando pretende se passar pela realidade, mas pode ser verdadeira pelo seu conteúdo que deve ser resgatado e, assim, conceitos do liberalismo, tais como: liberdade e indivíduo devem ser preservados. Desta forma, tanto o conservador genuíno, quanto o liberal genuíno, por guiarem-se por um "Ego maduro" podem perceber a contradição entre aquilo que existe e aquilo que é proposto e que devem existir alterações sociais, que possam pensar e defender. O primeiro, segundo a observação de Adorno et alii (1965) citada acima, percebe com o avanço das contradições sociais, o aumento do preconceito, algo que rejeita, devendo tornar-se cada vez mais crítico com relação ao sistema econômico, deixando de ser conservador e, o segundo, com o avanço das contradições sociais deve fortalecer o seu ideário.

Portanto, a personalidade é a mediadora entre a estrutura social e a ideologia, mas não devemos cair no engano de supor que ela seja um fator independente, pois como veremos mais a frente, a própria cultura é dotada de mecanismos que dificultam o surgimento de uma personalidade "genuína". Assim, a separação entre os termos "personalidade" e "ideologia" se dá para mostrar uma cultura que facilita a oclusão da subjetividade, pois aquela (a cultura) impõe-se como reação à maturidade individual. Já a separação entre ideário conservador e ideário liberal se dá, então, com a clara desvalorização do ideário conservador em relação ao ideário liberal.

Na separação ideário conservador-ideário liberal, o que está em questão é o movimento das relações sociais, mas não unicamente, como visto, na direção da emancipação, como também na direção da reação. O tipo "pseudoconservador" que obtém escores medianos ilustra esta reação, pois ele concorda com algumas questões do ideário liberal, mas, apenas, para fortalecer mais o endogrupo; já o tipo "liberal genuíno", que não tem a sua percepção guiada pela distinção endogrupo-exogrupo, consegue refletir sobre as injustiças presentes num sistema social desigual. Como veremos mais a frente, o que distingue para Adorno et alii (1965) o "genuíno" do "imitativo" são as identificações adequadas ou inadequadas que a criança pode ter na sua infância; aquele que conseguiu uma identificação quase não problemática teve a formação de um superego bem "instalado" e razoavelmente flexível, de tal forma que tem um ego capaz de se relacionar bem com os impulsos do id e com as exigências do superego, sendo capaz de agir com uma razão que não precisa defender o indivíduo de impulsos ambivalentes através de preconceitos e estereótipos.

Já aquele que não conseguiu uma adequada identificação parental na infância, e teve dificuldade de introjetar os valores parentais, quando adulto tem de fazer um esforço suplementar para fortalecer em si mesmo e no meio, estes valores para se defender de sua ambivalência de impulsos e do consequente sentimento de culpa. Precisa, em outras palavras, fortalecer a autoridade e dirigir a sua agressão para os grupos que imagina que o ameaçam. Mas, é importante enfatizar que os grupos nos quais projeta sua agressão, são depositários de seus desejos, o que significa que agredir estes grupos é, também, auto-agressão.

A distinção entre genuíno e imitativo feita com este critério leva à conclusão, explicitada por Rouanet (1989), que a personalidade autoritária se caracteriza não somente pelas idéias interiorizadas, mas ao como as expressa, ao que acrescentaríamos que importa, também, o como são interiorizadas. Da mesma maneira podemos salientar que a forma de pensar os conteúdos da experiência mediata e imediata são específicas da personalidade autoritária relacionando-se, tanto às suas necessidades psíquicas, quanto às necessidades culturais.

A "grosso modo", poderíamos dizer que a personalidade não autoritária pode vivenciar a sua própria experiência e elaborá-la na contraposição entre os ideais introjetados por ela e por aqueles valorizados pela cultura, o que é de difícil ocorrência na personalidade autoritária.

Adorno et alii (1965) expõem alguns fatores culturais que fortalecem as características psíquicas nas suas dificuldades de pensar adequadamente a realidade. São eles: confusão e ignorância frente a aspectos políticos e econômicos, estereotipia e personalização.

Duas das características do conservadorismo são: identificação do mundo tal como é, ou seja, não pensar em utopias e voltar a inteligência para solução de problemas imediatos, o que leva a uma postura antiteórica. Nos dois casos, a relação aparência-essência, abstrato-concreto, não pode ser pensada. O movimento fascista, segundo os autores pode encontrar um solo fértil, quando está adubado por estas características: "O ambiente em que melhor podem prosperar os movimentos fascistas é a configuração constituída pelo tecnicismo e o 'realismo' consistente em cuidar dos próprios interesses por um lado, e a obstinada resistência a penetrar a realidade com o intelecto, por outro". (p. 617).

Segundo Adorno et alii (1965) o capitalismo avançado cultua a ignorância para se manter, tanto, através de seus meios de comunicação de massa que, entre outras coisas, iguala informações de diversos níveis, quanto a tendência positivista de pensar que evita especulações. A ignorância não é atribuída à falta de capacidade de pensar, mas a repressões psíquicas expressadas no medo de pensar ou aprender erroneamente e, além disso:

Podemos acrescentar que este temor, em muitos casos provavelmente nascido da prática paterna de não explicar ao filho mais do que o primeiro supõe que este é capaz de compreender, se vê continuamente reforçado por um sistema educativo que propende a desalentar tudo o que poderia considerar-se "especulativo", o que não é possível é corroborar mediante comprovações materiais e expressar em "fatos e cifras". (p. 620).

A ignorância e a confusão dos sujeitos frente a temas políticos e econômicos é, então, atribuído pelos autores a um meio social que incentiva as pessoas a pensarem o mundo tal como se apresenta e a se afastarem de problemas que aparecem como distantes. Ao mesmo tempo, a democracia, necessita que as pessoas tenham posições tomadas a respeito de temas políticos e econômicos, o que leva as pessoas a se valerem dos clichês dados pela cultura para se posicionarem.

Mas, além disso, apesar dos problemas políticos e econômicos serem colocados à distância do cotidiano, as pessoas percebem a sua importância nas suas vidas criando um conflito semelhante ao da infância, no qual se quer fazer frente ao desconhecido. Para isso, a criança utiliza-se de dois mecanismos, que podem transforma-se em traços de caráter: a estereotipia e a personalização, que também são utilizados pelos adultos.

A estereotipia leva a criança (e o adulto) a dividir o mundo em categorias: "os bons e os maus", "nós e os outros", "eu e o mundo"; é uma abstração da experiência vivida que assim imobilizada, não pode ser elaborada; o "outro" é colocado em categorias rígidas e não pode ser adequadamente percebido. Já, na personalização, a criança (e o adulto) para diminuir a ansiedade frente ao desconhecido relaciona-o a categorias pessoais próximas.

A estereotipia e a personalização agem conjuntamente. Enquanto a primeira evita contactos diretos e imediatos com o diferente, a segunda evita a mediação do concreto com o abstrato. A estereotipia pode colocar os políticos em categorias dicotômicas e a personalização trata de lhes dar características pessoais, ocultando, assim, a impessoalidade das relações políticas e econômicas.

Mas, os mecanismos culturais que levam a idéias distorcidas da realidade, encontram mecanismos psíquicos que lhes dão suporte, o que é enfatizado em todo o livro A Personalidade Autoritárias que fica bastante elucidado na tipologia elaborada por Adorno. Essa tipologia divide os sujeitos em dois grandes grupos, cada qual subdividido em outras categorias: os de alto escore na escala F e os de baixo escore nesta escala.

Uma vez que a cultura é onipresente, segundo Adorno, não basta estudar os indivíduos preconceituosos, mas deve-se também levar em consideração aqueles que resistem aos preconceitos fomentados por ela. Como exitem diversos tipos de síndromes de escore baixo e somente a uma delas é atribuída uma adaptação adequada (o liberal genuíno), as demais também representam formas de ajustamento à realidade pouco satisfatória (3).

As síndromes dos sujeitos de pontuação alta caracterizam-se pela existência de uma unidade estrutural, o que as diferencia é a ênfase em uma ou outra característica. Estas característica são: convencionalismo, submissão e agressividade autoritária, a projetividade, a tendência a utilizar os demais para a satisfação de seus desejos. Como explicitado antes, a personalidade autoritária tem, em geral, as suas identificações infantis fracassadas, ocorridas no período do Complexo de Édipo, o que a leva a ter um superego rígido que dê conta de seus impulsos ambivalentes e, neste sentido, a valorização da autoridade e a agressão a exogrupos é uma forma de lidar com a ambivalência destes impulsos separando-os.

A subsíndrome que mais nos interessa neste artigo, é a do "Manipulador", que apresenta a estereotipia mais extrema e tem parentesco próximo com o narcisismo: "Este sujeito apresenta características que o aproximam ao clássico caráter "anal" concebido por Freud e, a este respeito recorda a síndrome "Autoritário". Mas, se diferencia deste por mostrar simultaneamente extremo narcisismo e certa superficialidade e vazio". (Adorno et alii, p. 776).

O "manipulador" volta a sua libido para o ego e evita os perigos do mundo externo reduzindo-os a meros objetos; não conseguiu transformar o poder externo em superego e rejeita todo impulso afetivo. Mas, apesar disso, libidiniza os meios para os resultados que quer, transformando-os em fins. O seu antisemitismo é explicado por Adorno, devido a valorização que os judeus dão às relações individuais. Embora raros na amostra pesquisada, este tipo pode ser observado em: "... numerosos homens de negócio e também em número crescente de meios da ascendente classe tecnológica e administrativa, que no processo de produção cumprem uma função intermediária entre o proprietário de outrora e a aristocracia trabalhadora." (p. 715).

Além de apresentar características da personalidade narcisista, o tipo manipulador parece ser privilegiado em uma ordem social tecno-burocrática que se auto-perpetua, graças a quase ausência de superego, que o torna isento de fazer críticas e a cisão entre o ego e o id que projetada se torna a cisão entre aqueles que querem preservar o sistema social e aqueles que não o querem.

As síndromes de baixo escore também são descritas em função da resolução do Complexo de Édipo e podem levar a uma revolta contra a autoridade, tão compulsiva, quanto a existente naqueles que têm altos escores, usando da mesma forma o recurso da estereotipia. Embora os sujeitos das síndromes de baixo escore sejam pouco propensos à ideologia nazista, isto não significa que sejam guiados pela experiência pessoal e por sua elaboração e não por desejos infantis. Ao contrário, o ódio à autoridade é tão infantil quando a submissão a ela dos sujeitos de alto escore.

Por esta tipologia podemos supor que Adorno não estava preocupado unicamente com a personalidade autoritária mas com configurações de personalidades que impediam a ação ou a existência de um ego maduro capaz de intermediar as relações entre o id e o superego, de um lado, e de si mesmo com o meio externo através do uso da razão. Este "ideal freudiano" é exemplificado no tipo "liberal genuíno" que: "...tem um profundo sentido de independência pessoal. Não admite nenhuma ingerência externa nas crenças e convicções pessoais, e tampouco deseja imiscuir-se nas dos demais. Seu ego está muito desenvolvido ainda que não libidinizado; raras vezes se mostra 'narcisista'. Ao mesmo tempo, está disposto a admitir as tendências do id e a sofrer as consequências tal como sucede com o tipo 'erótico' de Freud". (p. 727). Além disso, traz consigo um senso de justiça muito acentuado.

Para a formação do ego e do superego, a presença da família é importante, mas com as alterações econômicas e sociais a família modifica as suas funções, entre elas, a de socialização. Com estas modificações, a mediação que a família fazia entre o todo e a subjetividade é enfraquecida. Esta nova situação leva a uma má formação do ego, que é uma das características da personalidade narcisista que veremos a seguir.

 

2. A Personalidade Narcisista

Marcuse (1981) mostra as mudanças sociais que criam as condições para o fortalecimento da personalidade narcisista. Entre estas mudanças, aponta para a diminuição da importância da família para a socialização do indivíduo que deriva: "... dos processos econômicos fundamentais que têm caracterizado, desde o princípio do século, a transformação do capitalismo "livre" em "organizado" e, com isso: "... o valor social do indivíduo é medido, primordialmente em termos de aptidões e qualidades de adaptação padronizadas, em lugar de julgamento autônomo e da responsabilidade pessoal" (p. 96).

Quando da época do capitalismo concorrencial, segundo esse autor, o controle tinha que se dar sobre os instintos, pois o sistema não era suficientemente organizado e padronizado para exercer um controle mais global sobre a consciência; já no reino dos monopólios os instintos podem ser liberados, desde que associados à conformidade social. O id é reprimido por sua liberação, restando ao superego voltar a culpa ou contra si mesmo ou contra uma totalidade abstrata. Uma culpa impessoal, uma vez que a dominação também é impessoal.

O espaço psíquico de conflito contra a identificação efetuada no Édipo deixa de existir. Este espaço psíquico era o guardião da autonomia individual:

Através da luta com o pai e a mãe, como alvos pessoais de amor e agressão, a geração mais nova ingressou na vida social com impulsos, idéias e necessidades que eram, em grande parte, de cada um dos jovens. Por conseqüência, a formação do superego, a modificação repressiva de seus impulsos, sua renúncia e sublimação, eram experiências muito pessoais. Precisamente por causa disso, sua adaptação deixou cicratizes dolorosas e a vida, sob o princípio do desempenho, ainda se conservou uma esfera de não conformismo privado (p. 97).

Já no capitalismo dos monopólios, o pai é uma figura fraca para a identificação concorrendo em desvantagem com outros modelos fornecidos pela mídia e pela escola: "Os especialistas dos meios de comunicação com a massa transmitem os valores requeridos; oferece o treino perfeito em eficiência, dureza, personalidade, sonho e romance. Com essa educação, a família deixou de estar em condições de competir." (p. 97).

Se, na personalidade autoritária, a individualidade podia ser apontada por necessidades singulares, mesmo que através da negação de suas satisfações, na formação da personalidade descrita por Marcuse é difícil de se descobrir tais necessidades, pois são atendidas diretamente através dos simulacros ofertados pela Indústria Cultural.

Marcuse (1981) não menciona o termo narcisista, mas a não diferenciação entre o indivíduo e o meio, o apego a valores externos, apontam para este quadro.

Portanto, o avanço tecnológico e as consequentes transformações sociais tornam a família menos influente na socialização da criança e meios extra-familiares passam a socializá-la mais diretamente. Marcuse (1981) vai argumentar que o superego torna-se mais frágil e o ódio, antes voltado para o pai, direciona-se contra tudo, não encontrando objetos específicos para se expressar. Claro, Marcuse mostra que este processo de despersonalização não ocorre somente na família, mas no trabalho, na escola, facilitado pela crescente burocratização da sociedade e a complexificação da divisão do trabalho. Se a personalidade autoritária tinha o seu drama no cerne da família, com o enfraquecimento desta, o indivíduo é diretamente influenciado pelo todo. Assim, os modelos de identificação são vários, mas não tão variáveis, uma vez que com a crescente racionalização tecnológica da sociedade (Marcuse, 1981 e Habermas, 1983), diversos modos de ser se reduzem ao mesmo, ou seja, nos diversos meios de socialização, pelos quais a criança adquire hábitos, valores e (pré)conceitos, o mesmo modelo reaparece de formas distintas. Com estes diversos modelos, que mantêm uma relação distante com a criança, o ego fragmenta-se; são diversas introjeções mal feitas. Como o Ego é fragilmente formado, não pode, de um lado, dar conta das exigências do id e nem responder a elas de forma adequada, e de outro lado, dificulta a formação do superego.

Por todo este processo, Marcuse (1982) diz que não há ajustamento nos dias atuais, mas mimése, a criança imita o modelo, não negando-o, o que permitiria ter uma identidade.

Na lógica do equivalente geral, o ser diverso, o ser único é desviante. Se, o ego é fraco, o mesmo ocorre com o superego, o que faz com que o indivíduo seja heterodirigido. A autonomia, anteriormente possível, é cada vez mais rara.

Segundo Freud (1978) vários indivíduos, quando adultos, não demonstram a interiorização das normas sociais e, assim, não receiam ter intencionado uma má ação, mas apenas a sua descoberta pela autoridade, quando ela é executada. E, desta maneira, podem agir de duas formas para não serem punidos: 1. adequarem-se aos modelos valorizados pelo meio através da imitação e, 2. tentarem ocultar as suas ações más. Mas, se pensarmos que estas formas são intencionais, bem elaboradas, teremos que pressupor um ego razoavelmente bem constituído, o que contradiria o anteriormente exposto. O que ocorre é o contrário, ou seja, o processo de não personalização.

Como na atualidade, a cultura se caracteriza mais pela liberação do que pela repressão dos instintos, a ideologia a ser transmitida tem menos relação com a repressão para o trabalho, do que a liberação para o consumo. O indivíduo é menos o que produz e mais o que consome. A identidade é menos formada pelo trabalho, do que pelo consumo. E, aquilo que é consumido é vendido pelos meios de comunicação de massa, que estabelecem paralelos entre o ter e o ideal de ego cultural. As pessoas se representam por produtos culturais, que se constituem em clichês do pensar e comportar adequados. É a mentalidade do "ticket" divulgada pela Indústria Cultural, segundo Adorno e Horkheimer (1985).

Esta mentalidade já é apontada por Adorno em "A Personalidade Autoritária", conforme explicitamos anteriormente, nos sujeitos pesquisados, contribuindo para a confusão e ignorância em assuntos políticos e econômicos e na utilização da estereotipia e personalização. Mas, a personalidade autoritária, com exceção do tipo manipulador, ainda tinha a necessidade de manter os valores de um superego mal introjetado, nela se nota não só o conformismo como a rebeldia; já no narcisista isto não ocorre, só há conformidade com aquilo que lhe é mostrado como sendo verdadeiro, e mais do que isso, como o seu superego é frágil, torna-se um indivíduo mais corruptível (ver Lasch, 1983).

Assim, no pós-guerra a personalidade autoritária baseava-se na ambigüidade de afetos, ou melhor, na cisão de afetos relativos a autoridade, que levava a uma alternância de submissão-rebeldia calcada em objetos distintos: a submissão orientada para as autoridades constituídas e a rebeldia contra os exogrupos. A personalidade narcisista, sucedânea da autoritária, não se baseia mais no conflito de afetos e sim na desconexão entre eles e deles com o conteúdo da experiência.

Segundo Lash (1983) as características primárias da personalidade narcisista são: dependência de calor vicário proporcionado por outros; medo de dependência; sensação de vazio interior; ódio reprimido sem limites; e desejos orais insatisfeitos. A explicação ontogenética que Lasch dá do narcisismo, não tem como em Adorno, referencial freudiano, a teoria que adota é a de Melaine Klein e, assim, o narcisismo é a tentativa de resgate de situações anteriores à separação traumática: "Por meio da interiorização, o paciente procura recriar uma relação amorosa desejada, que pode ter existido antes, e simultaneamente anular a ansiedade e a culpa motivadas por impulsos agressivos, dirigidos contra o objeto frustrante e desapontador." (p.61). Traz consigo uma cisão interna entre imagens boas e más do eu e dos objetos, devido a sua intolerância de suportar a ambivalência e a ansiedade e da cisão surge a necessidade de idealização dos pais para evitar a ameaça dos "pais maus". Se, o obsessivo é fixado na fase anal, o narcisista é mais regredido, trazendo consigo características da fase oral.

No estudo sobre a personalidade, o ideário conservador e, mesmo o ideário liberal serviam de racionalização para desejos não permitidos, nos tempos do narcisismo declara-se o fim das ideologias, no momento em que a ideologia da racionalidade tecnológica auxilia na produção e consumo de massa que traz como valor o desenvolvimento e consumo de técnicas.

Mas, como a ideologia da racionalidade tecnológica se relaciona com a personalidade narcisista? É o que tentaremos ver a seguir.

 

3. A Ideologia da Racionalidade Tecnológica

A ideologia liberal própria do liberalismo europeu, que estava presente nos ideais da Revolução Francêsa, marco histórico da ascenção da burguesia, não serve mais para justificar uma relação social ditada pelo mercado livre, que aumenta a desigualdade social, com a presença dos monopólios substituindo o "livre comércio". Neste cenário, segundo Habermas (1983) duas transformações correlatas ocorreram: 1. Fortalecimento do Estado, no que se refere, tanto à intervenção na economia, quanto na provisão dos direitos sociais; e 2. Autonomia das forças produtivas das relações de produção, com o uso das técnicas e ciências substituindo a mão de obra humana.

Estes dois fatores atuam a favor do status-quo. O Estado que, de um lado, se privatiza atendendo às necessidades do capital e, de outro lado, contendo as possibilidades de revolta social ao dar uma série de benefícios para a classe trabalhadora, é o Estado do Bem Estar Social. Mas, para se perpetuar, o capital representado pelo Estado precisa mostrar-se provedor e eficaz no atendimento às necessidades da população para alijar os trabalhadores do processo político, ou seja, é necessário, segundo Habermas (1983), despolitizar as massas. Isto é feito com o uso da ideologia da racionalidade tecnológica, que coloca no lugar de questões políticas, questões técnicas. Assim, num processo de eleição, por exemplo, não é o conflito político de setores diversos da população que surge na escolha do governante, mas a escolha de administradores competentes, que podem tornar o mundo mais perfeito do que já é, ou seja, não se trata de modificar a sociedade, mas de aperfeiçoá-la, e, como a técnica traz, da Filosofia Positivista, a imagem da neutralidade, as contradições sociais são suspensas e a técnica adentra no cotidiano através de um processo de racionalização crescente.

Por trabalhar com conceitos próprios ao positivismo, esta ideologia fortalece o pensamento e o comportamento padronizados que têm como critério a eficácia sobre o meio; o que importa são os resultados (ver Marcuse, 1981). Mas, também, os processos são padronizados. Lasch (1983) mostra que a visão moderna da pedagogia que vê o desenvolvimento individual através de fases, torna a vida uma corrida de obstáculos a serem vencidos. O desenvolvimento através de uma educação moral, conflitiva, mas que permita o surgimento de um espaço psíquico autônomo de rebeldia é substituído por critérios de normalidade científica heterodirigidos.

No lugar de consciência política tem-se a consciência tecnologia, uma consciência que reduz a si mesmo e aos outros, a objetos técnicos. Não precisamos dizer que é o grau mais avançado da reificação.

Como o desenvolvimento tecnológico converte-se num fim em si mesmo, o tempo, a história, são dominados imaginariamente, vive-se somente o presente, pois o futuro torna-se o presente sofisticado e o passado converte-se em obscurantismo. Sem a noção do tempo e da história, a busca da Utopia e, portanto, a ruptura com a natureza repetitiva não existe. Tudo é reduzido ao mesmo. O idêntico e a identidade são objetivados e separados daquilo que poderia se constituir num "eu".

Ora, o narcisista é o próprio não-eu, o seu ego enfraquecido e autocentrado consulta o ideal de homem eleito pela Pedagogia e pela Psicologia, no mundo externo para poder valorizar-se. Mas, o mundo não lhe importa, a não ser para satisfazer os seus desejos de preencher o vazio de um eu não constituído.

Se, na dialética do Esclarecimento, Adorno e Horkheimer (1985) mostram o desenvolvimento da cultura através do controle da natureza, que envolve o controle da "natureza humana", esta não percepção da especificidade do objeto e o preço pago por isto, se mantém na ideologia da racionalidade tecnológica. E, assim, a manipulação técnica de objetos serve de protótipo para a manipulação pessoal, mas, mais do que isso, na manipulação técnica da natureza já está contida a necessidade do controle do homem. Ulisses na Odisséia, tem de controlar a natureza e possibilitar o seu ser homem. No entanto, ao esquecer a sua origem no desejo negado, esquece-se de si mesmo, e, o desejo de indiferenciação retorna na cultura, onde o particular deve ser subsumido ao todo.

A ideologia da racionalidade tecnológica, representante de um todo totalitário, constrói os espelhos para o narcisista se mirar. No reino dos monopólios, não há mais a necessidade de um ego independente e livre, pois a administração cuida da racionalidade da vida.

Adorno et alii (1965) apontam como características do ideário conservador, entre outras, a não existência de Utopias, o que leva a considerar o capitalismo como o sistema mais adequado à natureza humana, e a tendência a evitar radicalismos sociais, dando ênfase a uma posição política "centrista". Mostram esses autores, que a cultura da época recaía num tecnicismo e realismo, que levam a uma posição anti-teórica e a busca de solução imediata para problemas pessoais. Devemos, ainda, lembrar, que o tipo "manipulador", caracterizado pela cisão entre razão e afetos, poderia ser encontrado entre homens de negócios e administradores. O conjunto desses fatores auxiliam a preservação do sistema capitalista, permeando e sendo permeado pela Ideologia da Racionalidade Tecnológica.

Segundo Marcuse (1981) o avanço econômico levou a uma maior administração social com a presença da ciência positivista e da tecnologia. E, para Habermas (1983), a introjeção de valores morais, oriunda da esfera da interação social, submete-se a esfera do "agir racional com respeito à fins" tomando para si a racionalidade desta última. As diversas possibilidades de ser da sociedade convertem-se no aperfeiçoamento técnico de um sistema social altamente gratificador, através das mercadorias que oferece. As injustiças sociais tornam-se problemas técnicos. Assim, pode-se agredir o diferente através de preceitos da normalidade científica. A antinomia endogrupo-exogrupo é expressada por outras antinomias: normal-anormal, capaz-incapaz, mas sem o ódio visível do preconceituoso e com a frieza de um cientista frente ao espécime observado.

Os problemas sociais passam a ser considerados problemas técnicos, o que leva ao fortalecimento do existente. A redução da cultura feita pela indústria cultural rompe com a sua autonomia relativa e o ser só pode ser visto e percebido pela sua aparência, dada, por sua vez, pelo consumo de mercadorias, quer materiais, quer culturais.

Ao nível do pensamento, a fantasia e a especulação são proibidas como atesta Marcuse (1981), ao nível político, importam as questões técnicas, segundo Habermas (1983), ao nível da subjetividade, importa a sua abolição em nome da normalidade científica, como mostra Lasch (1983). O mundo expressa a sua impessoalidade na impessoalidade de Narciso.

A verdade da Personalidade Autoritária, assim como a verdade do Narcisista são expressas na ideologia da racionalidade tecnológica: a não-diferenciação do homem existente, em uma sociedade que espelhada na natureza só se repete recaindo na eterna mesmice.

Assim, o processo de desenvolvimento social se legitima em si mesmo, é um fim em si próprio representado pela administração racional, uma administração tão racional, que a leva à irracionalidade, por esquecer que ela é meio para a felicidade humana. Mas, por levar o seu controle da natureza a um controle extremo sobre o homem, impede a individualização deste. O sistema da razão formal, de servo se transforma em senhor, o animal racional apartado de sua especificidade, se aliena de si mesmo ao não se diferenciar neste formalismo. E, assim, à sociedade madura corresponde o adulto infantilizado, e à identidade heterodirigida corresponde o indiferenciado.

Mas, como reclamar de um mundo provedor de gratificação imediata? Não é melhor ignorar a possibilidade de liberdade e autonomia? Eis o narcisista.

 

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(1) O uso do termo "personalidade autoritária" não é plenamente adequado ao estudo desses autores. Embora ele se aplique ao título do livro, no qual relatam e interpretam o seu trabalho, refere-se especificamente a um tipo de escore alto nas escalas de antisemitismo, etnocentrismo e, principalmente, fascismo que desenvolveram. Os autores encontraram outros tipos de personalidade de escore alto naquelas escalas que, juntos, formariam uma síndrome. Da mesma forma, os autores descrevem tipos de personalidade expressados por escores baixos, alguns dos quais com uma estruturação semelhante aos sujeitos de escore alto. Utilizaremos neste trabalho, o termo "personalidade autoritária" para expressar os tipos de escore alto e o termo "personalidade não autoritária" para expressar os tipos de escore baixo.
(2) Adorno, em seu texto Sociology and Psychology de 1968, vai fazer a crítica da idéia da personalidade harmoniosa em relação às três instâncias psíquicas, apontando-a como conformista em relação ao todo. A única "imagem do homem" que não é ideológica é aquela que é negada no momento, segundo o autor. Ao salientarmos esse ponto, queremos ressaltar, que os autores de A Personalidade Autoritária não estão trabalhando com uma noção categórica de normalidade e anormalidade psíquica. Aliás, basta ler a análise que Adorno et alii (1965) fazem de um sujeito do tipo "liberal genuíno", para que se evidencie a relativização que os autores fazem da noção de "personalidade saudável".
(3) Quando empregamos os termos "adequado" e "satisfatório" não queremos salientar o conceito de normalidade, mas uma mediação entre personalidade e cultura que leve em conta a dinâmica psíquica, a dinâmica social e a sua relação. Em outras palavras, uma mediação feita pelo sujeito que não distorça a realidade interna e externa, percebendo que estas duas esferas se influenciam mutuamente.